segunda-feira, 26 de março de 2012

Ramos: o discurso do silêncio


Na proximidade da Semana Santa, sempre me fascina o fato de que Jesus, ao entrar em Jerusalém, produz um dos maiores contrapontos da História: entra montado num jumento, com uma coroa feita de ramos de árvore, tendo como chão os mantos de seus seguidores e admiradores.
Numa cidade dominada pelos romanos, é como se apontasse o dedo e dissesse: “vocês dominam pela força e pelo poder, eu vos ofereço a minha vida!” Para quem não lembra, os dominadores eram especialistas em cavalos, que transformaram em máquinas de guerra, vestindo-se de roupas faustosas (especialmente no uso do vermelho), usando muito metal, e seus administradores usavam e abusavam do ouro e de pedrarias de grande valor.
O Nazareno fez um dos maiores de seus discursos sem usar uma palavra: chateado porque os judeus não queriam ouvi-los e já planejavam a sua morte, marcou com um sinal a triunfante entrada na capital política e religiosa, sem que se tenha informação que houvesse, ao final, feito qualquer manifestação pública àqueles que estavam na cidade, vindos de muitas partes do Mundo conhecido de então.
As comparações são inevitáveis: o Filho de Deus anda num jumento, simples, às vezes teimoso, enquanto os dominadores cavalgam em imponentes corcéis; Jesus usa uma coroa capaz de se decompor em pouco tempo, enquanto aqueles que tramavam sua morte usam pedras preciosas; O Filho da Luz tem entre seus seguidores homens simples, na maior parte sem instrução formal, mas que estão transbordantes em espírito, enquanto romanos e a casta dominante de seu país tramam nos bastidores e se asfixiam no medo de um Messias que pode fazê-los perder o único “bem” religioso e político que conhecem: o poder.
Jesus já não mais falará às multidões. Seu último discurso será para seus mais íntimos na Quinta Feira Santa. Embora os sinais que se dão naqueles três últimos dias sejam muito fortes, fica sempre aquela referência, ao mesmo tempo jocosa e irônica: até o último momento, Deus não quer os sinais exteriores que demonstram a fé, mas, sim, a conversão de espírito. Aqueles que, em qualquer momento, não têm receio de parecer ridículo montando um burrinho, usando uma coroa de folhas, acompanhado dos mais simples, mas mirando a nova Jerusalém: na paz de quem, na Páscoa, passa pela morte e consagra a ressurreição.

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