terça-feira, 11 de maio de 2021

As migalhas que caem da mesa...

O governo federal está antecipando, pela segunda vez, o pagamento do 13º salário de aposentados e pensionistas, para ajudar na recuperação da economia do país. O que pode parecer uma boa notícia - no final deste mês de maio - tem tudo para se transformar em problema ao cabo do ano, quando contas acumuladas vão exigir alguma solução que, ao menos, no ano passado, a administração pública não encontrou. A falta de uma cultura financeira - que ajude no planejamento dos gastos, fez com que muitos julgassem que era um recurso extra e que poderia ser gasto sem preocupações.

Também a partir da virada do mês, os aposentados que declaram Imposto de Renda (vou cansar de dizer que é imposto sobre salário e não sobre renda) com mais de 60 anos terão direito à restituição, quase sempre de parcela pequena daquilo que o leão da receita abocanhou. Para quem consegue ainda organizar, nem que seja minimamente as suas contas, são reais contados que reforçam o caixa e dão uma folga no dia a dia. Sendo guardados, quando possível, para situações especiais.

Das chamadas “notícias boas”, algumas nem sempre se confirmam. O caso da diferença no cálculo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, para quem trabalhou de 1999 até 2013. Muita gente esfregou as mãos sentindo pingar alguns reais, porém o Supremo Tribunal Federal tirou de pauta a ação que seria julgada no dia 13 de maio. Literalmente, “quando o milagre é grande, até o santo se assusta!” E quem já espera há quase dez anos vai voltar pra poltrona do vovô e se acomodar.

Aposentados e pensionistas são dos mais prejudicados porque sabem que a derrocada econômica (que não veio com o coronavírus, mas se acentuou com ele) penaliza quem tem os menores salários. Veja-se o exemplo de comentaristas de economia que mostram suas tabelas sem se aproximar de uma gôndola de supermercado, onde a inflação dos supostos técnicos não tem absolutamente nada a ver com aquela que se verifica no dia a dia, especialmente, nos gêneros de primeira necessidade.

A gangorra das notícias desencontradas cria muita confusão. Não basta o idoso fazer a previsão dos próprios gastos, pois transformou-se em arrimo financeiro de família. Assiste a filhos e netos perderem empregos ou ter vencimentos reduzidos, levando a pedir socorro a quem ainda tem os parcos recurso de uma aposentadoria ou pensão. Em algumas situações, o casal ganha dois salários mínimos e precisa manter quatro ou mais pessoas, com moradia, vestuário e alimentação.

O auxílio emergencial, em 2020, injetou um pouco de ânimo na economia. O início de 2021, sem o auxílio, mostrou o lado macabro da insensibilidade de políticos que controlam a máquina pública. Sem abrir mão de altos salários, deixaram por meses pessoas passarem fome e, agora, distribuem esmolas... Para distrair, atritam facções ideológicas que polarizam confronto do qual a maior parte da população não participa. Enquanto a caravana passa, em todo o seu esplendor, precisa continuar sobrevivendo, nem que seja recolhendo migalhas que caem das mesas dos seus senhores…

domingo, 9 de maio de 2021

O ser mais chato que Deus já criou…

Os tempos são outros, mas aqueles que são um pouco mais velhos (ou mais experientes, como alguns preferem) lembram, hoje, de momentos vividos na relação com as mães, estando presentes ou fazendo parte da galeria da saudade. Especialmente, momentos da infância e da juventude, em que se compartilhava o convívio com pais, irmãos, amigos e vizinhos, dando a impressão de que o tempo não passaria e que seriam eternos… O futuro não era motivo de preocupação e se tinha a vaga ideia de que, exatamente, para garantir um futuro é que pai e mãe faziam tantos sacrifícios.

Numa ocasião, véspera do dia das Mães, fiz meu comentário pela TV UCPel. Disse acreditar que Deus não havia criado ser mais chato do que uma mãe… as muitas cobranças por cuidar do quarto, das roupas, da casa, obter resultados na escola, manter-se num emprego, comportar-se nos namoros… Aquele ser que atazanava as poucas liberdades que se ia conquistando. Um dia se saiu de casa para estudar mais longe ou trabalhar (a maior parte da turma que preparava o noticiário vinha de outras cidades) e sentiu-se a falta dolorida que a família, e especialmente a mãe, fazia.

As lágrimas foram rolando desajeitadas e, confesso, vendo seus jovens rostos pelo vidro da sala de controle, tive que conter as minhas. Vai ficando na memória as imagens que, um dia, pensamos esquecer e não nos fariam falta. Engano, o jeito de chegar em casa, passar pelo portão e encontrá-la trocando uma planta de lugar, sentindo o cheiro do café passado e a certeza de que a mesa estava posta porque se passou longo tempo longe de casa. Jovenzinhos, muitas vezes se ficava encabulado com os arroubos de carinho, em que nossas mãos ficavam presas numa teia de amor.

Alguns, depois, contaram-me detalhes das suas histórias. Com muitas e sentidas semelhanças. Ainda criança, o mesmo e costumeiro caminho de retorno para casa depois da escola, antevendo o cheiro da comida; muitas vezes, o aroma do pão recém-assado; seu jeito de enxugar as mãos no avental, de arrumar o cabelo, de um olhar avaliativo antes de nos prender num abraço… Muito antes do coronavírus, já mandava que fôssemos lavar as mãos, que não se passasse as mãos sujas nos olhos, que trocasse a roupa, embora o uniforme já voltasse em petição de miséria.

Hoje, a culinária atende as necessidades do dia a dia, com pouco espaço para a criatividade e o carinho. Em outros tempos (não vou dizer “priscas eras” porque a Guega Campos diz que eu confesso a minha idade), datas festivas tinham um quesito especial: os pratos feitos pelas mães. Iguarias como as sobremesas eram preparadas de véspera e os pratos salgados, especialmente as carnes, entravam nas panelas bem cedo. Como resultado, chegar em casa, nos domingos pela manhã, tinha jeito de festival de aromas mostrando o esmero das mães e irmãs mais velhas.

Esperas, orações por filhos e filhas que ganharam o mundo, lágrimas por incertezas e preocupações com notícias que ouviam do que se passava em centros urbanos, distantes do interior e das periferias de onde alçamos voos. Também as alegrias, com os empregos, as formaturas, os netos… Para onde se foi, por onde se andou, se levou um legado de carinho, que somente poderia ter vindo do ser mais “chato” que Deus já criou e carregou de sentido na primeira palavra que se balbucia e acompanha pelo resto da vida: mãe, sempre mãe, eternamente, mãe!

terça-feira, 4 de maio de 2021

As boas notícias e a pobreza de perspectivas

O Jornal Nacional do último sábado abriu com matéria que tinha como fonte o grupo de pesquisa da Universidade Federal de Pelotas, que trata da pandemia. Em meio a tantos números negativos, surge um vislumbre de esperança: depois de iniciada a imunização, na faixa etária acima de 80 anos, diminuiu sensivelmente o número de mortes. Some-se a um outro dado levantado pelos cientistas de que o uso de máscaras reduz em mais de 80% a possibilidade de contágio e se tem a possibilidade de, apesar das trapalhadas dos administradores públicos, acreditar que existe luz no fim do túnel.

A notícia é boa. Não o suficiente para pensar que aqui é um “novo Israel”, onde o isolamento, negociações iniciadas cedo para compra de vacinas e aplicação em massa fizeram as imagens de festas e rostos despidos deste acessório, do qual gostaríamos de abrir mão. Infelizmente, o bater de cabeças, informações desencontradas, petulância e incapacidade dos gestores nos colocaram atrasados na fila do mercado internacional de imunizantes, assim como maus exemplos…

Os números são apresentados como se fosse a disputa por um pódio. Somente se for uma corrida de tartarugas. Em dois meses, contentar-se em que o Brasil chegou a vacinar 15% da sua população é muita pobreza... e nem consola saber que o Rio Grande do Sul está beirando os 20%. A repetição destas planilhas em programas de televisão, especialmente, entrou num processo de “naturalização”, tornando a maior parte da população indiferente, especialmente ao perigo ao qual está exposta.

“Naturalização” são valores que alguns meios de comunicação – em especial a televisão, através de suas novelas – entranham na população, sob o formato de pílulas bem-apresentadas, jogando no ostracismo instituições que ajudavam a formatar valores e referências. Também a programação do jornalismo se transforma em espaço de disputa numa guerra financeira, de vaidades e poder, com a população assistindo (literalmente) e pensando que dá a última palavra, mas alijada do processo…

Revista de circulação nacional destaca a benemerência de grupos empresariais e financeiros. Espelha-se nos Estados Unidos, onde a filantropia faz história, para dar a sua mensagem: fazem o papel de “sociedade”, que não deveria preocupar o estado. Como assim? O estado existe para suprir carências do cidadão. Em tempos de crise, com uma longa estrada pela frente e instituições que atendem a estas demandas tensionadas e cansadas, vai-se “privatizar” o atendimento social?

A sociedade real esgota sua capacidade. Mal comparando, é o mendigo que ganha marmita, encontra companheiro e reparte, socializando a miséria. Algumas notícias são boas, mas as perspectivas não. Depois da pandemia, é preciso um período maior para ajustar a vida social e a economia. Pela falta de lideranças efetivas, leva-se mais tempo, mas assim como há uma maioria silenciosa preocupante, há quem não desistiu e insiste em dar o máximo para ver a gratidão de quem recebe comida, a peça de roupa, o carinho – a certeza de que ainda não perdeu a dignidade humana!

domingo, 2 de maio de 2021

São José: aprendendo a fazer, se aprende a amar


O mês que os cristãos católicos consagram à Nossa Senhora (com uma das mais belas homenagens em 13 de maio, dedicada à Nossa Senhora de Fátima) inicia com uma das festas de São José, seu marido e pai adotivo de Jesus. Para algumas religiões cristãs, também é considerado o mês das noivas, de lembrar e acarinhar as mães, enfim, tempo de celebrar a família. Como li em algum lugar “um sonho e projeto de Deus”, por ser uma expectativa, algo que se coloca no horizonte com um forte desejo de que se realize e que povoa nosso imaginário com as mais ternas possibilidades.

Para que a Sagrada Família pudesse se concretizar foram necessários dois “sins”: o de Maria, quando disse “faça-se em mim segundo a Sua vontade!” e, talvez o mais difícil, de José que precisou assumir uma paternidade que não era sua. Se na cabeça de muitos homens, ainda hoje, assumir esta responsabilidade seria difícil, imagine naquele tempo em que as leis e normas de relacionamento eram mais rígidas. Os registros mostram que José tinha que pesar o que haveria de fazer, pois poderia marcar definitivamente a sua vida e, especialmente, a vida da jovem Maria.

As conversas com a esposa eram momentos em que se sentia tranquilizado e pronto para enfrentar tudo aquilo que os Anjos anunciavam e, sabia pelas Escrituras, passaria seu filho adotivo. Moravam numa aldeia e qualquer deslize poderia resultar em que tivesse seu nome desonrado e que a esposa pudesse, até, ser apedrejada. Além do mais, não era daquele lugar e sempre haviam desconfianças com aqueles que chegavam aos vilarejos e passavam a exercer uma atividade que lhe dava um certo destaque social. Encontrava sua tranquilidade no trabalho e nos momentos em que conseguia rezar.

A lembrança deste “sim” ficou em seu espírito por toda a vida. Aprendeu a amar a criança que começou a engatinhar a seus pés e procurar pedaços de madeira para brincar, enquanto trabalhava na carpintaria; que levavam a passear pelas redondezas de Nazaré e perguntava sobre pássaros, árvores, plantações, trabalhadores e suas famílias; o dia em que o apresentaram na Sinagoga e deveria se separar das mulheres, quando precisou convencer Maria de que o menino crescia e era o momento de lhe mostrar os caminhos de Javé, mesmo que, de longe, um não tirasse o olho do outro.

Parceiro e aprendiz nas lides de trabalho: a construção de mobílias que a comunidade utilizava em suas casas, cercas dos pequenos quintais e cangas que auxiliavam a orientar os bois nas lides das lavouras e das cargas. As viagens ao Líbano em busca de madeira da melhor qualidade, em especial o cedro. Quando tinha mais tempo para ensinar a se relacionar com outros viajantes e desfrutar de uma jornada privilegiada com um menino que aguçava a curiosidade para conhecer melhor a humanidade, ainda precisando aprender a conhecer a própria divindade…

“Santa morte!” Assim o povo chama o fim de quem assumiu de fato e de direito a criação do ser mais especial que já assumiu a forma de um homem. Faz o pedido para ter um desenlace abençoado, como foi o daquele que teve ao lado Jesus e Maria. Missão cumprida, testemunho dado: foi aprendendo a fazer, que também aprendeu a amar. Não há detalhes a respeito, mas, se, hoje, pais adotivos são chamados de pais de coração, deveria se fazer imagem do Sagrado Coração de José… Aquele que abriu o próprio peito - e a mente - para acarinhar, num menino, um sonho de Deus!



terça-feira, 27 de abril de 2021

Lobos e homens: a procissão dos desamparados…

Há duas versões para os que estudam as alcateias dos lobos: na primeira, os mais velhos e estropiados encerram as fileiras, quando se deslocam, tornando-se vítimas ao sofrerem ataques ou emboscadas. E um segundo grupo que afirma irem os mesmos à frente para ditar o ritmo com que se viaja, o que atende também às mães com filhotes e os próprios pequenos que cansam e sempre buscam uma forma de diversão pelo caminho. Das discussões em torno da vacinação contra o coronavírus, não há como não se pensar que paira um clima semelhante… com o primeiro grupo.

A pandemia não tem lógica. Mesmo com todos os alertas, depois de um ano em isolamento, não se tem como dizer o que se passa na cabeça das pessoas. As reações são imprevisíveis, como a do idoso que recebeu a primeira dose e acreditou que já podia se livrar da máscara e refazer contatos. Infectado, voltou para casa com sequelas neurológicas, sua esposa está internada e as filhas em tratamento. Uma delas disse: “descuidamos e vamos pagar pelo resto de nossas vidas”.

Na semana passada, muitos hospitais reclamaram que estavam ficando sem os kits de entubação. Material fundamental para uma das etapas mais difíceis do tratamento, com medicações para controlar a dor e causar o menor desconforto possível numa técnica invasiva, mas necessária. O diretor de uma das casas de saúde chegou a anunciar que teriam que fazer o procedimento sem a utilização de anestésicos, precisando conter o paciente à força, sendo, dos males, o menor.

O candidato a vereador e enfermeiro apresentava vídeos pelas redes sociais acusando dirigentes políticos de estarem omitindo dados com relação ao coronavírus. Divulgou informações falsas sobre o covid, dizendo que não iria se vacinar e defendendo a utilização de medicações que a ciência negou a eficácia. O Conselho de Enfermagem do Rio abriu processo contra ele. Não chegou a cassá-lo, foi traído pelo próprio vírus que não acreditava ser capaz de levá-lo à morte.

Afinal, o que tem a ver lobos, com a vida em família, problemas hospitalares e um destes arautos de discursos prontos? A falta de uma cultura de responsabilidade social. Numa e noutra situação, os lobos agem por instinto de sobrevivência. O que os deveria diferenciar do homem é exatamente a sua capacidade de criar cultura, especialmente em tempos de crise, buscando atravessar todas as tormentas não “no mesmo barco”, mas com as mesmas condições em que se diminuam as perdas...

Gostaria de poder argumentar que somos uma sociedade solidária. Também não se pode generalizar dizendo que a população é avessa aos cuidados mínimos necessários para controlar a pandemia. Tem-se um grupo que age assim, tornando difícil o controle, e um outro que ajuda na situação de pobreza em que muitos sobrevivem. No meio, a maioria silenciosa e, preocupantemente, indiferente. Que deixa pelo caminho os desassistidos sem se dar conta de que a fila anda e, um dia, se tornarão os idosos ou estropiados que podem encerrar a grande procissão dos desamparados…

domingo, 25 de abril de 2021

Com doçura, uma boneca e muito afeto…

A proximidade do dia das Mães tem uma carga afetiva muito forte. Comércio e serviços garantem que vai ser difícil, com as pessoas gastando bem menos do que em outros anos. E quem não tiver condições, vai procurar uma lembrancinha para mimar quem já nos deu tantos mimos. Creio, será o momento de encontrar alternativas: pequenos objetos, cartões e muito carinho e amassos! Como diz a mídia: propiciar um “dia de rainha”, tomando para si atividades que ela faz todos os dias e que se rotula como sendo “coisas de mãe!”, na verdade, a doméstica não remunerada do lar.

Os dias próximos a esta festividade, assim como o aniversário da mãe - dona França, 1º de junho – tornam mais sensível o jeito com que se vê propagandas, especialmente em vídeos, e matérias humano/afetivas. Uma emissora de televisão apresentou especial sobre idosos que residem em casa atendida pelo setor público. Alguns há muitos anos sem contato com filhos ou netos. A psicóloga da instituição desenvolveu uma campanha recolhendo e recuperando bonecas, depois trabalhou a acolhida, por parte das senhoras, dos “filhos” ou “netinhos”, conforme o imaginário de cada uma…

Os psicólogos podem explicar melhor, mas, pelo processo de transferência, encontraram sentido e reagiram ao estado comatoso em que se encontravam. Passaram a fazer tarefas que não faziam, esforçar-se com a alimentação, com a higiene, cuidar do próprio espaço no dormitório… enfim, a nova companhia provocou mais do que a previsão dos cuidadores poderia imaginar e tornou o ambiente mais feliz e interativo. Claro que sempre tem um senão… e o delas é que, para as raras visitas que apareciam, todas queriam apresentar e descrever o que as suas “crianças” haviam feito!

Foi parecido com o processo que tivemos com a mãe quando passou a ficar mais tempo na cama. Havia um anjinho que rezava o Pai Nosso e ficava sempre na sua cabeceira, com o qual fazia sua primeira e última oração do dia. Mais uma boneca que andava com ela nas suas internações. O primeiro a acompanhou na última viagem… a segunda está, ainda hoje, na minha sala de trabalho - um jeito carinhoso dela se manter presente na minha vida. Dos objetos que guardam lembranças, o pai também tinha os seus e, ao nos deixar, levou um boné das suas caminhadas e o relógio de bolso.

Nos últimos tempos, ficávamos mais sozinhos. Quando um dos meus sobrinhos tinha um filho, sempre trazia para que a “bisa” conhecesse o mais novo integrante da família. Em determinado momento, acabava no colo da mãe, quando seus olhos demonstravam a felicidade em ver a família se renovando e pendia a cabeça em direção à criança – num sentido encontro de gerações… Tinha medo de que fosse muito peso para os ossos já fragilizados, mas era difícil tirar aquele pedacinho de gente de seus braços, que a fazia tão feliz e, parecia, renovar o sentido de seus últimos dias…

Com doçura, uma boneca, e muito afeto ficam as lembranças de mães que já não estão conosco; a vontade de pedir colo para as que estão por aqui; reconhecer os sacrifícios das genitoras biológicas; as “mães” de coração, que nos adotaram entre parentes, na escola, na vizinhança. Na falta de quem deveria amparar idosos que já não têm a mesma energia e memória, a boneca - como objeto de afetividade - dá sentido ao embalo em que dormitam abraçadas. No ocaso da existência, a dureza da vida se mistura com os sonhos, tornando menos doloridas as lembranças e a própria saudade…

terça-feira, 20 de abril de 2021

A morte silenciosa das consciências

Gostava quando, em priscas eras, se diferenciava “história” de “estória”. A primeira, eram os fatos registrados, a segunda aquilo que a imaginação criava. Discussão parecida se faz com relação à educação e ensino. Defensores de mudanças no atual sistema buscam espaços para um pacto que refaça esta trajetória. Ciências sociais e humanas não são exatas, portanto, as definições se diferenciam, guardando elementos em comum. Em princípio, o ensino se preocupa com conteúdos formais, especialmente, em sala de aula; e a educação com a formação de valores morais e éticos.

Daniel Scola, jornalista do grupo RBS, viajava pelo Japão quando precisou andar de metrô. Outono, chegando o Inverno e o frio se intensificava. Quando as portas se abriram reparou que, tanto do lado de fora, como do lado de dentro, todos – e eu disse todos – usavam máscaras, em época em que não se falava em pandemia. O costume se deve à poluição, por saberem que o uso protege dos estados gripais, comuns neste tempo, também para os que viajam juntos.

O apresentador Rodrigo Ruas estava do lado de fora de um mercado público. Descreveram as belezas e a história do local e veio a recomendação: não toque em nada, não apalpe nada! O péssimo costume de apertar tudo o que se encontra – no mercado ou na feira, é claro – levou a que muitos dos lugares que se visita tenham receio do comportamento do turista brasileiro, que julga serem suas férias períodos de “liberdade”, não importando onde se está e os costumes locais.

Empresários e políticos quiseram “levar vantagem em tudo, certo?” (Lei de Gerson) e foram vítimas da própria esperteza… políticos furaram a fila, para si e familiares, e ficaram com a marca de que prometem mundos e fundos, porém acabam colocando, em primeiro lugar, seus interesses, com argumentos encenados, lembrando lágrimas de crocodilo... E empresários em Minas Gerais que contrataram uma enfermeira mais esperta que cobrou por carne de lebre e entregou carne de gato!

Mas, de todas as “deseducações”, a mais triste é de que parcela da população não transforma informação em conhecimento. Milhares de pessoas sabem que precisam da vacina, receberam a primeira dose e, por diversos motivos, julgam estar imunizadas. Prejuízo para si e para a sociedade. Uma das grandes conquistas da humanidade – a prevenção pela vacina – já teve altos e baixos, conforme os governos de plantão foram capazes de deflagrar campanhas educativas e motivadoras.

Uso da máscara; o fato de que é preciso “ver com os olhos e não com as mãos” (você ouviu isto da sua mãe); abandonar a esperteza; ajudar idosos a entender o que acontece, faz parte do processo de educação. A pandemia aumenta o fosso entre quem possui recursos para aprender e quem mergulha no abismo da indiferença. Tempo de crise pode resultar em pacto social. O papa Francisco diz que “a educação é geradora de esperança”. Em contraponto, a ignorância é a morte silenciosa das consciências. Estamos perdendo a guerra, ao não garantirmos um futuro para as novas gerações…