domingo, 29 de novembro de 2020

Natal e ano novo: para não perder a fé e a esperança


As comemorações das festas de final de ano, desta vez, serão atípicas. A situação financeira, pessoas infectadas e mortas, preocupação com o que pode acontecer deixam marcas de angústia que precisam ser vivida com aquilo que ainda nos resta da fé... Nós, cristãos, somos especialistas em esperança. Toda a vez que alguém diz que está enviando energia positiva para ajudar a curar feridas, retribui-se com o que se tem de melhor: a confiança em Deus que coloca um patamar diferente na capacidade de viver a própria esperança!

O Natal e a virada de ano são tempos para serem vividos como aqueles em que se diz: são difíceis, alguns ficaram pelo caminho, viveram-se momentos em que não se sentia e sequer se achava que houvesse uma luz no caminho... A resposta tem que estar na capacidade de cada um de não esperar pelo outro para fazer a sua parte. As próprias fragilidades, muitas vezes, comparadas com as do outro são insignificantes e mostram, apenas, que não se conseguiu deixar de orbitar em torno do próprio umbigo... 

A voz alegre do outro lado quando se faz chamada de surpresa é recompensa pelas vezes que se pensou em ligar mas achou que não se conseguiria falar... a mensagem enviada para saber se tudo estava bem é respondida rapidamente, parecendo que o outro estava ao lado, temeroso, mas esperançoso de que se teclasse e acolhesse nas poucas e simples palavras com seus erros e abreviações... A conferência reúne quem amamos e fazem falta, com sorrisos, brincadeiras e o carinho de que tanto se precisa.

A amiga que preparou a casa para o Natal contou que foi colocando cada coisa no lugar com uma oração e precisando tornar o coração mais leve... Ao montar a árvore, lembrou da explicação do pastor, sobre Martinho Lutero. Passeava à noite no inverno pela floresta e ficou encantado com a beleza dos pinheiros cobertos de neve, ornados com a luz das estrelas. Voltou para casa e quis repartir com a família o encantamento que tinha presenciado. Estava surgindo, ali, uma das mais belas tradições cristãs.

Na porta, colocou a guirlanda, que, lhe contaram, surgiu em Roma. Acreditavam que presentear alguém com ramo de planta trazia saúde, motivo pelo qual enrolavam diversos galhos, desejando que a família se mantivesse unida e ficasse bem. A Guirlanda de Natal também representava o desejo de sorte, e, pendurada na porta, é vista como um convite para que se viva o espírito natalino, que, se espera, já esteja presente naquela casa. Este ano que sua família estaria longe, precisaria mais do que nunca de que seu coração estivesse vacinado - e protegido - pelo espírito natalino...

Faltava montar o presépio. Sempre fizera aquilo com os filhos e netos... Uma amiga católica lhe dissera que era uma lembrança de São Francisco de Assis que fez o primeiro para mostrar a beleza da cena ao povo. Pediu ajuda para a vizinha e os filhos. Brincando e conversando, o tempo passou e a representação do nascimento de Jesus ficou pronta: houve um silêncio diante das pequenas imagens e luzinhas. A mão da menina que segurou a sua garantia: pode até ser um Natal e Ano Novo difíceis, mesmo assim, haverá de ser o desejo de que não se perca a fé e a esperança e se consiga ter um abençoado recomeçar em 2021!

terça-feira, 24 de novembro de 2020

E depois da segunda-feira?


Não há como fugir de comentar as eleições do próximo fim de semana. Dizer que elas estão polarizadas é repetir o óbvio porque restaram dois candidatos que, em tese, se identificam com a esquerda e com a centro-direita. Dos números que surgiram da boca das urnas ficou claro o que também já se havia dito: não era e não é hora para eleições, porque a população acabou demonstrando todo o seu desinteresse quando, entre nulos, brancos e ausentes, o "candidato" somou votos suficientes para chegar em segundo lugar!

A pandemia do coronavírus encontrou uma população ausente das questões políticas e aumentou a sensação de que continua sem prestar atenção ao processo eleitoral, que deveria ser o grande momento da discussão das questões locais, pautando candidatos que dessem respostas razoáveis e factíveis. Os discursos na televisão e no rádio, assim como a praga dos santinhos espalhados pelas ruas, mostrou que os políticos e seus partidos apontam para o que sabem que não vão cumprir e se vota neles sabendo que não cumprirão o que prometem.

O problema real é: "e depois da segunda-feira?" Ainda cedo da noite de domingo se terá o resultado das eleições e, não importando qual dos dois se eleger, tudo aquilo que apresentaram terá que enfrentar a realidade. E se esta realidade já era difícil antes da pandemia, vai se tornar ainda mais agora que muitos salários diminuiram, pessoas ficaram desempregadas, não haverá 13% para aposentados e o 13% do trabalhador virá minguado pelos descontos dos acertos de tempos parados e adequação das jornadas de trabalho.

A expectativa de terminar o ano com recursos minguados aponta para o próximo ainda com "as abóboras se acomodando com o andar da carroça". A segunda onda do coronavírus no hemisfério norte dá a dimensão de que esta "gripezinha" tem uma capacidade de resistência que não será debelada com a primeira vacina. Necessária, mas que não pode ser vista como a cura para todos os males, mas, sim, como um primeiro instrumento de combate a um vírus mutante.

Brinco com amigos que não me cadastrei ainda no Pix (sistema de transferência e de pagamentos bancários), assim como não pretendo entrar na primeira leva da vacinação. Por um simples motivo: ambos são insipientes e em fase de testes, havendo a necessidade de que sejam aperfeiçoados, assim como foram tantos outros sistemas e vacinas. Foi o caso da chamada "vacina dos velhos" que levou muito tempo para perder a desconfiança, mas, hoje, grande parte já incluiu na sua agenda anual, fazendo parte do cotidiano.

Não é comum um milagre na economia, assim como não é comum um milagre na medicina. Os experimentos precisando que os cientistas tenham espaço, financiamento e tempo para encontrar resultados. Vamos ter atendimento emergencial para quem trabalha na saúde, grupos de risco e circula mais. Para os demais, resta pedir bom senso: achar-se imune, colocar outros em risco, transmitir falsas esperanças são sinais de que há virus tão ou pior que o "corona": aquele que te impede de usar a máscara... e também o cérebro!

domingo, 22 de novembro de 2020

O detalhe entre um triste Natal e um Feliz Natal!

No próximo domingo, 29, além das eleições em segundo turno para muitos municípios, as religiões cristãs marcam o início do período natalino, quando, por quatro fins de semana, faz-se memória e preparação para o nascimento de Jesus Cristo. Tempo de ornamentar a casa, montar a árvore de Natal, colocar à porta uma guirlanda, que represente a renovação, e a contagem regressiva, acendendo as velas na coroa do Advento. Em tempos bicudos, o comércio já faz as suas campanhas, certo de que o Papai Noel, este ano, se vier, vai estar com os bolsos bem mais vazios...

O chamado "espírito de Natal" é contado em livros, filmes, páginas de jornais, pela internet, enfim, com momentos hilários, espírito aventureiro, mas, ao final, restando o sentimento de que deveria ser um tempo de emoção por muitos reencontros de familiares e amigos, recuperando ou refazendo laços que, de alguma forma foram perdidos no ano que passou. Por algum condão encantado, estamos mais propícios à bondade e à concórdia, tendo plena convicção de que o Natal não é um período de final do ano e sim um estado de espírito.

O que é festa para muitos, é tristeza e, até, depressão, para alguns. Experiências com pessoas idosas ou doentes, especialmente ao se aproximar do final, é a de que aumenta a possibilidade de que este não seja um tempo de alegrias - talvez sequer de tristezas - mas de muita saudades e sentimento de solidão, mesmo estando acompanhado de familiares...  J.J. Camargo é médico e escreve com propriedade e sensibilidade para o jornal Zero Hora de domingo. Na edição deste final de semana, afirmou: "quem pensa que câncer é a pior das doenças, não tem ideia do que seja a solidão na velhice".

Reli mais do que uma vez a história que contou quando recebeu para consulta uma senhora idosa que vive sozinha, já viúva e longe do filho. Com o veredito da doença, deseja preparar o filho e trazê-lo de volta, porque não quer morrer sozinha e já sente que o seu final se aproxima. A conversa descontraída, mais do que de médico e sua paciente, entre uma pessoa fragilizada e seu confidente. Com um final surpreendente: o pedido de usar o álcool gel para higienizar as próprias mãos e as do profissional, para poder segurar durante alguns instantes as suas mãos...

O papa Francisco disse: "sempre que possível, dê um sorriso a um estranho na rua. Pode ser o único gesto de amor que ele verá no dia." Estamos perdendo o espírito natalino por detalhes: nos desacostumando de prestar atenção em quem passa ou convive conosco, perdendo a sensibilidade para tristezas e decepções alheias. Há tantos "ruídos" por querermos fazer de tudo e não nos damos conta de alguém que não se sente disposto a festejos e entrou em depressão... Num período tão curto - mas tão intenso - ouvir, olhar e sorrir mais pode parecer quase nada, mas é a diferença entre fazer um triste Natal ou um Feliz Natal!

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Eleições e os "falsinhos" da pandemia

Quem foi votar neste domingo para prefeito e vereador pode constatar, tristemente, que se repetiu uma cena já comum pelas ruas: pessoas levam a máscara na mão ou pendurada no pescoço e somente colocam em frente à boca e ao nariz quando lhes é cobrado. Se já agora que a temperatura é amena as desculpas são as mais diversas para enrolar e se negar a utilizar um dos elementos de proteção própria e cuidados para com os outros, então imagine quando, efetivamente, chegar o verão.

Alguns falam do cansaço com tudo o que está acontecendo e que as pessoas
precisam se dar ao direito de desopilar. Esta tolerância do erro menor é o que advém da nossa falta de educação. Uma visão de que se pode dar certos "direitos" que são dos males o menor e não causarão maiores problemas... Como se pode ter certeza de que é assim que vai acontecer? Há casos de infectados que estavam tendo todo o cuidado, mas conviviam com pessoas que transitavam por outros meios e se tornaram portadores.

Além do uso da máscara, aglomerações, desrespeito ao distanciamento social e "esquecimento" do uso do álcool gel. Uma senhora disse que não usava álcool porque ressecava as mãos... Quando amigos dizem que me tornei um chato com os cuidados creio ser bem claro: prefiro falar e até me tornar inoportuno repetindo o mesmo mantra até que se conscientizem, do que estar em silêncio nos seus velórios...

O mapa atualizado da pandemia no Estado mostra que o vírus até deu uma refreada, mas, coincidentemente, exatamente no período que antecedeu as eleições. Agora, mais de dez regiões com bandeira vermelha e endurecimento nas regras de atividades sociais, educacionais e de empregos. Dos Estados Unidos, seu novo presidente foi categórico: empossado, uma equipe de técnicos vai definir áreas que precisarão entrar em lockdown - fechamento da cidade ou de uma de suas regiões - pelo período necessário...

Os "falsinhos" de plantão estão dando um jeito para vender a ideia de que se exagera nas recomendações e que as medidas tomadas vão causar uma crise ainda maior para economia. Pena que a memória do brasileiro seja curta: a economia já vinha mal... antes da pandemia! E vai ficar pior quando se apresentar a conta, já no próximo ano. Por outro lado, o governo que deveria estar preparado para enfrentar situações adversas preferiu surfar na onda política e discutir em todos os tons o que desse dividendos eleitorais.

Reclamações com a eliminação de locais de votação - previamente anunciada - e desconhecida por parte da população, até do porquê de idosos passarem à frente... Sobrou para os mesário, com agressões verbais e físicas. As eleições deveriam aperfeiçoar o convívio democrático, mas se tornaram um fardo recoberto pela indiferença de muitos e o oportunismo de poucos... Triste Brasil: sem sermos capazes de fazer história no presente, ainda queremos ser o país do futuro...

domingo, 15 de novembro de 2020

Lembranças, com um gosto de solidão...


Depois que publiquei a crônica de domingo, falando sobre minha experiência político-partidária, especialmente com o saudoso Bernardo de Souza, tive reações diversas: de quem não sabia que eu havia trabalhado na prefeitura, dos que achavam que eu sempre trabalhara na Igreja e na Universidade Católica, mas também aqueles que foram ainda mais longe nas lembranças, boas lembranças, de um tempo privilegiado em que - jovem - se vivia o fim do regime militar e passar dos anos 2000 era apenas um sonho.

Antes, refleti sobre as lembrança dos mortos e recolhi da Neca Silva: "em criança, acompanhava a mãe ao cemitério e, enquanto ela limpava o mausoléu, eu ia, fascinada, para uma estátua de Jesus, imensa, e ali ficava... sentava em seu colo e conversava. A família do túmulo me conhecia e admirava o quanto eu gostava dali. Quando vou a Dom Pedrito, rezo para meus pais e irmãos, mas, na saída, meus pés traçam o caminho até aquele Jesus, não sento mais em seu colo, mas o coração bate forte".

Numa sexta-feira pela manhã, o casal Lupi e Kátia passaram pela minha casa pois iriam sair com o pai dela, viajando para Piratini. Na passada, deixaram um pão feito em casa, que o Lupi insiste em dizer que foram os dois que fizeram (mas eu ainda creio mais na Kátia...). Como pouco pão, então, reparti um pedaço com a Roberta e o filho, o Pedro, meus vizinhos. No dia seguinte, trocamos impressões: a Roberta dizia que o pão lembrava aqueles que eram feitos pela sua avó... eu lembrava dos que o meu pai fazia...

Andanças por caminhos dos cemitérios mostram o quanto é importante encontrar uma forma particular de viver com aqueles que permanecem ao nosso lado. A pandemia - e a própria vida social - nos priva do convívios de familiares e amigos. Os que se foram são vozes que vêm com as lembranças parecendo que a proximidade física de então se transforma em algo mais profundo: a proximidade espiritual. Uma questão de fé: a sensação de que o Universo, de alguma forma, ainda nos liga e aproxima.

Um simples pedaço de pão levou a Roberta à casa da avó e aos tempos em que conviviam. A mim, momentos em que meus sobrinhos vinham à tarde para o café e o pai assava um pão, preparando rodas de carreta ou bolinhos de chuva. Iniciava pelas massas, sovadas e estendidas sobre uma pedra. As frituras eram feitas dentro da churrasqueira, mas ao abrir o portão já se sentia o cheiro de gostosuras, assim como o de café sendo passado...

Os caminhos da saudade levam pedir colo, como conta a Neca, para se aconchegar, nem que seja a uma estátua com a representação de Jesus. Cheiros e gostos ficam impregnados nas lembranças e parecem repetir sorrisos e abraços que estão ausentes de nossas vidas. Não causam dor, mas uma tristeza contida, mesmo que, algumas vezes, uma lágrima percorra as marcas que o envelhecimento deixou em nossos rostos. Onde "o coração bate mais forte" e se continua a luta para fugir - e entender - a própria solidão...

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Próstata: prevenção e preconceito


A pandemia do Coronavírus trouxe consigo diversas consequências. Na área da saúde, demonstrou o quanto o sistema continua vulnerável e precisa de aportes para chegar a um nível adequado de serviços à população. Além do atendimento dos pacientes infectados, por ter deixado de lado o cuidado com outros problemas que ficaram com a demanda reprimida. Sem contar o caso daqueles que encontram uma desculpa para não enfrentar a "síndrome do jaleco", isto é, a consulta presencial com um médico.

Um dos mais renitentes em fazer prevenção e procurar atendimento quando necessita é o homem. Desde sua fundação, o Instituto Lado a Lado pela Vida realiza iniciativas para promover a mudança deste comportamento. Em 2011, lançou a campanha Novembro Azul, para conscientizar da importância de diagnóstico precoce do câncer de próstata, tendo no elemento masculino o protagonista da própria saúde, cuidando de maneira integral, com hábitos saudáveis e realização dos exames necessários.

O descuido do brasileiro tem sido responsável por uma estatística muito séria: a do câncer de pênis. No último ano, cerca de 1.600 homens precisaram fazer amputação deste órgão por relaxarem a prevenção e descuidar a higiene íntima, que deveria ter sido aprendida com pais e responsáveis, desde a infância. Para erradicar o problema é necessário que se aprenda com as mulheres a fazer a prevenção desde cedo e não ter vergonha de buscar informações.

O instituto apresenta as diversas fases e aprendizado. Na infância: prevenção e cuidados devem iniciar cedo, a melhor forma de viver bem as outras fases da vida. Na adolescência: informação, diálogo e  não ter medo do enfrentamento podem reverter o crescimento de muitos problemas com a saúde. Na vida adulta se constata que as doenças que mais matam são exatamente as que poderiam ser prevenidas. Na terceira idade, hábitos saudáveis e rotina de consultas e exames dão o direito de envelhecer sem sustos.

Câncer tem cura, basta prevenir. Para vencer esta luta é preciso conhecer o inimigo, que encontra "distraído" um em cada seis homens e acaba desenvolvendo uma doença de fácil diagnóstico. Assim como o outubro é rosa, para lembrar dos cuidados com a mama, o novembro é azul para que os homens tratem da próstata. Entre os que tem medo do dedo do urologista e quem sabe que sua vida vale mais do que um preconceito, há no horizonte a possibilidade da retomada de uma vida plena e saudável.

A pandemia não pode ser desculpa para a omissão no tratamento, tanto por parte dos serviços públicos e privados, quanto da população. Novembro é o mês de alerta através das mídias e campanhas institucionais, repetindo o que pode parecer o óbvio, mas que ainda é responsável pelo fim de muitos descuidados: o câncer mata. Ir em busca de milagre quando não houve prevenção - e está avançado - é prova de irresponsabilidade que nem o Santo consegue atender...

domingo, 8 de novembro de 2020

Eleições, pandemia e lembranças...


O ano era 1982. Até então não havia participado de atividades político-partidárias, mas o envolvimento com as comunidades de base levou a uma mobilização da zona norte de Pelotas pela melhoria no atendimento da empresa de ônibus Esperança. O canal na prefeitura era o secretário (se não me engano, na época, de serviços urbanos) Bernardo de Souza. Muitas reuniões, conversas e melhora significativa do serviço. Foi natural que, naquele ano, me envolvesse na campanha que elegeu Bernardo para prefeito.

Quando assumiu, pensei que minha missão tinha terminado. Fiquei surpreso ao receber sua visita, no secretariado de pastoral, convidando para integrar a equipe que assumia em 1º de março de 1983. Mudança radical: começando pelo fato de que as finanças estavam a zero e, por sete meses, não vimos nem a cor do dinheiro, sobrevivendo de bônus de supermercado, que era uma antecipação de salário. Mas, como diria o professor Marasco, fazíamos a "política da inocência" e tivemos que aprender a lidar e fazer funcionar a máquina pública.

Quando conto minha experiência daqueles quatro anos, digo que foi o complemento do meu aprendizado no curso de Comunicação Social da UCPel. Ali, aprendi a fazer marketing político na prática, com a definição mais clássica: "a capacidade de argumentar e convencer" e não de fazer proselitismo, ou colocar goela abaixo qualquer produto. Um grande número de lideranças vinha dos meios religiosos, populares, sindicais e acadêmicos e, de fato, não pensava em carreira política, mas encontrar formas de melhorar a vida da cidade e de quem nela habitava.

Já tinha percorrido praticamente todos os recantos dos bairros que ficam na zona norte, porém, só então, me deparei com as áreas mais pobre da cidade e tomei conhecimento do seu interior (que era extenso, na época apenas Capão do Leão havia conseguido sua emancipação. Seria seguido por Morro Redondo, Arroio do Padre e Turuçu). As diferentes realidades e atender demandas reprimidas por uma máquina pública que já estava com dificuldades para se manter, quanto mais de prestar os serviços que tinha por obrigação.

Nos momentos mais difíceis, o Bernardo mostrava como não desistir. Numa ocasião, no interior, chegamos cedo tocados por muita chuva. Devia haver uma meia dúzia de gatos pingados no salão para um encontro que aconteceria à tarde. Ao chegar, relatamos de forma negativa a situação. Quando falou, iniciou valorizando quem se fazia presente, dizendo que possivelmente muitos outros gostariam de estar ali e o tempo não permitira. Os presentes mereciam, mesmo assim, que se tocasse o encontro...

Minhas lembranças vêm em função de que no próximo fim de semana teremos eleições para vereadores e prefeito. Num tempo inoportuno em função da pandemia, já tendo mostrado o desinteresse popular e o oportunismo de certos candidatos. Marcadas estão e é necessário que se participe. Deixar de fazer significa, depois, não ter o direito de reclamar. Afinal, no dizer de Edmund Burke: "para que o mal triunfe basta que os bons fiquem de braços cruzados".

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Uma "pandemia" para a educação?


A pandemia do coronavírus provou o que já se sabia há muito tempo: recursos existem, mas dependem de decisões políticas para terem sua destinação adequada. Caso da saúde, que já beirava o caos e, de uma hora para a outra, precisou que se encontrassem formas de equipar hospitais e postos de atendimento, qualificar e pagar pessoal, ter insumos que atendessem desde a limpeza até o consumo de medicações. Infelizmente, também se viu que os "abutres" passaram a rondar a área...

"A dor ensina a gemer" é um ditado popular que faz sentido nesta época. Lideranças políticas e administrativas foram pressionadas a dar respostas para problemas que atropelaram o conhecimento que se tinha e planejar alternativas dos males que poderiam acontecer. Mesmo assim, tem gente achando que o remédio foi pior do que a doença, para quem preferiu prevenir do que correr atrás. O número de curados passa a ter valor significativo, mas ressalta as mortes que poderiam ter sido evitadas. 

Nestes dias em que parte dos escolares volta à sala de aula, a pandemia priorizou o que mobilizações não conseguiram: recursos para uma das áreas sociais que mais enfrenta problemas - a saúde. Com um viés sombrio: a piora foi gradativa, acostumando parte da população, como se isto tenha se transformado no "normal": "é assim e sempre foi assim!". O pensamento que não quer calar é: serão necessárias outras "pandemias", em áreas como a educação, segurança, habitação para se obter respostas efetivas?

Responsáveis e alunos correm atrás de soluções que precisam ser construídas a partir de modelos já existentes - como o ensino a distância - alternativa remota para o acesso de quem tem dificuldades com o presencial. Questiona-se a qualidade do que é oferecido e a capacidade de quem o procura de receber uma educação que, de fato, atenda ao aluno. De uma hora para a outra, problemas restritos exigiram solução de massa, sem ter receita para o atacado e tendo que atender às picuinhas do varejo...

De todas as discussões que se fazia antes do coronavírus, uma é certa: o estado deve estar presente, normatizar e fiscalizar - de fato - o ensino. Em especial, estabelecer as prioridades, começando pelo básico. Com problemas econômicos no horizonte - já a partir deste ano - escolas terão que dar respostas a questões elementares nas áreas de educação, alimentação e saúde. De forma criativa, liberar os pais para a luta pela sobrevivência, sem tirar das crianças os mínimos direitos de se constituírem cidadãs. 

Não há como resolver todos os problemas de uma só vez. O processo educacional é uma estrada onde se aprende mais do que colher flores, retirar ervas daninhas, remover pedras e afastar insetos. Leva em conta o lugar social de onde se vêm, na maior parte das vezes, com absoluta pobreza de recursos. Caminhar sem medo dos problemas e recomeçando, juntos, todas a vez que uma criança tropeçar e ficar para trás...

domingo, 1 de novembro de 2020

Um caminho de muita saudade...

A memória dos mortos, no dia de Finados, é celebrada de forma diferente por diversas culturas. Quem assistiu "Viva, a vida é uma festa", teve uma ideia de que os mexicanos mantém uma tradição indígena de  celebrar seus ancestrais, honrando os já falecidos. Conta a tradição que os mortos visitam parentes, sendo recebidos com comida, música e doces preferidos. As pessoas fazem máscaras de caveira, vestem roupas com esqueletos pintados ou se fantasiam de morte, incluindo
crianças e idosos.

A tradição portuguesa é diferente: celebram-se cultos e visitas são feitas aos cemitérios para colocação de flores e acender velas. Da mesma forma que os velórios e enterros, pranteia-se a ausência e se recolhe de forma mais sentida e entristecida. É o hábito cristão de dedicar um dia para rezar e homenagear os mortos, que remonta ao século V, mas foi no século XIII que o dia dois de novembro passou a ser o Dia de Finados.

Preparando a crônica de domingo, queria olhar para outras realidades antes de falar a respeito dos meus falecidos. Já tinha me impressionado com o personagem Miguel, da animação "Viva, a vida é uma festa", que para realizar seu sonho precisa entrar no mundo dos defuntos - mas muito vivos! - e resgatar a história da sua família. Não tinha me dado conta do quanto o filme é, do seu jeito, o retrato de uma cultura da morte, olhada por outro ângulo, e capaz de influenciar populações mais pobres de diversos países.

A primeira lembrança foi de que, logo que a mãe morreu, seguidamente, vizinhos falavam do quanto admiravam ver meus pais passearem pela manhã, na sua caminhada diária, observando, cumprimentando e conversando com os mais antigos. Reviviam fatos de mais de dez anos (tempo em que o pai faleceu). Mas que as recordações eram tão marcantes que pareciam ainda fazer o mesmo trajeto, sem pressa e dispostos a um dedo de prosa antes de voltar para casa e tomar seu chimarrão.

Há uma lista na memória para se relembrar: parentes, amigos, vizinhos, conhecidos. Um caminho por onde se faz história e, aos poucos, vai-se deixando companheiros e companheiras. Novos chegam e nos acompanham, mas o sentimento é de perda e de que não há como compensar a ausência. Toda a euforia do início da jornada dá lugar ao sentimento de que se está mais perto do fim e que é necessário tomar consciência de que, também para nós, há um tempo em que todo o andarilho conclui sua jornada.

Um caminho de muita saudade... Confesso: gostaria que a vida, assim como a morte, fosse sempre uma festa... O dever cumprido - e novas gerações tomando nossos lugares - indicam que se viveu bem. Talvez nossos mortos não participem do reencontro entre os dois mundos, para que a gente conte coisas em que eles não acreditarão e nos encantem com o que nos espera. Até lá, o melhor é cuidar dos vivos e deixar que os mortos cuidem dos seus. Afinal, é preciso viver, pois a vida pode ser, sim, uma festa!