Não acompanhei noticiários no final de semana de 17 e 18 de agosto. Estava envolvido em atividades de preparação dos Ministros da Palavra e da Eucaristia da Igreja Católica, em Rio Grande, no sábado; assim como da Pastoral da Comunicação, em Pelotas, no domingo. Segunda pela manhã, quando comecei a ouvir os relatos, fiquei chocado com a tragédia: a morte da Emily, de dois dias, seus pais e o motorista do carro da Prefeitura de Cristal que os levaria de volta ao lar e aos braços dos seus três irmãos.
Num trechos não duplicado da BR 116 (o que é a maior parte), uma ultrapassagem mal sucedida e uma colisão frontal. Infelizmente, há muitos anos, pessoas perdem a vida nesta estrada e alimentam contabilidade macabra - cruza do descaso e incompetência das autoridades públicas com um sentimento de inferioridade da região - que vê, na sua concretização uma espécie de favor: migalhas que se concedem aos cidadãos, que pagam impostos de primeiro mundo e recebem serviços de quarto, quinto...
Quem viajou com uma criança pequena no carro sabe que o balanço e o ruido abafado do motor são elementos para que durma durante bom tempo. Maiores e mais atentas, passam a olhar tudo o que podem acompanhar pelas janelas. Não vai ser o caso da Emily... Pelo jeito, de família pobre, voltava ao anoitecer numa "carona" pública que foi a sua primeira e última viagem. Tornou-se mais uma mártir da BR 116!
Fatalidades sempre vão acontecer. Mas aquelas que se dão por choque quando veículos trafegam em sentido contrário, se não podem ser completamente eliminadas, podem ser sensivelmente diminuídas com estradas duplicadas. Até nestas, como naquele final de semana, acontecem acidentes tipo o do motorista que destruíu a frente do seu caminhão, porque se chocou com o da dianteira, que bateu num terceiro...
A Emily alimenta uma estatísticas que já se tornou rotina. No interior, há o costume de que, com a morte em acidente na estrada, ali seja colocada uma cruz. A lembrança da imperícia humano - manutenção do serviço público ou descuido de um motorista - que levou à perda de uma vida. Hoje, se fossem colocadas cruzes para todas as existências ceifadas pela BR 116 faríamos uma longa, penosa e dolorida alameda da morte.
Há uma cruz a mais na estrada... Quando circular de ônibus, de carro ou caminhão pela rodovia, faça uma prece. Não importa sua filosofia ou religião, mas que não se permita que estas pessoas tenham morrido em vão. Motive lideranças sociais, políticas, dos meios de comunicação a não desistir. E quando a estrada ficar pronta, que haja um longo instante de silêncio pelos mártires de todas as idades, sacrificados no altar da imprudência, incompetência e, porque não, de todas as nossas omissões...
terça-feira, 27 de agosto de 2019
A imaginação que parece realidade
O livro Pequeno Príncipe inicia assim: "peço perdão às crianças por dedicar este livro a uma pessoa grande. Tenho uma desculpa séria: essa pessoa grande é o melhor amigo que possuo no mundo... é capaz de compreender todas as coisas, até mesmo os livros de criança... Se todas essas desculpas não bastam, eu dedico então esse livro à criança que essa pessoa grande já foi. Todas as pessoas grandes foram um dia crianças (mas poucas se lembram disso). Corrijo, portanto, a dedicatória: A Léon Werth. Quando ele era pequenino!"
Rei Leão (que ainda está nos cinemas) é uma volta a 25 anos atrás. A mesma história que encantou gerações passou do desenho animado para uma montagem feita em computadores com animais e cenários naturais. A fábula tem elementos comuns em contos com a preocupação de trazer uma lição: a disputa entre o bem e o mal, a preparação e o exercício para a liderança, o quanto o equilíbrio da Natureza é sensível, o valor que tem uma amizade e o companheirismo...
A roupagem dada pela tecnologia é um novo jeito de contar uma história antiga. A reciclagem de um conto que ainda mantem atentos os olhares de crianças e de muitos adultos que invejam o modo dos pequenos se encantarem com cenas, personagens, tramas... A mesma maneira com que, ao longo da História, menestréis, contadores, ambulantes, vendedores de miudezas andavam pelas estradas e caminhos levando informações, mas também cantigas e causos às populações distantes.
Quem se criou no interior ou quando a iluminação elétrica ainda era precária pegou contadores de histórias em casa: pais e mães alimentavam o imaginário tendo o lado feminino mais sensível e humanizado, mas também o lado masculino dando ênfase a aventuras eletrizantes, em especial o apelo ao terror... Até chegar ao rádio com as novelas em que as vozes estimulavam a imaginação a recriar as cenas e, enfim, a televisão, onde a criatividade já transcendeu a realidade...
Quando o filme acabou grande parte da platéia era como eu: adulto e sozinho. Não houve uma debandada imediata. Em silêncio, foram acompanhando os créditos e a música. A certeza de que a receita para um bom filma "de criança" continua a mesma e que efeitos especiais e uma fortuna investida precisam da simplicidade de uma boa história que envolva carinho, ternura, afeto...
Um "Léon Werth" lutando para entender o andar inclemente do tempo e o que disse o rei Leão: "o passado pode machucar. Mas do modo como vejo, você pode fugir dele ou aprender com ele". Amadurecer pode ser exatamente assim: conquistar os valores que a sociedade nos apregoa como sendo de adultos... Sem perder a capacidade de se encantar e emocionar diante de mundos que apenas a imaginação é capaz de fazer com que pareçam realidade!
Rei Leão (que ainda está nos cinemas) é uma volta a 25 anos atrás. A mesma história que encantou gerações passou do desenho animado para uma montagem feita em computadores com animais e cenários naturais. A fábula tem elementos comuns em contos com a preocupação de trazer uma lição: a disputa entre o bem e o mal, a preparação e o exercício para a liderança, o quanto o equilíbrio da Natureza é sensível, o valor que tem uma amizade e o companheirismo...
A roupagem dada pela tecnologia é um novo jeito de contar uma história antiga. A reciclagem de um conto que ainda mantem atentos os olhares de crianças e de muitos adultos que invejam o modo dos pequenos se encantarem com cenas, personagens, tramas... A mesma maneira com que, ao longo da História, menestréis, contadores, ambulantes, vendedores de miudezas andavam pelas estradas e caminhos levando informações, mas também cantigas e causos às populações distantes.
Quem se criou no interior ou quando a iluminação elétrica ainda era precária pegou contadores de histórias em casa: pais e mães alimentavam o imaginário tendo o lado feminino mais sensível e humanizado, mas também o lado masculino dando ênfase a aventuras eletrizantes, em especial o apelo ao terror... Até chegar ao rádio com as novelas em que as vozes estimulavam a imaginação a recriar as cenas e, enfim, a televisão, onde a criatividade já transcendeu a realidade...
Quando o filme acabou grande parte da platéia era como eu: adulto e sozinho. Não houve uma debandada imediata. Em silêncio, foram acompanhando os créditos e a música. A certeza de que a receita para um bom filma "de criança" continua a mesma e que efeitos especiais e uma fortuna investida precisam da simplicidade de uma boa história que envolva carinho, ternura, afeto...
Um "Léon Werth" lutando para entender o andar inclemente do tempo e o que disse o rei Leão: "o passado pode machucar. Mas do modo como vejo, você pode fugir dele ou aprender com ele". Amadurecer pode ser exatamente assim: conquistar os valores que a sociedade nos apregoa como sendo de adultos... Sem perder a capacidade de se encantar e emocionar diante de mundos que apenas a imaginação é capaz de fazer com que pareçam realidade!
terça-feira, 13 de agosto de 2019
Homens que choram, brincam, solidários...
Na fila para pegar comida. Atrás, dois rapazes conversavam, acompanhados por um menino na faixa dos 10 anos, que ouvia atento... Discutiam números da violência, em especial de assassinatos, que diminuiu na comparação com o ano passado. O pai do pequeno destacou que o feminicídio aumentou, com uma "pérola": "também, as mulheres querem tanto ir para a rua... e do jeito que vão... só podem se dar mal".
No Dia dos Pais, meios de comunicação destacaram que homens se tornam mais sensíveis quando acompanham o desenvolvimento dos filhos. Foto hilária se tornou símbolo de fofura do rapaz que - para se fazer presente na vida da filha de quase dois anos - vestiu roupa de bailarina e tirou fotos com boas e gostosas risadas...
Ninguém nasce preconceituoso. Aprende-se no convívio da família e grupos sociais. O preconceito com as mulheres é violência que se introjeta na formação de valores e referências. A repetição de discursos como do primeiro pai inculca sentimento de "superioridade", "senhor de todas as coisas" e, ao ser desagradado, o "direito" de resolver à sua maneira, com a cumplicidade omissa de vizinhos e "amigos".
A população se conscientiza enquanto é lembrada, mas tem memória curta. Em seguida, se interessa por outros assuntos e joga estes no esquecimento. Temas fundamentais como prevenção da saúde e uma sociedade sem violência precisam ser repetidos (de forma diferente) todos os dias, todos os meses, todos os anos...
Martin Luther King, falando do preconceito racial, sabia que não veria o momento em que negros e brancos coexistissem em paz. Mas precisava pregar repetidamente para se concretizar um dia... Comparava com o patriarca Moisés, que libertou o povo de Israel do Egito e viu mas não conseguiu entrar na Terra Prometida. Da mesma forma, intuía um novo tempo para seu povo que precisava vencer as próprias limitações.
Falar de feminicídio é mostrar o quanto uma sociedade machista e patriarcal marginalizou o papel da mulher. Respeitar direitos não é "guerra dos sexos", mas dar a cada um a possibilidade da sua realização. Vamos levar muito tempo para que haja uma educação que liberte dos ranços disfarçados de brincadeiras, piadas, descasos...
Homens que choram, brincam, solidários no sofrimento da companheira no parto não perdem a masculinidade. Ao contrário, transformam mulher e filhos em parceiros e amigos por toda uma vida. Uma nova cultura inicia quando existe a consciência de que não há filho perfeito, nem pai perfeito; mas que o primeiro vai ter o segundo como referência... Aceitar e conviver com pequenos e grandes defeitos faz parte do desafio sublime de ajudar a construir a identidade de um novo ser humano!
No Dia dos Pais, meios de comunicação destacaram que homens se tornam mais sensíveis quando acompanham o desenvolvimento dos filhos. Foto hilária se tornou símbolo de fofura do rapaz que - para se fazer presente na vida da filha de quase dois anos - vestiu roupa de bailarina e tirou fotos com boas e gostosas risadas...
Ninguém nasce preconceituoso. Aprende-se no convívio da família e grupos sociais. O preconceito com as mulheres é violência que se introjeta na formação de valores e referências. A repetição de discursos como do primeiro pai inculca sentimento de "superioridade", "senhor de todas as coisas" e, ao ser desagradado, o "direito" de resolver à sua maneira, com a cumplicidade omissa de vizinhos e "amigos".
A população se conscientiza enquanto é lembrada, mas tem memória curta. Em seguida, se interessa por outros assuntos e joga estes no esquecimento. Temas fundamentais como prevenção da saúde e uma sociedade sem violência precisam ser repetidos (de forma diferente) todos os dias, todos os meses, todos os anos...
Martin Luther King, falando do preconceito racial, sabia que não veria o momento em que negros e brancos coexistissem em paz. Mas precisava pregar repetidamente para se concretizar um dia... Comparava com o patriarca Moisés, que libertou o povo de Israel do Egito e viu mas não conseguiu entrar na Terra Prometida. Da mesma forma, intuía um novo tempo para seu povo que precisava vencer as próprias limitações.
Falar de feminicídio é mostrar o quanto uma sociedade machista e patriarcal marginalizou o papel da mulher. Respeitar direitos não é "guerra dos sexos", mas dar a cada um a possibilidade da sua realização. Vamos levar muito tempo para que haja uma educação que liberte dos ranços disfarçados de brincadeiras, piadas, descasos...
Homens que choram, brincam, solidários no sofrimento da companheira no parto não perdem a masculinidade. Ao contrário, transformam mulher e filhos em parceiros e amigos por toda uma vida. Uma nova cultura inicia quando existe a consciência de que não há filho perfeito, nem pai perfeito; mas que o primeiro vai ter o segundo como referência... Aceitar e conviver com pequenos e grandes defeitos faz parte do desafio sublime de ajudar a construir a identidade de um novo ser humano!
sábado, 27 de julho de 2019
Filhos especiais do Sagrado Coração de Jesus
Tenho tido a alegria de ser convidado por diversos grupos de pessoas que são formadores de opinião para conversar a respeito de Comunicação (por ser minha área profissional), mas também de situações que relacionam Igreja e Sociedade, no papel de leigo com formação e disposição de auxiliar àqueles que tem marcada atuação em dar sentido ao pedido dos bispos em Aparecida: ser "a presença do Mundo no coração da Igreja e a presença da Igreja no coração do Mundo".
No fim de semana de 20 e 21 de julho trabalhei "comunicador, comunicação e pastoral" com os Diáconos da Arquidiocese de Pelotas. Quando o Hélio Madruga (coordenador diocesano) me convidou, pedi que tivessem na sala onde trabalharíamos uma imagem do Sagrado Coração de Jesus. Armamos um pequeno altar ao lado da mesa principal, para onde convergiu nossa espiritualidade, no início da atividade, assim como ao finalizá-la. Mas, durante todo o tempo, ali estava uma referência tão necessária: o sinal da misericórdia de Deus!
Para ilustrar o que desejava que gravassem do encontro, contei a história do padre Fábio de Mello. Disse que todas as noites a mãe reunia a família em torno do Sagrado Coração de Jesus para rezar. O menino ficava admirado com aquela imagem que tinha o coração do lado de fora do próprio corpo. Um dia resolveu perguntar. A mãe era (e é) pessoa simples, pensou um pouco e disse que não sabia. Mas que o seu próprio coração lhe dizia que o fato de estar pelo lado de fora do peito significava que o seu amor pelas pessoas era tão grande que não podia ser contido dentro do corpo!
Ao longo de toda a tarde, fiz questão de que, novamente, voltassem os olhos para a imagem, pensando que homens que são sagrados como Diáconos Permanentes são filhos especiais do Sagrado Coração de Jesus! A Igreja chama, especialmente casados, que se dedicam a ajudar na vida da Liturgia, da Pastoral, do serviço social e caritativo. Como é dito nos Atos dos Apóstolos; "escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria".
Como resultado, temos hoje a formação de um quadro de pessoas que atuam em diversos setores da Igreja. O alerta é que não são "padres em miniatura", mas sim leigos escolhidos por Deus para serem presença na sociedade. Falávamos da necessidade que têm de andar e fazer presença nos lugares onde moram, trabalham, estudam, convivem com as famílias e amigos...
No mês em que rezamos pelas vocações (agosto), convido a orar pelos Diáconos. Assim como pelos ministros e ministras. Eles têm um papel importante no serviço ao Reino de Deus. Estão no Mundo como sinal da misericórdia do Sagrado Coração de Jesus e é dali que trazem os elementos para que se reze a vida do povo e devem ser a boa e saudável presença que transforma a religião num lugar de esperança!
No fim de semana de 20 e 21 de julho trabalhei "comunicador, comunicação e pastoral" com os Diáconos da Arquidiocese de Pelotas. Quando o Hélio Madruga (coordenador diocesano) me convidou, pedi que tivessem na sala onde trabalharíamos uma imagem do Sagrado Coração de Jesus. Armamos um pequeno altar ao lado da mesa principal, para onde convergiu nossa espiritualidade, no início da atividade, assim como ao finalizá-la. Mas, durante todo o tempo, ali estava uma referência tão necessária: o sinal da misericórdia de Deus!
Para ilustrar o que desejava que gravassem do encontro, contei a história do padre Fábio de Mello. Disse que todas as noites a mãe reunia a família em torno do Sagrado Coração de Jesus para rezar. O menino ficava admirado com aquela imagem que tinha o coração do lado de fora do próprio corpo. Um dia resolveu perguntar. A mãe era (e é) pessoa simples, pensou um pouco e disse que não sabia. Mas que o seu próprio coração lhe dizia que o fato de estar pelo lado de fora do peito significava que o seu amor pelas pessoas era tão grande que não podia ser contido dentro do corpo!
Ao longo de toda a tarde, fiz questão de que, novamente, voltassem os olhos para a imagem, pensando que homens que são sagrados como Diáconos Permanentes são filhos especiais do Sagrado Coração de Jesus! A Igreja chama, especialmente casados, que se dedicam a ajudar na vida da Liturgia, da Pastoral, do serviço social e caritativo. Como é dito nos Atos dos Apóstolos; "escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria".
Como resultado, temos hoje a formação de um quadro de pessoas que atuam em diversos setores da Igreja. O alerta é que não são "padres em miniatura", mas sim leigos escolhidos por Deus para serem presença na sociedade. Falávamos da necessidade que têm de andar e fazer presença nos lugares onde moram, trabalham, estudam, convivem com as famílias e amigos...
No mês em que rezamos pelas vocações (agosto), convido a orar pelos Diáconos. Assim como pelos ministros e ministras. Eles têm um papel importante no serviço ao Reino de Deus. Estão no Mundo como sinal da misericórdia do Sagrado Coração de Jesus e é dali que trazem os elementos para que se reze a vida do povo e devem ser a boa e saudável presença que transforma a religião num lugar de esperança!
terça-feira, 9 de julho de 2019
Frio: mãos que alcançam esperança
O frio dos últimos dias despertou em muitos gaúchos o espírito de solidariedade. Multiplicam-se ações de pessoas e grupos mobilizando a sociedade para dar àqueles que se encontram nas ruas - ou com dificuldades pela pobreza - alimento, roupas e cobertas. Entidades de todos os tipos - como clubes de futebol, grupos religiosos - mostram o que temos de nobre: não basta estar bem se ao redor outros passam mal.
Alguns ainda resmungam que é preciso ensinar a pescar ao invés de dar o peixe. Princípio aplicável a médio e longo prazo, mas que, na iminência das pessoas congelaram ou entrarem em desespero pela fome, o que se pode fazer é atender ao imediato e, depois, cobrar das autoridades públicas que use bem o nosso dinheiro.
Os meios de comunicação encantam com as belas imagens como o crepitar da chama de um fogão, a geada encobrindo os campos e os lagos, a neve pintando de branco ruas, árvores, carros... Ao mesmo tempo, homens e mulheres saem às ruas enquanto quase toda a população dorme ou se diverte para deixar embaixo de uma coberta de papelão ou no costado de um cachorro que aquece seu dono, uma caneca de café ou de sopa, um pedaço de pão e uma oração...
Não importam os nomes, são servidores do bem, identificados por crença religiosa ou valores humanos, acreditam que desapego começa por gastar o próprio tempo prestando serviço a alguém desamparado. Pais contaram de jovens que se reuniam em comunidade para arrecadar donativos, preparar o sopão, acondicionar em caixas de leite e peregrinar por lugares onde encontravam pessoas que obtinham daquela forma a única alimentação decente do dia. Detalhe: aprenderam a também cuidar de suas coisas e do que era comum em casa na experiência de cuidar de alguém na rua...
A Campanha do Agasalho de 2019, do Governo do Estado, diz que "toda a roupa tem uma história e toda a história pode ter um outro final". A solicitação de doações vem acompanhada de um pedido de conscientização: doar o que ainda se pode usar. Isto é, não apenas se livrar de algo indesejado, sobrando ou atrapalhando dentro de casa.
Li em algum lugar que "um simples gesto de carinho cria uma onda sem fim". A onda se chama compaixão, a forma como o ser humano se torna melhor, fazendo uma sociedade diferente onde a poesia também está em valorizar os belos detalhes que a natureza propicia com o frio... e, ainda mais, na paisagem humana onde se aprende com um olhar, um obrigado, um sorriso, que gratidão anda junto com solidariedade. Na prática, talvez não mude a situação social de quem está nas ruas. Mas, com certeza, não deixa morrer a crença no ser humano, de quem já desceu até o mais profundo dos abismos e encontra mãos que lhes alcançam a esperança!
Alguns ainda resmungam que é preciso ensinar a pescar ao invés de dar o peixe. Princípio aplicável a médio e longo prazo, mas que, na iminência das pessoas congelaram ou entrarem em desespero pela fome, o que se pode fazer é atender ao imediato e, depois, cobrar das autoridades públicas que use bem o nosso dinheiro.
Os meios de comunicação encantam com as belas imagens como o crepitar da chama de um fogão, a geada encobrindo os campos e os lagos, a neve pintando de branco ruas, árvores, carros... Ao mesmo tempo, homens e mulheres saem às ruas enquanto quase toda a população dorme ou se diverte para deixar embaixo de uma coberta de papelão ou no costado de um cachorro que aquece seu dono, uma caneca de café ou de sopa, um pedaço de pão e uma oração...
Não importam os nomes, são servidores do bem, identificados por crença religiosa ou valores humanos, acreditam que desapego começa por gastar o próprio tempo prestando serviço a alguém desamparado. Pais contaram de jovens que se reuniam em comunidade para arrecadar donativos, preparar o sopão, acondicionar em caixas de leite e peregrinar por lugares onde encontravam pessoas que obtinham daquela forma a única alimentação decente do dia. Detalhe: aprenderam a também cuidar de suas coisas e do que era comum em casa na experiência de cuidar de alguém na rua...
A Campanha do Agasalho de 2019, do Governo do Estado, diz que "toda a roupa tem uma história e toda a história pode ter um outro final". A solicitação de doações vem acompanhada de um pedido de conscientização: doar o que ainda se pode usar. Isto é, não apenas se livrar de algo indesejado, sobrando ou atrapalhando dentro de casa.
Li em algum lugar que "um simples gesto de carinho cria uma onda sem fim". A onda se chama compaixão, a forma como o ser humano se torna melhor, fazendo uma sociedade diferente onde a poesia também está em valorizar os belos detalhes que a natureza propicia com o frio... e, ainda mais, na paisagem humana onde se aprende com um olhar, um obrigado, um sorriso, que gratidão anda junto com solidariedade. Na prática, talvez não mude a situação social de quem está nas ruas. Mas, com certeza, não deixa morrer a crença no ser humano, de quem já desceu até o mais profundo dos abismos e encontra mãos que lhes alcançam a esperança!
terça-feira, 25 de junho de 2019
Especiais: mundos e caminhos diferentes...
The good doctor (o bom doutor) é daquelas séries de televisão que, periodicamente, nos permitem fazer uma reflexão sobre nossas limitações e o quanto ainda estamos longe de entender as limitações alheias. A síndrome da qual o jovem residente é portador o faz diferente, sem necessidade de rotular se isto é bom ou mau. Apenas que é aspirante a uma carreira, buscando tocar sua vida, encontrar o seu espaço e aprender.
A Síndrome de Savant (como diz a Wikipédia: síndrome do sábio, do idiota-prodígio é distúrbio psíquico com o qual a pessoa possui uma grande habilidade intelectual aliada a um déficit de inteligência) se caracteriza por possuir habilidades ligadas a memória extraordinária, com pouca compreensão do que acontece no seu contexto.
Shaun Murphy vem do interior trabalhar em um famoso hospital. Enfrenta os desafios na área médica, precisando provar sua capacidade para colegas e superiores. Um dos problemas é o de relacionamento com quem trabalha ou mesmo com os pacientes. Afinal, os códigos de linguagem mais sofisticados não fazem parte do seu entendimento. Neste sentido, tem dificuldades de aprendizagem, mas se transforma num desafio para aqueles que entendem o potencial da sua atuação.
Diálogo que demonstra a ausência de maldade é feito com a colega que luta por compreendê-lo: "porque você foi grossa comigo quando nos conhecemos? Depois gentil na segunda vez que nos vimos, e agora quer ser minha amiga? Qual destas partes você estava fingindo?" Não há meios termos, sem as nuances próprias do sarcasmo ou do cinismo. Para ele, o que se diz é textual: pedra é pedra, terra é terra e não existem figuras de linguagem que lhes possam alcançar uma outra significação.
Lembrei de outros casos: a mãe que carregava o bebê especial abordada por vizinha que desejava ver o que chamavam de "doentinho"; os pais que internaram o rapaz com síndrome de down e tiveram dificuldades de que os atendentes tratassem como apenas mais um paciente; o autista agredido porque também na prática de esportes ou nos exercícios do dia a dia sua mente percorria mundos e caminhos diferentes...
Pais de especiais trabalham mais a fim de que suas potencialidades sejam descobertas e atuam numa sociedade culturalmente preconceituosa. Enquanto o jovem Shaun tem sua capacidade colocada à prova, os demais têm as benesses de serem "normais". Sua presença incomoda: abandonar os padrões de comportamento convencionais desafia a fazer uma medicina onde a técnica não exclua o fator humano. E isto vai acontecer, até com alguns percalços, mas tendo as dores amenizadas por muito mais compreensão, mais sorrisos, mais carinhos e, quem sabe, muito mais abraços!
A Síndrome de Savant (como diz a Wikipédia: síndrome do sábio, do idiota-prodígio é distúrbio psíquico com o qual a pessoa possui uma grande habilidade intelectual aliada a um déficit de inteligência) se caracteriza por possuir habilidades ligadas a memória extraordinária, com pouca compreensão do que acontece no seu contexto.
Shaun Murphy vem do interior trabalhar em um famoso hospital. Enfrenta os desafios na área médica, precisando provar sua capacidade para colegas e superiores. Um dos problemas é o de relacionamento com quem trabalha ou mesmo com os pacientes. Afinal, os códigos de linguagem mais sofisticados não fazem parte do seu entendimento. Neste sentido, tem dificuldades de aprendizagem, mas se transforma num desafio para aqueles que entendem o potencial da sua atuação.
Diálogo que demonstra a ausência de maldade é feito com a colega que luta por compreendê-lo: "porque você foi grossa comigo quando nos conhecemos? Depois gentil na segunda vez que nos vimos, e agora quer ser minha amiga? Qual destas partes você estava fingindo?" Não há meios termos, sem as nuances próprias do sarcasmo ou do cinismo. Para ele, o que se diz é textual: pedra é pedra, terra é terra e não existem figuras de linguagem que lhes possam alcançar uma outra significação.
Lembrei de outros casos: a mãe que carregava o bebê especial abordada por vizinha que desejava ver o que chamavam de "doentinho"; os pais que internaram o rapaz com síndrome de down e tiveram dificuldades de que os atendentes tratassem como apenas mais um paciente; o autista agredido porque também na prática de esportes ou nos exercícios do dia a dia sua mente percorria mundos e caminhos diferentes...
Pais de especiais trabalham mais a fim de que suas potencialidades sejam descobertas e atuam numa sociedade culturalmente preconceituosa. Enquanto o jovem Shaun tem sua capacidade colocada à prova, os demais têm as benesses de serem "normais". Sua presença incomoda: abandonar os padrões de comportamento convencionais desafia a fazer uma medicina onde a técnica não exclua o fator humano. E isto vai acontecer, até com alguns percalços, mas tendo as dores amenizadas por muito mais compreensão, mais sorrisos, mais carinhos e, quem sabe, muito mais abraços!
Morrer: o direito a um porto seguro
Quando a mãe faleceu, no início do ano, eu tinha em mente algumas coisas que não desejava que acontecessem: que sofresse, morresse sozinha, dormindo ou em um hospital. Fui abençoado: faleceu pela manhã, em meus braços, tranquila, sem dizer uma palavra, apenas olhando para mim. Não sei se, na realidade, idealizei o que havia pensado ou se já era um pouco por estar marcado por outras mortes.
Fazendo parte da vida, o nascimento e o fim continuam e, seguidamente, ouço conhecidos contarem experiências com pessoas doentes ou idosas. Recentemente, um amigo acompanhou o pai com câncer num hospital. Chegou o momento difícil em que já não há mais nada o que fazer. O idoso se mantinha consciente e pediu: queria voltar para casa. Sabia que não restava muito tempo e desejava morrer em sua cama, no lugar que construíra para viver com a esposa e os filhos.
A família se envolveu na discussão. A maioria contrária a que deixasse o hospital. Mas, em última instância, quem devia endossar ou não o pedido do pai era o filho. Ele esqueceu de tudo o que os "sensatos" lhe disseram. Aprontaram o quarto para dispor de equipamentos básicos e voltou para o que, por toda uma vida, foi um lar. Na porta, uma parada e uma lágrima rolou enquanto o idoso olhava, possivelmente pela última vez, para o jardim onde em tantas ocasiões passara as tardes com sua esposa.
"Tua mãe me espera", ainda comentou. Dali em diante não falou mais, até falecer, uma semana depois. Meu amigo repetiu o que ouço de muitos cuidadores: o pai chamava sua esposa pelo nome de sua mãe; o chamava pelo nome do próprio avô e perguntava quando iriam voltar para casa e onde é que estavam. A memória próxima que se perde e a busca desesperada por um passado onde justificar a própria solidão...
Michael Bublé, na canção "Home" fala de suas andanças pelo mundo (Paris, Roma...), "talvez cercado por um milhão de pessoas, eu ainda me sinto totalmente sozinho. Eu só quero ir para casa. Eu sinto sua falta, sabe?" É o caso de uma pessoa idosa ou doente que se pensa estar melhor num hospital onde, apesar de toda a sofisticação e preparo técnico, não consegue servir como referência emocional e afetiva.
Embora o que se passe já não é o que entendemos por ausência, o "voltar para casa" de uma pessoa que está fragilizada é também um ponto físico, mas, mais do que isto, sentimento de que, em algum lugar, ancorou o coração e este é o porto onde acaba a grande viagem que se chama vida. A saudade do Infinito, como fala o padre Zezinho, é apenas caminhar em direção ao reencontro com tantas pessoas amadas, que fizeram o mesmo caminho e apenas desembarcaram um pouco mais cedo...
Fazendo parte da vida, o nascimento e o fim continuam e, seguidamente, ouço conhecidos contarem experiências com pessoas doentes ou idosas. Recentemente, um amigo acompanhou o pai com câncer num hospital. Chegou o momento difícil em que já não há mais nada o que fazer. O idoso se mantinha consciente e pediu: queria voltar para casa. Sabia que não restava muito tempo e desejava morrer em sua cama, no lugar que construíra para viver com a esposa e os filhos.
A família se envolveu na discussão. A maioria contrária a que deixasse o hospital. Mas, em última instância, quem devia endossar ou não o pedido do pai era o filho. Ele esqueceu de tudo o que os "sensatos" lhe disseram. Aprontaram o quarto para dispor de equipamentos básicos e voltou para o que, por toda uma vida, foi um lar. Na porta, uma parada e uma lágrima rolou enquanto o idoso olhava, possivelmente pela última vez, para o jardim onde em tantas ocasiões passara as tardes com sua esposa.
"Tua mãe me espera", ainda comentou. Dali em diante não falou mais, até falecer, uma semana depois. Meu amigo repetiu o que ouço de muitos cuidadores: o pai chamava sua esposa pelo nome de sua mãe; o chamava pelo nome do próprio avô e perguntava quando iriam voltar para casa e onde é que estavam. A memória próxima que se perde e a busca desesperada por um passado onde justificar a própria solidão...
Michael Bublé, na canção "Home" fala de suas andanças pelo mundo (Paris, Roma...), "talvez cercado por um milhão de pessoas, eu ainda me sinto totalmente sozinho. Eu só quero ir para casa. Eu sinto sua falta, sabe?" É o caso de uma pessoa idosa ou doente que se pensa estar melhor num hospital onde, apesar de toda a sofisticação e preparo técnico, não consegue servir como referência emocional e afetiva.
Embora o que se passe já não é o que entendemos por ausência, o "voltar para casa" de uma pessoa que está fragilizada é também um ponto físico, mas, mais do que isto, sentimento de que, em algum lugar, ancorou o coração e este é o porto onde acaba a grande viagem que se chama vida. A saudade do Infinito, como fala o padre Zezinho, é apenas caminhar em direção ao reencontro com tantas pessoas amadas, que fizeram o mesmo caminho e apenas desembarcaram um pouco mais cedo...
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