segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O respeito humano

Conversava com a Vanda e ela me disse que a emissora de rádio onde trabalha fez uma opção: realçar o positivo, sem negar o oposto, com ênfase em tudo o que pudesse ser otimista. Fiquei contente, pois se os meios de comunicação seguirem esta tendência, mais fácil se torna incutir valores. No entanto, domingo, um programa humorístico de rede nacional lançou um balde de água fria sobre este pensamento. Em poucos minutos, a cena numa biblioteca afrontava um dos maiores valores: o respeito pelo ser humano. Um “falso leitor” tirava os demais do sério por não respeitar um direito fundamental num espaço de estudos: o silêncio. Invocava o direito de estar numa área pública. Como quem diz: aqui eu posso fazer qualquer coisa. O que já se tornou comum, quando pessoas, iludidamente, entendem seus direitos, mas esquecem os seus deveres.
Pior ainda quando entrou em cena um ator caracterizado de idoso, que passou a ser o saco de pancadas do personagem principal, jogado de um lado para o outro, agredido fisicamente, além de ter seu “traseiro” chutado em diversas ocasiões.
Fiquei petrificado diante do que parecia uma brincadeira, falsamente inocente, mas que vai ser repetida por crianças, ao longo da semana, introjetando como valor o desrespeito pela coletividade e a desmoralização da pessoa idosa, já com tanta dificuldade de ver considerado o seu espaço na sociedade.
Pior é que, além das crianças, também os adultos estão sob influência nesta hora, já que se postam diante da televisão com as suas defesas desguarnecidas. A maior parte vai me dizer que não há perigo, porque já estão crescidos o suficiente e não sofrem este tipo de influência. Não é assim. Pois esta mensagem vai corroendo gradativamente os valores e se chega à máxima – e já chegamos – de considerar aquele que envelheceu como um estorvo a ser mantido afastado do lar, para, supostamente, ser protegido e cuidado.
Na maior parte das vezes, tudo o que o idoso necessita é o mesmo que qualquer um de nós: afeto, consideração e respeito. Se fôssemos seguir este trinômio, possivelmente, nenhum humorista tivesse coragem de julgar que a agressão é engraçada e deva ser incentivada e repetida.

domingo, 20 de setembro de 2009

A moral no legislativo

Instituições populares tentam passar no Congresso Nacional projetos de lei que moralizem a atuação política em todos os níveis. Os noticiários do dia-a-dia, com a avalanche de escândalos, quase sempre “justificados”, é o combustível para a insatisfação e a sensação de que, se deixarmos assim, ainda acontecerá coisas piores. A “Constituição Cidadã”, de 1988, prevê a possibilidade de que organizações protocolem projetos que contem com cerca de um milhão e trezentas mil assinaturas. A mais recente quer que políticos condenados em primeira instância não possam concorrer em todos os níveis.
Em alguns casos, são pessoas inocentes, que ainda tem direito à defesa. Mas, na maior parte das vezes, são políticos com práticas que envergonham aqueles que dizem representar. Preocupa mais ainda quando se tornou público que o Senado tem uma Comissão de Ética onde de cada dez senadores sete estão envolvidos em casos na Justiça. Como resultado, vimos nos últimos dias conchavos que livraram tanto à direita, quando à esquerda, aqueles que poderiam ser submetidos a julgamento e terem seus mandatos cassados.
Este é apenas um dos motivos que leva a outra campanha, em nível nacional, pedindo que os eleitores, em outubro do ano que vem, não votem em senadores. E existe uma forte campanha pela extinção do Senado, que, nos últimos tempos, tem se mostrado farto em gastos escusos e pobre em produção legislativa. E mais: uma redução substantiva do número de integrantes da própria Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores. Por aquilo que vemos em outros países organizados, não existe a necessidade de um número tão alto de representantes para qualificar o poder legislativo. Bem pelo contrário, onde aumenta o número de integrantes quase sempre diminui a sua qualidade.
E, por favor, não ofendam a inteligência do eleitor com esta história de que o orçamento do atual número de vereadores para o aumento substancial que foi autorizado se mantém o mesmo. Pode até ser que seja assim agora, mas num futuro não muito distante a conta vai ser apresentada à sociedade. Em tempos de Revolução Farroupilha, creio que está na hora de utilizarmos a única arma que temos em mãos: o voto. Trate bem dele e selecione com cuidado em quem vai votar. Assim como assine os projetos que pedem a moralização do processo eleitoral. Todos ganhamos com isto, especialmente um futuro onde possamos pensar realmente em qualidade de vida, sem estarmos preocupados com a porta do cofre.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Um bom sinal

Pesquisa recente mostrou que mais de 40 por cento da população brasileira tem por rotina reservar parcela do seu salário para leitura de revistas, jornais ou livros que não sejam didáticos. Confesso que fiquei surpreso. Não tinha ideia, em números, mas acreditava que era uma parcela bem menor da população que tinha este hábito tão saudável. E porque saudável? Porque o fato “de as” pessoas consumirem a leitura por prazer ou em busca de informação e formação é um dos pilares para o processo de conscientização, meta sempre tão almejada e tão difícil, já que, na maior parte das vezes, nos deparamos com parcelas da população alfabetizadas funcionais, pois conhecem as letras e sabem escrever seu nome, mas não são capazes de articular um raciocínio lógico.
Pode parecer estranho, mas esta informação, a meu ver, é mais importante do que a descoberta do pré-sal (ou, como brinca Luiz Fernando Veríssimo: pós-sal, já que vem depois do próprio e não antes). Enquanto as ainda misteriosas reservas de petróleo não representam uma realidade que possa, de fato, mudar a vida das pessoas, supostamente para melhor, a formação e a informação tendem a serem alavancas poderosas neste sentido, impedindo que as mesmas sejam manipuladas emocional e intelectualmente.
Fico emocionado quando um pai ou uma mãe fazem questão de afirmar que tiveram muitas dificuldades durante a vida, mas que fizeram questão de dar estudo aos filhos, sabendo que, na falta absoluta de bens materiais que propiciassem uma vida melhor, deram aos seus descendentes algo que ninguém mais pode tirar: o conhecimento e a capacidade de articular os seus próprios caminhos. Este é um bom sinal. Um sinal de que na formação e na informação está se construindo um futuro diferenciado, especialmente para as novas gerações. Em casa, temos o costume do chimarrão, às 10 horas, acompanhado da troca de informações da rua (as fofocas do dia) e da leitura dos jornais. Este hábito foi sendo passado naturalmente, sem a necessidade de qualquer incentivo. O exemplo foi mais forte e embora os mais novos iniciassem por alguma seção que lhes interessava, logo estavam lendo o jornal todo.
Pois agora vejo que este é um costume que não é tão difícil e pode fazer toda a diferença. Posso entender o que as pessoas querem dizer quando se referem à “capital intelectual”, uma moeda muito mais poderosa do que o próprio capital financeiro, especialmente porque faz parte do próprio indivíduo e lhe abre janelas que pavimentam o próprio futuro.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Os segredos da memória

Telefonei ao Charles e ele me contou que estava assistindo o filme “O E.T.” (O Extraterrestre), um clássico do cinema onde é narrada a história da amizade entre um menino e um pequeno ser de outro planeta. O motivo da “sala de cinema” era simples: os pais do Ricardo e do Gustavo deram-se conta de que, embora em seu quarto houvesse o boneco do personagem, não sabiam quem era.
Lembrei desta história ao ouvir a palestra em que o professor contava que somos incapazes de aprender algo que seja absolutamente novo. Mesmo que seja um tema muito interessante, ao sermos apresentados a uma determinada situação, precisamos de “âncoras” já conhecidas, com as quais estamos familiarizados, para podermos entender o que está sendo dito. Usou como exemplo a própria audiência, dizendo que embora estivéssemos ali para ouvi-lo, haveríamos de reter até cerca de 60 por cento das informações repassadas em nível de teoria; e alcançaríamos 80 por cento quando fossem usadas imagens que referenciassem o conhecimento. Mas que, em hipótese alguma, conseguiríamos atingir os 100 por cento.
Assim como fez o Charles com os dois garotos, também acontece no aprendizado: são muitas as situações onde precisamos recordar algo passado e que, mesmo estando de alguma forma em nossas memórias, precisa ser “renovado” como conhecimento, numa simples sessão de cinema ou em alguma atuação comunitária, sala de aula ou situação de trabalho.
Falo a este respeito quando faço minhas conversas com pessoas que atuam em paróquias ou comunidades em diversas dioceses. Embora tenhamos um vastíssimo campo pastoral e teológico, quando as pessoas procuram uma comunidade não estão sedentas de conhecimentos, mas tentando encontrar um porto para abrigo. Portanto, não é necessário que haja uma pregação ou algum tipo de envolvimento que estimule a razão, mas um coração aberto e acolhedor.
Fica claro que elas estão em busca do que possa suprir a sua emoção e o seu imaginário: a própria fé. Muito provavelmente, na preparação de uma Missa, de um Culto, ou de qualquer atividade religiosa, estejamos precisando que, antes de pensar em argumentos racionais, busquemos saber quais são as angústias, os temores, as dores, as felicidades, os motivos de celebração de quem chega. Possivelmente, será necessário, apenas, procurar nos segredos da memória um dedinho erguido em sinal de amizade, como acontece no filme, dizendo: “E.T.!!!”