terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Hora do Ângelus

Início da década de 60, tempo em que cursava o primário pela manhã, brincava na estrada da Silveira à tarde (bolinha de gude, taco, empinar pandorga...) e voltava para casa, antes do sol se por, de preferência sem aprontar nenhuma e ter o direito de ouvir o Ângelus, quando o locutor dizia: “Seis horas da tarde, momento de reflexão... Ave Maria, cheia de graça...” Ao redor do rádio, minha mãe, meus irmãos e uma espiritualidade serena, de quem tinha na fé uma motivação vinda da catequese, quando uma professora vinha de casa em casa recolhendo as crianças, para as aulinhas de sábado; ou o padre Roberto, de batina, levando a turma para o campo, jogar futebol.
Foi do que me lembrei quando, no último domingo, Bento XVI fez sua última aparição para o Ângelus, na Praça de São Pedro. Todos aqueles que tiveram o privilégio de estar em Roma num domingo e conseguiram estar na praça, acompanhando a oração com o papa, dizem que é um momento mágico! Este foi mais especial, ainda! O papa fazia a sua despedida e afirmava que iria “subir ao Monte”! Simbolicamente, despojava-se de sua condição majestática, para assumir o homem que precisa se reencontrar com Deus, longe de tudo e de todos, no silêncio em que somente o vento do Espírito Santo assopra.
Depois do dia 28, os olhares em nível internacional, estarão atentos para o conclave que vai escolher seu sucessor. Examinando a história, embora se diga que os cardeais ficam longe da influência externa, sabe-se que, na prática, isto não é verdade. Em muitos momentos, governos dos países que dominam os eixos econômicos tentaram “consagrar” um candidato, sabedores de que a Igreja Católica, se não tem poder pela força ou pela economia, ainda lida com a política internacional, podendo ser uma forte aliada, ou uma adversária a ser temida.
Talvez seja exatamente isto o que a Igreja precisa: no final da tarde, no horário do Ângelus, quando o Anjo passa em silêncio e surpreende Nossa Senhora com a notícia de que vai gerar Jesus, também gere um novo tempo, um novo jeito de ver as populações mais simples que têm na instituição, em muitos casos, o único jeito de se ver defendida. Não volto mais aos meus tenros anos de vida, mas tenho esperança de que – tendo sobre si o olhar esperançoso de um povo que teima em buscar a felicidade – a Igreja renasça das cinzas, não mais como uma representação política, mas apenas aquela que quer ver viva a palavra de Jesus Cristo!

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