sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Investimento no futuro

Dois fatos e uma lembrança: a Prefeitura de Pelotas iniciou o processo de transporte de pneus que se encontravam num lixão para um centro de reutilização deste material; algumas ruas de bairros da cidade começam a receber a instalação de canos para ampliar a rede de esgoto; em tempos de calor exacerbado, sentimos falta de que exista mais verde pelas ruas, parques e praças.
O caso dos pneus é quase de saúde pública. Quando foram recolhidos, havia a promessa de reciclagem, podendo ser utilizados na composição de canos. Também poderiam ser usados num novo tipo de asfalto que mesclasse os materiais. Embora os discursos de ocasião, nunca se concretizou e faziam um visual feio e perigoso nos locais onde eram armazenados a céu aberto, com os mosquitos batendo palminhas pelos criadouros naturais!
Com relação aos esgotos, considerados como "obras enterradas", não é daquelas preferidas pelos administradores públicos, porque não aparecem e não se faz discurso sobre o "aqui jaz"! Mas são muito importantes considerando que grande parte de nossos problemas de saúde começam, exatamente, no mau direcionamento e na falta de tratamento dos dejetos que saem das casas.
A lembrança ficou por conta de que Pelotas é considerada uma cidade pobre em árvores há muito tempo. Em meados da década de 80, o então prefeito Bernardo de Souza fez uma campanha para que se arborizasse a cidade e declarou um sonho: gostaria de ver algumas avenidas com Paineiras - do tipo que existe na João Pessoa, em Porto Alegre, belas, altas, distintas, uma marca do verde entre o céu e a terra.
O responsável por parques e praças disse que as Paineiras levam muitos anos para se desenvolver e a administração deveria pensar no curto prazo. Bernardo foi enfático: "a cidade também precisa ser pensada para o futuro!"
Poucos são aqueles que têm esta visão: somos imediatistas, queremos para o hoje, no máximo amanhã. Desta forma esquecemos que a cidade precisa ser um investimento no futuro, que talvez não apreciemos, mas dará qualidade de vida a nossos filhos, netos...

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Ao menos em nossas lembranças

Apenas a a solidão me faz companhia.
O silêncio somente é quebrado
pelo barulho de carros que passam ao longe,
ou por vozes que se perdem na noite.

Sei que, por sobre as nuvens,
a Lua reina faceira e faz companhia às estrelas.
Mas não as vejo, apenas distingo
o contorno de árvores e arbustos
por onde até o vento esqueceu de passar.

O friozinho das noites de Primavera
convida a caminhar, mãos nos bolsos,
tendo apenas como companhia
o murmurar dos insetos.

Neste momento especial, os perfumes se misturam:
De longe, a sedução da Orquídea,
Do pátio, o encanto do Jasmim,
Da vizinhança, o grito sufocado da Dama da Noite.

Há o encanto deste momento do dia
em que o não revelado é a provocação
para apenas andar, buscar caminhos,
pensar naqueles que, de alguma forma,
nos amaram e fazem companhia:
Ao menos em nossas lembranças.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Vileiro e universidade

Recebi carinhoso telefonema da Gicelda fazendo uma entrevista sobre a minha aposentadoria da Católica, a partir do final do ano. Tentei ser claro que guardo grandes amizades por muitos alunos que buscaram descortinar mundos com a ajuda de um professor que já se considerou bom, mas que hoje não consegue se julgar adequado à sala de aula. Mas que, hoje, os jovens estão com problemas diferenciados e que, eu, não consigo me ver como aquele arrimo que precisam para encontrar horizontes. Então é hora de deixar para outros, mais jovens, que possam fazer uma nova jornada.
A pergunta de sempre: vais sentir falta dos bancos escolares e dos horários a serem cumpridos? Não, não vou. Há algum tempo, minha vida tem sido de atendimento em sala de aula, mas, também, em palestras, rádio, televisão, jornais, atendimento pela internet, que faz com que muitos dos ex-alunos procurem uma formação continuada, ou um consultor para as horas mais difíceis.
Mas tem, também, aquele olhar de vileiro que sou, há 53 anos, desde que chegamos a Pelotas, vindos do interior de Canguçú, quando tinha quatro anos. Sair pela manhã para cortar o cabelo é encontrar a turma da ginástica, na igreja, a caminho de casa; passar pelo açougue é descobrir as notícias mais recentes; ganhar uma muda de roseira é conhecer os recantos de um belo jardim e programar o plantio no horário e local mais conveniente; assim como voltar para casa é encontrar pessoas rezando com a mãe, na cama, e investir na gentileza de ceder mudas e trocar informações sobre o plantio.
As mudanças em minha vida nunca foram radicais. Deus sempre foi me preparando até assumir um novo jeito de viver. Creio que, agora, a mudança é para melhor: talvez não escreva mais, quem sabe não tenha rádio e televisão, mas deve haver alguma instituição precisando de alguém que lave pratos, descasque batatas ou cuide de crianças no intervalo de aulas...

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Fim do fator previdenciário

Um dos grandes problemas que temos, no Brasil, é que, quando interessa ao poder econômico (diga-se aqui governo federal), as mudanças de regras acontecem em pleno jogo, sempre penalizando aqueles que aceitaram as regras que, ao fim, não são cumpridas. É o caso da aposentadoria por tempo de serviço. Quando comecei a assinar carteira de trabalho - ainda com uma carteira de menor, para quem não lembra, era verdinha, diferente da azul de hoje - a regra era clara: qualquer cidadão precisava chegar aos 35 anos de contribuição para poder requerer aposentadoria. Perfeito, se as regras fossem cumpridas. Não foram.
Como disse um deputado, há uma demanda reprimida de aposentadoria porque muitos, como eu, estão com o tempo cumprido ou já ultrapassaram, mas não querem cair numa regra perversa feita por um governo de centro - FHC, mas com a bênção da esquerda, Lula e Dilma, que nos retira até 30% dos vencimentos, diga-se de passagem, sobre um salário máximo que não chega aos quatro mil reais, quando, no nascedouro, o teto era de dez salários mínimos!
Há uma mobilização nacional para que se pressione o Congresso e também a presidente Dilma. Os rombos da Previdência não foram causados pelos aposentados, menos ainda pelos trabalhadores, mas por aqueles que - governo após governo - administraram mal os recursos que foram recolhidos - compulsoriamente, quando não foram desviados!
O senador Paulo Paim chegou a falar em greve de fome para que se aprove e sancione a mudança. Sugiro que todos pensem no assunto porque, se eu estou falando em causa própria, não esqueçam que se as regras não mudarem agora, haverão de causar problemas para as futuras gerações.
Numa emissora de rádio, uma repórter falou que "faltava responsabilidade" por parte de quem queria o fim do fator previdenciário. A pergunta que não quer calar é: "na ponta do lápis, os recursos existem, mas cumprem com o papel de pagar os aposentados e ainda injetar recursos no caixa do governo. Quem, afinal, tem que pagar a conta?"

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Bênção, pai!

As cores começavam a desaparecer enquanto o sol se punha no final de tarde. O branco da fumaça do fogão à lenha singrava os céus, numa prece silenciosa que se perdia no infinito. O silêncio somente era cortado pelas machadadas cadenciadas que interrompiam o silêncio da Primavera, na certeza de que a lenha era boa e que o friozinho da noite se transformaria em aconchego na cozinha.
Ao transpor a porta, o lampião sendo aceso e as crianças, brincando no chão, ao redor da mesa, erguiam os olhos: “bênção, pai”. Olhar de felicidade sobre os meninos que se divertiam com seus bois, cavalos e ovelhas feitos com pedaços de milho, onde as pernas eram pequenos gravetos e os olhos os grãos de milho, feijão ou arroz: “Deus te abençoe, meu filho”.
É a única lembrança que tenho do interior de Canguçu, onde passei minha infância até os quatro anos. Talvez um pouco misturado com nossas voltas, onde meus segundos pais: Tio Ciano e Tia Toninha repetiam o mesmo ritual, que incluía ligar o rádio a pilhas e ouvir os programas tradicionalistas de rádios da capital.
A noite terminava relativamente cedo, pois estávamos cansados das muitas atividades diárias. Havia ruídos da noite transformados em acalentos para nossos sonhos, que começavam a se esvanecer ainda na madrugada ao primeiro canto de um galo, ou o início da atividade dos pássaros.
Ir para a cozinha significava encontrar uma bacia pronta para a primeira higiene, um rosto amigo sorrindo com um bom dia e a certeza de que, nesta etapa da vida, estávamos protegidos e dispensando qualquer pressa em enfrentar o futuro: o presente era uma bênção que Deus dava para a inocência daqueles que não precisavam de mais nada para, apenas, ser feliz!

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Um menino que gostava de livros

Tempo de feiras do livro, bom para se observar as praças por onde se escondem emoções, aconchegos, entregas, surpresas... Embora o livro seja o destaque, também se podem observar aqueles que lidam com eles: a fauna é variada, com idosos em busca de recordações, aqueles títulos que marcaram uma vida; adultos preocupados com sua formação profissional ou em encontrar um espaço de lazer; jovens em busca de um horizonte de esperança e crianças que tentam entrar num mundo que parece, ao mesmo tempo, complicado e tentador.
O garoto que furungava nos sebos e nas seções infantis tinha a expressão de ansiedade: mãozinha fechada, segurava algum dinheiro com a força de quem sabe que ali está a chance de adquirir alguma novidade. Depois de um interrogatório com o livreiro, foi adiante. Não resisti em perguntar ao livreiro o quê ele procurava. A resposta: ganhara cinco reais de um padrinho e queria um livro. Quase afirmei ser impossível comprar um livro com cinco reais. O olhar entre compreensivo e debochado do atendente afirmava que sim, era possível comprar um livro com tão pouco dinheiro!
Tive vontade de ir atrás do menino e conversar com ele sobre seus gostos, os desafios que enfrentava, os desejos que procurava realizar. Mas me contive. Não tinha o direito de penetrar naquele universo infantil e violentar a sua vontade que era dele próprio fazer a sua busca e saber que encontrara, comprara e poderia curtir o tão sonhado livro.
Diante de uma realidade que, na maior parte das vezes, aponta perspectivas sombrias para as novas gerações, estava ali uma chama que merecia ser acalentada. Não era um intelectual, não era um sábio, sequer um experiente degustador de obras clássicas.
Apenas um menino que gostava de livros. Fazendo a diferença do que se pensa para as novas gerações: nenhuma perspectiva pode estar perdida se apenas um menino estiver entre sebos e seções infantis ampliado seus horizontes, alimentando a fantasia, os sonhos e as sementes que fazem a vida ter um colorido muito, muito especial, com um livro nas mãos!

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Uma bênção para "encalhe"

Em alguns lugares mais simples, por onde passo, ainda ouço histórias de curandeiras, pessoas especiais da comunidade que, na ausência de médicos e enfermeiros, faziam as suas rezas e imposição das mãos para alcançar alguma cura.
Benziam de quebranto, mau olhado, dente doendo, encalhe etc. Numa conversa com o Hélio, Janete e dona Vanda fomos lembrando de diversas situações onde a mãe da dona Vanda fazia suas rezas e bênçãos. Todos lembravam de histórias contadas, como aqueles casos em que era necessário um pequeno paninho, agulha nova e linha nova, para "amarrar" problemas.
Um dos problemas sérios de então era quando a criança, por ingerir algum alimento de forma incorreta, sem a devida mastigação, "encalhava", trancava no aparelho digestivo. A oração era seguida de um forte tranco o que, na maior parte das vezes, resolvia o problema.
Brincando, acabei dizendo que deste encalhe eu não conhecia, mas que me faltou uma bênção de encalhe de outro tipo: aquele em que não se consegue casamento! No dito popular: "fiquei encalhado"!
Vou cobrar de minha mãe e saber se ainda há tempo para desencalhar. Confesso que não tenho muitas esperanças. Não vai haver quem me aguente, assim como não aguentaria uma outra pessoa dentro do meu espaço. Então, pelo certo ou pelo duvidoso, vou deixar a bênção de lado, a não ser que tenha um tipo de "porta fechada".