terça-feira, 30 de agosto de 2011

Palavrinhas mágicas

Manhã de conversa com professoras na Creche São Francisco de Paula, onde são atendidas crianças pobres. Provocar o debate sobre o perdão, com duas palavrinhas mágicas que lhe são complementares: obrigado e desculpe.
Pelos olhares, o sentimento de que tocava em cada uma delas, especialmente quando a gente trabalha com crianças, onde a necessidade da tolerância é grande e ser capaz de reconhecer algo de bom - obrigado - é a tônica. Mas também a capacidade de entender o erro próprio - desculpe - acaba fazendo a grande diferença.
Amar não é aprisionar o ente amado - este é o maior erro da frase que se tornou clássica do filme Love Store "amar é nunca ter que pedir perdão" - mas a capacidade de que, mesmo protegido, também se sinta em liberdade para alçar o próprio vôo.
Amar é ter que pedir perdão quantas vezes for necessário, mesmo que não seja fácil, para que a vida continue, talvez com alguma marca (as feridas deixadas por nos sentirmos agredidos com maior ou menor intensidade - com a consequente marca em nossas almas: algumas tenras e que logo desaparecem, outras profundas e que, mesmo o tempo, depois de curá-las, não as faz desaparecer)
Sendo no seio da família, no lugar de trabalho, numa cama em recuperação, na carícia de uma mão infantil, no olhar de um idoso pedindo amparo, as palavras mágicas existem: obrigado (por cada segundo da existência), desculpe (poderia ter sido bem melhor e eu atrapalhei), mas no ato de compreender e perdoar está a presença divina que nos faz melhores, mais tolerantes, mais capazes de ser e repartir a felicidade.

sábado, 27 de agosto de 2011

Carta aberta para Renato Aragão

Creio que vale a pena a reflexão:


Querido Didi,
Há alguns meses você vem me escrevendo pedindo uma doação mensal para enfrentar alguns problemas que comprometem o presente e o futuro de muitas crianças brasileiras. Eu não respondi aos seus apelos (apesar de ter gostado do lápis e das etiquetas com meu nome para colar nas correspondências) ..........
Achei que as cartas não deveriam ser endereçadas a mim. Agora, novamente, você me escreve preocupado por eu não ter atendido às suas solicitações.
Diante de sua insistência, me senti na obrigação de parar tudo e escrever uma resposta.
Não foi por "algum motivo " que não fiz a doação em dinheiro solicitada por você.
São vários os motivos que me levam a não participar de sua campanha altruísta (se eu quisesse poderia escrever umas dez páginas sobre esses motivos).
Você diz, em sua última carta, que enquanto eu a estivesse lendo, uma criança estaria perdendo a chance de se desenvolver e aprender pela falta de investimentos em sua formação!
Didi, não tente me fazer sentir culpada. Essa jogada publicitária eu conheço muito bem. Esse tipo de texto apelativo pode funcionar com muitas pessoas, mas, comigo, não.
Eu não sou ministra da educação. Não ordeno e nem priorizo as despesas das escolas e nem posso obrigar o filho do vizinho a freqüentar as salas de aula.
A minha parte eu já venho fazendo desde os 11 anos de idade, quando comecei a trabalhar na roça para ajudar meus pais no sustento da família.
Trabalhei muito e, te garanto, TRABALHO NÃO MATA NINGUEM! Muito pelo contrário, faz bem!
Estudei na escola da zona rural, fiz Supletivo, estudei à distância e muito antes de ser jornalista e publicitária eu já era uma micro- empresária. 
Didi, talvez você não tenha noção do quanto o GOVERNO FEDERAL tira do nosso suor para manter a saúde, a educação, a segurança e tudo o mais que o povo brasileiro precisa.
Os impostos são muito altos! Sem falar dos Impostos embutidos em cada alimento e em cada produto ou serviço que preciso comprar para o sustento e sobrevivência da minha família. 
Eu pago pela educação duas vezes: pago pela educação na escola pública, através dos impostos, e na escola particular, mensalmente, PORQUE SOMENTE A ESCOLA PÚBLICA NÃO ATENDE COM ENSINO DE QUALIDADE QUE, ACREDITO, MEUS DOIS FILHOS MERECEM!!!
Não acho louvável recorrer à sociedade para resolver um problema que nem deveria existir, pelo volume de dinheiro arrecadado em nome da educação e de tantos outros problemas sociais!
O que está acontecendo, meu caro Didi, é que os administradores dessa dinheirama toda não vêem a educação como prioridade! PARA ÊLES, A EDUCAÇÃO LHES RETIRA A SUBSERVIÊNCIA E ÊSSE FATO, POR SI SÓ, NÃO INTERESSA AOS POLÍTICOS QUE ESTÃO NO PODER. POR ISSO, O DINHEIRO ESTÁ SAINDO PELO RALO; ESTÃO JOGANDO FORA, OU APLICANDO MUITO MAL!!!
Para você ter uma idéia, na minha cidade cada alimentação de um presidiário custa para os cofres públicos R$ 8,82 (oito reais e oitenta e dois centavos), enquanto que a merenda de uma criança na escola pública custa R$ 0,20 (vinte centavos)!!! O governo precisa rever suas prioridades, você não concorda? Você pode ajudar a mudar isso! Não acha?
Você diz em sua carta que não dá para aceitar que um brasileiro se torne adulto sem compreender um texto simples ou conseguir fazer uma conta de matemática. Concordo com você! É por isso que sua carta não deveria ser endereçada à minha pessoa. Deveria ser endereçada a Presidente da República!!! Ela é "a cara"!!! Ela é quem tem a chave do cofre e a vontade política para aplicar os recursos!
Eu e mais milhares de pessoas só colocamos o dinheiro lá para que eles façam o que for correto e necessário para melhorar a qualidade de vida das pessoas do país, sem nenhum tipo de distinção ou discriminação. MAS, NÃO É O QUE ACONTECE!!!
No último parágrafo da sua carta, você joga, mais uma vez, a responsabilidade para cima de mim, dizendo que as crianças precisam da "minha doação" e que a "minha doação" faz toda a diferença...
Lamento discordar de você, Didi!!! Com o valor da doação mínima de R$ 15,00(quinze reais) eu posso comprar 12 quilos de arroz para alimentar minha família por um mês, ou posso comprar pão para o café da manhã para 10 dias.....!!!
Didi, você pode até me chamar de muquirana, não me importo, mas, R$ 15,00 (quinze reais), eu não vou doar! Minha doação mensal já é muito grande. Se você não sabe, eu faço doações mensais de 27,5% de tudo o que ganho!!!
Isso significa que o governo leva mais de um terço de tudo que eu recebo e posso te garantir que essa grana, se ficasse comigo, seria muito melhor aplicada na qualidade de vida da minha família!
Você sabia que para pagar os impostos eu tenho que dizer NÃO para quase tudo que meus filhos querem ou precisam? Meu filho de 12 anos quer praticar tênis e eu não posso pagar as aulas que são caras demais para nosso padrão de vida. Você acha isso justo? Acredito que não. Você é um homem de bom-senso e saberá entender os meus motivos para não colaborar com sua campanha pela educação brasileira.
Outra coisa Didi, MANDE UMA CARTA PARA A PRESIDENTE "DILMA" pedindo para ela selecionar melhor os ministros e também os professores das escolas públicas! Só escolher quem, de fato, tem vocação para ser ministro e para o ensino.
Melhorar os salários daqueles profissionais também funciona para que eles tomem gosto pela profissão e vistam, de fato, a camisa da educação! Peça para Ela, também, fazer escolas de horário integral, escolas em que as crianças possam, além de ler, escrever e fazer contas, possam desenvolver dons artísticos, esportivos e habilidades profissionais. Dinheiro para isso está sobrando sim! Diga para Ela priorizar a educação e utilizar melhor os recursos.
Bem, você assina suas cartas com o pomposo título de Embaixador Especial do UNICEF para Crianças Brasileiras e eu vou me despedindo assinando... Eliane Sinhasique - Mantenedora Principal dos Dois Filhos que Pari!!!
P.S.: Não me mande outra carta pedindo dinheiro. Se você mandar, serei obrigada a ser mal-educada: vou rasgá-la antes de abrir.
PS2* Aos otários que doaram para o criança esperança, fiquem sabendo: AS ORGANIZAÇÕES GLOBO ENTREGAM TODO O DINHEIRO ARRECADADO À UNICEF E RECEBEM UM RECIBO DO VALOR PARA DEDUÇÃO DO SEU IMPOSTO DE RENDA!!! Para vocês a Rede Globo anuncia: essa doação não poderá ser deduzida do seu imposto de renda! POR QUE É ELA QUEM O FAZ!!!
PS3* E O DINHEIRO DA CPMF QUE PAGAMOS DURANTE ONZE ANOS? MELHOROU ALGUMA COISA NA EDUCAÇÃO E NA SAÚDE DURANTE ESSES ANOS?
BRASILEIROS PATRIOTAS (e feitos de idiotas)!!! DIVULGUEM ESSA REVOLTA.... Isto deveria chegar a Brasília, não acham???
CARTA ABERTA DE ELIANE SINHASIQUE (jornalista e publicitária) PARA RENATO ARAGÃO (o Didi da REDE GLOBO DE TELEVISÃO) . . . . . !!!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O desenvolvimento de Rio Grande e Pelotas

Debate, ontem à noite, no auditório da Católica. Em discussão, o desenvolvimento conjunto da região Sul, capitaneado por Rio Grande e Pelotas. Exatamente nesta ordem, mais os municípios menores. Pelotas tem que se conscientizar de que passa a ser um coadjuvante de luxo, pois os aportes maiores virão para Rio Grande, mas que o desenvolvimento atingirá o conjunto dos municípios.
Muito grande a preocupação com a formação de mão de obra qualificada, mas também com o processo de humanização. Alguém disse que são equipamentos de ponta, mas que precisam de um homem ou uma mulher para acioná-los.
A discussão, provocada pela Rádio Gaúcha (Lasier Martins), vem buscar a repercussão do que já se discutiu há dois anos atrás. De lá para cá, o que mudou? Segundo os integrantes do debate, uma maior integração, especialmente no que se refere às principais reivindicações. Muitas cristas já baixaram (algumas ainda vão cair), pela força das circunstâncias. A indisposição entre Pelotas e Rio Grande é baseada em bobagens históricas de acusações sem fundamento.
Passando por cima e reivindicando em conjunto, ganham os dois municípios e ainda sobra para os demais. O grande destaque ficou por conta da necessidade de que se aproveite este momento para investir em educação. Nossas universidades precisam se atualizar, mas precisamos retomar uma formação técnica qualificada para o segundo grau.
O caminho está aberto. Um exemplo dado foi o de que pessoas que toda a vida trabalharam na pesca, hoje buscam formação técnica para trabalhar no polo naval. Possivelmente, também nossos jovens que hoje se formam e tem que botar o pé no Mundo, em seguida vão ter emprego aqui mesmo. Um sonho bom de ser sonhado: uma nova perspectiva para uma região que, até pouco tempo atrás, tinha o fantasma do atraso rondando em suas portas.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A noite e a droga


Duas matérias estiveram nas páginas de jornal da semana passada. A primeira: a Justiça afirma que vai marcar de cima bares e similares que venderem bebidas alcoólicas para menores de idade. A segunda: o drama vivido pelos pais de um jovem dependente químico para tentar interná-lo para desintoxicação e possível recuperação.
Em princípio, uma não tem nada a ver com a outra. Engano: o fato dos jovens (quase crianças) estarem nas ruas é sinal de que “ganharam” a disputa com os pais para terem “liberdade” cada vez mais cedo. Os pais se dizem impotentes, não conseguindo mantê-los em casa, não somente pela argumentação, mas também porque eles fogem. Culpar aos pais é uma forma fácil de tirar de nossas costas a responsabilidade social.
Na maior parte das vezes, esta liberdade conquistada sem um amadurecimento sadio é que vai resultar na segunda matéria: como não foram se acostumando com limites, a droga é um dos elementos oferecidos na rua para que a “liberdade” seja mais bem saboreada. Triste engano, pois embora digam que param quando quiserem, é um retorno difícil e penoso, muitas vezes impossível.
Palmas para setores da Justiça que fazem batidas e recolhem jovens para casas de passagem ou os levam de volta para suas casas. Palmas para pais que levam e buscam seus filhos, mesmo que na madrugada, até as festinhas, ou que organizam “mutirões” com outros pais, para um revezamento sadio e produtivo.
Nossa máquina pública, infelizmente - embora alguns exemplos como exceção - peca pela omissão: que bebidas não podem ser vendidas para menores, isto é o óbvio, que deveria ser respeitado ou os responsáveis serem penalizados. Mas também deveria haver marcação severa para que menores não perambulem pela noite.
Assim como programas de saúde para internação - com sua permissão ou não, de jovens dependentes. Infelizmente, num caso destes, existe a perda do discernimento, então é o caso da família ou mesmo do Estado efetivar providências. Medidas e discussões paliativas de “respeito por autonomia” pavimentam a estrada que leva ao fundo do poço.

domingo, 21 de agosto de 2011

Boneca de crochê

Uma conhecida me enviou. Espero que o marido não esteja a perigo:

Um homem e uma mulher estavam casados por mais de 60 anos.
Eles tinham compartilhado tudo um com o outro e conversado sobre tudo.
Não havia segredos entre eles, com exceção de uma caixa de sapato que a mulher guardava em cima de um armário e tinha avisado ao marido que nunca abrisse aquela caixa e nem perguntasse o que havia nela.
Por todos aqueles anos ele nunca nem pensou sobre o que estaria naquela caixa de sapato.
Um dia a velhinha ficou muito doente e o médico falou que ela não sobreviveria.
Sendo assim, o velhinho tirou a caixa de cima do armário e a levou pra perto da cama da mulher.
Ela concordou que era a hora dele saber o que havia naquela caixa.
Quando ele abriu a tal caixa, viu duas bonecas de crochê e um pacote de dinheiro que totalizava 95 mil dólares.
Ele perguntou a ela o que aquilo significava, ela explicou;
- Quando nós nos casamos minha avó me disse que o segredo de um casamento feliz é nunca argumentar/brigar por nada. E se alguma vez eu ficasse com raiva de você que eu ficasse quieta e fizesse uma boneca de crochê.
O velhinho ficou tão emocionado que teve que conter as lágrimas enquanto pensava 'Somente duas bonecas preciosas estavam na caixa. Ela ficou com raiva de mim somente duas vezes por todos esses anos de vida. Isto que é amor.' 
- Querida!!! - Você me explicou sobre as bonecas, mas e esse dinheiro todo de onde veio?
- Ah!!! - Esse é o dinheiro que eu fiz com a venda das bonecas, só sobraram duas.
ORAÇÃO  
Senhor, dai-me sabedoria para entender meu marido, amor para perdoá-lo e paciência para aturá-lo, porque se eu pedir força, eu bato nele até matar, pois EU NÃO SEI FAZER CROCHÊ... Amém!

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Sonhos que sonhei

Apenas restaram as brasas no fundo da lareira.
Já tivemos um fogo mais forte,
com labaredas ardentes e ofegantes.
Mas o tempo deixou o calor
e a certeza de que o remexer nas brasas
despertam chamas temporárias.
Passou a vida, o tempo deixa marcas
que não gostaríamos de carregar.
Cada um de nós dormita na serenidade
do fogo que se apaga
e do vento que bate na janela.
Como é que a história poderia ser diferente?
Carregamos nosso destino
certos de que nunca perdemos a esperança.
Caminhar para o fim ainda é uma busca,
somente anula o sentido quando perdemos
aqueles que arrimam nossos sonhos.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Entre a vida e o fundo do poço

Em Pelotas, uma segunda nublada, úmida, típica da chamada "segunda Londres". Em meio ao mau tempo, a procura por ânimo e disposição de enfrentar mais uma semana. Ouvindo o programa do professor Jorge Malhão, na Rádio Tupanci - onde também faço comentários às segundas e sextas - uma frase lapidar: "abrace a vida e não o fundo do poço".
Opa, que tiro certeiro. A gente passa por diversos momentos na vida onde, até se tem o direito, de chegar à beira do poço. Mas é preciso lutar para não "abraçá-lo", ou cair nele.
Tenho dito que, no meu momento atual, acompanhando uma pessoa idosa, as nossas forças vão sendo solapadas, mas que existem, ao menos, dois fundamentos que não deixam desistir: a espiritualidade e saber que esta mesma pessoa nos deu muitos e muitos anos de muitas alegrias.
Viver tem que ser exatamente isto: encontrar sentido em cada um de nossos momentos: aquele em que se passeia pelos caminhos e aqueles que se fica aprisionado a um leito; os sorrisos marotos e provocativos e as lágrimas furtivas pela espera do fim da vida; a mão que é estendida para uma brincadeira e aquela que pede forças para enfrentar a dor.
O telefonema para um amigo foi para dizer que não podia estar com ele todo o tempo que ele merecia - mas que estava com ele em minhas orações - mas que também o meu tempo era gasto acompanhando alguém que precisava dele.
Pode ser qualquer dia da semana, pode ser qualquer dia do mês, o que importa é que a caminhada continua: muitas vezes andamos meio mancos, mas o que nos empurra para o chão tem a contrapartida daqueles que nos sustentam com sua presença e orações.
Somos nós e nossas circunstâncias. A vida nos pede sacrifícios, mas nos oferece um dia de sol para os pais; a leitura de um poema por uma sobrinha, ou apenas um olhar de confiança de quem depende de nós para o ato mais sagrado da existência: viver.

domingo, 14 de agosto de 2011

Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil

Para quem quer entender este documento da CNBB, aqui vai um resumo comentado:


O documento 94 da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil - “Diretrizes gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2011-2015” - inicia com uma provocação: “escutar os sinais dos tempos e os desafios que neles se manifestam”. Pontual e correto. A população espera de instituições como a Igreja Católica, uma resposta aos “desafios que emergem em nosso tempo de transformações radicais na totalidade da existência, que, às vezes, geram perplexidade, ameaçam a vida em suas diversas formas e levam o ser humano a se afastar dos valores do Reino de Deus.”
Foi organizado de tal forma que, no capítulo 1, a reflexão gira em torno de Jesus Cristo, o grande iluminador da caminhada. No capítulo 2, procura colocar os pés no chão, uma espécie de “choque de realidade”. Esta realidade tem urgências, que são detectadas no capítulo 3. Com o seu enfrentamento, no capítulo 4. Indicando as urgências que devem ser priorizadas, especialmente nas Igrejas particulares, no capítulo 5.
São cinco as urgências apontadas: Igreja em estado permanente de missão; Igreja: casa da iniciação cristã; Igreja: lugar de animação bíblica da vida e da pastoral; Igreja: comunidade de comunidades; Igreja a serviço da vida plena para todos. O que permite que sejam respeitadas duas características da Igreja: a unidade e a diversidade.
Neste momento, o documento toca num ponto que é sensível para os homens e mulheres de Igreja, repetindo o papa Paulo VI: “o homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres; ou, então, se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas”. É preciso ajudar as pessoas a conhecer Jesus Cristo, fascinar-se por Ele e optar por segui-lo. “Na alvorada do terceiro milênio, não só existem muitos povos que ainda não conheceram a Boa Nova, mas há também muitos cristãos que têm necessidade que lhes seja anunciada novamente, de modo persuasivo, a Palavra de Deus, para poderem assim experimentar concretamente a força do Evangelho”.
Dois pontos preocupantes: precisamos de mais testemunho efetivo e afetivo. Tanto entre os leigos, quanto entre os sacerdotes ou consagrados, há o desafio de vivenciar o ser cristão na realidade do dia a dia. E onde encontrar este rumo? A Igreja tem consciência de que “particularmente as novas gerações têm necessidade de ser introduzidas na Palavra de Deus através do encontro e do testemunho autêntico do adulto, da influência positiva dos amigos e da grande companhia que é a comunidade eclesial”.
No atual período da história, marcado pela mudança de época, a missão assume um rosto próprio, com, pelo menos, três características: urgência, amplitude, inclusão. Um tempo que deve levar a uma forte comoção missionária. Mas alerta: “em virtude do enfraquecimento das instituições e das tradições, cresce a responsabilidade pessoal”.
Chega a hora de dar passos concretos. Iniciamos pela pastoral da visitação, precisando de maior organicidade e eficácia para este serviço. Passamos pelos jovens: a oferta de um itinerário para a organização de seu projeto pessoal de vida contribuirá com a vida plena desta parcela tão significativa de nossa Igreja e da sociedade. Enfrentamos um desafio que é muito teorizado e pouco praticado: “O encontro fraterno e respeitoso com os seguidores de religiões não cristãs e com todas as pessoas empenhadas na busca da justiça e na construção da fraternidade universal”. Não deixando de reconhecer e recolher as muitas manifestações da piedade popular católica que “precisam ser valorizadas e estimuladas e, onde for necessário, purificadas. Tais práticas têm grande significado para a preservação e a transmissão da fé e para a iniciação à vida cristã.”
O desafio do homem do século XXI: “as pessoas não buscam em primeiro lugar as doutrinas, mas o encontro pessoal, o relacionamento solidário e fraterno, a acolhida, vivência implícita do próprio Evangelho.” Revitaliza-se a urgência de conhecer as Sagradas Escrituras. Mas que não basta possuí-las, é necessário que a pessoa seja ajudada a ler corretamente. Neste sentido, o cuidado com as comunidades, para que não sejam pequenas paróquias locais, com estruturas pouco utilizadas.
Não perder de vista, igualmente, a missão fundamental de leigos e leigas como presença e testemunho na sociedade e na profissão; o carisma da vida consagrada - em suas dimensões apostólica e contemplativa - presente em fronteiras missionárias; inserida junto aos pobres; atuante no mundo da educação, da saúde, da ação social; orante em mosteiros e carmelos, comprometida a evangelizar por sua vida e missão; podendo questionar o grande número de instituições que surgiram amparadas pela Igreja e que hoje se tornaram leigas, ou até contrárias à própria Igreja. Não esquecendo que a Igreja é a presença mais capilar de uma organização social, no Brasil.
Diretrizes indicam rumos, abordam aspectos prioritários da ação evangelizadora, princípios norteadores e urgências irrenunciáveis. Não há como executar planejamento pastoral sem antes pararmos e nos colocarmos diante de Jesus Cristo. O discípulo missionário é chamado a, profeticamente, questionar, através de suas escolhas e atitudes, um mundo que se constrói a partir da mentalidade do lucro e do mercado, não esquecendo que tais atitudes geram violência, vingança, guerra e destruição.
Como o Filho de Deus assumiu a condição humana, exceto o pecado, nascendo e vivendo em determinado povo e realidade histórica (cf. Lc 2,1-2), nós, como discípulos missionários, anunciamos os valores do Evangelho do Reino na realidade que nos cerca, à luz da Pessoa, da Vida e da Palavra de Jesus Cristo, Senhor e Salvador. Infelizmente, criou-se um paradoxo: já não é mais a pessoa que se coloca na presença de Deus, como servo atento (cf. 1Sm 3,9-10), mas é a ilusão de que Deus pode estar a serviço das pessoas. Acaba se tornando uma espécie de culto de si mesmo.
Ao pensar nas perspectivas de ação, será útil lembrar que de 2012 a 2015, estaremos comemorando os 50 anos da realização do Concílio Vaticano II, com várias ações na Igreja no Brasil. O Concílio representa um acontecimento eclesial que marcou fortemente a caminhada da Igreja, promovendo a atualização de métodos e de linguagem, verdadeiro Pentecostes do século XX. Deu à Igreja instrumentos arrojados que, ainda hoje, precisam ser digeridos. Mais do que isto, lembrar da figura ímpar de João XXIII, um papa que deveria ser de transição, convocou o Concílio e, até hoje, é sinônimo de pastor, angustiado em buscar ovelhas perdidas.
O documento pede que não esqueçamos os novos areópagos: mundo universitário e uma ousada pastoral da comunicação. O terceiro areópago liga-se à presença pastoral junto aos empresários, aos políticos, aos formadores de opinião no mundo do trabalho, dirigentes sindicais e comunitários, disponibilizando e formando pessoas que se dediquem a ser presença significativa nestes meios. Cabe também incentivar a Pastoral da Cultura, viva e atuante, através de centros culturais católicos e de projetos que visem atingir os núcleos de criação e difusão cultural. Pois, ao ignorarmos a realidade, com certeza, não evangelizamos.
As boas respostas pastorais dependem de identificar as verdadeiras necessidades de evangelização. A pergunta é: o que nos diferencia dos demais credos religiosos? Exatamente aquilo que deixamos de fazer, especialmente quando abandonamos nosso carisma: o fascínio por Jesus Cristo e o compromisso pelo Reino de Deus e sua justiça. Elas representam forte apelo à unidade. Vale a pena lembrar a ousadia e o testemunho dos primeiros cristãos. Num mundo em transformação, as pessoas necessitam de referências de fé, vividas intensamente num dia a dia em que possam dizer: “vejam como eles se amam!”.

sábado, 13 de agosto de 2011

A cozinha de Charlie

O Super Chef 2011 do programa Mais Você (diga-se Ana Maria Braga e louro José), da Rede Globo, teve como vencedor o gaúcho Charlie Colonetti. Tímido e quieto, soube vencer, num primeiro momento sendo capaz de circular pelos dois grupos contendores, mas também sabendo se definir, depois, assumindo suas simpatias e sua dificuldade em entender as artimanhas que eram feitas por alguns dos integrantes do jogo.
Acompanhei diversas etapas do concurso e sempre me atraiu a atenção o fato de que o gaúcho sempre procurava, nos momentos em que um especialista estava presente para fazer oficinas, sugar o máximo possível de informações a respeito da culinária ou do prato específico.
Já disse aqui que gosto de cozinha, embora sendo um cozinheiro limitado às receitas das quais gosto. Mas vejo que muitos fazem da preparação de um alimento, autênticas obras de arte e, outros, que vão mais longe, autênticos rituais mágicos que encantam pela seleção dos produtos, temperos, ingredientes.
Pois era isto que eu via no Charlie: o prazer de tratar cada um dos ingredientes como uma especiaria que iria entrar na panela. O respeito no trato de cada um de seus componentes, assim como a certeza de que o carinho com que colocava em cada etapa de seu trabalho faria a diferença.
Sei que o cozinhar no dia-a-dia pode ser extremamente enfadonho. Mas aqueles que ali estiveram presentes me pareciam ir além de um simples ato de cozinhar. Faziam com prazer e viviam cada momento com tamanha intensidade que despertavam, para além da curiosidade, a alegria de partilhar de um alimento.
Sim, porque nenhum daqueles pratos teria significado se, depois, alguém não pudesse sorver seus elementos com o prazer característico de quem ergue os olhos aos céus e apenas pode dizer: "hum"!
Lembrei da cozinha de muitas de nossas "mães" e de nossas "nonas", onde o sentido da acolhida estava presente e se tinha prazer de sentar à mesa para poder assistir àquele festival gastronômico, com direito a uma provada do molho, pedacinhos de toucinho fritos, uma primeira fatia de pão, ainda quente, com um pouco de manteiga se derretendo por seus costados ...
Quando me dizem que cozinhar pode ser um ato religioso, eu acredito. Quem coloca a mão na panela, está olhando para além dos ingredientes que ali vão, aos poucos, se misturando. Está seguindo a liturgia que agrega uma família ou amigos em torno da mesa, num ritual que celebra os sabores da vida e entusiasma corações.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Lorena "de Jesus"

Lorena é uma bênção. Veio ao Mundo depois que os pais tiveram três gestações e as três foram interrompidas. Mas não desistiram e quiseram mostrar que uma vida sempre vale a pena, mesmo que existam muitas dificuldades a serem vencidas.
O caso foi mostrado num programa de televisão que colheu depoimentos da mãe ainda grávida, o parto - com todos os medos e expectativas - e como ela está hoje, exigindo total disponibilidade dos pais.
Lorena foi ansiosamente esperada. No momento em que estava nascendo, fiquei surpreso ao ouvir a música de fundo que a produção escolheu: "Ó vinde, adoresmos", marcada no cancioneiro por ser natalina, muito conhecida pelos cristãos.
Inicia pedindo que haja união - "cristãos, vinde todos", a mesma que fez aquela família insistir, superar suas dores na busca pela filha. Passa pela criança que alimenta esperanças - "Deus pequenino, Deus envolto em faixas". Para chegar às surpresas da vida - "a estrela do Oriente conduziu os magos e a este mistério envolve em luz, tal claridade, também, seguiremos".
O Natal cristão é exatamente assim: um motivo de esperança que não desiste, mesmo nos momentos mais difíceis e que hajam muitas perdas ao longo do caminho. A felicidade que alcançamos - assim como a dos pais da Lorena - está no semblante em que, além de felicidade, se mostra a realização de um sonho. Eles mesmo reconheciam que, embora mais magros pelas "noitadas" da filha, sentem-se mais fortalecidos pelo presente que a vida lhes deu, insubstituível, diferente de tudo o mais que já passaram.
Embora a dor das perdas tenha deixado suas marcas, hoje elas são cicatrizes que apontam para o projeto realizado e o desejo de que possa haver uma nova "Lorena", assim como novos sonhos, novas realizações... Uma menina que, marcada pela canção de Natal, possa ser Lorena "de Jesus".

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Pai nosso...

A mãe esteve hospitalizada na Beneficência Portuguesa. Uma noite antes da internação, depois da medicação para dormir, perguntei se queria rezar. Alcancei-lhe um anjinho que está na sua cabeceira, que, acionado, reza a oração do “Pai nosso”. Peguei sua mão e a mão do meu sobrinho, enquanto uma voz de criança balbuciava a prece que o próprio Jesus ensinou: Pai nosso...
Foi um momento mágico. Depois da oração, o sinal da cruz e o beijo no anjinho, com um rosto feliz e sereno. Assim como o pai, que nos seus últimos dias nos dava boa noite, disse: "boa noite, mãe". Com uma lenta, mas intensa resposta dada já no limiar do sono: "boa noite, meu filho".
A força da oração está, exatamente, em auxiliar a enfrentar um determinado momento difícil, nos aproximar das outras pessoas, além de nos aconchegar a Deus. Aí reside a força para enfrentar os dias que estamos vivendo: acompanhar uma pessoa doente não é um fardo difícil de ser carregado, pois dela, quase sempre, já recebemos muito e, agora, nos pedem, apenas, que não as abandonemos quando declinam seus dias. Acredito no dito popular: Deus não dá o fardo maior do que a capacidade que temos de carregá-lo.
Voltar para casa, quase sempre, é a sensação de que se venceu uma batalha, mas que muitas outras precisarão ser enfrentadas. A força está em ver uma melhor alimentação, alguns resmungos, ou até o sentimento de que a fala é coerente, quando vence 86 anos de idade.
Então, na calada da noite, vale a pena balbuciar uma oração que tem cheiro dos tempos de infância, que embalaram nossos sonhos, nossas esperanças e decepções, e no final de nossos dias, a tranquilidade para aceitar as consequências da vida que vivemos e a aproximação do encontro com Deus. Ao unir as mãos e fechar os olhos para a prece de boa-noite - ou ao ouvir a voz de um pequeno anjo - fazemos uma das grandes experiências místicas do nosso dia-a-dia e repetimos palavras que se jogam para a eternidade: “Pai nosso...”