terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Educação: um outro tipo de preconceito

Uma das muitas dívidas sociais que já aparecem e que vão se acirrar quando (e se…) a pandemia passar se refere à educação. Os dois últimos anos não são a causa dos nossos muitos problemas nesta área, mas acirraram as deficiências, especialmente, na atividade pública. A escola, como lugar privilegiado para o ensino e referência social, cultural e das relações humanas, foi dos primeiros ambientes a serem abandonados à própria sorte. O futuro dos pequenos cidadãos – crianças e jovens - entrou na fila onde se privilegiam espetáculos futebolísticos e campanhas eleitorais, por exemplo.

Há muito tempo, educadores reivindicam a transformação destes espaços em lugares onde as aulas convencionais sejam parte de um todo, olhando para as necessidades básicas das crianças, desde a sua alimentação e higiene, primeiros valores, até o acesso a esporte e cultura. Uma forma de preservar a integridade daqueles que, em muitos casos, ficam sob o olhar atento de um diretor, um professor, um funcionário, podendo impedir casos de agressão ou, como se deu recentemente, de que, na ausência das aulas, a permanência em casa levasse alguns ao espancamento e à morte.

Igreja Católica lança a Campanha da Fraternidade, abordando o tema da Educação. Com o lema “Fala com sabedoria, ensina com amor”. Vive, também, o tempo da Quaresma e a mobilização sinodal. Tenho dúvidas se a instituição tem “pernas” para enfrentar três frentes diversificadas e necessitadas de tanta atenção, não apenas em discussões acadêmicas, mas prática pastoral de inserção nos meios mais carentes. Educar para a fraternidade e o bem comum responsabiliza a todos pelo processo de evangelização e é desafio que precisa de quadros que a Igreja não tem.

Num tempo de tantas carências, é difícil fazer com que crianças e jovens vejam sentido no processo educacional se não encontrarem educadores que os ajudem a vislumbrar caminhos. Uma linguagem inadequada, assim como espaços e professores despreparados não é propriamente um elemento motivador para que vejam na escola um lugar onde delinear seu futuro. Infelizmente, a rua se transformou em lugar de maior atrativo, respondendo mais às suas perspectivas de vida. A pandemia apenas aguçou o fosso existente entre as classes sociais e o seu acesso aos bens elementares.

A Igreja Católica também tem problemas nesta área. O processo de catequese está longe de auxiliar no discernimento, por exemplo, do que se celebra em torno da “mesa da Eucaristia” (o ágape), quando as crianças, muitas vezes, nem sabe o que é isto, em suas casas; não está acostumada a compartilhar, porque não tem espaços de interação social (o lúdico); não sabe cuidar da casa comum, porque não tem acesso a um cantinho de jardim ou horta onde se encante com a vida que surge da terra. Vê histórias de solidariedade nos livros que não encontram eco na vida real...

Muito se falou de que a educação é o espaço de oportunidades para todos. Infelizmente, também neste caso, há privilégios e preconceitos. A pandemia pode ser o tempo oportuno para repensar a educação formal e a que deve ser feita na família, igrejas, sindicatos, associações. Triste, mas, em muitos casos, a luta pela sobrevivência minou o direito a uma perspectiva de vida. Valores básicos, como a liberdade, perde-se na vala onde, na volta às atividades presenciais, centenas de alunos estão longe dos bancos escolares, porque necessitam auxiliar os pais a buscar o sustento da própria casa…

Um comentário:

daviddutkievicz disse...

"A pandemia apenas aguçou o fosso existente entre as classes sociais e o seu acesso aos bens elementares". De fato, é bem perceptível que os ricos ficaram mais ricos e os pobres, mais pobres. A anos não via pessoas batendo de porta em porta pedindo comida. Assim como pedintes em semáforos, portas de mercados, etc.

Na educação ficou gritante.. .famílias estruturadas com notebooks e tablets para as crianças acompanharem as atividades remotas, enquanto outras não tinham sequer sinal de internet em casa, quanto mais dispositivos para acompanhar as aulas.

Tempos complicados.

Texto de uma reflexão tremenda. Dias sempre melhores quanto tem artigo novo publicado. ;)