sábado, 26 de maio de 2012

Uma alameda de acácias


Dos meus contos escondidos no baú de um livro com publicação restrita.
Era o início da Primavera. A marca certa de que as árvores estavam voltando a ter suas folhas, de que voltavam as flores, tempo em que os pássaros começavam a cantar, mesmo antes do nascer do sol.
Mas, o que mais marcava para o Mestre, na chegada da estação das flores, era o cheiro que exalava de uma árvore simples e considerada de pouca resistência: a Acácia.
Deixou o Mosteiro e seguiu por uma trilha que o levaria até o alto do monte. Era o seu lugar preferido para ver o sol nascer. Mas também era o único caminho que formava uma alameda de acácias. O suave perfume, misturado com a musicalidade das abelhas que madrugavam para não serem atingidas pelo sol mais forte, tinham o dom de relaxá-lo, deixar seu espírito aberto e disponível para o que pudesse acontecer durante o dia.
  Mal havia sentado, quando ouviu passos que vinham pelo mesmo caminho que percorrera. O Aprendiz. Pensou em mostrar-se zangado, mas não conseguia.
- O senhor vai ficar brabo comigo, se eu ficar aqui?
Não podia mentir.
- Até pensei que sim, mas não vou, não. Mas como me encontrou?
- Segui-lo é relativamente fácil, Mestre.
  Também tinha o seu ataque de petulância, àquela hora da manhã, o pequeno Aprendiz.
- Então, explique-me.
- Acontece que existem duas formas do senhor iniciar seu dia.
  Aguardou uma explicação que não veio. Suspirou fundo e teve que perguntar:
- Então?
- Ah, sim. Quando o senhor vai direto para as preces, tudo é feito às pressas. Ouço-o saindo de sua cela, batendo tudo. É certeza de que o dia também vai passar assim.
- E a outra forma?
- É quando o senhor vem aqui. Sempre agradeço ao Eterno Descanso quando vejo que sai furtivo e se encaminha para o monte. O dia, então, será sereno, tranquilo, a sua energia é contagiosa e faz com que tudo se torne mais fácil.
  Estavam começando a surgir os primeiros raios de sol. Todas as coisas já haviam recuperado suas formas e o azul começava a ser preenchido por esgares do suave vermelho da manhã.
  Mais do que se tornar previsível, estava precisando deste alimento para continuar com o trabalho do Mosteiro.
- E eu vou ajudá-lo, Mestre.
  Já não se assombrava sabendo que ele lia seus pensamentos. Afagou-lhe a cabeça, com o cabelo encaracolado e rebelde a fazerem moldura para aqueles olhos que retribuíam seu carinho com amor, muito amor. O amor de quem também precisava compartilhar do sol nascer, do perfume das acácias e de cada momento de sua vida. Foi então que lhe veio à memória a ocasião em que conhecera o tamanho do mar.

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