sábado, 24 de dezembro de 2011

Juntando os cacos


Entro em recesso durante o mês de janeiro, Volto em fevereiro. Grande abraço.

Pensei em não fazer nada a respeito de Natal ou de Ano Novo, nos comentários em jornal, rádio e televisão. Não deu: a provocação é grande e, querendo ou não, fazemos deste tempo um momento de reflexão, em muitos casos, de juntar os nossos cacos emocionais. Brinquei que nosso Deus é um Deus debochado. Embora todos os nomes que damos para o Natal: manjedoura, gruta de Belém etc. O que os gaúchos diriam é que Jesus foi colocado num cocho, numa estrebaria. O maior Ser do Universo contentou-se em provocar no homem o sentimento de amor ao próximo.
Um casal de atores viveu José e Maria pelas ruas de Porto Alegre. Tiveram a mesma sorte dos originais: perambularam pelas ruas encontrando alguns poucos bons Samaritanos. A lição: embora sejamos cheios de boas intenções, infelizmente, se o menino Jesus voltasse hoje, dificilmente nasceria em um de nossos espaços cristãos!
O tempo de Ano Novo, então, é exatamente este: dar uma chance para que repensemos nossas relações. Não é o que esperamos dos outros, mas o que podemos fazer por eles. Nisto está incluída a relação de casal, pais e filhos, irmãos, amigos, vizinhos, companheiros de trabalho. Não há boas intenções que sobrevivam a um espírito que está querendo se adonar de todas as bem-aventuranças! Pelo contrário, exatamente por ser um dom de Deus, nem sempre funcionam pela nossa lógica, mas por algo que está, exatamente, fora da lógica: a lógica de Deus.
A grande lição é não desistir, nunca. Manter o norte e auxiliar a andar o idoso que tropeça nas próprias pegadas; o jovem que fez opções que consideramos erradas (bateu a própria cabeça e tem que ser ajudado a reiniciar); aqueles que se sentem desgostosos porque a religião já não se enquadra em seus próprios conceitos. Abençoado 2012, com força e energia para reinventarmos a própria vida, com a alegria de quem se sente capaz de reiniciar a cada tropeço, sabendo que a felicidade nos dá pequenas provas e pode estar, ali adiante, ao nosso alcance.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

A cumplicidade do mar

Brinco com os sentidos, como o tempo brinca com meu corpo.
Aguço meu olhar, reforço minha imaginação.
Meus dedos desenham mistérios, percorro caminhos desconhecidos.
Sinto o sabor do novo, mas também sinto o vazio de viver este tempo.
Ouço o vento que sussurra, tentando entender o que ele diz.
Aspiro os últimos cheiros da Primavera, mas sinto que o Verão se fará inclemente.

Há um tênue linha entre o que meu corpo sente e o que gostaria de sentir:
É a linha que me separa da eternidade.
Como se, estendendo meus sentidos, também pudesse estar mais perto de Deus.

A provocação que misteriosamente conduz as mãos que tiram a forma
da pedra;
O poeta que reúne palavras, jurando que expressa ideias;
Ou do marinheiro que apenas joga a rede, porque quer a cumplicidade do mar.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O homem que comprou o filho

Um homem muito rico e seu filho tinham grande paixão pela arte. Tinham de tudo em sua coleção, desde Picasso até Rafael. Muito unidos, sentavam-se juntos para admirar as grandes obras de arte. Por uma desgraça do destino, seu filho foi para guerra. Foi muito valente e morreu na batalha, quando resgatava outro soldado. O pai recebeu a notícia e sofreu profundamente a morte de seu filho. Um mês mais tarde, justo antes do Natal, alguém bateu na porta... Um jovem com uma grande tela em suas mãos disse ao pai:
- Senhor você não me conhece, mas eu sou o soldado por quem seu filho deu a vida, ele salvou muitas vidas nesse dia, e estava me levando a um lugar seguro quando uma bala lhe atravessou o peito, morrendo assim, instantaneamente. Ele falava muito do senhor e de seu amor pela arte. 
E o rapaz estendeu os braços para entregar a tela:
- Eu sei que não é muito, e eu também não sou um grande artista, mas sei também que seu filho gostaria que você recebesse isto. 
O pai abriu a tela. Era um retrato de seu filho, pintado pelo jovem soldado. Ele olhou com profunda admiração a maneira em que o soldado havia capturado a personalidade de seu filho na pintura. O pai estava tão atraído pela expressão dos olhos de seu filho, que seus próprios olhos se encheram de lágrimas. Ele agradeceu ao jovem soldado e ofereceu pagar-lhe pela pintura. 
- Não, senhor, eu nunca poderia pagar-lhe o que seu filho fez por mim. Essa pintura é um presente" 
O pai colocou a tela à frente de suas grandes obras de arte, cada vez que alguém visitava sua casa, ele mostrava o retrato do filho, antes de mostrar sua famosa galeria. 
O homem morreu alguns meses mais tarde e se anunciou um leilão de todas as suas obras de arte. Muita gente importante e influente, com grandes expectativas de comprar verdadeiras obras de arte. Em exposição estava o retrato do filho. O leiloeiro bateu seu martelo para dar início ao leilão. 
- Começaremos o leilão com o retrato "O FILHO". Quem oferece por este quadro? Um grande silêncio...
Então um grito do fundo da sala: 
- Queremos ver as pinturas famosas!!! Esqueça- se desta!!!!.
O leiloeiro insistiu...
- Alguém oferece algo por essa pintura?? $100? $200? 
Mais uma vez outra voz:: 
- Não viemos por esta pintura!, Viemos por Van Goghs, Picasso,.. Vamos às ofertas de verdade... 
Mesmo assim o leiloeiro continuou...
- O FILHO!!! O FILHO!!! - Quem leva o filho? 
Finalmente, uma voz :
- Eu dou $10 pela pintura. 
Era o velho jardineiro da casa. Sendo um homem muito pobre e esse era o único dinheiro que podia oferecer. 
- Temos $10! quem dá $20? gritou o leiloeiro. 
As pessoas já estavam irritadas, não queriam a pintura do filho, queriam as que realmente eram valiosas, para completarem sua coleção. Então o leiloeiro bateu o martelo 
- Dou-lhe uma, dou- lhe duas, vendida por $10!!! 
- Agora vamos começar com a coleção!!, gritou um. 
O leiloeiro soltou seu martelo e disse:
- Sinto muito damas e cavalheiros, mas o leilão chegou ao seu final. 
- Mas, e as pinturas? disseram os interessados. 
- Eu sinto muito, disse o leiloeiro, quando me chamaram para fazer o leilão, havia um segredo estipulado no testamento do dono. Não seria permitido revelar esse segredo até esse exato momento. "Somente a pintura do filho seria leiloada; aquele que a comprasse, herdaria absolutamente todas as posses deste homem, inclusive as famosas pinturas". 
- O homem que comprou O FILHO fica com tudo!....
Reflexão: Deus nos entregou seu filho, que morreu numa cruz. Assim como o leiloeiro, a mensagem hoje é O FILHO, quem ama o filho tem tudo. Tua vida não é uma coincidência, é um reflexo do que semeastes....
Colaborou Ana Paula Leão

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Um SUS melhorado

O governo federal baixou normas disciplinando o tempo que os planos de saúde particulares podem demorar no atendimento médico: desde uma semana para serviços gerais, duas semanas para especialidades e, de imediato, para emergência e pronto-atendimento.
Perfeito, muito bom. Mas as autoridades são especialistas em darem normas para os outros. E para os próprios, o que vale? Infelizmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) não é exatamente um modelo de atendimento e as queixas se acumulam desde aqueles que procuram um atendimento elementar nos postos de saúde, até chegarem aos pronto-socorro.
Contava um amigo que precisou marcar um tipo de exame e passou por duas dificuldades: na primeira, a qualidade do material era tão ruim que precisou refazer os procedimentos. No segundo, quando seu pai foi chamado para o exame, ele já havia falecido.
Claro que os planos de saúde precisam de regulamentação e, mais, serem fiscalizados. Hoje, em muitos casos, são apenas um "SUS melhorado", havendo caso em que os médicos não aguentam trabalhar assim e buscam o descredenciamento.
Mas, para que não pareça uma ação de deboche, a coerência deveria prevalecer: cobre-se da iniciativa privada, mas também se enquadre o sistema público. A esta altura, melhorar o sistema de saúde, tornando-o um mínimo necessário e satisfatório seria, apenas, dar um pouco de dignidade a um brasileiro já tão desiludido por normas legais do governo.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Um gosto de desafio


De artigos já publicados, este sobre a educação que temos e que queremos.

A discussão a respeito do ensino que temos e do ensino que queremos é, normalmente, extensa, marcada por desencontros e, muitas vezes, capaz de colocar educadores em campos diametralmente opostos.
É o que salta aos olhos quando recebo um envelope do professor Samir - que faz uma leitura peculiar dos jornais que recebe - dois textos, que parecem um enigma: um em que um pensador da educação diz que a universidade forma empregados – e não empreendedores; outro em que são mostrados - e comprovados - números que apontam as potencialidades econômicas brasileiras (as más línguas dizem que seremos eternamente “potência”) que precisam estar em foco nas negociações, em especial com os Estados Unidos, no que se refere à Área de Livre Comércio das Américas.
Que eu não mereça um anátema dos economistas, em especial do professor Massaú, mas há uma distância entre a exportação dos nossos produtos primários e a possibilidade – policiada pelo sistema econômico internacional – de se exportar com valor agregado (o caso dos industrializados). E há uma distância ainda maior entre os diversos índices que medem o desenvolvimento, o avanço nas políticas sociais e o nível de vida da população.
Mas, voltando aos estudantes. Onde um artigo pode encontrar o outro? Exatamente em que temos um ensino que busca, às vezes desesperadamente, preparar o aluno para um mercado dinâmico, capaz de tornar superados velhos ensinamentos, se estes se cingirem apenas a um “treinamento” do uso de recursos. E qual é a alternativa? Parece (mas não é) simples: na sua formação, o aluno precisa compreender, ser desafiado para trabalhar com princípios, isto é, tornar-se um empreendedor, o construtor do seu próprio conhecimento.
É este aluno, que busca nos bancos escolares de sua formação profissional muito mais do que apenas aulas e trabalhos a serem realizados extra-classe. Ele quer, ainda, “sugar” dos professores o que eles podem lhe dar a mais, corre atrás de bibliografia, busca expandir seus horizontes em todos os eventos que possam auxiliar na sua formação.
Este é um empreendedor. E serão os empreendedores que poderão fazer a mudança entre um país que exporta apenas sua produção primária – que já é de bom tamanho, visto que há escassez de alimentos no mundo; mas que também pode ocupar mercados com elementos que desafiam a inteligência, como é o caso, hoje, dos recursos da informática.
Claro que os números repassados nos artigos são preocupantes: o Brasil investe, hoje, 1% do seu produto interno bruto em tecnologia. E, mais do que isto, não há uma cultura das empresas em firmarem parcerias com as instituições de ensino, propiciando condições de pesquisa em que os resultados revertam para o desenvolvimento comum.
Infelizmente, muitas são as mazelas, ainda, em nível de educação e de comércio exterior. As mudanças têm que iniciar por uma nova mentalidade.
Passamos por uma época em que o governo repassou muitos recursos para o ensino, quase sempre mal direcionado. Hoje, a pobreza é quase franciscana e requer, acima de tudo, criatividade. A criatividade que assusta a muitos de nós, professores, porque requer a capacidade de deixar os alunos avançarem sem ter muita certeza de onde chegarão. Um certo medo do desconhecido, compreensível, inerente às novas rupturas e deixando um gosto de desafio, capaz de realimentar quem olha para estes rapazes e moças e vê que eles têm sede. Sede de novos caminhos para uma educação.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Também sou pai


O Menino parou abismado diante da vitrine: ali estava o mais belo Presépio que já tinha visto. As figuras eram quase de tamanho natural: o pai, José, demonstrava serenidade; a mãe, Maria, a preocupação com o filho deitado no cocho de alimento dos animais; o menino, Jesus, com os braços e as perninhas erguidas. Perfeitos, quase, pensou, poderia se ouvir falarem.
Mas foi voltando até alguns anos atrás, quando nasceu seu último irmão. Também se encantara com aquela pequena criatura que se movia parecendo sem coordenação. Lançava os braços e as perninhas em todas as direções e tinha os olhos ávidos por acompanhar quem estivesse por perto.
Mas foi quando saíram de casa que se assustou. Seu pai o chamou a parte e foi taxativo:
- Tá na hora de tu cair no mundo.
Achou que não tinha entendido.
- Já tens 12 anos, podes te cuidar por ti mesmo. Aqui a gente já tem boca demais pra sustentar. Vai quietinho e pega as tuas coisas.
Pensou em procurar a mãe, pensou em tentar convencer o pai, mas ficou mudo. Sabia dos problemas da família e que ele era mais um fardo. Apenas pegou uma sacola com suas poucas coisas e foi saindo para a rua. Ainda de longe, olhou pela última vez a casa. Fazia tanto tempo!
Sentou-se na beirada da janela, encostou-se na grade enquanto olhava aquela família e ouvia música que vinha da praça. Ainda tinha lágrimas nos olhos quando se encostou à parede e foi resvalando para o sono. Não tinha pai, não tinha mãe, não tinha irmãos.
Foi então que sentiu que alguém o levantava e o abrigava em seus braços. Pensando se era realidade ou se era sonho, sentiu-se transportado pelo padre, que pensou:
- Depois da Missa de Natal, procurei tanto por este menino, mas parecia que tinha desaparecido. E ei-lo aqui. Minha vocação sacerdotal não me permitiu ter filhos, mas quem sabe possa dar uma vida e dignidade para este Menino.
Olhou para o céu: o rastro de luz de uma estrela cadente marcou o firmamento. Não, não era apenas um meteoro que caia, era a sua Estrela de Belém. E, nos seus braços, tinha o menino Jesus! Sorriu para Deus e pensou que agora sim, podia dizer: também sou pai!

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Mirar a eternidade


O relógio é inflexível, como o andar cadenciado de um soldado.
Cumpre sua missão com a precisão de quem marca o passo.
Já não faz mais tic-tac, mas um som profundo de virada do tempo.

Posso andar pela casa, posso andar pelas ruas, posso andar pelas estradas.
Na minha volta, o aconchego de quem referencia minhas rotinas.
Sei que vai bater novamente, do mesmo jeito que bateu quando parti.

O relógio não diz adeus, nem dá boas vindas.
Mas segue o ritual da vida, de quem sabe que um dia partirei e, possivelmente,
Ele ainda estará na parede, repetindo para outrem o que marcou minha vida:
A marca dos 15 minutos ... dos 30 minutos ... dos 45 minutos... a hora cheia.

Será como a marcha que se cadencia pela música ou pelas palavras de ordem,
Mas que passa, ficando um som ao longe, falando do presente, mas dizendo
Que o tempo me é indiferente, se consigo mirar a eternidade.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Fazer parte da vida

Embora muitos não acreditem, estou virando um homem do lar. Meu aprendizado de jardinagem, por exemplo, segue firme, e já começo a distinguir o que é um pé de beijinho, uma alamandra, uma hortência e demais pequenos arbustos, que prometem flores logo em seguida.
Nosso terreno é suficientemente grande para comportar além do arvoredo que deixamos, também espaços para as flores que, para se plantar, seguem um ritual: encontrar um lugar adequado, em que se balance a presença do sol e de alguma sombra, a terra apropriada, com um sulco onde a planta encontre menos resistência para expandir suas raízes, cobrir com um pouco de água e, só então, colocar a nova muda.
Até agora, já vi nascerem beijinhos, alamandras e hortências, junto com outras mudas de diversos fornecedores amigos, atendidas todos os dias, inclusive como o de ontem, com chuva, em que aquelas que ficam sob árvores, não receberam nada de água, sendo necessário compensar a Mãe Natureza.
É um prazer redobrado sentir que a vida que plantamos e carinhosamente acompanhamos retribui com a exuberância própria da Primavera. Nestes pequenos prazeres, também vamos deixando uma boa parte do stress acumulado no ano. Para trabalhar com um jardim e uma horta, não adianta querermos seguir o nosso cronômetro e o nosso calendário, é preciso seguir aquilo que dita a própria Natureza. Impossível não sorrir diante da pressa que se esvai e das angústias que tratamos, pois nos dá a medida de tratar com o Mundo e com os homens: Deus não tem pressa, serenamente inspira que pequenos brotos vão tomando seu rumo, as flores fazem a diferença no matizado do verde e o conjunto nos convida a fazer parte da vida.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Mudança de hábitos

Final de ano, tempo, também, de fazer uma revisão geral de saúde. Enfrentar a retirada de sangue (acho que o técnico pensou que eu ia fazer doação, pela quantidade que armazenou num frasco), aguardar resultados, mas também já se preparar para enfrentar, nas férias, exames complementares, inclusive o tão marcado exame de próstata.
Porque falar deste assunto, se ele é rotina para quem já passou dos 50 anos? exatamente porque para a maioria isto não é rotina, as pessoas somente procuram o médico em última instância, então, pensar em prevenção, não existe.
Pois algumas atitudes do governo federal, mesmo que tímidas, são excelentes sinais para que se tenha a solução de alguns problemas sérios: a distribuição de medicações grátis para hipertensos e pessoas que têm problemas com o colesterol, não dá desculpas para aqueles que, muitas vezes, dizem que no seu orçamento têm que optar entre comprar remédios ou fazer outros investimentos em família. Saber que as pessoas não têm mais desculpas, significa, também, diminuir o número de internações hospitalares.
Pois é verdade: nesta idade, começamos a colher os frutos do que plantamos durante toda uma vida. Infelizmente, na maior parte dos casos, plantamos tempestade (má alimentação, falta de exercícios, stress excessivo), mas não queremos colher tempestade. Impossível, então, é hora de procurar o médico, comportar-se nos exames, ouvir conselhos, receber receitas e mudar os hábitos que são passíveis de mudanças.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Sorte e felicidade

O assunto era a mega sena da virada, que corre no final do ano, estimada em cerca de 200 milhões de reais. A Ana Maria Braga (junto com o Louro José), que me faz companhia nas manhãs da semana, enquanto faço minha ginástica, levou ao programa Mais Você (Rede Globo), o matemático Paulo, para falar a respeito das possibilidades existentes para que um sortudo ganhe o grande prêmio.
Começou estragando minha crença: a de que se fizer sempre os mesmos números, um dia, quem sabe ... Não é assim. Os números a cada concurso têm sempre a mesma possibilidade de serem sorteados. O que aumenta a chance de ganhar é aumentar também os números da aposta, o que também aumenta o valor da aposta, chegando a números que não cabem na minha carteira. Sugerindo, para isto, os famosos e sempre mal lembrados bolões.
Simpático, bem falante, carinhoso com a apresentadora e seu fiel escudeiro, Paulo terminou sua participação com uma preciosidade. "tudo o que traz felicidade, traz sorte". Felicidade é viver bem em família, se relacionar bem na vizinhança, ter amigos, realização no que faz. Esta é a maior sorte possível e imaginável.
Mas foi mais longe, dizendo que, muitas vezes, a simples presença de um cartão de aposta no bolso faz com que, quando o chefe solte o seu mau humor, em vez de estrilar com ele, possamos pensar: "amanhã vou ganhar na mega sena e não vou ter que aguentá-lo mais!".
Sua mensagem era de que nos alimentamos de sonhos, dos quais precisamos para viver. A mega sena é um deles. Em tempos bicudos, aponta uma possibilidade que para o matemático nunca chegou, pois não ganhou, ainda, nenhum prêmio. Fica a ideia de que a vida é assim mesma, uma luta pela felicidade que, em consequência, também traz a sorte.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Palmada: sim ou não?

Fui consultar meu analista e também meu orientador espiritual. Nenhum deles viu em meu caráter algum resquício das muitas palmadas que recebi quando criança e alguns safanões quando já estava chegando à adolescência. Na verdade, verdade verdadeira, não guardo nenhuma lembrança destas ocasiões, a não ser o porão que existia embaixo do balcão do armazém onde meu pai trabalhava, coberto por uma tábua, onde sentávamos até que a tabuada estivesse decorada e os temas terminados.
Creio que nossos deputados poderiam prestar atenção em coisas mais importantes do que institucionalizar uma lei que proíbe a palmada. Infelizmente, é mais uma lei que não vai pegar. Pais conscientes somente utilizam da palmada quando ela é o fim da estrada: a criança já esticou tanto a paciência e os limites que tem que entender fisicamente seus limites. Como dizia um pedagogo: "a palmada dói mais em quem dá do que em quem recebe".
Por outro lado, quem dá a palmada para ferir é uma pessoa doente. Então, a legislação não vai mudar seus hábitos. E, para isto, nossa legislação já prevê que pessoas que ferem outras, em qualquer idade, devem ser enquadradas enquanto criminosos, em diversos níveis.
A maior parte das crianças passa uma vida inteira sem ter ideia do que é uma palmada. Mas, algumas, precisam, sim, de um corretivo físico, que não significa agressão, mas os limites do respeito. Vamos dar crédito aos pais que lutam num mundo difícil para orientar bem seus filhos. Mas, também, vamos ficar de olho naqueles que batem pelo prazer de bater. Estes são doentes e, com certeza, vão criar futuros cidadãos doentes.

domingo, 11 de dezembro de 2011

A viagem de Exupéry


Artigo já publicado em 1994.
 
É uma pena que os pesquisadores tenham achado e recuperado, ao sul da França, os destroços do avião de Saint-Exupéry, o escritor que é o pai do Pequeno Príncipe. Ainda bem que não encontraram seu corpo, ou o que dele deve ter sobrado, já que ficou submerso desde julho de 1944 - cerca de 60 anos - quando o piloto francês deixou a Córsega para uma missão de reconhecimento da mobilização das tropas alemãs, em continente europeu.
Na verdade, verdade pura, que é a verdade da imaginação, sempre acreditei que, num determinado momento, antes do final, o Pequeno Príncipe (aquele que caiu na Terra, encontrou um aviador e procurava um amigo) apareceu junto ao ombro de Saint-Exupéry, expiou para fora e, vendo a tempestade que se aproximava, disse: “Tens certeza que não queres voltar comigo para o meu planeta?” O aviador sorriu e perguntou se ele tinha uma outra rosa em seu pequeno mundo. Entre perplexo e surpreso, o garoto disse: “É bem possível que sim. Faz tanto tempo que estou longe de casa!”
E partiram. Mergulhando nas águas do Mediterrâneo, procurando uma tumba silenciosa e o melhor caminho para retornar ao pequeno planeta que, até hoje, os astrônomos teimam em procurar entre as diversas constelações. Esquecem da máxima com que Saint Exupéry encerra sua obra maior que é o Pequeno Principe: “E gosto, à noite, de escutar estrelas. É como ouvir quinhentos milhões de guizos...”
Aí, exatamente, reside a única orientação astronômica dada pelo Pequeno Príncipe, recebida na conversa que teve com a sua amiga raposa: “só se vê bem com o coração”. E dá um desfecho capaz de sensibilizar até os mais céticos: “O essencial é invisível aos olhos”. 
Então, já não há outro caminho que não seja o de dar valor aos pequenos grandes prazeres da vida. Podemos encontrar a beleza da obra deste aviador, que viveu tão intensamente seus 44 anos, quando nos damos conta que o sentido maior do viver está em encontrar prazer nas coisas simples: como uma rosa que se cultiva, uma amizade que mostra sua cumplicidade até no olhar, a possibilidade de poder olhar para as estrelas Ou, quem sabe, um carneiro que se precisa cuidar para que não coma a única rosa existente no planeta.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Os dois meninos


O último paroquiano já havia entrado na igreja e a comunidade cantava uma música natalina. O padre espiou a redondeza e viu apenas o Menino sentado no pequeno muro ao lado dos degraus. Não soube dizer, depois, porque o fez, mas foi até lá e sentou ao seu lado.
- O senhor está cansado?
Ficou desnorteado, porque esperava que ele fizesse a abordagem. Mas, olhou para o Menino e sentiu vontade de contar toda a sua vida e o momento de deserto espiritual que estava vivendo, suas dúvidas e angústias. A mãozinha aproximou-se e tocou a sua, um calidoscópio se formou em sua cabeça. Teve vontade de soltar todas as lágrimas, todos os soluços que estavam presos em sua garganta.
- Não precisa dizer nada, o senhor tem a graça de ter o Menino.
Surpreso, o padre perguntou:
- Que menino?
Olhar carinhoso para um adulto que desconhece seu próprio mundo:
- O que está na Manjedoura!
O padre sentia-se contrariado e flagrado em contradição, mas o Menino continuou:
- Eu tentei chegar perto do Menino que está naquela loja ali na frente, mas não me deixaram.
O padre sentiu que tinha caído a ficha. Um menino de rua lhe dava a mais brilhante lição de Teologia. Tomou a sua mão:
- Pois você vai sentar ao lado do Menino!
Levantou-se e teve que puxá-lo para que entrasse, meio assustado, na igreja.
A música continuava, enquanto as pessoas se voltavam, entre aturdidos e escandalizadas. Chegou ao altar, onde estava montado o Presépio.
- Vá até o Menino, Ele é todo seu!
Olhos de encantamento, sentimento de felicidade plena. Foi chegando devagar e fez um carinho na imagem. O padre olhava a cena e surpreendeu-se por reparar, pela primeira vez, que o Menino da Manjedoura sorria.
Naquele momento, os sinos bateram meia-noite. Como estava combinado, o coro começou a cantar o “Noite Feliz”. O Padre tomou o Menino no colo, chegou ao microfone e declarou, sentindo um frio no estômago:
- Hoje, este Menino fez Natal, mais que isto, fez Advento, me fez reviver o meu sacerdócio.
A irmã que estava no coro começou a aplaudir, lentamente. Em pouco tempo, todos aplaudiam, igualmente emocionados. Era tempo de comemorar o nascimento do Senhor.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Jornal e instituição

Hoje foi a vez do Pablo Rodrigues (editor do Diário Popular de Pelotas) conversar com a turma da Teologia, onde estou dando aula, ao longo desta semana. Deixou claro como funciona a relação de um jornal com instituições, inclusive as igrejas.
Para os veículos, as instituições são tratadas da mesma forma, não havendo relação de poder que coloque uma em vantagem sobre as outras. Hoje, o jornalista vai atrás da verdade, onde ela estiver, e o que querem é "fazer comunidade", na busca por uma informação de qualidade.
Classificou a Igreja como um "agente social" que precisa ser respeitado e entendido, mas que há falhas de ambos os lados: uma Igreja que quer fazer pautas que não são jornalísticas e jornalistas que não buscam entender os mecanismos, a forma como funciona esta estrutura social.
Falando de alguns fatos recentes, foi enfático: quando há responsabilização social, o que deve funcionar é a Justiça, que, no caso, tem que ser a mesma para quem é da Igreja, assim como para aqueles que não são.
Mas que uma marca importante para esta relação é a "responsabilidade humana e social", pois as pautas vão atrás de fatos acontecendo com gente e isto as comunidades podem ter a sensibilidade de flagrar.
Exemplificou, dizendo que o "nascimento do menino Jesus", hoje, não é notícia, mas pode se tornar se uma comunidade ou paróquia apontar para a realidade onde, de alguma forma, a sociedade está fazendo este menino renascer de uma forma mais justa e humana.
Provocações que deixaram muitos questionamentos. Nenhum que termine em paranoia, mas para ver a riqueza que pode se tornar uma caminhada onde se conheça o outro lado com o qual nos relacionamos, buscando respeito e as possibilidades mútuo entendimento.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Fonte e meios de comunicação

O Marcos Sphor (chefe do telejornalismo da TV UCPel) foi conversar, nesta quarta, pela manhã, com os alunos da Teologia. Dentro da ideia de que os estudantes se aproximassem de quem atua no dia a dia dos meios de comunicação, deu uma bela noção de como funciona uma redação de televisão, assim como a sua relação com a sociedade.Os alunos ouviram um lado que nem sempre é conhecido e onde uma instituição - como é o caso da Igreja Católica - tenta ocupar espaços para dar respostas à sociedade e nem sempre sabe o que e como se faz para utilizar a mídia como intermediação.
Além dos exemplos de vida - são muitos anos de reportagens em telejornais de ponta, somados aos recentes anos de trabalho numa tv universitária - Marcos tem a sensibilidade de olhar de diversos ângulos uma mesma realidade: não apenas mostrou o que a televisão espera, mas o que a instituição para a qual falava - igreja - poderia fazer de útil para melhorar esta relação.
Quando se ouve profissionais que estão no meio fica mais fácil de entender os mecanismos, seu funcionamento e as chances que se têm de aproveitá-los. Esste diálogo tende a ser muito proveitoso, pois desmistifica preconceitos e coloca em compasso de colaboração quem é fonte e quem atua nos meios de comunicação.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Incríveis pequenas conquistas

Quando se convive com uma pessoa idosa, são pequenos gestos que alimentam nossa esperança de dias melhores. Depois de algum tempo com muitas dificuldades físicas, juntando elementos emocionais, e tendo deixado de caminhar, pequenas vitórias alimentam nossas esperanças na recuperação de minha mãe, dona França, assim como algumas aprontadas.
Sempre tínhamos que auxiliá-la a sair da cama, passando pela mesinha de cabeceira e chegando até a cadeira da mamãe, praticamente com o uso da nossa força. Dia destes, enquanto terminava de arrumar seu almoço, ouvi barulho e, quando cheguei à porta, já tinha saído da cama e passado, sozinha, para a poltrona, com um sorriso maroto de vitória no rosto.
A alimentação tem sido muito pouca, às vezes, praticamente, nada. Quando acha que colocamos a mais, seleciona e come o que lhe agrada, junta o resto num cantinho e cobre com um lencinho de papel. Com certeza, escondido de tal forma, nem o mais competente detetive vai descobrir!
Embora as pernas não ajudem felizmente a mente continua afiada, tanto para as lembranças, que, muitas vezes, não vêm para nós, mais jovens, assim como o senso do deboche e de falar mal quando julga necessário.
Quando partilho destas experiências, vejo que o gênero humano é o mesmo, sempre. Com pequenas nuances, quem convive com idosos, sabe que eles farão algo muito parecido. Mas cada um tem as suas marcas, que acabam sensibilizando e nos convencendo de que vale a pena lutar enquanto existe ao menos um tênue resquício de vida.
Acabamos fazendo uma agenda não convencional: as aulas do dia a dia, as bancas de trabalhos de conclusão de curso, o trabalho em escolas, ainda são complementadas por atividades que tornam a rotina necessária e a capacidade de aprender contínua, em momentos de dor, em momentos de alegria, ou apenas em pequenas, mas incríveis pequenas conquistas.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Mais um ministro se foi

"Sou do tempo" já diz tudo: o quanto a gente é rodado. Mas é verdade, sou do tempo em que se aprendia de cor e salteado o nome das principais figuras da República, especialmente dos ministros. "Naquele tempo", um ministro durava o mandato de um presidente, diferente de hoje que, em menos de um ano, sete dos ministros empossados com a presidente Dilma acabaram afastados por desvio de conduta (bonito nome para o que vocês sabem o que é).
Pois, creio, é a chamada herança maldita que Dilma herdou de Lula. As quedas já eram anunciadas, mas o presidente Lula tinha um jogo de cintura próprio que o levava a empurrar com a barriga (literalmente) os problemas que desaguariam no governo seguinte.
Dilma foi "abençoada" com nomes que estavam em boca pequena nos bastidores do poder, mas que se mantinham por uma necessidade de "governabilidade" que mantém uma partilha do poder, consequentemente, de recursos destinados a cada pasta.
Em tempos de final de ano, quanto todos nós - mesmo os que não acreditam em Papai Noel - estão esperançosos de mudanças, estou fazendo campanha para que a presidente Dilma tenha coragem e audácia para mudar. Afilhada de Lula, é a hora de cortar o cordão umbical e mostrar a que veio. Uma reforma ministerial já é anunciada e, no frigir dos ovos, espera-se que levem em conta os interesses da nação e não os apadrinhamentos políticos.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Um inquietante momento de silêncio


Da série "arquivo", aos domingos apresento textos já publicados. Este é de março de 2003. Bem oportuno:
 O profissional que se pôs à minha frente parecia carregar o peso da humanidade. No entanto, tinha um problema bastante comum: cansara do discurso para o qual fora treinado. E cada vez que falava, sentia-se vazio, como quem está enganando o público para o qual está falando. E enganando muito mal, porque incapaz de convencer-se, conseqüentemente, de convencê-lo.
Nos cursos e palestras que realizo, em Comunicação Social, acabo chegando, em parceria com o grupo, a uma triste constatação: estamos empobrecendo o elemento mais importante, fundamental, do processo comunicativo: a palavra.
Repetida burocraticamente, a palavra passa a ser, apenas, dita à exaustão, desgastando seu sentido e tornando-se muito próxima de um mero ato mecânico. E este não consegue fazer com que se “descubra” (no sentido de retirar o véu que a preserva) e se possa saborear plenamente o seu sentido.
Para um determinado tipo de situação, a “fórmula” já está pronta, é chavão, e vem envolta em algum sorriso, cara compungida ou feição que nada demonstra, esperando que resulte num efeito previamente estabelecido.
Vejo que isto acontece com alguma freqüência entre aqueles que precisam utilizar o discurso religioso. A pura repetição de um ato não o transforma em rito, mas atende apenas a um suposto “tratado” com Deus: a “soma” de determinadas ações deveria resultar no “produto” esperado.
Este é um ledo engano: o rito tem seu valor em si. Não precisa de pregações alongadas, entediantes e, muitas vezes, desestruturadas, juntando elementos que vêm à cabeça do pregador, que alonga seu discurso por um único motivo: como não sabe por onde iniciou e por onde andou, também não sabe como terminar.
Triste e maltrapilho desejo! Brinquei uma ocasião, durante uma palestra, que acredito ser necessário “rezar pelo Espírito Santo” e não “rezar ao Espírito Santo”. Explico: a mesma crise de identidade no encontro do sentido das palavras faz com que se abuse do ato de pedir ao Espírito Santo para que faça uso de seus atributos. Um dos principais: a inspiração. Coitado do Espírito Santo! Um “burocrata do Senhor” que não consegue fazer ao menos a sua tarefa básica, que é a de preparar-se para a liderança, não deveria ter o direito de chegar a esta instância.
Então, qual é a solução. Para quem crê, é simples: a oração. E para quem não crê? Também é simples: o silêncio.
O silêncio precisa antecipar a palavra para poder dar-lhe substância e sentido. É assim que se evita encorpar aqueles vazios que vão ficando quando a repetição se torna rotina; o improviso, a regra; e a manipulação dos sentidos o caminho mais fácil para o fim de uma carreira de comunicador, seja ele religioso ou não.
Em cada uma das atividades, torna-se fundamental incorporar espaços de sanidade mental. São aqueles momentos em que podemos nos recolher ao silêncio e ordenar nossos conhecimentos, sentimentos e, mesmo, rezar.
O que mais impressiona é que somos capazes de elencar dezenas de argumentos para não encontrarmos estes momentos. Eles parecem supérfluos diante de rotinas pré-estabelecidas em que somos tragados pela avalanche de ações que são “urgentemente necessárias”, em nosso grupo familiar, atividade profissional, educativa ou, até mesmo, religioso.
Paciência. Conheço profissionais que enfrentaram a crise diante da palavra e entraram em desespero. Até silenciar e abrir o coração para a reflexão, a meditação e a oração, é um longo caminho, para o qual não existem fórmulas prontas. Cada qual tem que encontrar o seu. Mas ele precisa ser iniciado: com um inquietante momento de silêncio.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Uma rosa partilhada

Da série "Crônica de uma saudade":
O garoto sentou-se ao lado do rapaz:
- Dê esta rosa pra aquela moça!
Tão concentrado estava o rapaz que levou um susto quando ouviu seu pensamento na boca daquele menino.
- Que isto, garoto, me estranhando. Onde tu roubou esta rosa?
Olhar sério e reprimenda contida na voz:
- Não roubei, não, ela caiu de um monte de flores que aquele pessoal levava pra igreja.
Sem querer perder a compostura, o rapaz ainda provocou:
- Mesmo assim, porque eu iria dar uma rosa pra aquela moça?
Riso maroto, olhar de malícia:
- Porque você aí, babando! Faz tempos que não para de olhar pra ela.
Rubor adolescente de puro êxtase, baixando o olhar:
- Bobagem, eu nem ia saber o que dizer pra ela!
Cumplicidade disposta a ser parceria:
- Não diz nada, apenas entrega a rosa.
Olhar entre desconfiado e disposição para ao menos tentar:
- Tu achas?
Dez anos, olhar de absoluta certeza:
- Vai por mim.
Ambos levantaram, enquanto o menino ia embora, o rapaz chegava na moça, que sorriu, acariciou a rosa e o convidou para sentar ao seu lado. Já saindo da praça, o menino sorriu para a aragem que vinha chegando ao vilarejo e que dava uma sensação boa de aconchego e de que a vida valia a pena em pequenas coisas: até numa rosa partilhada.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Palavras


As palavras se refazem no sabor de serem partilhadas.
Dizemos “amor”, sentimos “saudade”, palmilhamos “caminhos”.
E cada uma delas parece se conter na ânsia de transbordar!
Mais do que o sentido que têm, mais do que a vontade que abarcam,
Mais do que o significado que lhes damos, está a exuberância que apontam.

Algumas delas foram vulgarizadas e já não têm o mesmo sabor.
“Amar”, significa olhar nos olhos e partilhar carinho.
“Saudade”, sentimento que se divide com uma lágrima nos olhos.
“Caminhos”, o infinito provocando que nos desacomodemos,
A um, dois, três, muitos...

Palavras: as ditas e as silenciadas.
Palavras: as que emocionam e as que decepcionam.
Palavras: insuficientes para que se diga tudo,
Mas complemento necessário para
A cumplicidade de um beijo,
A provocação de um carinho,
A ternura de um olhar.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

A lagoa e a vida

Minha irmã, Leonice, está curtindo três dias de descanso merecidos, em Pelotas. Tempo para aproveitar passeios, como o de hoje pela manhã, ao Laranjal, a nossa praia de lagoa. Apesar do friozinho fora de tempo, o visual é de revigorar qualquer neura de final de ano.
Uma caminhada pelo calçadão que está sendo revitalizado, um solzinho bom acompanhado de chimarrão, andar pela beira da água, curtindo uma lagoa sossegada, brincando com a areia, convidativa para tirar os calçados e deixar os pés relaxarem no contato com a natureza.
O Laranjal está tão perto de nós que, às vezes, não sabemos a preciosidade que temos ao nosso alcance. Alguns dias atrás, uma amiga contou que levou parentes, inclusive um menino dos seus dez anos para conhecer a praia. A criança estancou, deixou o queixo cair e murmurou: "que marzão"!
A Lagoa é feita para ver o sol nascer, para aproveitar os deleites da sombra de suas figueiras e, no final da tarde, aproveitar aquele azul esmaecendo de um por de sol ao contrário. Em qualquer momento, um tempo precioso para viver, retomar energias, aproveitar os amigos.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Tolerância zero

A expressão não é nova, caracterizou um período dos mais difíceis em Nova Iorque, quando seu governo decidiu que era hora de dar um basta à bandidagem que tomava conta das suas ruas: tolerância zero. Significava: nem os pequenos erros - muito menos os grandes - eram tolerados, sem ter a sua consequência.
Recentemente, ouvi um comentarista falando a respeito da questão de álcool e direção, na Espanha, onde qualquer transgressão é punida com cadeia. Quando a ficha caiu, os motoristas viram-se obrigados a se conscientizar e não misturar as duas coisas, baixando, impressionantemente, o número de autuações.
Pois esta semana, a Justiça Esportiva julgou o jogador Bolivar, do Internacional, e resolveu, além da pena convencional, ainda mantê-lo suspenso de jogar enquanto o jogador do Bahia que foi atingido em uma jogada intempestiva, não voltar a jogar.
Alguém chegou a comparar com a Lei de Talião, isto é, "olho por olho, dente por dente". A comparação, embora tenha sido feita de forma depreciativa, tem um quê de verdade. O que assistimos, em muitos casos, não são atitudes esportivas, mas autênticos atos de bandidagem, seguidos pelo erguer de braços, como se dissesse: "não tive nada com isto".
Muitos vão dizer que é exagero, mas se não for criada uma cultura do respeito pela integridade física do outro, muitas desculpas esfarrapadas serão dadas para aqueles que terão suas atividades profissionais suspensas por um ato impensado.
A tolerância zero tem que valer para a área política, esportiva e, mesmo, familiar: achar que um jovem pode fazer tudo o que quer porque está em fase de experimentação, está plantando um caminho quase irreversível. Então, que ao menos se tenha claro as regras, que, se forem afrontadas, reste pagar pelo que foi feito, independente do seu salário, posição social, ou proximidade familiar.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Emergir da solidão

Desculpa se não ouvi tua voz.
Estava mergulhado em meus pensamentos,
afundado em minha dor.
Fizeste-me emergir da solidão
buscando um novo sentido em tua companhia.

Não me deixes.
Posso voltar ao meu silêncio,
mas agora sei que não estarei mais sozinho,
tenho sempre, na tua voz, a esperança de um norte
que me faça voltar para ti.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Traçando o próprio destino


A imagem era patética e, com certeza, não iria dar em boa coisa: primeiro os adolescentes encontraram um sulco na pedra onde colocaram gasolina e fogo, passando de skate por cima. Cansaram e resolveram encharcar também as pernas de um deles com combustível e acender fogo sobre a pedra. Não deu outra, o fogo subiu pelas calças e embora o garoto tentasse de tudo e gritasse “meu Deus, meu Deus”, somente quando caiu e os outros destroçaram a calça foi que conseguiu se safar, com as pernas queimadas.
As igrejas cristãs não acreditam em destino, ao menos não neste que se lêem nas cartas ou se anuncia em horóscopos ou mapas astrais. Acreditam que o próprio homem faz o seu destino, com uma série de fatores que poderiam ser elencados desde a busca por qualidade de vida – alimentação, exercícios físicos e mentais, bons relacionamentos, mas também de encaminhamento da vida, pois o que plantamos em nossa juventude e como adultos, vamos colher em nossa velhice.
Claro que, muitas vezes, temos consciência que estamos plantando o pior – especialmente nos vícios socialmente aceitos, como álcool e fumo – mas há uma dificuldade grande em reverter este caminho. Então, olhamos para o destino que traçamos com a certeza de que, mais cedo ou mais tarde, acabaremos pagando um preço.
O garoto que procurava adrenalina colocando combustível no chão e nas próprias calças sabia que o acidente era possível. Correu o risco e perdeu. Tomara que a ardência de alguns dias e as marcas que possivelmente ficarão para toda a vida sirvam ao menos de lição. Sempre acreditei que para se aprender não basta ouvir conselhos, em uma ou outra ocasião é preciso bater com a própria cabeça para aprender. Certamente isto também dói na gente quando acompanhamos o processo, porque também aprendemos da forma mais difícil. Este garoto não está apenas aprendendo que não se chama por Deus irresponsavelmente, mas, de alguma forma, está traçando o próprio destino.

domingo, 27 de novembro de 2011

É possível cansar de Deus?

Da série "arquivo", aos domingos apresento textos já publicados. Este é de 10 de dezembro de 2003. Bem oportuno:
Durante muito tempo, tive dificuldade de ouvir, confesso, sem bocejar, uma das mais belas canções: Noite Feliz. Como um burocrata do Senhor, fui ouvindo, repetidamente, a música e a letra. O sentido e o sentimento foram se perdendo, até restar, apenas, um tema de um determinado período do ano, incluído na liturgia.
Ouvir a interpretação do Coral da UFPel, na Catedral do Redentor, foi um sinal de que precisava retomar certos valores, não apenas por eles mesmos, mas por todo o sentido que têm, no envolvimento com as pessoas e a própria comunidade.
Minha desculpa sempre foi no sentido de que o Natal é por demais comercializado e que, da lembrança do Menino, muito pouco, ou quase nada, restou. E ficava apenas um momento triste, uma espécie de deserto espiritual. Era preciso fazer alguma coisa.
Lembrei-me, então, do seu Chico Silva, da antiga Loja A Principal, que perdeu um filho e ia para o trabalho passando as contas de seu terço. E quando não conseguia rezar o pai-nosso, as ave-marias e o glória ao Pai, porque as lágrimas eram mais fortes, conseguia cantarolar uma música: “segura na mão de Deus e vai...”
Este não é o tempo mais fácil. Embora todas as luzes e festas, muitos são aqueles que se deixam vencer pela depressão, o medo de se lançar em uma nova jornada, a frustração por ainda não ter conseguido tudo o que projetou. E, então, é possível cansar de Deus.
Fácil se torna culpá-lo, por tudo o que não conseguimos fazer. “É, Deus bem que poderia ter dado uma força. Não deu. Então paciência”. A fadiga de Deus. Do deus que fizemos à nossa imagem e semelhança. Incapazes de reconhecer nossas limitações e de buscar nossa realização dentro do potencial que temos, não do que desejaríamos ter, ficamos frustrados com o que não veio, esquecendo do muito que a vida já nos deu. Nos dá. E, com certeza, nos dará.
Outros passam a ser os valores. “Negociamos com Deus”. Não deu certo. Hora de encontrarmos outros deuses. Este é um caminho perigoso. Cansados de Deus (ou de nós mesmos?), arrumamos qualquer desculpa para nos negarmos ao silêncio – a única forma de, mesmo num deserto espiritual, voltarmos a vislumbrar a luz.
Pois este é o momento em que se lembra o nascimento do Menino: feche os olhos e ouça seu primeiro choro; os primeiros balbucios, ainda nos braços de Maria. E veja que ele cresce, sob o olhar carinhoso dos pais, até estar preparado para a sua missão.
Você pode – e com razão – dizer que nada disso é com você. Então, você é um privilegiado. Porque uma fé é construída superando dúvidas, aceitando momentos em que as tormentas parecem ser o único horizonte. Superadas estas, ninguém garante que outras dúvidas e outras tempestades não existirão.
Faz parte da doce aventura humana. Nossa realização está em superarmos cada obstáculo: sensibilizados pela fé, Deus se torna novo a cada momento; provocado pelo outro, não há como ter uma visão burocrata da vida, somos desacomodados pelo sentido do existir; e o deserto volta a florir, quando uma chuva de vida passa pelos olhos daqueles que abraçamos neste tempo e que oferecem amor, amizade, parceria. Mas também pedem conforto, solidariedade, carinho.
Feliz Dia do Nascimento do Menino. Esta é a maior bênção deste tempo. Deus lutando para que nos despojemos de tudo, abertos apenas para Ele. Já que, conseqüentemente, também abertos para o mundo. Cansado, é possível. Mas não de Deus.

sábado, 26 de novembro de 2011

O pão com torresmo


Da série "Crônica de uma saudade":
A senhora mostrou dificuldade de continuar andando. O menino percebeu que havia parado e dirigiu-se a ela, boné na mão, jeito sem jeito de falar com um adulto:
- A senhora quer ajuda?
Olhar desconfiado, frio e inseguro:
- Não precisa, minha casa é na outra quadra.
Distância segura, mesmo jeito de quem apenas quer ajudar:
- Deixe que eu a ajude.
- Não vais querer me ajudar, não tenho dinheiro pra te dar.
O olhar foi de sorrateiro a brejeiro:
- Não tem importância.
Andaram juntos por uma quadra, ele carregando a bolsa com as duas mãos. Na porta, a mulher olhou para o menino já com um jeito diferente.
- Realmente, não tenho dinheiro, mas espera aqui.
Depois de algum tempo, voltou para a calçada e entregou algo embrulhado num papel toalha. Foi a vez do garoto olhar desconfiado:
- O que é isto?
Um sorriso aberto iluminando cada uma das dobras de um rosto marcado pelo tempo:
- Pão, pão com torresminho. Fiz hoje pela manhã, tá fresquinho.
O garoto agradeceu e foi em direção da praça. Ali sentou e descobriu um dos lados do pacote, deixando aparecer uma beirada de pão com uma casquinha torrada e um miolo absolutamente tenro.
Mordeu com o respeito de quem pratica um ritual religioso. Olhou em direção à casa da idosa, que, da porta, sorriu e acenou em retribuição. Fizera o que sua mãe sempre lhe dissera que fizesse – ajudar aos outros – e ainda ganhara aquela maravilha! Fechou os olhos e suspirou satisfeito.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O arrogante discurso da simplicidade


A revista Isto É desta semana traz a entrevista do acupunturista Gu Hanghu, que já tratou de diversas figuras da República, em Brasília, entre eles o ex-presidente Lula, assim como a presidente Dilma Rousseff. Simples, falou a respeito do que faz, do que não pode fazer e dos seus sonhos com a profissão que reverencia como se religião fosse.
Em diversos momentos, o entrevistador queria colocar um “pega ratão” (gíria para aquelas perguntas maliciosas que fogem ao assunto focado), mas, com toda a “finesse”, voltava ao tema para o qual tinha concedido a entrevista.
Um homem profundamente conhecedor do seu “metier”, que revelou não cobrar nada da presidente e do ex-presidente, inclusive se deslocando até o Palácio por conta própria, porque achava que era uma contribuição que dava ao país: se a sua liderança maior pudesse relaxar e atuar de forma menos estressada, também estaria contribuído, num tributo à cidadania.
Depois disto, fui até um centro que atende pessoas carentes. Fiquei preocupado com a forma de atuação de algumas pessoas: desatentas, mal informadas, sonegando informações, tratando as pessoas como se estivessem fazendo um imenso favor. Pena, embora falem de simplicidade nos seus discursos, não sabem atender aos simples com o direito que têm.
Confesso que me preocupa quando figuras religiosas se caracterizam como simples e humildes. Um marketing perigoso que, nem sempre, corresponde à realidade: o discurso é vazio e não diz aquilo que é a realidade.
A simplicidade não é uma espécie de vestimenta, mas um estilo de vida. Não significa maior ou menor gasto de dinheiro, mas um comportamento que esquece os primeiros lugares para estar com aqueles que são considerados marginalizados: não se faz diferente, vivendo com eles, mas sabe que este é um caminho a trilhar, com muitos tropeços, mas que exige, sempre, coerência. A não ser assim, esqueça de todo o resto, porque vai parecer que é, apenas, um arrogante discurso da simplicidade.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A responsabilidade social de contestar

Os professores ligados ao Estado do Rio Grande do Sul resolveram em assembléia entrar em greve pelo piso salarial da categoria, com outras reivindicações em segundo plano. Contestar é um direito de qualquer categoria, mas também tem que se ver a forma de fazê-lo e, se peitando o "patrão", não acaba sobrando para a parte mais fraca que, neste caso, é o aluno.
Esta greve é uma greve política (óbvio, toda a atividade humana é política), tentando delimitar forças para futuras negociações, mesmo que o governo que hoje ocupa o Palácio Piratini seja o mais próximo possível do espectro ideológico da direção do Centro dos Professores.
Sei que toda a comparação é manca, mas a greve, neste momento, causando tanto prejuízos a todos, menos ao governo, parece com o caso da babá que pede aumento de salário, não consegue, e passa a descuidar da criança sobre a qual tem responsabilidade.
Porque não encontrar novas formas de contestação? Recentemente, duas categorias o fizeram. Os professores da rede privada fizeram uma "greve" no domingo! Queriam mostrar que a carga de trabalho fora da sala de aula é muito alta e que merece atenção. Também a brigada teve manifestações criminosas em que pneus foram queimados, bonecos foram espalhados e até artefatos explosivos estiveram em lugares próximos à sede do governo. Uma, criativa, a outra, de forma bandida, mas diferentes.
Somente no Brasil, dizemos que uma lei não pegou. Também, aqui, temos uma greve furada. Embora o ponto seja cortado para quem fez greve, o gosto de derrota fica para a sociedade que escuta discursos inflamados e "bem intencionados", mas acaba, literalmente, pagando a conta.

domingo, 20 de novembro de 2011

As pegadas de Nossa Senhora

Da série "arquivo", aos domingos vou apresentar textos já publicados. Este é de 12 de novembro de 2003.


Hoje já estamos a uma distância histórica bastante significativa. Em tese, permitiria fazer uma avaliação “mais científica” possível. Mas não é o que acontece na realidade. Cada vez que alguém relembra uma das aparições de Nossa Senhora deixa que seu coração ocupe o lugar da razão e que a emoção diga, não o que viu, mas muito mais o que sentiu naquele momento.

É o pensamento que tenho quando ouço do Túlio Oliver a lembrança do que sua avó contava, agraciando filhos e netos com suas histórias a respeito do que aconteceu em Fátima (Portugal), onde três pequenos pastores viram Nossa Senhora, que lhes contou segredos futuros e, até hoje, mexem com a fantasia e o imaginário das pessoas.

Mas, sabendo que apenas os três pastores viram Maria aparecer sobre os arbustos, então, o que atraiu uma multidão para aquele lugar?

Um detalhe simples e emocionante: embora as pessoas não pudessem ver o que Lúcia, Francisco e Jacinta viam, quando anunciavam: “Ela está chegando!”, um silêncio absoluto tomava conta das milhares de almas que haviam acorrido em busca de uma bênção, de algum consolo por parte da Mãe do Senhor. E, no silêncio, podiam ver que os arbustos afundavam no lugar em que deveriam estar os pés encantados da Senhora.

Esta imagem, de que os arbustos cediam ficou para sempre no coração daquela avó, que desejou passar – e emocionar – netos e filhos com a certeza de que, de Deus, nem tudo é para ser visto. Muito é para ser sentido. É o sentimento que se tem quando, num abraço de despedida, as palavras faltam e um aperto maior diz o não dito: “estou aqui, ao teu lado”. Mulher que silenciosamente acompanhou o filho até vê-lo suspenso na cruz, entre o céu e a terra, numa muda oração.

É algo parecido com o que vemos, hoje, acontecer com o papa João Paulo II. O polonês que mostrou ao mundo disposição para fazer a Igreja reencontrar com seu povo. Tornou-se grande motivador para um novo ânimo, especialmente através do seu exemplo, já que incansável na defesa dos mais pobres e das grandes causas da humanidade.

Tendo cumprido sua missão, marcando a terra como o Papa da Paz, sente-se como alguém que, tendo “lutado o bom combate”, encontra-se na hora de ter a graça de ver o que viram os três pastores. E seguir as pegadas de Nossa Senhora.

sábado, 19 de novembro de 2011

Uma nova aventura

Da série, "Crônica de uma saudade", que pretendo apresentar todos os sábados:


Era apenas uma bicicleta velha encostada num poste, em frente a uma ferragem, deixada por um senhor moreno, já idoso. O garoto, calças curtas, boné jogado de lado, mãos nos bolsos, aproximou-se furtivamente. Espiou para todos os lados possíveis e, não vendo ninguém, tirou-a do lugar, montou e saiu.

Tive vontade de gritar: “ladrão”, mas um sexto sentido me disse para não fazê-lo. Olhar feliz, rosto empinado para o sol, jeito matreiro e realizado, meio atrapalhado pelo peso, custou a se acostumar. Mas, depois, foi só correr para o abraço.

Da minha janela, pude vê-lo circular em torno da praça, em alguns momentos com os braços jogados para o céu, puro prazer e satisfação. Completou duas voltas, sem que ninguém o percebesse. Então, voltou ao lugar de partida e, no mesmo poste, deixou a parceira de alguns minutos.

Saiu andando pela rua, novamente com as mãos nos bolsos, mas agora não estava mais tenso como quando chegou. Havia uma aura de felicidade e um jeito de menino realizado, capaz de concretizar um sonho e de alimentar a esperança de que, amanhã, de novo, a bicicleta estivesse no mesmo lugar, para uma nova aventura.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

O Jasmim por meus olhos

Um botão de Jasmim está se abrindo.
Por enquanto, é apenas promessa.
Faz-se de rogado e vai estufando o peito,
como quem diz: "me espera"!
Eu só posso contemplá-lo, todos os dias,
e sonhar com o momento em que seu perfume
Vai inebriar o pátio, invadir a casa
e se instalar nos meus sentidos.
Enquanto um se abre, outros acabam se formando,
e a vida segue o ritual da Primavera:
se renova, se refaz, se pronuncia.
Não basta dizer que é uma nova estação,
é preciso sentir que a vida pulsa,
que existem novos cheiros no ar,
que há um sentido diferente inebriando o meu olhar.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Lula e Marisa

A imagem que se destaca nos jornais de hoje é a do ex-presidente Lula, em tratamento para combater um câncer, agora sem barba e sem cabelo. Para refrescar a memória, algumas fotos mostram Lula ainda em tempo de sindicalista, com cabelo e barba desgrenhados; já presidente, com um tratamento adequado para a liturgia do cargo; e, agora, a imagem da preocupação com a saúde, tentando vencer uma etapa difícil da vida.
Se para um comum mortal já é difícil superar a dificuldade de perder os cabelos, muito mais difícil para uma figura pública - mesmo que diga o contrário - pois faz parte da indumentária com a qual foi vendida uma imagem.
Uma queda sempre anunciada nesta fase do tratamento, acaba sendo difícil, quando não traumática, pois altera até mesmo aquilo que dá uma certa estabilidade ao olhar para o espelho: a própria imagem. Não é mais a mesma, embora se busque em perucas ou bones uma compensação para aquele figura que, em muitos casos, acaba ficando patética.
Muitos podem dizer que não têm estas vaidades. Têm, sim. Se não a vaidade em excesso, as pequenas vaidades de alguns fios de cabelo que escondem um defeito de orelhas; a tentativa de puxar outros fios sobre o nascedouro de uma careca; ou um corte de cabelo que disfarce as tão malfadadas entradas.
Uma imagem pode ser apenas uma imagem. Mas também pode fazer parte de um todo, onde um acompanhamento médico e afetivo podem fazer a grande diferença. Mais do que um Lula sem cabelos e barba, o que fica é o carinho de sua esposa, dona Marisa, que, neste momento difícil, não deixou que outros cumprissem esta tarefa tão espinhosa: unidos na vida e na morte, preferiu ela mesma fazer do corte de cabelo um belo gesto de amor à vida, que ela compartilha há tanto tempo.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

De onde vem a República

Quarta-feira com cara de segunda, depois do feriado da Proclamação da República. Quem conhece a História e se aventura por ela sabe que, como sempre, no Brasil, as coisas nunca acontecem com princípio, meio e fim. Ao que tudo indica, embora os militares e a Maçonaria estivessem tramando a queda do império há muito tempo, havia uma certa estima por Dom Pedro II, um tipo interessante intelectualmente, simpático à população.
Nossa República começou a nascer em 1808, quando a família imperial foi corrida por Napoleão de Portugal e teve que vir para o Brasil. Só então, diferente dos demais países colonizados por espanhóis, tivemos a presença da cultura e de uma política que não fosse apenas estrativista.
Sempre tivemos uma certa tolerância aos desmandos de nossas autoridades, que não vêm de hoje, chegou com dom João VI, passando pelos dom Pedros e chegando ao Lula... Mas esta já é outra história. Para quem interessar possa, aconselho que leia 1808, de Laurentino Gomes. Uma leitura divertida, mesclada por curiosidades e fatos que os livros de História, de alguma forma, esqueceram.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Vinícius

Dia de viver uma saudade. No mesmo dia em que minha mana Leonice completa aniversário, também marca o dia em que o Vinícius partiu. 14 anos, cheio de energia, deixou Pelotas para ir com a família para a Serra. Não chegou a Porto Alegre. Um acidente vitimou a ele e a seu irmão Cássio.
Cerca de 20 anos depois, ainda dá um sentimento de frustração, pois ele havia se desentendido com seu pai e disse que ficaria na minha casa. Na véspera me ligou para dizer que tudo estava bem e que iria junto. "Mas que voltaria, nem que fosse em minhas lembranças".
Foi o que nos restou. Nunca tive grandes problemas com a morte. Já convivi com ela quando partiram meus irmãos - Loci e Cláudio - assim como meu pai. Mas a partida do Vinícius deixou um vázio muito grande pelo jeito carinhoso como o adolescente me tratava, ouvindo e sendo ouvido, compartilhando cada coisa nova que a vida lhe oferecia. Era tanta coisa que se lhe apresentava que a vida era um turbilhão de emoções que... um dia ... teve fim prematuramente.
Muitos e muitos anos se passaram, mas a sensação é frustrante de um quase filho ter partido quando havia tanto ainda a ser compartilhado. Nas fotos, nos objetos, nas trocas de saudades com sua mãe, a Jânea, ficou a marca que não se apaga: seu sorriso fácil, seu riso sedutor, seu olhar envolvente não desapareceram, persistem em dizer que a vida continua e que ele fez, faz e sempre fará parte do nosso existir.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Marketing de segurança

Os bolsões de miséria que se tornaram reféns da bandidagem pelo Brasil não são tão incomuns quanto se idealiza imaginar. A retomada da Rochinha – no Rio – é um exemplo do que já poderia ter acontecido e não aconteceu, pela omissão das autoridades públicas. No entanto, o momento, preparatório a dois eventos de nível internacional – Copa do Mundo e Olimpíadas – desencadeou a união de diversas forças policiais para fazerem o que já poderiam e deveriam ter feito.
Em todas as grandes e médias cidades existem problemas semelhantes, com a restrição da entrada de policiamento em determinados horários. A ocupação, com a retomada da segurança, é um dever de quem faz – polícias em todas as instâncias – e um direito daqueles que vivem aos sobressaltos, por não saber se penam mais nas mãos dos bandidos ou da polícia. Imagens de congraçamento entre população e força militar podem ser interessantes para marketing, mas não correspondem à realidade: há um longo caminho a ser percorrido para recuperar um histórico de omissão, ausência e abuso de autoridade, onde vileiros e negros são considerados, em princípio, possíveis delinquentes, até que se prove em contrário.
Uma “autoridade” ouviu uma pesquisa de que mais de 90% da população se sentia sem segurança, contra menos de 10% que se afirmavam seguras. Resolveu dizer uma pérola: “segurança é uma sensação pessoal”. Impressionante! Toda uma quadra que coloca grades, sobrepostas de arame farpado e mais cerca eletrificada, está tendo uma sensação pessoal de segurança!? Os sociólogos têm sido muito claros em afirmar que não basta levar a segurança às diversas comunidades periféricas. Depois disto, é preciso que se confirme outros direitos: saúde, educação, lazer...
Ninguém é contra que se comece a fazer a preparação para eventos esportivos por um “marketing da segurança”. Mas quem sabe estes investimentos possam ser preparados de tal forma que os outros direitos também possam ser respeitado. Mais do que um discurso, a população possa usufruir das sobras destes investimentos tendo um mínimo necessário para retomar a sua dignidade.

domingo, 13 de novembro de 2011

Cúmplice de Deus

Nos últimos encontros com pessoas que me pedem palestra, tenho abordado o que chamou de "Evangelho da Mãe", o livro de São Lucas. Deixo minha imaginação voar e tento entender a forma como construiu um Evangelho tão bonito, com tantos detalhes que somente uma mãe poderia ter a respeito de um filho.
Se é verdade que Jesus passou três anos em pregação, também é verdade que Ele se preparou durante 30 anos! 30 anos bem vividos, junto de uma mãe que tinha na educação e na formação do caráter a sua maior preocupação. Fazendo uma leitura a partir de Augusto Cury, encanta olhar a figura histórica de Jesus, que deve ter passeado ao lado de Nossa Senhora, onde aprende a "olhar os lírios dos campos", ver como ceifavam o trigo, admirar as figueiras, entender como a Natureza dava condições de vida aos animais. Passeios longos, cheios de silêncios contemplativos, de perguntas respondidas, de cumplicidades que respingam por algumas páginas do Evangelho.
Maria era o sinal maior de que o Mistério havia acontecido em suas vidas e devia ensinar: se não fizeres uma experiência de fé diante do Mistério, você vai se frustrar e ser alguém frustrante. A fruta nunca cai muito longe do pé e se a mãe foi capaz de assumir sua missão histórica, o filho, que também era de natureza humana, também não podia frustrar a sua natureza divina.
Jesus somente frustrou àqueles que entendiam a História apenas pela metade. Aprendeu com aquilo que uma educadora do povo podia lhe dar de conhecimento, viveu num momento difícil para uma sociedade cansada pela opressão de Roma, morreu com a esperança de alimentar uma nova visão de Mundo, onde ao invés de Javé, um deus autoridade, passava a valer o Pai, o Deus da ternura e do perdão.
Maria já em idade avençada, deve ter sentado à sombra de uma árvore, com Lucas ao seu lado, em finais de tarde, e contado aquilo que seu coração guardou. Muitos momentos de silêncios, instantes de comoção e o sentimento de que partilhou de algo que nenhum outros ser humano partilhou: não escolheu o seu Deus, mas soube ser cúmplice dele, como ninguém o foi em nenhum outro momento da História.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Uma fezinha na vida

Os números sempre mexeram com as pessoas. Dificilmente encontramos alguém que não tenha um "número de sorte", ou ao menos, um número com o qual "simpatiza". Foi do que lembrei quando começaram a dizer que havia um cruzamento astral interessante pois hoje - 11/11/11 - também teria às 11h11min.
Claro que no próximo ano teremos 12/12/12 - com o horário das 12h12min. Mas é diferente. Os números ímpares são mais atrativos, têm algo de poderoso, quase mágico.
No meu caso, gosto muito dos números 3, 12 e 21. Três, por significar a comunidade perfeita - a Trindade; 12, o número escolhido para serem os acompanhantes de Jesus - 1+2: 3; e o 21 por ser uma espécie de comunidade que criei nos livros "Que seja em nome de Deus" e "Nos Braços do Eterno Descanso" - faltando ainda um para completar a trilogia que só ainda não foi concluído por... relaxamento! (2+1: 3).
Os números acompanham a história, inclusive no jogo do bicho. Quando era criança, meu pai se ofereceu para fazer um jogo para mim. Disse a relação dos bichos e eu escolhi o cachorro. No final da tarde, o bicheiro chegou com o dinheiro que eu tinha ganho, todo feliz, pensando que estaria fazendo uma criança feliz. Fiz a cara maior surpresa possível: eu não queria dinheiro, queria o meu cachorro!
Os números são como muitos dos fetiches que juntamos na vida. Em muitos casos, são que nem as pílulas de placebo (sem nenhum elemento químico a não ser farinha), mas nas quais acreditamos e surtem, de alguma forma, efeito. Se os números não são mágicos, que a vida o seja e faça valer a pena, até, fazer uma fezinha no jogo do bicho!

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Voltarás a viver

Uma discussão sempre difícil diz respeito à doação de órgãos. Segui o exemplo do meu pai, que foi um dos primeiros a registrar na carteira de identidade que era doador. Infelizmente, pelo avançado da idade e da doença, não podia se aproveitar os seus órgãos. Também tenho em minha carteira o selo da ADOTE, uma organização de Pelotas para o Mundo em defesa de que não se perca a possibilidade da vida continuar numa outra pessoa.
Mas a conversa em um grupo era a respeito de um rapaz conhecido que sofreu um acidente de moto e que estava em morte cerebral. Se não seria o caso de se alertar para a possibilidade de doação. Uma pessoa, em seguida, disse que não queria ver seus órgãos doados. Mas, refletindo, afirmou que se fosse para auxiliar alguém próximo até que não se oporia, como tem acontecido de familiares doarem um rim e continuarem sua vida normal, também permitido a quem recebeu uma nova vida.
Creio que o mais difícil deste momento é exatamente isto: o momento. Embora todas as crenças e lendas, a maior parte da população já tem alguma consciência do bem que uma doação pode fazer. Acontece que o momento tem todo um significado emocional, difícil de ser superado. Ver um pai ou uma mãe enterrar um filho é contrário à natureza, portanto compreensível que estejam aturdidos, desorientados e incapazes de tomar uma decisão.
Creio que, mais do que os técnicos da área médica, aí está o momento dos familiares e amigos assumirem a dura missão de convencer da doação. Assistindo às matérias que tentam motivar para que isto ocorra, a impressão que fica é de que aquele que aguarda vive em constante agonia, somente querendo o direito de viver a própria vida, desligado de máquinas ou de tratamentos mais prolongados. Quer ver, no horizonte, apenas a esperança de voltar à sua rotina de vida, com um órgão que, de outra forma, será desperdiçado e seguirá o princípio bíblico: "voltarás ao pó". Talvez a própria Bíblia reescrevesse este princípio, de um novo jeito e num novo tempo, defendendo a doação de órgãos: "voltarás a viver!"

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Brincando

Brincando com os dedos que percorrem a areia.
Brincando com o olhar que se distrai no horizonte.
Brincando com o suspiro que teima em sair de meu peito.

Brincando com a Primavera que traz novos cheiros.
Brincando com a terra que se revela em novos frutos.
Brincando com a Natureza que sacode o Inverno e se renova.

Brincando com a vida que se refaz e se entrega.
Brincando com Deus que acalenta tantas esperanças.
Brincando com quem está ao meu lado e dá sentido a cada um dos momentos que vivo.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Que droga é a droga!

A manchete de Zero Hora da segunda-feira - 07 de novembro - era o número assustador de municípios aonde o Crack já chegou. Esta droga superou o consumo das demais e faz um rastro de estragos em todos os meios, não deixando escapar desde crianças - especialmente aquelas que estão em situação de risco - até pessoas idosas, com problemas financeiros ou afetivos.
Mas me impressionou um relato que ouvi numa roda de como tinha sido divertido terem dado, durante um almoço de final de semana, um copo de cerveja para uma criança de 9 anos. Havia ficado muito "engraçadinho". Não achei graça nenhuma na história. Infelizmente, muitos de nós já tem problemas no convívio com as chamadas drogas legais - álcool e cigarro, por exemplo - e não nos damos conta de que somos parâmetro e referência para as crianças e jovens. Embora sempre se ache que sabemos quando parar, o mesmo não acontece com a criança que começa cedo a ingerir bebida alcoólica ou a fumar.
Estamos em tempo de dar exemplo. Não adianta querer, depois, acabar com o mal. É muito mais difícil. O melhor, mesmo, é prevenir. Quanto mais distante deixarmos crianças e jovens desta possibilidade, mais chances terão de não ter problemas no futuro.
Afinal, não há expressão mais dolorosa no rosto de uma criança de rua, que fuma uma droga, do que um olhar que não tem esperança e que não vê futuro. Vamos cultivar, então, uma vida diferente para nossos filhos e, se não conseguimos nos afastar das drogas lícitas, ao menos que tenhamos o juízo de afastá-las deles.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Amigo é coisa pra se guardar...

História já conhecida. Mas as grandes verdades valem a pena serem repetidas. Enviada pela mana Leonice.
 Um filho pergunta à mãe:  - Mãe, posso ir ao hospital ver meu amigo? Ele está doente! - Claro, mas o que ele tem?
 
O filho, com a cabeça baixa, diz:  - Tumor no cérebro.   

A mãe,  furiosa, diz: -E você  quer ir lá, para quê? Vê-lo morrer? 
O filho lhe dá as costas e vai...  
Horas depois ele volta vermelho de tanto chorar, dizendo:  
- Ai mãe, foi tão horrível, ele morreu na minha frente! 
A mãe, com raiva:  
- E agora?! Tá feliz?! Valeu a pena ter visto aquela cena?! 
Uma última lágrima cai de seus olhos e, acompanhado de um sorriso, ele diz: 
- Muito, pois cheguei a tempo de vê-lo sorrir e dizer: 
'- EU TINHA CERTEZA QUE VOCÊ VIRIA!'  
Moral da história: a amizade não se resume só em horas  boas, alegria e festa. Amigo é para todas as horas, boas ou ruins, tristes ou alegres. 
CONSERVEM SEUS AMIGOS(a)! PERDOE QUANDO PRECISAR, SEJA FELIZ AO LADO DELES PORQUE O VALOR QUE ELES TÊM NÃO TEM PREÇO...