Uma charge de hoje mostra Millór Fernandes chegando ao Céu e um dos auxiliares de São Pedro diz: "Millór chegando ao Céu e o Papa visitando Cuba, onde vamos parar?". Não consigo ver uma melhor forma de homenagear o grande humorista que era capaz de, em curtas frases, transmitir uma ironia felina e arrasadora.
Mas, porque as situações podem ser consideradas antagônicas? Porque Millór tinha um traço esquerdista, às vezes contrários a certos valores religiosos, em especial aquelas políticas mais tradicionalistas, próprias do ranço do poder. Em contraponto, a visita do papa Bento XVI a um dos poucos países que ainda se considera comunista, tem tudo de negociação e articulação política. Sua Santidade Reverendíssima está na ilha muito mais como estadista do que como pastor.
Quando converso em palestras, seguidamente me pedem esclarecimentos sobre o porquê da Igreja ser Católica, Apostólica e "Romana"? Os dois primeiros são de fácil compreensão: universal e de origem nos apóstolos de Jesus. E porquê "Romana", se nasceu em território que hoje é Israel? Exatamente porque o primeiro estrategista da Igreja - Paulo - deu-se conta de que se ficassem naquele território, não conseguiriam ser universal. O grande centro de então era Roma, que se expandia e ia em direção a todo o mundo conhecido de então.
Esta opção e depois a união entre a Igreja e o Estado permitiu que ela também se expandisse, mas também cobrou uma conta que pagamos até hoje: muitas lideranças esqueceram que, passando o tempo, igreja e estado entraram em conflito e se desligaram, mas ainda restam resquício da magnificência e do poder.
Que Millór, por seus merecimentos, chegue aos Céus. Mas que também o papa faça as suas visitas como pastor, talvez com menos pompa e circunstâncias, mas na humildade daquele que para servir não poupou sacrifícios e, em nenhum momento, pediu honra e poder, mas o direito de lavar os pés daqueles que o seguiam. Novos tempos pedem uma nova Igreja, quem sabe capaz de dar um exemplo daquilo que é o seu maior carisma: o amor ao próximo, a caridade, alimentados na fé e na esperança, valores esquecidos ou escanteados e que precisam ser revividos.
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