domingo, 16 de dezembro de 2018

A derradeira gota de felicidade...

Reunião de fim de ano do Rotary. Convite para tratar do tema "dar de si antes de pensar em si". Conduzi a reflexão partindo do conceito de que alguém que trabalha pelo outro precisa ser bem resolvido e, antes de mais nada, saber cuidar de si mesmo. Um depoimento forte veio da Olga: "a gente luta a vida inteira para ser independente e, muitas vezes, no avançar dos anos, o que se quer é apenas alguém que nos cuide!"
Pode parecer uma questão semântica, mas expliquei que uso o termo "autonomia". Toda a vida esta é a nossa busca, primeiro na interação com os pais e, depois, como pais, tios, avós, respeitar um ente querido que dá seus próprios passos, com o direito de acertar, mas também de cometer os seus próprios erros.
Recentemente, um grupo de autistas e portadores da síndrome de down fez uma experiência de autonomia. Durante um período ficou distante dos pais ou responsáveis e tinha que dar conta desde as tarefas mais simples - arrumar a cama, por exemplo - até a interação com outros jovens em condições semelhantes.
Creio que o projeto se chama "Te vira!" Dos depoimentos, se percebia que, para os jovens, era um desafio. Na hora do "vamos ver" tinham condições de aprendizado e, se não conseguissem, a solidariedade falava mais alto. O coração nas mãos ficava com quem estava fora da casa, que, na ânsia de "compensar" suas restrições, negava a oportunidade de que, no que fosse possível, conduzissem as suas próprias vidas.
Na vivência com idosos tenho encontrado casos em que já perderam os movimentos - deixaram de caminhar e, muitas vezes, passam a maior parte do tempo na cama;  não têm forças com a fala, restringindo-se a poucas e esparsas palavras; mas capazes de interagir com aperto de mão, o olhar, o sorriso ou um leve menear da cabeça...
Nestes casos, uso a palavra "independência", que poderia ser trabalhada como sinônimo de autonomia, mas que recebe especial importância por expressar algo que não temos critérios para medir: a condição do nosso espírito de sobreviver, em muitos casos, à deteriorização do próprio corpo.
O que nos atrapalha é a falta de capacidade de olhar para além dos limites que o corpo impõe. Durante toda a vida, o que dá sentido é a sensação de que somos úteis. Envelhecer é tomar consciência do que se pode ou não fazer. Tornar-se vítima de um "coitadismo" é transformar a vida dos outros e a própria num Inferno! No convívio com um grupo, interação de diversas formas, no olhar que "fala" há um espírito determinado a viver, alerta, aproveitando a vida até a derradeira gota de felicidade...

domingo, 9 de dezembro de 2018

Convívios e reencontros...

Foi a Clotilde quem fez a pergunta: "tu te sentes velho?" Já havia pensado nisto, portanto, não era difícil responder: "não, não me sinto velho, mesmo que isto não impeça que eu já esteja envelhecendo!" O questionamento nasceu de um comentário feito pelo Antônio de que, cada vez mais, me pareço com meu pai, o seu Manoel.
Expliquei que era uma honra a comparação. Afinal, um homem que enfrentou tempos difíceis e morreu aos 85 anos abatido por um câncer, mas que tinha condições de ter vivido bem mais. Depois que deixou de fumar, aos 55 anos, manteve-se elegante, ereto, sem a presença nefasta de barriga, como, infelizmente, acontece comigo...
A conversa continuou. Me senti na obrigação de compartilhar observações: a própria pessoa não sente que envelheceu, a não ser que seu corpo esteja pagando com uma doença degenerativa, falta de atividade física, de cuidados com a alimentação, cigarro, bebida...
O que faz com que nos sintamos velhos são as ausências... Aqueles que já morreram, foram para outros lugares ou que, mesmo as distâncias sendo curtas, se tornaram ausentes do nosso convívio. Especialmente as pessoas que ficam doentes ou que a velhice se prolonga experimentam o quanto se gostaria de ter próximo quem foi especial para nós, mas que a recíproca não é verdadeira.
A capacidade de autonomia - em qualquer etapa da vida - depende daquilo que aprendemos e das oportunidades que se construiu. Até no envelhecer. Andar pelas ruas procurando nos outros os traços que mostram o passar do tempo é esquecer que o espelho é um conselheiro implacável que não permite enganos.
A Natureza é sábia e seleta. Quando dá uma oportunidade para que se viva mais, também alcança as condições para aproveitar melhor esta etapa. Já não se precisa de todas as pessoas sempre. Ocasiões em que se formam multidões ou muita agitação já não agradam, mas permite andar por uma calçada sorvendo o sol da manhã, vendo crianças que ajudam os pais no pátio, passe por uma grávida que sonha com o futuro...
Futuro um dia sonhado, que virou realidade, fez atravessar e viver parte da História. Reencontrar amigos e conhecidos alimenta os dias em que nos recolhemos ao silêncio. Aos 63 anos, posso até estar no alvorecer da terceira idade, mas sei, com certeza, que viver é uma bênção. Uma bênção em que o tempo não permite que se perca a esperança. Não mais de grandes realizações, apenas de convívios e reencontros... porque aprender a viver bem o envelhecimento é já sentir um gostinho da própria Eternidade!

domingo, 2 de dezembro de 2018

Um dezembro até o Natal...

Quando se aproximam as festas de fim de ano acirram-se duas vertentes: daqueles que se enchem de expectativas positivas vendo no Natal e Ano Novo um tempo diferente, capaz de atender a muitos de seus anseios. Também, daqueles que já não encontram sentido nos festejos e gostariam de vê-los passar da forma rápida e silenciosa.
Não há como atender a nenhum dos lado. Tanto em nível pessoal quanto do ambiente criado pela mídia somos instados a ver uma abundância de prazeres, especialmente ao consumirmos, e uma alegria postiça alimentada pela sensação de perfeição (ou quase) de pessoas que bebem, comem, divertem-se numa festa que parece não acabar...
Paralelamente aos incontáveis anúncios para o consumo, há também a preocupação por parte de publicações em mostrar que é uma época propícia para a depressão, frustração por expectativas não cumpridas e o desapontamento por parte de familiares e amigos que julgam cumprir com sua boa ação ao fazer visita a um idoso ou doente (por exemplo), neste tempo, compensando toda a sua ausência do resto do ano!
Mesmo na infância, o "espírito de Natal" apregoado nos comerciais destoa de tal forma da realidade que, ao receberem seus presentes, há uma diferença tão grande que frustra o esperado. Além do fato de que a repetição de momentos em que a criança "deve" receber presentes causa outro problema: o acúmulo de coisas desnecessárias e, muitas vezes, a volta aos brinquedos velhos com os quais tem mais identificação.
Não há como fugir àquilo que está nos meios de comunicação e nas ruas. Embora também se saiba que desta orgia consumista o que vai sobrar são contas nos cartões de crédito e nos carnês. Ano novo com novas e salutares intenções... que, na maior parte das vezes, evaporam-se antes da Festa dos Santos Reis (6 de janeiro).
Os cristãos vão dizer que a solução está em viver este tempo pensando na mensagem daquele que tem a lembrança de seu nascimento em 25 de dezembro: Jesus, o homem de Nazaré. Hoje, grande parte da população utiliza este período apenas para comemorar o Papai Noel. Entre o velhinho de saco cheio de presentes e o pensador que pedia amor e paz à humanidade, os homens escolhem o primeiro...
Infelizmente, somente com o tempo é que se aprende de fato a respeitar a individualidade. Enquanto alguns azaram com foguetes e buzinas, outros acendem uma vela e quedam-se em oração... Lembram do que alguém já disse: "a melhor mensagem de Natal é aquela que sai em silêncio de nossas almas e aquece com ternura os corações daqueles que nos acompanham em nossa caminhada pela vida..."