domingo, 25 de setembro de 2022

Um radinho da saudade

Ganhei meu primeiro radinho de pilha quando completei 15 anos. Fico imaginando o sacrifício que meus pais fizeram para comprar. Ainda era uma raridade, no ano de 1970. Os dois trabalhavam no armazém da família e mantinham quatro filhos. Meus irmãos eram dependentes, da mesma forma que eu, que estudava em internato. Em tempos em que assistir televisão era raro, o presente era pelo aniversário, assim como para escutar os jogos da seleção brasileira que, naquele ano, ganhou a copa do Mundo, no México.

Passou a ser meu companheiro inseparável, nos horários permitidos. Além do futebol - por transmissões, noticiários e comentários - se acompanhava programas de humor, por emissoras do Rio e de São Paulo, que, à noite, aumentavam sua potência para barrar a entrada das emissoras do Uruguai e da Argentina. Com alguma sorte, pegávamos emissoras internacionais, como foi o caso do Festival de San Remo, na Itália, em que se apresentou o Roberto Carlos quando se ouvia uma parte e em outras “fugia”.

Companheiro em noites e fins de semana, assim como, depois, ao pé do ouvido (naquele tempo não se utilizavam fones) quando fazia cursos em Porto Alegre e seguidamente estava no Beira Rio, para torcer pelo Internacional, o meu Colorado. Grandes vozes que surgiram na rádio Guaíba e migraram para a Gaúcha, literalmente, ecoando nos campos de futebol. Não era suficiente testemunhar, era preciso a empolgação dos narradores que tornavam o lance mais simples como se fosse uma disputa de final de campeonato.

O padre Olavo Gasperin era um dos responsáveis pela nossa formação. Todos os anos, organizava gincana com atividades físicas e artísticas. Nas físicas, eu ia mal... mas nas artísticas tirava a diferença. Numa disputa, colocou como prêmio um radinho maior, que já pegava ondas curtas, as que permitiam ouvir emissoras mais distantes. Suei para não ficar mal nas atividades físicas e me esmerei na apresentação de uma música italiana – “Guitarra sona piú piano” – levando o rádio e um passeio em Porto Alegre. Foi a glória!

Nem é preciso dizer que um deles – Olavo ou o padre Guerino – tinham que passar pelo dormitório e ameaçar confiscar o rádio se não fôssemos dormir. Eram tempos do governo militar (década de 70) e, embora sem consciência política, se procurava por emissoras como a BBC, Voz da América e uma russa que transmitiam em português, pela curiosidade e o encanto de ouvir outras vozes, de outros cantos do mundo, sem nos darmos conta de que eram os primeiros passos para a comunicação que se tem hoje.

Enquanto trabalho, um rádio retrô me acompanha. De antigo, tem a aparência, pois funciona por bluetooth. Seleciono emissoras do Mundo, porém prefiro as nacionais, como a Saudade FM (de Santos/SP) e a Studio Web Rádio (de Ribeirão Preto/SP). Utilizo o streaming para ouvir orquestras, música italiana, francesa, romântica antiga ou gospel internacional... Bebi de boas fontes e a inspiração vem de lugares especiais. Não é à toa que a Web Rádio brinca com seus ouvintes: “Em sintonia com o seu bom gosto!”

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