domingo, 26 de setembro de 2010

Humanizar a saúde

A professora Maria Firmina emprestou-me o livro Tocar – O significado humano da Pele, onde se analisa um dos fundamentos da relação humana: o toque. Não apenas por seu significado físico, mas pelo simbolismo que representa. Foi do que me lembrei em duas ocasiões: na palestra de abertura das comemorações dos 10 anos do Curso de Fisioterapia da Universidade de Ijuí e quando tive chance e tempo de observar profissionais da saúde em ação.
Médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos da saúde, hoje, têm uma carga estressante de trabalho, pois, em muitos casos, cumprem dupla jornada para conseguir rendimento financeiro justo. Possivelmente, este seja um dos motivos pelos quais podem até serem burocratas da área - atendendo com civilidade e cortesia - mas falta o sentido humano do trato com o paciente.
Tivemos duas pessoas internadas e, embora toda a atenção, faltava a sensibilidade de não lhes negar a noção de tempo e manter as referências que têm no dia a dia. No caso de pessoas idosas, as referências são a casa, a cama, seus remédios, pessoas que precisam de seus cuidados ou pelas quais são cuidadas. Isolá-las desta realidade é um martírio que em nada auxilia na melhora.
Um ser humano, mesmo que esteja um “caquinho”, não é uma máquina. Não adianta apenas corrigir algum mau funcionamento, há uma cabeça envolvida que pode auxiliar ou atrapalhar este processo. Neste caso, mais do que fórmulas, é necessária a capacidade de tolerância para entender o ser humano que deseja voltar para casa.
Têm-se aprimorado - e muito - as técnicas para tratar diversas doenças, mas precisamos humanizar a saúde. A debilidade provocada pela idade não tem muitos remédios possíveis. Talvez seja aí, exatamente, o momento de compensar carências com um olhar desprendido do relógio, um toque carinhoso e sem pressa e um coração aberto para um olhar cansado, que não pede muito, a não ser o respeito por uma história de vida e seus sentimentos.

domingo, 19 de setembro de 2010

Em busca de um novo sol

Vivíamos o final da década de 70 - o período da ditadura militar chegava ao fim – quando surgiu, na paróquia católica Santa Teresinha, em Pelotas, um grupo de jovens: Em busca de um Novo Sol. Era o auge da Pastoral da Juventude das igrejas cristãs, propiciando aos jovens, além de um ambiente religioso, também um espaço social de convívio e de aprendizado.
Lembro deste tempo com muito carinho, pois tive muitas alegrias com aqueles que, agora, chegam à casa dos 50, mas que tiveram seu caráter moldado naquele período. Até agora, seguidamente sou chamado para conversar com jovens ou orientadores a respeito da necessidade de espaços de convívio onde se aprenda elementos básicos, como o respeito pelo outro, a capacidade de moldar um caráter e a relação com a subjetividade.
Hoje, a Pastoral da Juventude não enfrenta um bom momento. O que é pena, pois num momento em que o jovem encontra-se com tantas dificuldades de caráter pessoal, social e profissional, este tipo de convívio poderia dar um novo rumo para a sua vida. O que, repito, é o óbvio: um bom grupo de jovens tem que ser um espaço de vivência religiosa, mas também de aprendizado social e profissional.
O primeiro é tranqüilo, mas o segundo, como é que acontece¿ Depende muito da criatividade de quem orienta os trabalhos, mas algumas instituições têm buscado em oficinas profissionais um atrativo que possa tornar estes momentos prazerosos, mas também educativos, buscando em escolas técnicas, universidades, setores públicos de trabalho as informações tão necessárias para as coisas mais elementares: de como conseguir documentação adequada, até colocação no mercado de trabalho.
Algumas igrejas reconhecem que investem na formação de seus quadros e que dão prioridade para aqueles que, depois, lhe darão algum tipo de retorno. Não há nada de errado nesta opção, bem pelo contrário, jovens formados numa perspectiva de sociedade e de religiosidade são aqueles que encontram respostas para os tempos atuais e, com certeza, continuarão em busca de um novo sol.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Operação cara de pau

A prisão do governador do Amapá foi apenas a ponta do iceberg. O articulista Arnaldo Jabor teve um texto censurado pela Justiça, a pedido do presidente da República (ainda bem que se tem a Internet e muita gente tomou conhecimento – “A verdade está na cara, mas não se impõe”), onde desnudava o ventre do poder – em todos os níveis – mostrando a vergonha do que está sendo feito à esquerda e à direita, passando pelo centro, com recursos públicos. Em síntese: os projetos apresentados podem ser de governo, mas por trás está um projeto de poder, perpetuado de qualquer forma por grupos econômicos que têm, nos políticos, autênticos fantoches utilizados para disfarçar reais interesses.
Quando vemos o que nos apresenta a campanha eleitoral, é preciso rir, para não chorar. Nada, absolutamente nada de novo, está sendo apresentado. Praticamente todos os candidatos já ofereceram seus nomes e, em muitos casos, foram eleitos, com as plataformas que voltam a propor, mesmo não tendo cumprido promessas anteriores.
Então, como depositar um voto de confiança nestes candidatos? Os escândalos que eclodem nacionalmente ou no próprio estado mostram que os políticos ainda não se deram conta de que, eleitos, deixam projetos partidários e passam a trabalhar por projetos de estado. Consequentemente, não podem se amesquinhar achando explicável a receita federal e o governo do estado deixar vazar dados privados do cidadão, ou um banco público ter recursos desviados sem que se julgue e condene os infratores.
As explicações são dadas com tanta ênfase e com jeito de quem está sendo ofendido, que um incauto até pode ser enganado. É uma autêntica “operação cara de pau”, somente vencida pelo voto. Não temos alternativa e se o “ficha limpa” ainda é pouco, está na hora de nos livrarmos dos “bolsos sujos”. Não se engane com anúncios e estatísticas. Fique atento e, se não encontra no espectro político alguém que atenda a todos os quesitos, vote no “menos pior”. Pode ser a diferença entre mudar ou continuarmos patrocinando orgias com nossos minguados recursos.

domingo, 5 de setembro de 2010

O direito de viver a própria vida

Sexta-feira (03 de setembro), marcou a data em que o Mundo tomou conhecimento de que, durante a 2ª Guerra Mundial, o regime Nazista Alemão, utilizou pela primeira vez, em campos de concentração, a câmera de gás para matar seus supostos adversários: judeus, ciganos e homossexuais. Um dos maiores crimes cometidos contra a humanidade dizimou famílias inteiras e praticou experiências pseudamente científicas.
Este fato foi o motivo para que fosse escrito um belo livro: O Menino do Pijama Listado. Em síntese: um garoto é filho de um oficial alemão transferido para trabalhar num campo de concentração. Uma realidade nova, completamente diferente da Berlim, onde morava, tendo a casa junto a um imenso muro gradeado e coberto por rolos de arame farpado. Seu espírito de aventura leva-o a caminhar ao longo da cerca.
Um dia, surpreende-se porque, do outro lado, está também um menino, da sua idade – cerca de sete anos - com um “pijama listado” (roupa de prisioneiro). O relacionamento é desenvolvido a partir do que existe em cada um de seus mundos: o pequeno alemão que perdeu as regalias do convívio com outras crianças de seu povo e o pequeno judeu que, nos últimos anos, somente recorda da vida sem liberdade.
O judeu diz que seguidamente as pessoas lá de dentro saem para viajar e não voltam. O alemão diz que nunca viu ninguém sair de lá: com mala ou sem malas. O destino, vai mostrando o livro, eram as câmeras de gás. Não posso contar o desfecho que é, ao mesmo tempo, belo e profundamente triste, quando, para provar a sua amizade, o alemão veste a roupa de prisioneiro e entra no campo de concentração.
É triste que ainda hoje existam lutas pelo mesmo motivo: econômico, sacrificando vidas em frentes de guerra ou em campos e cidades que são devastadas por falsos princípios democráticos. Quando falarem que há guerras justas, não acredite: as guerras não são religiosas, étnicas ou sociais, são feitas por grupos que, no final das contas, ganham muito dinheiro. Pena é que elas deixam, no seu rastro, muitos sacrifícios: inclusive de crianças que não tiveram o direito de viver a própria vida.