segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Referência de fé e religiosidade

Um dos temas recorrentes no mês de agosto que termina é o da "vocação". Especialmente para a vida da Igreja Católica (mas também de outros credos), sendo uma das maiores preocupações o número menor de sacerdotes e religiosos, com a diminuição do atendimento nos espaços sagrados, comunidades e às pessoas.
Em Canguçu, o padre Estêvão Echer disse que gostaria de ir ao Vaticano pedir ao papa Francisco para receber de volta padres afastados de suas funções - mas com presença na Igreja - que buscaram, especialmente, o matrimônio. Em muitos casos, homens de comprovado testemunho moral em condições de exercer o sacerdócio.
Mas falávamos, também, dos muitos diáconos casados, hoje, que já têm uma estrutura para receber a ordem do sacerdócio, necessitando, apenas, complementar a sua formação. E a esperança de que ainda sob o papa Francisco possamos ter mulheres recebendo o diaconato.

Vocações tardias se manifestam no sacerdócio e na vida religiosa. Mulheres que viveram toda uma vida de atividade social e profissional e que, passada esta etapa, sentem que podem complementar sua realização no serviço religioso. Mesmo caso de viúvas que já criaram uma família, mas ainda guardam muita energia para trabalhar.
O chamado vocacional é especial. Durante muito tempo concentram-se esforços em construir uma profissão. Depois, é tempo de buscar patrimônio, assim como uma família. Estabilizados financeiramente e com filhos e netos criados, em determinado momento, na crise da meia idade, vem a pergunta: para quê?
São muitos os homens e mulheres respondendo carinhosamente ao chamado de Deus. Figuras especiais porque não se importam que a sociedade os considere algo curioso, destoante, gastando "inutilmente" sua energia. São sinal de que uma sociedade saudável precisa de referências de fé e religiosidade.
Vou pedir ao padre Estêvão que, quando for ao Vaticano, permita que o acompanhe. Serei reforço para que se amplie o leque dos que têm este trabalho privilegiado de serem homens e mulheres de Deus. Afinal, vocação religiosa alça pessoas a dar resposta àquilo pelo qual o Mestre suspirou: "tenho compaixão deste povo!"
A compaixão inicia por se despir de vaidades e preconceitos. Num mundo carente de valores elementares, o religioso luta por ampliar horizontes. Consagra sua vida à esperança de fazer a existência de mais gente reencontrar sentido - a realização enquanto ser humano, mas também a busca pelo caminho que leva até Deus!

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Um olhar de fé, um porto seguro

Participei, em agosto, do Mutirão de Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Realizado em Joinville, Santa Catarina, teve momentos especiais. Um dele foi quando, no encerramento do evento, aconteceu a consagração dos comunicadores à Nossa Senhora Aparecida, a estimada Padroeira do Brasil, mas também das grávidas e recém-nascidos, rios e mares, do ouro, do mel e da beleza.
Quando se completam 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora da Conceição pelos pescadores há muito o que se aprender com a fé popular que irradia daquele centro de evangelização. O momento de oração iniciou com a retirada do manto e da coroa que tradicionalmente conhecemos. Despida, a imagem é de um corpo negro, de uma mulher grávida.
A pequena imagem foi descoberta, inicialmente, pelo corpo e só bem mais tarde pela cabeça. Dom Darci Nicioli, referencial de Comunicação da CNBB, fez a motivação dizendo que sempre se perguntou porque, ao encontrar um pedaço de imagem, o pescador não atirou de volta ao rio. Afinal, era apenas uma parte de uma estátua, sem valor algum.
Mas o pescador tinha um "olhar de fé ". O suficiente para aguardar e ser recompensado com a outra parte. Conta a história que ele a envolveu em sua camiseta de trabalho, primeira proteção daquela que se tornaria a Padroeira do Brasil. Uma cobertura para não ser esquecida, já que também da família do pescador viria o primeiro lugar sagrado onde seria venerada pelo povo, assim como seu primeiro manto trabalhado.


No mesmo evento, duas estandes era dedicadas à Aparecida. Uma delas à televisão, que já alcança o território nacional e busca fazer seu trabalho de evangelização. No outro, o Memorial, ainda em formação, mas já com mais de uma centena de imagens de cera, representando figuras que fizeram a história do Santuário, assim como de muitos que contribuíram para se tornar o que é hoje - uma referência de fé.
Este ano, muitos são os caminhos que levam à Aparecida. A motivação do encontro dizia que havia uma explicação para Nossa Senhora não ter seu filho no colo: "para receber em seus braços todos aqueles que dela necessitam."
A consagração terminou quando lhe restituíram o manto e a coroa. Elementos que o povo lhe deu como adereços, numa justa e singela homenagem. Mas fiquei com a impressão de que aquela imagem - desnuda - era mais significativa. Uma mulher negra e grávida, cheia de sonhos e preocupações: uma humanidade que, no ir e vir de seus problemas, volta os olhos para o lugar onde fica a mãe de todos, numa súplica por um abraço e um colo que se torne um porto seguro de fé.
(Foto: imagem de Nossa Senhora sem o manto e a coroa)

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Dunkirk: um caminho de volta para casa

Dunkirk é um filme pesado. Pesado e triste. Uma síntese se apresenta em duas frases emblemáticas - do comandante que organiza a evacuação: “muitas vezes a distância para casa acaba sendo muito longa”. E do garoto que faz de tudo para sobreviver e quando fica estendido no tombadilho de uma embarcação de turismo que o resgatou apenas murmura: “me levem para casa!”....
Mais de 300 mil homens foram encurralados no norte da França e seus comandantes sabiam que pela lógica macabra da guerra poderiam ser sacrificados pois ainda não acontecera a tentativa de invasão à Inglaterra. Os recursos da marinha e aeronáutica seriam reservados para a proteção da ilha. Homens jovens são transformados em massa de manobra, mas, se recuperados por embarcações civis, teriam aumentado o seu prazo de validade.
Olhar para os jovens que andavam pelo shopping na noite em que assisti o filme apertava o coração imaginando que no jogo pelo poder econômico e político estariam nas frentes de batalha, muitas vezes até pensando na obrigação “moral” de defender uma causa. Mas ceifando ou aleijando o futuro de tal forma que suas chagas até hoje ainda não cicatrizaram.
Há um dito segundo o qual “o primeiro que morre numa guerra é a verdade”. Pode ser, mas na sequência morrem também os sonhos. Em determinado momento já não importa mais lutar, mas sobreviver. As feridas físicas têm impacto semelhante ao das marcas psicológicas. São terríveis para quem viveu os horrores dos bombardeios, mas também calam naqueles que recebem um corpo ferido, um corpo sem vida, ou ainda um corpo em que a vida perdeu o sentido.
Os meninos que se fazem de homens indo para a guerra são os mesmos que choram encolhidos pedindo para voltar para casa. Em ambos estão certos: acreditaram naqueles que lhes incutiram sonhos e razões de sobra para fazer uma guerra. Na prática, no entanto, acaba sendo uma escola de sobrevivência, onde não se premiam os mais capazes, mas o destino sorteia aqueles que vão viver.
A guerra é a violência exacerbada. Sacrificar jovens por pendências internacionais é o mesmo que aceitar a reclusão em casa porque perdemos o controle sobre a violência nas ruas. Nos dois casos, os jovens são sacrificados: na guerra correm atrás de um sonho que vira tortura. Nas ruas, atrofiam seu amadurecimento: em muitos casos querem apenas encurtar distâncias, o simples e elementar direito de voltar para casa.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

O entardecer de nossos dias

Envelhecer leva a ter mais paciência com os jovens... e com os mais velhos! Seguidamente, saudosistas elencam o que era bom no passado. O sinal mais evidente é acharem as músicas da sua mocidade as melhores. Juventude é, também, um estado de espírito e, sem contrariar o físico, presentificam-se velhos e bons tempos.
Tomar consciência que, exatamente por se viver hoje, com os avanços tecnológicos, é que se recupera material - musicais, por exemplo - das diferentes décadas. É, então, que apresento a sugestão para quem já se aposentou e busca ocupação: kit básico - um bom par de tênis e um tablet.
Não sei se esta é a receita ideal. É a minha receita. Leva em consideração que um dos maiores pecados da atualidade é o sedentarismo e, caminhando (o par de tênis) pratica-se exercícios e, ao mesmo tempo, faz-se uma higiene mental ao sair para a rua, em busca de ar e interação.
Hoje diminuiu a vida em família - embora se mantenha muitos parentes. Então, aprende-se que ficar sozinho não é, obrigatoriamente, sinônimo de solidão. O convívio não se dá da mesma forma. A interação é planejada pelas redes. O tablet mantém viva relações sociais e recolhe músicas, filmes, livros...
Claro, nas conversas tem sempre aquele que diz preferir o cheiro e a textura das páginas do livro impresso para um poema, uma crônica, uma boa história. Para estes lembro que ao Gutemberg inventar os tipos móveis saudosistas torceram o nariz porque ainda preferiam fazer suas leituras em pergaminho e papiro...
O importante quando se busca instrumentos que levem as pessoas a circularem pelas ruas, sindicatos, associações, igrejas, é que tenham consciência de que novos tempos geram novas formas de convivência. Um conhecido dizia: "não tenho medo de ficar sozinho, o que me assusta é a possibilidade de ser abandonado".
Não são somente as famílias que estão diminuindo. As relações também estão se diferenciando e, em muitos casos, aqueles que saem das casas dos pais não querem casar ou manter uma relação estável. Há uma reengenharia da convivência e, especialmente, do jeito como as pessoas estão encarando a si mesmas.
Envelhecer não precisa ser a certeza de dependência. Sem procurar culpados, é preferível ser feliz sozinho do que amargurar que toda a experiência de uma vida não ficou como bênção. Na "inutilidade" encontrar um porto seguro que, silenciosamente, alcance a mão e o coração para dar dignidade ao entardecer de nossos dias.

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Educação: as razões para viver

Quando se fala em educação, uma das imagens apresentadas diz que as crianças chegam faltando um instrumento: o manual técnico de montagem e uso. Seguindo o mesmo raciocínio, um palestrante brincava não ser este o problema, já que, como na vida real, dificilmente lemos os manuais antes de manusear um eletrônico e somente recorremos a ele quando temos problemas, muitas vezes causados por mau uso!
Lembrei da imagem ao participar de encontros com educadores. Num deles, a professora falava de atitudes das crianças sendo algumas toleradas e até incentivadas quando pequenas, mas recebiam a repressão dos pais depois de uma certa idade. Caso típico das danças eróticas em moda.
Uma avó contou o caso do neto que aprontava todas quando tinha "plateia" e, ficando apenas com os pais, mantinha-se calmo. Em ambos, parece-me que a preocupação da criança não é dar show, mas pedir a atenção. Em tempos difíceis de ter em torno pais, avós, tios... envolvidos, a criança apenas repete aquilo que chama para si a atenção do adulto - sem distinção de certo ou errado.
No encontro de escritores com professores na Academia Pelotense de Letras novamente foi apresentada questão semelhante, por outro ângulo: crianças tranquilas para brincar, desenhar, representar - enfim - serem crianças, ao chegar à pré-adolescência ficam inibidas de tudo que chame a atenção sobre elas.
Encontraram na produção de textos motivação para todas as idades. A literatura é um instrumento do qual a pedagogia pode - e deve - se valer. A criação de histórias - textos e ilustrações - sua leitura e representação, incendeia a imaginação de crianças e jovens, nas páginas do papel ou telas de computadores.
Os aspectos lúdicos, culturais e esportivos também ajudam professores na compreensão dos conteúdos diários. Tanto para homens e mulheres que escrevem - quanto para as demais áreas - é importante a humildade diante do conhecimento. Não "transmitimos ensinamentos", propiciamos instrumentos para que a criança e o jovem façam o seu próprio processo de descobertas e aprendizado.
Uma criança é um ser chegando ao mundo com o olhar encantado com o que vê, ouve, sente. O adulto perdeu este encantamento. Os professores que fazem esta nova cruzada - da mesma forma que Rubem Alves - têm razão: "sem a educação das sensibilidades, todas as habilidades são tolas e sem sentido". Porque "são as crianças, que, sem falar, nos ensinam as razões para viver". Simples assim. O problema continuam sendo os manuais...