quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Um sínodo para dar voz e vez ao leigo

Beirando os 85 anos, o papa Francisco não parece disposto a aceitar o que muitos já anunciam como o ocaso do seu pontificado. Depois da cirurgia em que analistas afirmavam ser o “começo do seu fim”, retomou as sandálias do pescador Pedro e voltou a andar pelo Mundo. Até quarta da semana passada, esteve na Hungria e Eslováquia, onde bateu de frente com a intransigência de setores da população, incentivando a acolhida dos imigrantes e defendendo que “a diversidade sempre causa um pouco de medo, pois coloca em risco a segurança adquirida e frustra a estabilidade alcançada”.

Já disse que não me importo que trabalhe até os 90, 95 ou 100 anos! É um caso extraordinário em que “os mais novos” tem o direito de explorar um idoso! Pois o papa ancião surpreendeu novamente: um assunto que se conversava ao pé do ouvido recebeu selo oficial e caiu na boca do Mundo: a Igreja Católica, Apostólica e Romana prepara um Sínodo dos Bispos, em 2023. Durante dois anos, faz uma etapa diocesana, outra continental e, por fim, a conclusiva, como igreja universal. Com uma diferença: a convocação para que haja um amplo envolvimento dos leigos.

É bom ficar atento porque, entre 9 e 10 de outubro começa a ser discutida a “sinodalidade”, como disse o analista Carlo Di Cicco: “uma forma de sair da pandemia tentando ser melhor do que antes”. Por definição, seria um jeito de caminhar juntos. Só que, até agora, o “juntos” significava os bispos, sem a presença, em alguma das etapas, dos leigos. A grande mudança de Francisco é o desafio para que também o povo de Deus tenha vez e voz, não apenas como especialistas, mas nas assembleias que começam a se formar ao redor do Mundo. E que pode definir novos caminhos para a Igreja.

Na sua recente viagem, desafiou a se sair da crise, melhores: A fé não pode ser reduzida a um açúcar que adoça a vida. Jesus é sinal de contradição. Veio para trazer a luz onde há trevas, pondo as trevas a descoberto e forçando-as a renderem-se. Por isso, as trevas lutam sempre contra Ele. Quem acolhe Cristo e se abre para Ele, ressuscita; quem o rejeita, encerra-se na escuridão e arruína-se a si mesmo”. Muito forte para um argentino ancião que, como João XXIII, ao convocar o Concílio Vaticano II, estava pronto para pendurar as chuteiras. Mas Deus tinha outros planos…

Passados quase 60 anos, o encontro que propiciou mudanças na Igreja Católica precisa se consolidar. O sonho de João XXIII viu em Paulo VI um “carregador de piano” que abriu as portas do Vaticano e começou a oxigenar as estruturas. O desafio de Francisco é grande para concretizar o “caminhando juntos”, o espírito da sinodalidade. Por falta de preparo e de espaços numa estrutura centralizadora – “padricêntrica” e “bispocêntrica” - também por uma cultura de dependência, precisa mais do que “documentos” para transformar a participação em efetiva realidade.

Especialmente para os leigos, que não podem perder a oportunidade. Documentos estão na internet e, a partir do próximo mês, estruturas paroquiais e diocesanas se movimentam para dar a sua contribuição. Historicamente, a parcela da Igreja que reclama não ter vez e voz, embora aumente a participação em atividades secundárias. A formação e a informação são necessárias para uma nova e concreta mentalidade, pois Francisco propõe: “um à escuta do outro; e todos à escuta do Espírito Santo”. Quem sabe, desta vez, destranca e se concretiza o que ele sonha: “uma igreja em saída!”

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