sábado, 10 de dezembro de 2011

Os dois meninos


O último paroquiano já havia entrado na igreja e a comunidade cantava uma música natalina. O padre espiou a redondeza e viu apenas o Menino sentado no pequeno muro ao lado dos degraus. Não soube dizer, depois, porque o fez, mas foi até lá e sentou ao seu lado.
- O senhor está cansado?
Ficou desnorteado, porque esperava que ele fizesse a abordagem. Mas, olhou para o Menino e sentiu vontade de contar toda a sua vida e o momento de deserto espiritual que estava vivendo, suas dúvidas e angústias. A mãozinha aproximou-se e tocou a sua, um calidoscópio se formou em sua cabeça. Teve vontade de soltar todas as lágrimas, todos os soluços que estavam presos em sua garganta.
- Não precisa dizer nada, o senhor tem a graça de ter o Menino.
Surpreso, o padre perguntou:
- Que menino?
Olhar carinhoso para um adulto que desconhece seu próprio mundo:
- O que está na Manjedoura!
O padre sentia-se contrariado e flagrado em contradição, mas o Menino continuou:
- Eu tentei chegar perto do Menino que está naquela loja ali na frente, mas não me deixaram.
O padre sentiu que tinha caído a ficha. Um menino de rua lhe dava a mais brilhante lição de Teologia. Tomou a sua mão:
- Pois você vai sentar ao lado do Menino!
Levantou-se e teve que puxá-lo para que entrasse, meio assustado, na igreja.
A música continuava, enquanto as pessoas se voltavam, entre aturdidos e escandalizadas. Chegou ao altar, onde estava montado o Presépio.
- Vá até o Menino, Ele é todo seu!
Olhos de encantamento, sentimento de felicidade plena. Foi chegando devagar e fez um carinho na imagem. O padre olhava a cena e surpreendeu-se por reparar, pela primeira vez, que o Menino da Manjedoura sorria.
Naquele momento, os sinos bateram meia-noite. Como estava combinado, o coro começou a cantar o “Noite Feliz”. O Padre tomou o Menino no colo, chegou ao microfone e declarou, sentindo um frio no estômago:
- Hoje, este Menino fez Natal, mais que isto, fez Advento, me fez reviver o meu sacerdócio.
A irmã que estava no coro começou a aplaudir, lentamente. Em pouco tempo, todos aplaudiam, igualmente emocionados. Era tempo de comemorar o nascimento do Senhor.

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