domingo, 6 de maio de 2012

Os ruídos da noite


Da série de já publicados, já com saudades da Primavera.
Os primeiros raios de sol foram precedidos pelo cantar dos pássaros que procuram alimento no arvoredo. Marca certeira de que a estação do frio está chegando ao fim, já que se depositam os primeiros brotos nas árvores que, até então, estavam desnudas.
Os ruídos da madrugada sempre se transformam num ritual que prepara a chegada do dia.
A vida chega quando se percebe o ruído das primeiras bicicletas com operários que vão para o trabalho; as primeiras charretes que transportam feiristas, os primeiros estudantes buliçosos comentando o que passaram no dia anterior; o primeiro guincho do ônibus que para e recolhe os passageiros.
Gosto muito do frio do inverno, com seu aconchego e aquele manto encobrindo a cidade, aproximando as pessoas. Mas fico ouvindo, durante a noite, e sinto falta daqueles sons de pequenos animais que grasnam próximo da sanga, ou que circulam em meio ao espaço verde que ainda sobrevive frente à minha casa.
Quando acordo, em meio à noite, os ruídos que vêm da natureza presente em volta dão o ritmo da vida que me faz voltar a dormir. Com a certeza tranquila de que tudo está bem.
Não são simples ruídos – que não passam de barulhos, mas sinais de vida que, ausentes, deixam a sensação de que estamos absolutamente incompletos.
Não há como viver sem algumas coisas que nos parecem óbvias, mas que, na sua falta, vão nos deixando com a impressão de que as perdas se tornam irreparáveis e encaminhadoras do fim. E não são somente os ruídos da noite: de igual forma o primeiro ar fresco da manhã, quando abrimos a janela; o sol que nos faz cerrar os olhos, mas que afaga o rosto; o sereno que se deposita por sobre as plantas, o abanar espontâneo de quem acordou e levantou mais cedo.
A vida, em todos os sentidos, dos seres que nos cercam e que, muitas vezes, dos quais somente ouvimos o som de calçados no asfalto da rua. Mas que dão a sensação de que alguém está por perto, dando segurança de que podemos voltar ao nosso sono, envoltos na noite e em seus sons. Admiravelmente silenciosos.

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