O Aprendiz chegou à porta da sala do Mestre e não entrou. Tinha uma mochila nas costas e se mostrava decidido.
- Eu vou
embora!
O Mestre
brincou:
- Eu
também. Posso ir junto?
Mas o
menino já tinha se afastado em direção ao portão do Mosteiro. Só então, o
Mestre percebeu que a coisa era séria. O pequeno tomou a estrada em direção à
vila, no sopé da montanha, utilizada apenas pelos monges, aprendizes, assim
como os moradores das proximidades. Todos eram conhecidos, familiarizados com o
Aprendiz fujão.
A estrada
era irregular, estreita, passando pessoas, mulas e algumas poucas carroças.
Descuidado, o Aprendiz não se deu conta de um buraco e, quando percebeu, ainda tentou
se equilibrar, mas foi ao chão. Era muito azar. Agora estava brabo, cansado e
ainda sujo. Tentou levantar e não conseguiu. Havia torcido o pé. Arrastou-se
até a sombra de uma árvore. Muitos dos que passavam lhe ofereciam ajuda. Não
queria, não precisava...
Era quase
o fim da Primavera. Um vento quente soprava. Lembrou do Mestre dizendo que eram
os ventos dos espíritos da intriga. Dificilmente, nesta época, não haviam
desavenças. Tentou lembrar do que o irritara tanto. Eram coisas tão pequenas
que já começava a sentir vergonha. Mas não tinha o que fazer. Iria descansar e
arrastar-se até a vila...
No final
da tarde, o Mestre teve a notícia de que viram o pequeno pisado na beira da
estrada. Sem muita pressa, deixou o Mosteiro e, pouco antes do povoado, avistou
o menino. Não era a melhor hora para dizer alguma coisa. Preferiu oferecer seu
colo para trazê-lo de volta. Embora já estivesse crescendo, ainda era muito
magro. Em pouco tempo, chegariam em casa.
O pé
precisou ser enfaixado. Só que, agora, ao invés de emburrado, o Aprendiz estava
encabulado. Seus colegas não sabiam o que fazer e o Mestre acreditava que era
bom dar um tempo. Depois de dois dias, convidou para jantar no refeitório.
Quieto
chegou e quieto ficou. Durante a refeição, um a um deram um jeito de ajudá-lo
no que precisava. Faziam parte daqueles com quem havia se desentendido.
Depois de
um tempo, o Aprendiz apenas baixou a cabeça. Tinha medo de chorar. Olhava para
sua tigela onde o arroz chegava a um pouco mais do que a metade. Mas não tinha
fome.
Foi
quando o Mestre usou o hashi para depositar o primeiro bolinho em seu prato. Na
sequência, um a um, os demais companheiros de mesa foram colocando pedaços de
comida, num gesto de carinho que não esperava. E que o desarmaram!
As
lágrimas foram rolando devagarzinho. Quando levantou os olhos, o Mestre estava
junto dele e se aconchegou ao abraço que lhe era oferecido.
Enquanto
o burburinho de crianças e jovens voltava ao normal, o Aprendiz deu-se conta de
que o Mosteiro era a sua casa. Ali, não precisava ter medo do que lhe poderia
acontecer. Seria o seu lugar de partida e para onde sempre poderia voltar.
Ainda doía ter que reconhecer, mas seu erro era uma das etapa do seu
aprendizado. O certo é que Mosteiro era mais do que a sua casa, era o seu lar.
De longe,
o Mestre observava o pequeno com a perna estendida ao lado da mesa sendo
paparicado pelos demais. Por quanto tempo ainda estariam por ali? Um dia, cada
um deles faria mais do que pegar sua mochila e fugir para a vila. Iriam além,
se arriscando no Mundo. A vida que continua... Pássaros que saem do ninho e
voam pela primeira vez, certos de que o horizonte é apenas o começo do que se
chama futuro!
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