sábado, 28 de agosto de 2010

Filhos do coração

A Lígia Antunes enviou a história do escritor Leo Buscaglia: “Os alunos da professora de primeira série estavam examinando uma foto de família. Uma das crianças tinha os cabelos de cor bem diferente dos demais. Alguém sugeriu que ela tinha sido adotada. Logo uma menina falou: - Sei tudo sobre adoção, porque eu fui adotada. Outro aluno perguntou: - O que significa "ser adotado"? - Significa - disse a menina - que você cresceu no coração de sua mãe, e não na barriga!”
Foi do que me lembrei quando estava sendo atendido num serviço por uma senhora que atendeu o celular. Logo seu rosto se transformou emocionada. Falavam a respeito de um sobrinho que viera conhecer a ela e à irmã, já que o pai e a mãe biológicos não existem mais. A então criança foi entregue para adoção e a família deixou Pelotas e nunca mais voltou. No entanto, quando soube de sua história, quis conhecer seus parentes. Quase às lágrimas, a tia agradecia pelo jeito como o rapaz havia sido formado, tendo sido respeitoso e carinhoso para com elas, mas demonstrando uma devoção que transparecia no olhar cada vez que falava da família que o acolheu.
Acompanhei muitas campanhas que buscam um lar para crianças que não têm como permanecer com seus familiares. As dificuldades são muitas, pois adotar alguém é considerado um tiro no escuro: no que pode dar? No entanto, aqueles que aceitaram o desafio dizem que valeu cada um dos sacrifícios. Lembro de uma família que recebeu uma criança com Síndrome de Down e da mãe que aceitou uma menina com problemas cardíacos. No primeiro caso, os pais dizem que depois que os outros filhos cresceram e se foram, restou uma companhia amiga e solidária. No segundo, foram anos tentando vencer a doença que finalmente ganhou.
Nas duas histórias, cada momento foi vivido como único. Na solidariedade do tempo que passa, assim como na mãozinha que pela última vez foi estendida para agradecer o afago que diminuía a dor, estava a certeza de que não haviam sido gestadas na barriga. Foram e continuarão sendo filhos do coração.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O voto é seu

Faltando em torno de um mês e meio para as eleições em diversos níveis – presidência, governo, senado, câmara dos deputados e assembléia legislativa – a campanha eleitoral ainda não embalou. Mesmo iniciada a propaganda eleitoral em horários nobres – para desespero da maior parte das pessoas – não se percebe interesse por parte da população. Bem pelo contrário: a apatia é a regra e o desinteresse quase que total.
Até o início de outubro, muitas águas vão passar, mas nada indica que exista mudança no comportamento do eleitor. E por que esta indiferença? Infelizmente, em todos os níveis, o que se vê é a banalização dos escândalos, com desvios de recursos e comportamentos que beiram o deboche: a repetição de um discurso recheado de expressões sociais bate no vazio das ações, ou em atos escusos, onde se mascaram números, ficando para investimentos priorizados pela população – educação, saúde, segurança – migalhas comparadas às somas que são investidas nas máquinas eleitorais.
Sobram produções cinematográficas maquiando candidatos sabidamente sem atrativos populares – até com dificuldade de um dos atos mais simples de simpatia: sorrir - vendidos como solução para todos os problemas. É preciso reconhecer que o trabalho de profissionais do marketing ainda consegue vender “gato por lebre”. Pena é que, muitas vezes, está embutido bem mais do que apenas um pobre animal, também um projeto político que tem o verniz de realização cidadã, escondendo interesses de grupos que controlam a máquina administrativa, tanto à direita, quanto à esquerda.
Gostaria de dizer que existe alguma chance de mudança em curto prazo. Não creio. Mesmo havendo um grande número de políticos honestos, não está em suas mãos o controle e a decisão dos investimentos. Veja-se o Senado e a Câmara Federal dando espetáculos vergonhosos. Ainda temos - como gaúchos - fama de “certinhos” e, mesmo assim, já vemos estes sinais se repetindo em executivos e legislativos. Antene-se: o voto é seu, mas as decisões futuras não. Portanto, é um gesto de confiança que deve ser bem pensado, para não se arrepender num futuro bem mais próximo do que você imagina.

sábado, 14 de agosto de 2010

Crenças e superstições

Recentemente, passamos por uma sexta-feira, 13 de agosto. Serve para refletirmos que o advento da luz elétrica e o aumento do número das pessoas que podem acessar o conhecimento diminuíram significativamente o número das pessoas que reconhecem ainda ter alguma crença ou superstição. A crença se distingue da fé por não ser algo ligado a uma religião, mas uma construção pessoal, com uma espécie de “lógica” para cada um. E a superstição, bem, esta é muito engraçada, pois é mais comum do que se pensa, mas não se reconhece que existe.
As superstições mais comuns passam por evitar números como o 7 e o 13 (dizem que alguns países, inclusive, não numeram o décimo terceiro andar); passar longe de gato preto, não cruzar embaixo de uma escada. Mas as mais modernas estão na cueca, camiseta, abrigo etc. utilizadas em alguma partida de futebol e que “deram sorte” e a vitória para o nosso time. A partir daí, precisa ser repetida sempre, mas, se acontecer algo em contrário, arruma-se uma desculpa para não culpar a peça de roupa. Segue-se a máxima de que “não creio em bruxas, mas que elas existem, existem”.
Mesmo as pessoas que estudam os processos religiosos não conseguem explicar como estas coisas acontecem. Talvez porque não existam explicações, mesmo. É uma necessidade do ser humano mais simples de ter amuletos que o aproximem do Divino, por elementos que somente ele reconhece e entende. Crenças e superstições podem não ser aceitas, mas, desde que respeitem os demais, devem ser respeitadas.
As crenças estabelecem juízos populares que dão como verdade um conjunto de coincidências. Por exemplo: “agosto é o mês do desgosto”. Muitas desgraças aconteceram neste mês, assim como em todos os outros do ano, mas o consenso popular é de que ele atrai energias negativas e põe fim na vida de muitas pessoas idosas (coincidência com o final de Inverno). O pai conta a história de um vizinho alemão que tinha medo deste mês. Em 31 de agosto afirmou, contente, para os familiares que estava quase vencido o “adversário”. Morreu no dia 1º de setembro.

domingo, 8 de agosto de 2010

Receita para uma família feliz

A receita é relativamente simples, talvez o complicado seja o jeito de tratar os elementos: todos querem ter uma família feliz. Mas como fazer com que isto aconteça? A receita: fazendo pessoas felizes. Os elementos, nesta Semana da Família: crianças desajustadas, jovens sem identidade, adultos amargurados e idosos definhando por serem considerados um incômodo a ser tolerado.
Ainda bem que estes casos não são a regra, mas a exceção, aparecendo mais porque demonstram nossas fraquezas e, em muitos casos, a incapacidade para enfrentar problemas. A tentação é negar que, exatamente embaixo de nossos narizes, as coisas estão acontecendo e tentamos deixar que se resolvam “naturalmente”.
Pensar que uma palmada é o mesmo que uma ação constante de violência é desconhecer por completo as relações de família. Ninguém aceita a violência, por não ser natural nas relações, mas fruto de uma mente doentia. Acompanhar um jovem enquanto define sua personalidade é um jogo de acertos e erros, que precisa ser enfrentado com um olhar que, ao mesmo tempo, signifique firmeza, solidariedade e carinho.
Embora sempre se pense que adultos, por estarem muito ocupados, estejam livres de problemas, o que se percebe é o contrário: Não deixar fluir os sentimentos faz com que se chegue a um momento em que se transborda e todo o processo de reconstrução é muito doloroso. E, numa sociedade em que se trata o outro como objeto útil, o idoso é algo descartável, porque não há muito mais o que possa oferecer em troca.
Estas idades formam a família: a criança em busca de caminhos, o jovem sedimentando conceitos, o adulto carente de acolhida e o idoso, porto seguro onde se ancora na espera de passar a tempestade e chegar a bonança. A receita da família feliz não existe. Mas há elementos a serem vividos quando resta um abraço, uma lágrima ou um sorriso maroto no rosto do idoso que reencontra a neta e lhe falta a palavra, mas escorrem sentimentos represados de saudade e ternura no que há de mais sublime na vida: laços que não se desfazem com a distância física ou o passar do tempo.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Um homem bom

Os mais antigos tinham clara a definição do que era um “homem bom”: temente a Deus (uma religiosidade bem definida), bom marido, bom pai de família e com posição bem definida na vizinhança, o que significava ser alguém que valia a pena ouvir ou consultar quando necessário.
É no que penso quando vejo tantas dificuldades para entender como os homens públicos pregam um tipo de comportamento e agem de forma diferente. Não vale a pena personalizar, mas olhem para a política e vejam o que dizem e o que fazem, ou, em nível internacional, o que, por exemplo, se noticia a respeito deste último derramamento de petróleo no mar: a preocupação é com os milhões de dólares que a empresa perdeu e sobra pouco espaço para ver a ferida que se abriu no meio ambiente.
Esta conduta é a mesma que, vista por nossas crianças e jovens, vai pautar o seu jeito de se comportar, não apenas no futuro, mas já no presente: se minha mãe pode xingar alguém no trânsito, porque não posso fazer o mesmo com meu colega na Escola? Se meu pai pode ameaçar agredir alguém na rua por uma ninharia, porque não posso descontar a minha raiva no irmãozinho ou irmãzinha em casa?
Este procedimento que parece banal está causando mais danos do que imaginamos. Regras de comportamento somente são assimiladas se antes vierem acompanhadas de exemplos. Não é à toa que se diz que “conselhos são bem vistos, mas exemplos arrastam”. Não é necessário que nos transformemos em modelos absolutos de integridade – porque os santos, hoje, são raros – mas que façamos do nosso agir um jeito de dizer que somos homens do bem.
Em família, na escola, na religião, no trabalho ou na diversão, a preocupação deve ser apenas uma: não faço ao outro o que não quero que me façam, respeitada a máxima de que a minha liberdade acaba quando inicia o nariz do outro. É o melhor jeito de pacificarmos as relações e descobrir que ainda podemos ser, ao jeito antigo, um “homem bom”.