terça-feira, 28 de setembro de 2021

Monquelat: “Os livros fazem silêncio”

Nas mudanças dos conteúdos de disciplinas que lecionava no curso de Comunicação - Redação 3 - foi incluído o Novo Jornalismo (ou Jornalismo Literário). Das muitas leituras, percebi que precisava ter contato com a extinta revista Realidade, assim como alguns dos grandes nomes de profissionais desta área, com forte influência norte-americana. Na biblioteca da Universidade Católica não havia nada disto. Foi então que falei para um grupo que estava na sala dos professores, num intervalo de aula. Foi quase unânime: precisava consultar o dono de uma livraria e sebo, o Adão Monquelat.

Nunca tinha entrado numa livraria que também era sebo e foi encantamento à primeira olhada. A simplicidade do atendente e os espaços estreitos entre as prateleiras tornavam o lugar uma preciosidade para quem precisava da orientação de um livreiro, pesquisador e escritor. Sem ser pedante, trazia temáticas que eram luz para conhecer autores ou quem ajudaria a entender melhor o tema. “Referência”, como disse Ana Cláudia Dias, no texto “Pelotas perde Adão Monquelat”, assim como a feliz chamada de capa em que consta a sua foto e um epíteto: “Os livros fazem silêncio”.

Na primeira conversa, expus o problema com a bibliografia. Mais do que isto, sabendo que a maior parte das edições esgotara, queria constituir acervo pessoal e levar para a aula o material a fim de que os alunos pudessem manipular. Iniciamos pela revista Realidade que, no Brasil, estavam apenas em mãos de colecionadores. Mas… sempre existe um mas… ele acreditava que, indo a Montevidéu (não sei se o próprio ou conhecidos), garimparia em sebos da capital da república oriental.

De fato, as edições que depois doei à hemeroteca da Universidade vieram do país vizinho, sendo cobrado o preço de uma revista semanal daqui. Também estão lá obras que se garimpou com o tempo: A Sangue frio, Truman Capote; Hiroshima, John Hersey; Rota 66, Caco Barcellos, entre outras. Fizeram o encanto dos futuros profissionais do jornalismo que sabiam da sua existência por citações. Ao fim da aula, brincavam que acabariam “esquecidas” dentro das suas mochilas…

Durante a pandemia, não estive em livrarias e sebos. Mas já vinha me programando para voltar a percorrer estes espaços em busca de material que subsidie minhas atividades. Não era só o que auxiliasse em atuações profissionais, também a oportunidade de percorrer estandes e buscar títulos de suspense e ação, meus preferidos para momentos de desopilação. Já conhecia o lugar onde ficavam, mas sempre recebia a companhia carinhosa para mostrar o que havia chegado de novo.

Poderia contar, ainda, que me ajudou a recuperar livros que, de tanto emprestar (e não voltar), desisti de adquirir. Rondando sobre minha mesa estão o Pequeno Príncipe, Fernão Capelo Gaivota e O Profeta. Não queria acreditar, mas o sentimento é real: o mundo dos livros silenciou mais um pouco. Há algo de especial em homens e mulheres que tratam a leitura como ser amado, com momentos de seriedade ou aqueles em que ela brinca com as inteligências. Partindo, o vazio entorpece os sentidos e faz falta. Fica a saudade e, nas páginas dos livros, as muitas lembranças!

domingo, 26 de setembro de 2021

Os rios que correm pelos céus

Um de meus programas preferidos na televisão são roteiros de viagens. Sou preguiçoso e precisam conjugar muitos fatores a fim de me tirar de casa e da rotina para acompanhar passeios como os que me propiciaram o grupo do Júnior Turismo. Para acomodados, há muitas opções pela telinha, como os clássicos Mundo visto de cima, Brasil visto de cima, Pedro pelo Mundo e Ricardo Ruas. Recentemente, descobri Viagem e Gastronomia (CNN Brasil), com a Daniela Filomeno. Do sofá da sala (ou até da cama), curtir paisagens e gastronomia típica e ricas das regiões, não tem preço...

Minha curiosidade foi aguçada quando me deparei, num sábado, com uma matéria sobre a produção de uvas e vinhos na Serra da Mantiqueira. Fiquei curioso com a demonstração de que existem regiões novas com uma rica produção da uva, de vinhos de mesa e safras especiais. Fui pesquisar no YouTube e descobri que o programa foi desdobrado em dois para mostrar a produção de queijos, azeitonas e cafés. A partir dali, renovei meus roteiros de turismo, descobrindo que era impossível não se encantar com os lençóis maranhenses, tendo paisagens de deserto, contendo belas lagoas.

O meu destino seguinte acabou sendo a Reserva do Cristalino. Bem no meio de uma área de preservação de 11 mil hectares, oferece atividades ao ar livre, especialmente, a observação de pássaros, canoagem e uma imersão na região do sul da Amazônia. Suas torres de observação permitem ultrapassar a copa das árvores e contemplar a imensidão verde que se perde no horizonte. Também espécies que estão naquele “cantinho perdido de Deus” por cerca de mil anos… e um dos mais belos fenômenos que, preferencialmente, se contempla ao amanhecer: os rios voadores!

Embora alguns pensem que é brincadeira, os rios voadores existem e estão mais próximos do que se possa imaginar. Nesse momento, muitos deles estão sobre nossas cabeças, invisíveis, transportando quantidades de água equivalentes às vazões dos maiores rios do mundo. A expressão foi criada para designar a enorme quantidade de vapor d’água que chega à atmosfera, sendo transportada pelas correntes de ar e formando os ciclos de chuva necessários às diversas regiões. A floresta funciona como uma bomba d’água, captando água dos solos e jogando na atmosfera.

Uma das funções das torres de observação é, na madrugada, quando se forma a aurora e a natureza desperta, flagrar o fenômeno mais intensamente e se visualizar a umidade se formando e juntando as árvores num imenso tapete branco. As palavras são pobres para descrever as maravilhas que os primeiros raios de sol fazem ao dar contorno à natureza, com a trilha sonora dos pássaros e animais que iniciam seu dia. Encantamento, silêncio respeitoso, reconhecer que, diante de tanta beleza, há um Criador que agracia com um mundo intocado, exatamente para a preservação da própria vida.

Além de auxiliar na preservação da floresta, há um longo caminho a percorrer sobre diversos estados do Brasil, chegando, inclusive, ao nosso. Forma os ciclos que deveriam, em tempos normais, regular as estações climáticas, por exemplo. Infelizmente, um dos problemas causados pela devastação da Amazônia é o que se sente com a falta de água em reservatórios fundamentais para a geração de energia e, também, a previsibilidade do comportamento do tempo para que o agricultor possa se preparar para plantar e fazer a colheita, que vai chegar à mesa de todos nós.

Por rios que correm sobre a terra, ou aqueles que percorrem os céus, passa a água que sacia a sede e auxilia a aplacar a fome. Preocupação de ambientalistas, comprovando o discurso do papa Francisco de que é necessário cuidar da casa comum. A “casa” onde se recebem notícias contando catástrofes e aquilo que não desejaríamos ver nos telejornais. Mas, também, alcançam imagens que permitem viajar pela imaginação. A imaginação que alimenta sonhos e também esperanças - soma perfeita para não se desistir da vida, em todos os seus níveis e com toda a riqueza das suas espécies!

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Um sínodo para dar voz e vez ao leigo

Beirando os 85 anos, o papa Francisco não parece disposto a aceitar o que muitos já anunciam como o ocaso do seu pontificado. Depois da cirurgia em que analistas afirmavam ser o “começo do seu fim”, retomou as sandálias do pescador Pedro e voltou a andar pelo Mundo. Até quarta da semana passada, esteve na Hungria e Eslováquia, onde bateu de frente com a intransigência de setores da população, incentivando a acolhida dos imigrantes e defendendo que “a diversidade sempre causa um pouco de medo, pois coloca em risco a segurança adquirida e frustra a estabilidade alcançada”.

Já disse que não me importo que trabalhe até os 90, 95 ou 100 anos! É um caso extraordinário em que “os mais novos” tem o direito de explorar um idoso! Pois o papa ancião surpreendeu novamente: um assunto que se conversava ao pé do ouvido recebeu selo oficial e caiu na boca do Mundo: a Igreja Católica, Apostólica e Romana prepara um Sínodo dos Bispos, em 2023. Durante dois anos, faz uma etapa diocesana, outra continental e, por fim, a conclusiva, como igreja universal. Com uma diferença: a convocação para que haja um amplo envolvimento dos leigos.

É bom ficar atento porque, entre 9 e 10 de outubro começa a ser discutida a “sinodalidade”, como disse o analista Carlo Di Cicco: “uma forma de sair da pandemia tentando ser melhor do que antes”. Por definição, seria um jeito de caminhar juntos. Só que, até agora, o “juntos” significava os bispos, sem a presença, em alguma das etapas, dos leigos. A grande mudança de Francisco é o desafio para que também o povo de Deus tenha vez e voz, não apenas como especialistas, mas nas assembleias que começam a se formar ao redor do Mundo. E que pode definir novos caminhos para a Igreja.

Na sua recente viagem, desafiou a se sair da crise, melhores: A fé não pode ser reduzida a um açúcar que adoça a vida. Jesus é sinal de contradição. Veio para trazer a luz onde há trevas, pondo as trevas a descoberto e forçando-as a renderem-se. Por isso, as trevas lutam sempre contra Ele. Quem acolhe Cristo e se abre para Ele, ressuscita; quem o rejeita, encerra-se na escuridão e arruína-se a si mesmo”. Muito forte para um argentino ancião que, como João XXIII, ao convocar o Concílio Vaticano II, estava pronto para pendurar as chuteiras. Mas Deus tinha outros planos…

Passados quase 60 anos, o encontro que propiciou mudanças na Igreja Católica precisa se consolidar. O sonho de João XXIII viu em Paulo VI um “carregador de piano” que abriu as portas do Vaticano e começou a oxigenar as estruturas. O desafio de Francisco é grande para concretizar o “caminhando juntos”, o espírito da sinodalidade. Por falta de preparo e de espaços numa estrutura centralizadora – “padricêntrica” e “bispocêntrica” - também por uma cultura de dependência, precisa mais do que “documentos” para transformar a participação em efetiva realidade.

Especialmente para os leigos, que não podem perder a oportunidade. Documentos estão na internet e, a partir do próximo mês, estruturas paroquiais e diocesanas se movimentam para dar a sua contribuição. Historicamente, a parcela da Igreja que reclama não ter vez e voz, embora aumente a participação em atividades secundárias. A formação e a informação são necessárias para uma nova e concreta mentalidade, pois Francisco propõe: “um à escuta do outro; e todos à escuta do Espírito Santo”. Quem sabe, desta vez, destranca e se concretiza o que ele sonha: “uma igreja em saída!”

domingo, 19 de setembro de 2021

A vó Tutu e o direito de sonhar até o fim

Início da noite de domingo e a programação na televisão é muito parecida. A perspectiva de começar mais uma semana de trabalho faz com que se procure algo mais leve para encerrar o fim de semana. Não há muita variedade, mas os canais abertos têm uma receita em comum: apresentam situações em que os protagonistas (normalmente pobres) vivem situação financeira difícil e transformam em “novela” que, ao final, terá uma solução positiva, claro, com a audiência torcendo para que tudo dê certo e, mais ainda, tendo deixado algumas lágrimas pelo caminho.

O domingão do Huck, em sua segunda apresentação, não foi diferente. No horário das 20 horas, em que a gente já tá pensando seriamente em colocar o pijama, trouxe a história da vó Tutu, mulher, negra, moradora da favela da Brasilândia. Com a crise e a pandemia, arregimentou a família para fazer pão para a vizinhança – chegou a cerca de dois mil por dia – e ensinar as mães a prepará-los. A panificadora social, a “escola” e a residência eram precárias. Foi quando apelaram para o apresentador, já marcado pelo trabalho aos sábados – o Caldeirão do Huck – com o seu “lata velha”.

Calma, ele não “reformou” a vó Tutu, mas deu uma boa repaginada nas três áreas, melhorando o atendimento à população carente da região, condições de aprendizado e moradia decente para uma idosa, que quase enfartou com o resultado. O trabalho foi feito por uma arquiteta que nasceu e cresceu na favela, mas tem um olhar social que a levou, junto com o Luciano Huck, a percorrer cidades da Colômbia, onde esta preocupação com a recuperação de ambientes urbanos degradados apresentou resultados que merecem atenção em nível internacional. Mas esta já é outra história…

A fórmula é conhecida: apresenta a estrutura utilizada, com deficiências, propõe que a pessoa que fez a solicitação passe um tempo afastada para que a equipe faça a reforma, em curtíssimo espaço de tempo, e o retorno, com o encantamento e a emoção de quem vê realizado um sonho. Um pouco teatral, na chegada, vó Tutu foi amparada pelos filhos e, ao entrar no primeiro ambiente, ajoelhou-se rezando o “Pai Nosso”, em meio a lágrimas e exclamações. Foi exatamente neste ponto que uma frase dita pela idosa chamou a atenção: “eu nunca tinha sonhado em que isto fosse possível...”

Possivelmente, meus amigos psicólogos expliquem que esta pode ser uma válvula de escape. Explico: a maior parte da população nunca vai ter seus maiores sonhos realizados. Ver a vó Tutu usufruir do que almejou parece que um pouco de nós também esteve junto e vivenciou aquele momento. Passivos diante de um aparelho de televisão, emocionados, aceitamos que a realidade é assim e que, por sorte (e não por merecimento – que não significa meritocracia, mas direito como ser humano) alguns conseguem e os demais, literalmente, ficam “chupando o dedo!”

Torci pela vó Tutu, como torço todos os dias pelas “vós tutus” de todas as idades que batalham por seus sonhos. Já que a morte não acontece quando corpos definham, mas quando um olhar perde o brilho e as pessoas esquecem que um dia sonharam: Uma criança com o olhar entristecido, um adulto desesperançado, um idoso sem autonomia e capacidade de interagir… O fim da jornada chega e apaga a última luz de um corpo que, muito antes, perdeu a beleza que foi ter sido capaz usar a imaginação, correr atrás do que acreditou e compartilhar com quem efetivamente já se amou…

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Para que não se repita um “11 de setembro”

Preparava aulas durante a manhã e não havia ligado a televisão ou o rádio. Quando desci para a casa de meus pais, a fim de almoçar, estavam perplexos diante do aparelho e as imagens eram aterradoras: as torres gêmeas atingidas e a velocidade das informações deixava jornalistas buscando analisar e explicar a situação. Em seguida, ficou-se sabendo que, além dos edifícios do World Trade Center, mais dois aviões-suicidas estiveram no ar: um em direção ao Pentágono e o outro em que os passageiros lutaram com os terroristas e lançaram o aparelho em campo aberto.

Depois, foi uma enxurrada de notícias, com analistas tentando entender como uma guerra que os Estados Unidos sempre deixaram fora das suas fronteiras atingiu o coração simbólico de seu país. Passados 20 anos, numa data tão significativa, a nação do presidente Joe Biden reconhece que falhou em acabar com o Talibã e as demais redes que afrontaram a potência americana. Quase três mil vidas foram sacrificadas, demonstrando que os poderosos não são tão poderosos como pensam e seus desafetos não são melhores porque também desprezam a vida das populações civis.

O colunista David Coimbra publicou texto em jornal da capital falando do 11 de setembro, com o título “o que é importante falar na hora da morte”, a respeito dos passageiros que frustraram um dos quatro ataques e sabiam que iam morrer: “As pessoas ligaram para dizer a outras pessoas que as amavam. Ou seja, quando tudo ia terminar, as pessoas entenderam instintivamente o que é mais importante: o amor.” Ninguém falou de dinheiro, de poder ou de trabalho. Ninguém ligou para fazer um insulto final, para dar um conselho ou para deixar uma mensagem para a posteridade.”

As torres gêmeas são, também, alerta para todos os desastres que as guerras, invasões, guerrilhas causaram em cada canto do planeta. Mais importante é a lição que praticamente ficou esquecida daqueles mártires que sacrificaram as suas vidas sem saber no que resultaria. Mas que tinham claro que precisavam proteger aquelas pessoas que lhes eram especiais e, havendo chance, dizer, talvez pela primeira vez, o quanto as amavam. O cenário político internacional tem sido muito pobre de respeito pelas pessoas e de acolhida nas suas carências, que é uma das expressões do amor.

Todos os grandes líderes espirituais, entre eles Jesus Cristo, Mahatma Gandhi, Martin Luther King, nunca pegaram em armas para defender suas pregações, mas incentivaram a que as pessoas aprendessem a amar. Difícil de ser definido, mas tão necessário de ser sentido e vivenciado. Com elementos práticos, como o distensionamento que permite o diálogo, a tolerância, a busca pela compreensão do ponto de vista alheio e o respeito pelo simples fato de ser uma outra pessoa. Um sentimento que inicia nas relações pessoais, já que todos eles pediam uma cultura da paz e do amor.

Que inicia pelo desarmamento dos espíritos. Precisamos de familiares, amigos e daqueles com quem nos identificamos, não somente por postura política, ideológica ou religiosa. Encerra: “Talvez muitas delas só tivessem compreendido isso porque sabiam que estava na hora da morte. Mas, pelo menos, tiveram chance de falar. Certamente um consolo para quem ouviu. E uma lição para quem está vivo”. Parece pouco, mas, hoje, a pergunta é: há quanto tempo não digo para alguém um simples “eu te amo!”? Um pequeno detalhe, que pode fazer uma grande diferença!

domingo, 12 de setembro de 2021

Fake news: o coronavírus da fofoca

Poderia falar em “notícia falsa” e, possivelmente, muitos entenderiam, mas não se interessariam tanto quando se a expressão usada fosse mais charmosa e estivesse na moda: “fake news”. O significado é o mesmo, mas ganhou repercussão em função dos recursos da internet e, especialmente, da velocidade com que as informações correm através das redes sociais. Objetiva atrair visualizações para páginas nas mídias sociais, mas têm sido usadas de muitas formas na política partidária e disseminar o ódio contra pessoas, instituições, empresas e governos.

Não confundir com a “fofoca”, que tem o seu cunho de maldade em relações familiares, vizinhança, grupos de trabalhos ou estudos. Mas, enquanto esta sempre tem sua origem num fato concreto, mesmo com uma interpretação distorcida, a fake news possui, desde a origem, a marca da mentira e da intenção de ser prejudicial. Enquanto a fofoca nasce do tradicional: “você viu o que aconteceu com a fulana (o)?”, a fake news tem estrutura bem montada tecnicamente para utilizar imagens, textos e embaralhar a realidade, quase sempre com o interesse de tirar um adversário do caminho.

A fake news parte de uma mente que distorceu valores e pensa estar num mundo – na política, meio empresarial, mas também no ensino, religião e família – onde há uma concorrência predadora e quem for mais esperto vai ter as melhores chances. E não precisa de limites éticos e morais... Isto não aparece de uma hora para a outra. Faz parte de um processo educacional iniciado na infância, onde se toleram pequenas mentiras, a violência de ações infantis, apropriações indevidas do que é de outras crianças e se quebrem regras elementares de convivência, especialmente em brincadeiras.

O “7 de setembro” mostrou que as fake news foram constantes com limites institucionais ultrapassados e muitas explicações. Um líder disse estar tranquilo porque, se outros fazem, porque sua turma não poderia fazer? As fronteiras já não são ditadas pelas leis e valendo para todos, mas a flexibilização se dá porque alguém fez por primeiro e, então, fica tudo liberado! Engraçado é que de tanto deturparem informações, acabaram “vítimas”, com alguns colocando as “asinhas de fora” e, se dando conta de que havia caçadores na área, recolheram-se aos seus poleiros

Tempos difíceis para um jornalismo sério. Você entra na fila do mercadinho, da feira, do banco e vai ter alguém trocando informações, para, em seguida, um “especialista” intervir e dizer que não é bem assim, porque “o meu primo postou no grupo da família que o fulano só deu aquela declaração porque estava pressionado, mas a coisa ainda vai feder!” Na volta, já tem uma meia dúzia que passa a acreditar e fazer corrente. No “disque me disque” e “quem conta um conto aumenta um ponto”, tá feito o estrago! Já se tem um foco de pessoas desinformadas, mas crente, preocupadas e assustadas.

Educar é sempre um processo difícil. Ainda mais, quando jovens lidam com informações que, até agora, eram de difícil acesso. Especialistas alertam que a conscientização é fundamental para não se replicar informações falsas. O ideal seria que cada um verificasse os fatos antes de compartilhá-los e não acreditar em tudo o que circula pela internet. Mas quem disse que vivemos num tempo ideal? A mistura de fofoca com mentira parece com o coronavírus: posso ser portador e não ter problemas, mas disseminando, me transformo numa arma perigosa para ferir as pessoas e prejudicar a verdade!

terça-feira, 7 de setembro de 2021

Cristão, cidadão e brasileiro

O texto que o pastor Ismar Pinz publicou no dia 03 de setembro incomoda. “Manifestação política? Uma palavra profética e pastoral” (na íntegra, no meu blog) não mira o governo, sequer naqueles que o apoiam ou quem lhe é contrário. Texto lúcido, visão cristã da problemática social, sem lugar para meias palavras, assumindo ser formador de opinião. Em tempos de polarização, quando comunidades religiosas têm problemas por enfrentamentos partidários, cumpre seu papel como “político”, aquele que tem responsabilidade sobre a “polis” (cidade) e a vida do seu povo.

Na Semana da Pátria, quando se comemora a Independência do Brasil, em 7 de setembro, defende o direito de ficar “em cima do ‘púlpito’ - do ofício pastoral, que cuida, exorta e consola a todos; e não somente uma parte (partido)”. Em tempos em que se se transformam políticos em celebridades, adverte, como o profeta Jeremias: “Maldito o homem que confia no homem. Aqueles que fizeram a si mesmos de deuses, foram tiranos; que roubaram a liberdade dos demais”.

Sua advertência mais dura é quando afirma que “ter Deus como Senhor é colocar absolutamente nele a fé, e não em ideologias e sistemas! Por isso, em nome do Senhor, e certo de como é triste perceber que amigos não estão debatendo e construindo ideias, mas brigando por sistemas, que apesar dos méritos também tem falhas, uso a partir de agora uma expressão bíblica e profética (os ais), e anuncio, com dureza, mas com carinho e intenção de reflexão a todos”.

Açoita esquerda e direita elencando problemas que levaram ao confronto e fizeram grupos dogmatizarem posições, esquecendo recomendações religiosas e humanistas. Clama: “Ai dos corruptos espalhados por todas as partes. Ai dos mentirosos e de todos os que criam narrativas para contar meias verdades. Ai dos que distorcem a justiça, e não me refiro apenas aos que usam togas. Ai dos que se consideram ‘gente do bem’ e olham para os outros como se fossem inferiores”.

Repete o Evangelho: parecem “cegos guiando outros cegos!” Aos ausentes, indiferentes e apáticos recomenda: “lutemos e oremos por um país mais justo. Que a pátria de fato seja amada! Que somente Deus seja adorado e realmente ouvido! Que a força do seu amor nos proteja; mantendo a paz externa e gerando a paz no coração e, quem sabe, uma união que nos faça, não alimentar polaridades, mas avançar para o bem comum, pois Jesus deseja que caminhemos juntos!”

Embora muitos olhem com desconfiança para líderes religiosos com esta preocupação, a ausência na cena pública é sentida. Oportunistas e aproveitadores ocupam espaços, em nome dos credos, que distorcem e afastam quem ainda têm fé, mas se decepcionou com algum “religioso”. Os problemas sociais e ausência de referências leva a que se percam os valores da ética e da moral. Sete de setembro é para demonstrar que somos cristãos, cidadãos e brasileiros… e que o país merece mais de políticos e administradores, que deveriam ser apenas o que de fato são: servidores públicos!

MANIFESTAÇÃO POLÍTICA? Uma palavra profética e pastoral

Em nosso país vivemos mais uma semana da pátria. Há convites para manifestações no dia 07 de setembro; de um lado e de outro; da posição e da oposição! Há liberdade para expor pensamentos e lutar pelo que se considera melhor. Mas não deve haver espaço para violência! Absolutamente não deve haver violência!

Como pastor não assumo posição partidária. E sigo essa postura não apenas por força de um regimento ou ordens superiores, mas por convicção! Anuncio uma pátria celeste, mas bem sei que esse anúncio de fé tem e deve ter repercussões nas pátrias terrenas. Alguns acusam a posição pastoral que defendo como “ficar em cima do muro”; mas retruco que não tem nada a ver com ficar em cima do muro; tem a ver com ficar em cima do “púlpito” - do ofício pastoral, que cuida, exorta e consola a todos; e não somente uma parte (partido).

Declaro aqui uma palavra bíblica que diz: “Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esse mundo (a pátria terrestre) somos os mais infelizes de todos os homens. (1 Co 15.19)”. “Pois não há justo. Não há um sequer! (...). Todos pecaram e carecem da glória de Deus (Rm 3.10,23).

Por isso, temos o conselho bem direto: “Não confiem em príncipes, nem nos filhos dos homens, em quem não há salvação (Sl 146.3)”. A palavra “príncipe” se refere as autoridades e líderes políticos. Alguns poderiam deduzir que a política é do mal. Mas não é bem isso. Na verdade, está escrito que “toda autoridade é constituída por Deus (Rm 13)”. Por isso é da vontade de Deus que honremos e respeitemos as autoridades. No entanto, jamais devemos colocar nossos corações nelas.

Ao contrário dos egípcios dos tempos bíblicos, que consideravam faraó o seu deus – os cristãos têm apenas um só Senhor e Redentor. Ao contrário do império romano que proclamava César como um deus - os cristãos anunciam um único Criador e afirmam que antes importa obedecer a Deus do que a homens. (Atos 5.29).

Jeremias chegava a clamar: “Maldito o homem que confia no homem (Jr 17.5). Aqueles que fizeram a si mesmos de deuses, foram tiranos; que roubaram a liberdade dos demais.

Na semana que celebramos a pátria; repitamos a palavra do Salmo 33.12: “Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor.” Ter Deus como Senhor é colocar absolutamente nele a fé, e não em ideologias e sistemas! Por isso, em nome do Senhor, e certo de como é triste perceber que amigos não estão debatendo e construindo ideias, mas brigando por sistemas, que apesar dos méritos também tem falhas, uso a partir de agora, uma expressão bíblica e profética (os ais), e anuncio, com dureza, mas com carinho e intenção de reflexão a todos - cada tópico mereceria contra-argumentos, mas fico a exortação direta:

Aí dos esquerdistas que impõe suas vontades, antes da vontade divina.

Ai dos direitistas, que limitam Deus aos seus esquemas e a sua cartilha e desejam tirar o cisco do olho do outro e não percebem a trave diante dos seus olhos!

Ai dos esquerdistas e de todos os que desvalorizam a vida humana, que parecem clamar por minorias, mas esquecem os menores, os pequenos fetos, desconsiderando suas vidas em prol de abortos.

Ai dos direitistas que lutam para manter seu status e fazem uso de suas posições para impor pela força; com suas bocas enaltecem suas famílias, mas traem seus maridos e esposas e se distanciam de seus filhos.

Ai dos esquerdistas que enaltecem o barro e esquecem do oleiro! Que criam um discurso que confunde a identidade sexual, e trocam a liberdade por libertinagem, gerando acúmulos e acúmulos de ansiedade!

Ai dos direitistas que enaltecem o barro e esquecem o oleiro, quando usam o nome do Senhor em vão, em prol dos próprios benefícios, misturando o Reino celeste de Deus com seus pequenos reinados.

Ai dos esquerdistas que desejam decidir o que fazer com a propriedade do outro, mas que acabam esquecendo de procurar o progresso do semelhante. Clamam por direitos e esquecem os deveres.

Ai dos direitistas, que a semelhança dos fariseus, protegem suas propriedades, que de fato são suas, mas não se esforçam para proteger as pessoas ao seu redor; e assim apenas alimentam a desigualdade social.

Ai dos esquerdistas e direitistas que esquecem que as instituições são feitas para os indivíduos e não os indivíduos para as instituições.

Ai dos corruptos espalhados por todas as partes.

Ai dos mentirosos e de todos os que criam narrativas para contar meias verdades. Ai dos que distorcem a justiça, e não me refiro apenas aos que usam togas.

Ai dos que se consideram “gente do bem” e olham para os outros como se fossem inferiores.

Ai dos pecadores! Ai de mim! Ai de todos nós que formamos essa, e muitas outras pátrias humanas.

O juízo de Deus virá sobre todos nós! Não há justo; não há sequer um! Dos Céus Deus olha e procura se há algum justo (Sl 14). Olha para a esquerda e nada encontra. Olha para a direita e nenhum justo há.

Miseráveis seres que somos! Na luta por uma pátria melhor, somos como cegos guiando outros cegos! (Mt 15.14). Quem nos livrará desta perdição? (Rm 7.24) Quem nos livrará dessa escuridão?

Graças a misericórdia do Pai do Céu, algo já foi feito. Graças a misericórdia de Deus, ele resolveu fazer isso! E fez do único jeito possível. Através de Jesus. Ele se fez gente e habitou em meio as pátrias humanas - e habitou em justiça. Um justo que assumiu a culpa de todos os injustos. Um justo que recebeu sobre si a pena de todas as injustiças. Um justo que recebeu o direito de justificar os outros. De declarar inocência! De salvar. De redimir! E ele o faz, por meio da fé. Ele prometeu assim e podemos sentir no coração que ele cumpre; perdoando e renovando!

Ele é aquele que faz novas todas as coisas! Em Cristo “nascemos de novo” (Jo 3). E assim, o Senhor promove transformação, proibindo nossa acomodação (Rm 12), e nos impulsionando a olhar para o mundo com amor. Assim como Deus Pai enviou Jesus ao mundo pecador; Cristo também nos envia (Jo 20.21), como sal e luz (Mt 5.13-14). Não para julgar e condenar, mas promover salvação.

Assim, lutemos e oremos por um país mais justo. Que a pátria de fato seja amada! Que somente Deus seja adorado E REALMENTE OUVIDO! Que a força do seu amor nos proteja; mantendo a paz externa e gerando a paz no coração e; quem sabe, uma união que nos faça, não alimentar polaridades, mas avançar para o bem comum; pois Jesus deseja que caminhemos juntos rumo a pátria celeste!

TEXTO ESCRITO POR: Pastor Ismar Lambrecht Pinz – 03/09/2021