quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Acidentes e sobressaltos

Presenciei hoje pela manhã um acidente no centro da cidade. Um carro com dois idosos estava numa preferencial, quando um jovem cortou a rua. Não houve feridos, mas os carros ficaram, praticamente, demolidos. O que me chamou a atenção foi o fato de que os idosos estavam sob uma marquise - chovia bastante - trêmulos, ligando para o filho e repetindo, catatonicamente, "bateram no nosso carro, bateram no nosso carro".
Embora a culpa não fosse do senhor idoso, fica sempre a preocupação com relação a dirigir após uma certa idade, não somente pelo fato de que as reações ficam mais demoradas, mas pelo trauma e a dor que certas situações acabam causando.
Aqueles que estavam à sua volta queriam consolá-los de qualquer forma, mas não havia como: foram vítimas de uma violência e estavam perdendo, possivelmente por um bom tempo, um bem que deveria ser valioso para eles.
Creio que cuidar dos idosos não significa que devemos colocá-los numa redoma de vidro e tirá-los da sociedade. Mas também, numa situação caótica de trânsito, preservá-los de situações traumáticas. Infelizmente, aqueles idosos vão levar um longo tempo para esquecer, se é que vão esquecer. Um acidente assim deixa feridas que não cicatrizam na pele, mas causam sobressaltos pelo resto de uma vida.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Gentileza para compartilhar vida

Sou até chato quando registro o quanto faz a diferença, pessoal e socialmente, quando "cometemos" atos de gentileza. Tive que sorrir, hoje, pela manhã, quando o carro na minha frente parou para dar passagem a um idoso que andava com muitas dificuldades. Do outro lado, um motoqueiro (quase sempre responsabilizados por todos os problemas de trânsito e de incivilidades) também trancou o trânsito para que aquele senhor fizesse o seu percurso com toda a segurança.
Dias atrás fui passado, pela direita e pela esquerda, por quatro motoqueiros. Em seguida, havia uma faixa de pedestres, onde se preparava para atravessar uma mãe com o filho pela mão, sendo que o filho segurava um boneco. Pensei: "estes filhos da .... não vão parar". Queimei a língua: os quatro pararam! E mais, quando já estavam quase do outro lado, o boneco caiu e a criança deu um safanão na mão da mãe, libertou-se e correu para apanhar o objeto. Quase fechei os olhos, pensando na desgraça anunciada. Mas nada aconteceu, os quatro permaneceram esperando que a criança apanhasse o objeto do seu desejo e que a mãe - estresse puro e desespero - alcançasse o pequeno.
Meu ex-colega de escola, Marcos Medronha, escreveu sobre um personagem do Rio de Janeiro, alcunhado de Gentileza, pois encontrou no interiorzão de Canguçu alguém com o mesmo sobrenome, acreditando que o nome também tornava a pessoa portadora das mesmas qualidades. Que bom que fosse, pois precisamos da gentileza para fazer a vida melhor. Precisamos da gentileza para gastar mais tempo com as pessoas do que com nossas preocupações e objetos. A graça da vida está exatamente aí: compartilhar vida.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

"Não foi meu aluno"

Sábado assisti ao último capítulo da novela Fina Estampa, pois, a partir desta semana, minhas noites são tomadas por aulas. Fiquei indignado com a participação de um jornalista, Beto Júnior (personagem de Danilo Sacramento), que anda muito perto de deixar a ética e percorrer o território maldito do jornalismo de espetáculo.
Em duas ocasiões, ele violou os códigos mais elementares do jornalismo: ao invadir um apartamento para forçar uma fonte a lhe dar uma entrevista e, ao realizar a entrevista, distorcendo o que a fonte dizia, além de dizer que já tinha opinião formada, contrária à pessoa que estava ouvindo.
Fiquei chocado e tive que pensar: "não foi meu aluno". Logo, tive que voltar atrás, ao lembrar de muitas ocasiões em que alunos já no mercado diziam que "na prática, a teoria é outra". Um quadro surreal em que narravam situações em que tinham sido orientados para exacerbar uma situação emocional, de tal forma que pudessem registrar lágrimas, muitas lágrimas.
Ouvi outras pessoas, que também disseram algo semelhante: Danilo Sacramento conseguiu um personagem que deixa uma boa parcela da população indignada. Mas é claro, jornalistas assim não são a regra, mas exceções: agredir as normas da ética não fazem um bom jornalismo, mas criam, ao contrário, o constrangimento e a descrença, o que é ruim para todos. Na verdade, tenho o prazer de dizer que a maior parte daqueles que passaram por nossas salas de aula dão exemplo de um jornalismo que deseja colaborar para tornar a sociedade melhor e mais solidária.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Dinheiro fácil


Artigo de maio de 2005. Infelizmente, a realidade não mudou muito.
Nos últimos dias tem se tornado uma constante o anúncio de instituições que oferecem dinheiro fácil. É o caso de bancos que emprestam para idosos, como também o do governo querendo institucionalizar mais uma loteria com a finalidade de auxiliar os grandes clubes de futebol.
Não consegui desvincular esta informação de uma outra, também muito comum, que é o caso do golpe da premiação, que aparece das mais variadas formas, hoje, inclusive, por telefone ou por internet.
O que tem em comum? O oferecimento de dinheiro fácil. Mas a que custo? Aí é que está o problema.
Com relação aos golpes, é sempre bom prevenir, especialmente os mais idosos, de que premiações desproporcionais ao investimento não existem. Ou são muito difíceis. Não passem dados por telefone e liguem para alguém pedindo orientação. Se for o caso, até para a polícia. E quem tem familiares idosos, previnam. É o melhor remédio.
No caso de oferecimento de empréstimos para aposentados, é bom que se dê conta de que, a partir daquele momento, uma parcela fixa do seu salário vai ser automaticamente descontada. Não tem como voltar atrás. E tem juros. Portanto, usem somente se precisarem, numa emergência. Se não for o caso, a velha dica ainda vale: poupar, juntar dinheiro para fazer aquela viagem ou comprar algo com o que estão sonhando.
Já a nova loteria é um atentado. Seguindo este raciocínio de que os clubes precisam de auxílio, quantas outras loterias precisariam ser criadas, já que grande parte da população está enfrentando problemas com as suas finanças.
Infelizmente, há uma cultura do brasileiro de que poderá solucionar seus problemas financeiros por um milagre vindo de uma loteria. Esqueçam. Não há milagres para resolver problemas econômicos.
Há esforço, muito esforço para resgatar o cheque especial, conseguir uma poupança para os investimentos que se deseja. Nada é para ontem. Bem pelo contrário, deve ser uma programação a médio e longo prazo.
Mas não desista, o contrário é naufragar na insegurança e na angústia que se vive quando desajustamos nossa saúde financeira.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Porque devemos silenciar mais?


Do meu livro "Remendos e arranjos", a segunda história sobre um Mestre e seu Aprendiz.
O Aprendiz estava à beira do pequeno lago e brincava atirando pequenas pedras contra o espelho d’água. Ele alternava formas rápidas e precisas, com outras vezes em que jogava para o alto as pequenas contas que, igualmente, iam mergulhar de encontro aos seixos. Observando à distância, o Mestre pensou que somente podia ser uma brincadeira de criança. Aproximou-se, dizendo:
- Também sou bom em atirar pedras na água. Quando era da sua idade, no mosteiro em que morávamos, tínhamos um grande lago, onde, quando nos era permitido, gostávamos de chapinhar com as pedras, vendo quem conseguir fazer com que elas deslizassem mais até mergulhar. Você está gostando de brincar com as pedras na água?
- Meu amado Mestre, eu não estou brincando com as pedras na água.
O Mestre fez-se de sério e perguntou:
- Então o que foi que eu vi, vindo por este caminho, e com estes olhos que a natureza vai pedir de volta um dia?
Tranquilamente, o pequeno garoto apanhou uma nova pedra e jogou-a na água, agora quase a soltando, fazendo com que a agitação da água fosse pouca e o barulho menor ainda.
- Posso saber, então o que fazes?
- Eu me preparo para ouvi-lo.
- Creio que não entendi!
- É muito simples. Quando estou agitado, o que o senhor diz é como a pedra que lanço muito alto e quando ela cai faz mais barulho e buliço do que sentido.
- E quando você a solta como agora a pouco?
- É como se eu estivesse me preparando a longo tempo para ouvi-lo. Neste caso, estou preparado e o que diz cala dentro de mim, pois eu envolvo suas palavras com todos os meus sentidos.
Era melhor pensar em alguma coisa para argumentar. Mas não encontrou. Teve vontade de experimentar jogar uma pedra das duas maneiras, para ver como estava se comportando nos últimos tempos. Mas já sabia que havia muito agito e pouca serenidade; muito buliço e pouca capacidade de silenciar. Quem lá em cima prepara esta pequena estrela para dizer estas verdades? Quando lá chegasse iria precisar de uma pequena cadeirinha, sentar-se diante do Deus e pedir-lhe explicação.
- Mestre, porque o senhor quer explicações de quem já lhe deu todas as chances de compreender? Quando chegar lá em cima, não vai precisar de explicações. Você já vai ter entendido tudo!
Era uma grande verdade. Mas também era verdade que estava precisando, com urgência, controlar seus pensamentos. Mas era hora de voltar aos demais meninos e aprender como é difícil ser pai.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

"É tudo tão simples"

O programa Mais Você (Rede Globo, Ana Maria Braga e Louro José) entrevistou na manhã desta sexta a jornalista e escritora Danuza Leão. Uma agradável surpresa para quem conhecia a socialite e desconhecia a autora de "É tudo tão simples", que já se transformou numa espécie de livro de autoajuda para quem deseja exatamente isto, uma vida mais simples.
Dando por exemplo a própria vida de quem saiu de um super apartamento para um apartamento de um quarto, vai mostrando o quanto a vida fica mais leve se somos capazes do desapego e de seguir uma certa normatização de etiqueta.
O desapego vai num exemplo concreto, onde um objeto ou roupa que não se usa durante um ano inteiro (um ciclo que se completa com todas as estações), pode ser descartado: doado ou encaminhado para vender.
A etiqueta, que definiu como "pequena ética", são as normas de boas maneiras e de bom relacionamento, capaz de tornar nossas relações mais fáceis. Lembrei da novela Fina Estampa, de ontem, onde Danielle Fraser (personagem de Renata Sorrah) tenta ensinar etiqueta ao seu namorado Enzo (Júlio Rocha), como o jeito de abrir uma garrafa de vinho ou de utilizar os talheres.
Achei que o filho do peixeiro iria debochar, mas aconteceu exatamente o que Danuza apregoa: a etiqueta não é apenas para tornar chique algum tipo de evento, mas estabelecer normas que sejam assumidas por todos e facilite a vida de todos.
Ao fazer uma revisão, claro que todos nós encontramos momentos de apegos desnecessários, assim como da vivência de normas de etiqueta, traduzidas em atos simples, como o segurar uma porta aberta para alguém, respeitar a faixa de pedestre ou um simples "bom dia". "É tudo tão simples" e a vida merece ser descomplicada.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Grenal e o dia seguinte

Uma olhada rápida no Facebook e lá está a deitação dos gremistas sobre os colorados pela vitória de ontem, que eliminou o Internacional. Tem coisas muito criativas e tem, também, muita gente com dor de cabeça, não pensando em sair ao sol, nem encontrar o adversário corneteiro.
Já fui um colorado mais praticante. Hoje, nem terminar de ver um jogo tenho paciência. Para mim, que vi apenas o primeiro tempo, o jogo terminou empatado. Consolo-me com isto.
Mas, em outros tempos, meados de 1970, estava em Porto Alegre e acompanhei as duas disputas finais do Brasileirão. Na flor dos meus 20 anos, entrávamos para o estádio no meio da manhã para um jogo que iria iniciar apenas às cinco da tarde. Dia seguinte, óbvio, não havia voz! Mas era uma festa que deixava o Beira Rio e se estendia até a Glória Gruta, onde sempre ficava.
Na infância, torcedor do Pelotas, confesso, não sei porquê. Quando fui para o Seminário, descobri que existia Grêmio e Inter, por um simples motivo: numa turma de 18 alunos, 16 eram gremistas, um (o Cleiton, de Pedro Osório) era colorado e eu, que não sabia da existência dos dois times. Por solidariedade, fiquei colorado e foi o último campeonato do Grêmio, que ficou hepta. No ano seguinte, o Inter iniciou a sequência que o levaria a ser oito vezes campeão gaúcho.
Para muitos, futebol é como religião. Há uma liturgia até na forma de se preparar para ir ao estádio: mesmo relógio, mesma roupa, sentar no mesmo lugar, ouvir a mesma rádio e sofrer. Mas é uma sofrimento que, entre lágrimas e risos, sempre gera uma boa discussão, uma boa flauta, aquele agito que os antigos já advertiam: "religião, mulher e futebol, não se discute". Atualizando: "se lamenta", especialmente o caso dos adversários.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Caindo na gandaia, no Carnaval

Vamos combinar, o que se vê no Carnaval da televisão tem todo o direito de ser considerado o "maior espetáculo do Mundo". Um espetáculo magnífico que pode ser considerado uma superprodução, em todos os sentidos: enche os olhos com cor e movimento, abunda (em todos os sentidos) a coreografia e dá um sentido de brasilidade como nenhum outro povo na Terra consegue fazer.
Claro que é um espetáculo com acertos e com erros, mas que o final é deslumbrante, nem o mais cético dos seus críticos consegue negar. Além da manifestação cultural, existem muitos interesses financeiros que mobilizam a ânsia de um povo de entrar na avenida e mostrar que, apesar de todos os seus sofrimentos, compensa com o samba no pé (que não é exatamente o meu caso - no máximo conseguiria ser um daqueles que empurram os carros alegóricos).
Ver crianças que veneram o samba, até idosos que não se constrangem em derramar lágrimas por suas Escolas, dá um sentido de pertença que não se encontra em outras manifestações culturais, inclusive religiosas.
Acompanhei dois repórteres que foram desafiados a se preparar para, em 40 dias, saírem como mestre sala e porta bandeira. Os dois reconheceram que tiveram que se superar, física e emocionalmente. A repórter chegou a desmaiar na avenida, mas não desistiu. E quando desfilaram, a emoção estava no olhar de cada um deles, que reconheceram ser o espetáculo apenas a ponta de toda uma convivência de uma comunidade.
Não discuto o espetáculo comercial, mas reconheço que o espetáculo popular meche com a população. Não é apenas aqueles que vão para a avenida, mas também aqueles que curtem pela televisão. Quando uma escola samba e atravessa na nossa tela, nossos corações se enchem de alegria e de satisfação: somos brasileiros, portanto, quando o samba arranca, a emoção movimenta nossos corpos e, nem que seja em espírito, também caímos na gandaia!

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Para ser e fazer feliz


Noveleiro de férias, acompanho Fina Estampa, na Rede Globo, tentando ter um entretenimento para aquela hora da antiga novela das oito, mas também observando perfis humanos diferenciados. Desde dezembro, chamou-me a atenção o personagem Paulo (Dan Stulbach), que rejeitou a filha de sua esposa, Esther (Julia Lemmertz), gerada em laboratório, ao ponto de separar-se e criar uma autêntica aversão à menina Vitória.
O grande lance foi quando, para solucionar um problema gerado pelo fato de que a médica Danielle (Renata Sorrah) resolveu brincar de deus e utilizou esperma e óvulo de pessoas de sua relação para a fecundação, era necessário que Esther voltasse de um “exílio” para defender, com unhas e dentes, a sua maternidade.
Resultado, engambelou Paulo que, ao acordar, estava junto com seu “desafeto” e um mapa de atividades para cuidar da menina, desde uma simples mamadeira, até trocar as benditas e carregadas fraldas.
Com certeza, não poderia ser qualquer ator para fazer a transformação: do absoluto repúdio até, gradativamente, ver-se envolvido pelo bebê, com acertos e erros, mas com a capacidade regenerativa que uma nova vida pode causar.
Em alguns capítulos, o comportamento de Paulo chegava a ser doentio, possivelmente pela própria incapacidade de gerar um filho e vendo que, de outra forma, sua esposa havia conseguido a realização. Não entro na discussão da fecundação, mas do quando é necessário, para que tenhamos sanidade mental, a capacidade de estar aberto nas relações, em especial naquelas mais duradouras, como as familiares e afetivas. Do contrário, somos capazes de atormentar até mesmo aqueles que julgamos amar.
Há sempre uma chance, em algum momento, de refazermos caminhos, redescobrindo o jeito perdido de chegar a um coração: pode ser um pouco mais complicado do que uma mamadeira ou a troca de fraldas, mas vai aparecer como uma surpresa que talvez nos dê apenas uma chance para ser e fazer alguém feliz.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Almas desencontradas


Relembrando artigos já publicados. Em agosto de 2005, enquanto era apresentada pela Rede Globo a novela Almas Gêmeas
Não me admiro que os antigos defendam a ideia de que assuntos como religião, futebol, política e mulher (elas dirão: homem) não devem ser discutidos em grupos de amigos. É um bom motivo para o início de uma confusão. Mas não posso deixar de escrever sobre a novela que está no ar às 18 horas, tratando um dos aspectos ligados ao Espiritismo, que é a reencarnação.
Minha intenção não é falar a respeito deste tema especificamente, até porque, do que ouvi, os próprios espíritas não estariam lá muito contentes com este retalho do seu credo filosófico, feito mais para criar uma situação sentimental (sentimentalóide?) do que esclarecer seus princípios.
Minha questão é outra. O contraponto a esta pretensa pregação é a Igreja Católica, com elementos não de sua doutrina, mas do uso de seus espaços físicos, antro onde todas as ações do mal são articuladas. Vai haver uma negociata? É iniciada na igreja. Vai haver uma traição? Foi acertada na igreja. Vai se passar alguém para trás? É na igreja que se amarra a forma de fazê-lo.
Quando vejo as damas e cavalheiros ajoelhados em suas tramóias, fico pensando se os próprios santos não teriam vontade de descer de seus pedestais e esbofetear solenemente aqueles sacrílegos.
Creio que os autores e diretores têm todo o direito de tomar elementos da realidade – inclusive religiosa – para serem discutidos nas novelas. O que não têm direito é de fazer proselitismo de uma religião ou filosofia em demérito de outra.
Sei de todos os pecados que nós Católicos, Apostólicos, Romanos acumulamos ao longo da história. Mas daí a fazer uma leitura atravessada e mal intencionada vai uma grande diferença. Os espaços de manifestação religiosa – sejam templos, sinagogas, terreiros, salas de reuniões de determinadas filosofias – precisam ser respeitados e salvaguardados.
O imperativo no convívio das diferenças é, exatamente, o respeito. Este não se manifesta apenas quando o defendemos em tese, mas em situações em que, na prática, evitamos divulgar conceitos, insuflar pessoas. Especialmente as mais simples, que já vivem num mundo bem difícil para que coloquemos em dúvida o pouco arrimo que ainda têm: a própria fé.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Aprender a olhar para as estrelas

Um dos meus livros chamou-se Remendos e Arranjos, contendo crônicas, contos e poesias. Os contos contavam a relação entre um mestre e seu aprendiz. Aqui a primeira história.


O aprendiz olhou para as sombras e viu que lá estava seu mestre. Ele falava com alguém.
- Não tem sentido esconder-se na noite. Você não praticou nenhum crime, nem tem a forma tão horrorosa que tenha medo de assustar alguém.
- Não é por minha forma, ou por um crime praticado que me escondo. Acontece que as pessoas têm medo de seus próprios pensamentos. Sentem até algum prazer em saber que o que pensam é somente delas. E quando olhamos um rosto e vemos um sorriso maroto e atravessado, já o sabemos: ela está pensando algo que não compartilha com os demais.
Foi se aproximando e a forma foi desaparecendo na noite.
- Com quem falava, Mestre?
- Ninguém, pequeno menino. Ninguém.
- E porque “ninguém” precisaria dizer o que nós sentimos quando estamos pensando em alguma coisa que não queremos repartir?
- Ah. Tu escutastes? Pois é.
- É o que, Mestre?
- Era a morte.
- A morte!!!
- Sabia que irias assustar-te. Mas ela não é tão tenebrosa assim.
- Cruzes, Mestre, então o que ela é?
- Ela é a única certeza que temos na vida.
Durante um pouco tempo, somente ouviam os grilos reclamando do meio da grama.
- É verdade. Mas o que ela queria com o senhor?
- Um dia temos que nos encontrar com ela.
- Mas tem que ser agora? Vais nos deixar?
- É uma longa história. Vamos sentar ali adiante e eu explico.
Acomodados de encontro a uma pedra, podiam ver o céu, os desenhos que ninguém conseguia reproduzir; o sussurro da brisa nas árvores, que nenhum instrumento era capaz de executar, e o gemido dos pequenos animais da noite, que formavam uma perfeita sinfonia.
- A morte vem, pequeno menino, mas muitas vezes não quer nos levar. Ela acaba nos preparando para continuar a caminhada. Se não temos a perspectiva da nossa finitude, então podemos nos tornar difíceis, envelhecer incomodando os outros, ou enchendo-os de conselhos que não somos capazes de praticar.
Ficou em silêncio para poder desfrutar do calor do pequeno corpo alojado ao seu lado e da natureza que parecia envolvê-los e harmonizá-los com o céu, a terra e o ar. Olhou para o lado, o pequeno aprendiz ressonava. Meu discurso está se tornando enfadonho. Tenho que me concentrar mais em silêncios do que em discursos!
As estrelas no céu piscavam. Uma delas pareceu mostrar o rosto do menino ao seu lado, que cintilava e perguntava:E porque devemos silenciar mais?”

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Democracia de papagaios

No início dos anos 80, estávamos em fase de redemocratização, com o regime militar chegando ao seu final, era comum de que pessoas mais simples utilizassem jargões de esquerda, julgando estar fazendo um discurso politicamente correto. Infelizmente, o máximo que acontecia, é que se transformavam em papagaios ideológicos.
Foi do que me lembrei quando, esta semana, discutia com amigos a respeito do julgamento do "Ficha Limpa" (que deve passar no Supremo Tribunal Federal) e as suas consequências para a sociedade. Alguém dizia que era necessário um processo de politização da população. Argumentei que não concordava: para mim, conscientização é um processo que precede e que deve levar à politização como resultado.
Conscientização é algo mais elementar, pois trabalha com um dos mais ricos elementos da atualidade: a informação. Na atual Campanha da Fraternidade - Fraternidade e Saúde Pública - tenho defendido que uma das ações seja informar, para poder conscientizar, a população dos seus direitos mais elementares: como a disponibilidade de remédios da cesta básica para toda a população, com prescrição médica.
A população precisa conhecer os seus direitos - e deveres, consequentemente - para poder efetivar a sua participação plenamente consciente. O "Ficha Limpa" é uma das etapas - necessária, é claro - mas parte do seu processo de amadurecimento, na busca do sonho de que, um dia, possamos viver plenamente um relacionamento democrático, em todos os níveis: político e econômico, por exemplo, para não viveremos uma democracia de papagaios.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Gustavo e uma morte anunciada

Uma criança, um pátio de fácil acesso, um cachorro de raça classificada como "animal feroz" e um "acidente", que resultou na morte do Gustavo. Todos eram fatores de risco: a criança estava sendo descuidada, foi relaxada a capacidade de contenção do animal e a fatalidade aconteceu.
Há uma briga histórica entre aqueles que defendem a criação destes animais e aqueles que julgam que situações de risco devem ser eliminadas, especialmente pela castração, o que, em algum tempo, acabaria com estas raças.
No entanto, parece que aqueles que defendem a sua existência, mais do que os argumentos colocados, têm, inconscientemente, a necessidade de provarem que são capazes de dominar o perigo. Quando ouvi técnicos falando a respeito, veio-me à lembrança os muitos animais que passeiam com seus donos pelas calçadas e calçadões, ostentando sua "arma" em potencial. Confiam no braço para controlar um animal que, na maior parte das vezes, está numa coleira, mas sem a salvadora focinheira.
É mais uma demonstração de machismo recalcado que tenta colocar num animal a sua potencial violência e virilidade. Na maior parte das vezes, sem ter plena consciência - por ser um tipo de exibicionismo - dos perigos que pode causar a terceiros.
A morte do Gustavo era plenamente evitável. Mas quando se expõe a perigos - inclusive de uma criança - o pior pode acontecer, porque a própria criança não tem noção de perigo. Infelizmente, muitas explicações vão ser dadas, mas nenhuma vai trazer o Gustavo de volta.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A morte, o espetáculo e seus atores


A defesa de Lindemberg Alves Fernandes, acusado de matar a estudante Eloá Cristina Pimentel, 15 anos, está usando como tática culpar o Grupo de Ações Táticas Especiais da Polícia Militar de São Paulo e a imprensa. Tenho pensado nisto há algum tempo: a responsabilidade dos integrantes da área militar e do jornalismo no campo da ética, em coberturas onde a vida está em risco.
Não resta dúvida que muitos destes eventos foram espetacularizados, onde, muitas vezes, os limites são bem mal definidos. Por conta disto, em muitos casos, espetáculo e protagonistas se confundem.
No caso da imprensa, em muitos casos, a pressa em dar a notícia confunde os limites e faz com que parentes e amigos das vítimas também sejam vítimas, pois recebem através dos meios de comunicação a narração de desgraças, como acidentes, envolvimento em seqüestros, etc.
Também os militares não escapam. A falta de preparo acaba transformando-os em fontes que perdem a noção diante das luzes das câmaras e a atração dos microfones. Tornam-se “artistas” por um dia, dizendo impropriedades em horas inadequadas.
No caso citado, as duas coisas se juntaram e foram sendo passadas para vizinhos, parentes e, até, os três que estavam dentro da casa: Lindemberg, Eloá e uma amiga. O passar dos dias transformou a todos os envolvidos em protagonistas de uma grande tragédia com o final plenamente anunciado.
Estes limites, realmente, são muito difíceis. Mas é necessário que retomemos a discussão ética e moral de certas coberturas. Mesmo que se diga que o ridículo e a tragédia têm papel especial na cabeça da maior parte da população, isto também faz parte do papel da comunicação, que é educar um povo para que mude e assuma a sua própria cidadania.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

A saúde, a doença e quem cuida dela

Na última semana, participei de diversas reuniões preparatórias à Campanha da Fraternidade deste ano, que vai tratar da saúde pública. Interessante a quantidade de depoimentos, pois todos nós, de alguma forma, tivemos alguma experiência com esta área.
Creio que se pode categorizar em três grupos que interagem: o primeiro é daqueles que, pela prevenção, poderiam manter a saúde, ou ao menos retardar o processo de envelhecimento, ou, ainda, ganhando qualidade de vida para envelhecer.
O segundo é dos doentes, estágio onde ninguém quer chegar mas que, por ação ou omissão, ou porque temos escondido em nossos corpos um relógio tipo bomba de alcance retardado, em que, um dia, algo pode estourar, como um câncer, por exemplo.
O terceiro diz respeito aos cuidadores. Podem ser os familiares (especialmente), mas aqueles que, hoje, tornaram-se quase profissionais da área e que também precisam de uma atenção especial, pois carregam, em muitos casos, as dores do acompanhamento e a solidão de um tempo que passa com as batidas inexoráveis de um relógio que aponta para o fim.
Quando foi apresentado o cartaz da Campanha, numa das reuniões, algo que chamou a atenção de quem explicava era exatamente o olhar que o médico dá para o idoso que está à sua frente. Num meio sorriso, com uma mão segurando a mão da pessoa supostamente doente e a outra no ombro, há um olhar de acolhida e de entendimento.
 Nossa família passou por experiência parecida na morte de meu pai. Seu médico - doutor Gustavo - sempre que o atendia, fazia questão de segurar seu braço e conversar olho no olho. Somente depois fazia a parte administrativa.
Em palestras, costumo dizer que a comunicação inicia no olhar: ele pode acolher, dar sinais de entendimento, indicar esperança, mas, sobretudo, apontar para a solidariedade, tão necessária para quem deseja a prevenção, para quem está doente, ou para aquele que exerce um sacerdócio santificado no abraço e no carinho de quem cuida de uma pessoa debilitada e, em muitos casos, fragilizada pelas deficiências do próprio corpo.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Milho de pipoca

Texto do mestre Rubem Alves, extraído do livro: O Amor que Acende a Lua.
Enviado pela Elaine Neutzling Bierhals
 
Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre.
Assim acontece com a gente.
As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo.
Quem não passa pelo fogo, fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma
mesmice e uma dureza assombrosas. Só que elas não percebem e acham que seu jeito de
ser é o melhor jeito de ser. Mas, de repente, vem o fogo.
O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: a dor.
Pode ser fogo de fora: perder um amor, perder um filho, o pai, a mãe, perder o
emprego ou ficar pobre.
Pode ser fogo de dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas
causas ignoramos.
Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! Sem fogo o sofrimento diminui. Com
isso, a possibilidade da grande transformação também.
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro cada vez mais
quente, pensa que sua hora chegou: vai morrer. Dentro de sua casca dura, fechada em
si mesma, ela não pode imaginar um destino diferente para si.
Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada para ela. A pipoca não
imagina aquilo de que ela é capaz. Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo a grande
transformação acontece: BUM!
E ela aparece como uma outra coisa completamente diferente, algo que ela mesma nunca
havia sonhado. Bom, mas ainda temos o piruá, que é o milho de pipoca que se recusa a
estourar.
São como aquelas pessoas que, por mais que o fogo esquente, se recusam a mudar. Elas
acham que não pode existir coisa mais maravilhosa do que o jeito delas serem. A
presunção e o medo são a dura casca do milho que não estoura. No entanto, o destino
delas é triste, já que ficarão duras a vida inteira. Não vão se transformar na flor
branca, macia e nutritiva. Não vão dar alegria para ninguém.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Entre a realidade e a fantasia

Brinco com as imagens que flutuam em minha mente.
Elas são parte de recordações,
De sonhos aflitos,
Ou de sonhos desejados.

Acordar é ficar na incerteza entre o sono que se foi
E a vida que procura um novo embalo.

As imagens das lembranças nem sempre são perfeitas,
Muitas vezes são apenas contornos de sombras,
Que sugerem rostos, mãos, corpos.

É então que se instala a angústia do tempo:
Lembrar é uma mistura entre realidade e fantasia,
Entre as certezas que nos atormentam
E as esperanças que dão uma cor diferente ao sabor de existir.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

O ritmo da música de Wando

O anúncio da morte do cantor Wando acaba deixando um pouco mais silencioso o nosso repertório musical. Para quem como eu, está na casa dos 50 anos, sabe que fomos privilegiados em ter nossa juventude numa das épocas de maior efervescência da música popular brasileira.
Posso dizer: "somos do tempo" em que músicas duravam, não eram apenas modismos em forma de refrões, que embalam um verão e desaparecem na entrada do inverno. Havia as paradas musicais, quase sempre semanais, onde as músicas emplacavam primeiro lugar durante meses e, mesmo depois que já não estivessem nas paradas, ainda se mantinham na memória, sendo murmuradas ou assobiadas, conforme o gosto.
Muitas são as baladas românticas do Wando que estão na lembrança daqueles que viveram aqueles tempos, mas que se mantiveram até para as gerações atuais, que não têm dificuldade em encontrar estes sucessos nas redes da Internet.
Os puritanos vão lembrar apenas da marca do cantor de que acabava distribuindo calcinhas femininas ou as recebia daquele público. Gostos são gostos. Não se discute, em muitos casos, se lamenta. Pois era um jeito de falar da intimidade de um artista com o público mais fiel ao seu repertório: o feminino.
Mas mesmo os homens, que em muitos casos, diziam que iam apenas acompanhar companheiras ou levar os pais, acabavam entrando no embalo e dançando no embalo daquelas canções.
Não sou nenhum pé de valsa, mas lembro das "brincadeiras musicais" organizadas pelo grupo de jovens da Igreja, em que tínhamos momentos de música para "os embalos de sábado à noite", assim como o de dançar juntinhos, a dois. Claro que Wando era um dos preferidos.
Nossos cantores já estão chegando na casa dos 70 anos, com certeza, em fase de encerramento de carreira. Mas sabem que marcaram diversas gerações, especialmente aqueles que compuseram com paixão e deixaram, em cada um, o ritmo doce de vida bem vivida, ao som da música do nosso coração.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Início e fim

Não adianta segurar a noite.
Ela vai desaparecendo,
se escondendo por cantos e recantos
do quarto, onde o sol não chega.

Além dos ruídos do dia,
a luz teima em redesenhar cada um dos móveis.
Reflete nos espelhos
e brinca com a poeira em suspensão
que não sabe se vai ao teto
ou se acomoda no chão.

A vida reinicia.
Me escondo sob o travesseiro,
mas não há mais chance:
é preciso seguir o sol
e entrar na fila do dia que se espicha
até que a noite retorne.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A mãe Terra

Um dos elementos que salvou minhas férias e garantiu um espaço de sanidade mental foi trabalhar com flores. Fui aprendendo a lidar com hortênsias, alamandas, beijinhos, maravilhas e onze horas. Como nosso pátio tem muito verde e arvoredo, queria dar cor aos diversos espaços.
Foi então que descobri a existência de uma confraria das plantas: com cada uma das pessoas com quem falava, sempre havia uma receita, seguida de uma muda de alguma nova espécie, numa solidariedade que levou a descobertas e cuidados especiais com cada uma: a que exige mais terra, mais água, ou folhas em decomposição para se alimentar.
Depois das mudas trazidas pela Neida e a Neli, hoje foi a vez da Alessandra trazer uma orquídea. Uma planta que, além de bela, ainda tem um perfume marcante, fazendo descer um cacho de cores e formas. Embora seja a professora Margareth a especialista em orquídeas, creio que a orientação da Alessandra vai incluir um novo elemento naquilo que é um incipiente jardim, agora também colocando cor nos diversos pés de árvores.
Somente quem ainda não pôs a mão na terra pode achar que o assunto não é interessante. Cada muda plantada, cada afago na terra para acomodar a planta, cada vez que se rega, um pouco do stress acaba sendo canalizado e eliminado. A mãe Terra tem seus segredos e é parcimoniosa em revelá-los. Não é para quem quer, é para quem ela escolhe. O povo diz que esta gente tem "mão boa", isto é, tudo o que toca e planta se transforma em vida. Saúdo a Terra e aqueles que encontram no seu trato mais do que um passatempo, um estilo de vida.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A busca de um sentido

Passou o temporal.
Agora apenas as árvores se quedam silenciosas
absorvento a seiva da vida que alimentará
seu tronco, suas raízes, suas folhas.

No passar dos dias, tento também
armazenar a seiva da vida para continuar a existência.
os dias de sol, em que tudo parece bem,
os dias nublados, em que existem dúvidas,
os temporais, em que a vontade é de abandonar tudo.

Esta chance, a vida não me dá.
Então, tento viver e ajudar a viver.
Toco a vida, buscando um sentido
para cada momento.
E também para quando for o seu final.

Fraternidade e Saúde Pública


Tradicionalmente, na Quarta-Feira de Cinzas (encerramento do Carnaval), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil lança a Campanha da Fraternidade. Este ano, também participam diversas igrejas cristãs. O tema é provocante: “Fraternidade e Saúde Pública”; o lema é incendiário: “Que a saúde se difunda sobre a Terra”.
Esta é uma área preocupante para países do Terceiro Mundo ou emergentes (como é considerado o Brasil), assim como educação, moradia, segurança... A forma colocada pela Igreja Católica permite um olhar sobre a saúde pessoal, coletiva, assim como o instrumental colocado a serviço da população para que possa ter saúde física e psíquica.
Embora o tema seja bem claro: “saúde pública”, aquela que, conforme a Constituição Federal, é um direito de todo o cidadão e deveria ser propiciada pelo Estado, também se deve olhar para a forma como muitas instituições – inclusive a própria Igreja Católica – atuam nela. Recentemente, numa reunião, foi dito por um religioso que os diversos serviços de saúde mantidos pela Igreja através de Universidades, por exemplo, poderiam corresponder ao atendimento de até 40 por cento da população.
Olhar para o sistema único de saúde é olhar para algo que já conhecemos, na maior parte, com grandes dificuldades e, em muitos casos, negando o elementar direito à vida. Será que basta? Os analistas da área dizem que um eficaz sistema de urgência e emergência é muito difícil e o que precisamos é de prevenção. Nesta aposta, encontram-se os grupos que praticam algum tipo de atividade física ou mesmo os atendimentos médicos e de enfermagem domiciliares, capazes de evitar que muitos casos se agravem.
Há a necessidade de pensar os espaços cristãos. São muitas as paróquias e comunidades com espaços ociosos. Também é verdade que muitos cursos de fisioterapia e de educação física procuram onde fazer a aplicação daquilo que aprenderam na teoria. Talvez este não seja o momento de reinventar a roda. Quem sabe somar dois com mais dois dá um simples quatro, ou seja, juntando estruturas com potencial e alunos com grandes expectativas? A saúde de todos nós, com certeza, agradeceria.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

preconceito musical

Durante a programação de algumas emissoras da capital, durante a manhã deste sábado, fui achando interessante que os comentaristas se rendessem e confessassem que tinham preconceito musical, sim, achando que Michel Teló seria apenas mais uma baboseira a se apresentar no Planeta Atlântico.
Pois o garoto que confessa suas origens gaúchas abalou, inclusive, incluindo cancioneiros dos Pampas e levando a que se formasse um coral de mais de 40 mil vozes. Foi, sem dúvida, uma das grandes apresentações da noite, independente do gênero musical, importando, sim, que o espetáculo se formou pela afinação entre artista e público que não teve o coração aliviado, mas teve sim, o coração embalado nos acordes do sertanejo universitário.
Cada vez que uma destas pesquisas de Internet me pergunta qual o gênero musical do qual gosto, digo que "os bons", o mesmo a respeito de músicas: não é um gênero que me agrada, mas são algumas canções, assim como são algumas músicas, aquelas que desde o início, ficam na cabeça da gente e que são assobiadas ou murmuradas a todo o momento.
Sou movido a música. Ela está presente quando trabalho, quando faço minhas caminhadas, ou quando estou no meu carro. Gosto do Roberto Carlos, pois sua voz é inconfundível para mover com os sentimentos; do Chico Buarque (sem ele cantar, mas suas canções na voz de outros cantores), naquela remexida da vila, e do sambinha de roda, que alimentaram minha juventude em intermináveis noites ao redor de uma mesa, com instrumentos musicais, ou apenas o improviso de talheres, beiras de mesas, ou batidas de latas.
Dizem que a música é o instrumento dos deuses. O que fazemos é tentar roubar um pouco daquilo que se ouve por todos os caminhos da Eternidade. Sendo assim, não há como ter preconceito, por mais simplória, mais estranha, mesmo comercial, faz parte de um desejo do ser humano de superar-se e atingir a realização de seus próprios sonhos.

O riso da esperança

Teu riso ainda ecoa na noite.
Brincavas com as certezas e com as esperanças.
O tempo não fazia sentido para ti.

Como poderia definir-te?
Mais do que um ente sobrenatural,
mais do que a natureza esmerou-se em construir,
mais do que a inocência da criança que não precisa ver caminhos
para continuar andando.

Teu riso ainda ecoa na noite.
Maltrata minhas lembranças,
instala-se em meu peito,
tolda minha visão.

A lua passa escondida por entre as nuvens
para não dar contorno ao teu rosto.
E, de todas as lembranças,
a que se faz mais presente é de um riso cristalino
acalentando a minha última lembrança.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Investigação na Justiça

A decisão do Supremo Tribunal Federal de ontem dando poderes para o Conselho Nacional de Justiça investigar os juízes é histórica, além de dar um novo ânimo para a população brasileira que vem num marasmo diante dos poderes públicos que vê como incompetentes (na maior parte das vezes), achando que não há nada o que se possa fazer para mudar este quadro.
Mesmo que a decisão tenha sido apertada, venceu a vontade da sociedade de que todos aqueles que têm alguma função pública, também publicamente tenham que prestar contas, a tão abençoada, apregoada, mas nem sempre praticada "transparência".
Um dos integrantes da suprema corte chegou a afirmar que todos sabem que, ao haver um julgamento entre pares (próximos), a benevolência é maior, quando não se esquece dos prazos e, muitas vezes, deixam-se prescrever crimes ligados à corrupção, especialmente.
Há um frio percorrendo a espinha do poder Judiciário no Brasil, fruto de uma decisão que vai acelerar a cobrança deste poder, em todos os níveis. Deveríamos trabalhar para que o mesmo aconteça no poder Executivo (governos federais, estaduais e municipais), assim como no Legislativo (nossas câmaras, em todos os níveis).
Este ano, a luta é por fazer valer a lei da "ficha limpa" para as eleições para prefeito e vereador. Dizer que uma pessoas condenada em primeira instância ainda pode ser inocentada é um risco. Quem bom que seja inocente, mas, então concorra numa próxima vez, quando, efetivamente, sua ficha estiver limpa.
Porém, o mais perigoso, continua sendo o dinheiro público mal empregado pelo governo. Em todos os escândalos recentes, o problema é sempre o mesmo: alguém resolveu colocar a mão em dinheiro que não era seu para o próprio bolso ou de alguém muito próximo.
Temos uma esperança no horizonte. Mas ainda temos um longo caminho para ver gente honesta trabalhando em todos os níveis e recursos sendo bem empregados a serviço da população. Posso ser repetitivo, mas o mais importante está em suas mãos: seu voto, nas eleições de outubro deste ano.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

O sentido de nossas vidas

Meus olhos cruzaram com os teus.
Um momento fugaz,
cheio de dores e expectativas.
Havíamos gasto quase todas as palavras,
tanto quando nos amamos,
como quando chegamos a nos odiar.

Amor e ódio,
o zero e o 360, na circunferência:
Tão próximo e, ao mesmo tempo, tão distantes!

Mas não ouve uma palavra dita,
mágoas sedimentaram nossa separação.
Bastaria tão pouco, mas fomos incapazes
de dizer o que guardamos, para perder
o sentido de nossas próprias vidas.

Futebol sem violência

A notícia caiu como uma bomba no meio esportivo: no Egito, duas torcidas se enfrentaram e o resultado é que cerca de 80 pessoas já morreram, enquanto muitas ainda estão em situação de risco. Recentemente, depois de um enfrentamento entre torcidas, com bem menos baixas, um juiz proibiu a entrada de homens, num estádio, somente permitindo que entrassem mulheres e crianças. Todos aqueles que lidam com segurança foram unânimes em afirmar que foi um jogo seguro, tranquilo e familiar.
Porque o homem precisa provocar situações de risco para ter prazer? Basta olhar para as estatísticas e se vê que homens morrem mais cedo por diversos motivos: exagero na velocidade, assumem um maior consumo de drogas lícitas e ilícitas, têm uma propensão para se envolver em situações violentas.
Pena que isto acabe ceifando a vida de muitos de nossos jovens, não vão nos dar o prazer da sua convivência e, sequer, terão o prazer de uma vida onde possam aproveitar o que um relacionamento maduro oferece em todos os sentidos.
A ideia do juiz que deixou os homens do lado de fora do estádio pode ser boa enquanto medida pedagógica, mas não pode servir de parâmetro. Coibe-se a violência usando de todos os meios possíveis de prevenção, inclusive com o monitoramento direto de câmeras de vídeo, que tem levado muitos dos bandidos/arruaceiros para a cadeia.
O futebol, como qualquer esporte, é saudável para quem pratica, assim como para quem assiste. Pode ser um jeito de aliviar stress, xingar a mãe do juiz e soltar nossos pulmões em aplausos ou vaias. Depois disto, é voltar para casa, certos de que nos resta uma boa discussão sobre os lances mais polêmicos e, se possível, passar uma boa flauta na torcida do adversário.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Apenas um perdão

Poderia ter sido mais fácil,
mas não foi:
tivemos que viver as mesmas dores,
refazer os mesmos caminhos,
enfrentar as mesmas desilusões.

Nossos erros não adiantaram nada,
nossas marcas passadas não foram sinais de experiência,
Enganos e acertos mostraram-se igualmente inúteis.

Restou apenas o sentimento humano do desgosto.
O sabor das lágrimas que se esquivam pelos sulcos de nossos rostos.
E mesmo que o tempo tenha passado,
Mostra a face implacável do quanto fomos incapazes
de pedir perdão.

Dia do Publicitário

Sou um apaixonado por peças publicitárias bem feitas. Aquelas que são, no fundo, coisas simples que mexem com nossos sentimentos, que, de alguma forma, nos sensibilizam. Em palestras para grupos de igrejas cristãs tenho dito que se oferecerem um espaço de uma hora para uma entrevista ou 60 inserções de 30 segundos, fiquem com a segunda: uma mensagem bem feita e repetida tem uma força muito grande, seja em rádio, seja em televisão.
Joseph Goebbels, o grande articulador de comunicação do governo Hitler, na Alemanha da segunda guerra, dizia que "uma mentira mil vezes repetida vira uma verdade". Veja-se o que fazem nossos políticos e administradores públicos, que se valem deste princípio para estabelecerem "verdades" que não deveriam resistir a uma boa argumentação.
No entanto, é exatamente aí que entram as peças publicitárias: além da sofisticação (que nem sempre é sinônimo de requintes tecnológicos), entra a alma e a sensibilidade de quem as produz, capaz de flagrar em 30 segundos aquilo que o ouvinte ou o telespectador gostariam de ver, ou, ainda mais, são provocados para reconhecer que, ali, está algo absolutamente novo. E encantador.
Bons publicitários são como encantadores. Neste caso, encantam gente. Vão em busca de nossas lembranças mais remotas, trabalham com aquilo que nos sensibiliza, são capazes de despertar um sorriso maroto ou uma lágrima teimosa que expõe tudo o que guardamos no fundo de nossas gavetas sentimentais.
Não tenho esta sensibilidade, mas, no dia do Publicitário, gostaria de reverenciar quem, diariamente, olha para a humanidade com o desejo de surpreendê-la, de alguma forma, desalojá-la de seu quotidiano e, se possível, fazê-la mais feliz.