Gratidão. Foi o que senti quando deixei meus óculos ao lado de uma balança, numa farmácia, e, depois de algum tempo, ao dar-me conta, entrei na angústia da procura. A informação por telefone foi de que lá nada havia aparecido. Final de tarde, preferi ficar de óculos de sombra com grau e tomar providências em uma ótica na manhã seguinte. Antes, pensei passar no local da perda e falar com as atendentes. A primeira sorriu quando brinquei se “um par de óculos não procurou pelo dono”. Disse que sim.
Com um jeito feliz no rosto, passei por outros
profissionais que, em seguida, colocaram o objeto perdido em minhas mãos.
Estava preparado para enfrentar uma manhã em que deveria providenciar a receita
recentemente conseguida, escolher armações e lentes, e aguardar... Por quantos
dias? Com o inconveniente de ficar por algum tempo usando óculos de sombra durante o dia e à noite. Ninguém
merece! Voltei para casa levinho. Podia pensar em outras coisas para fazer, sem
preocupações e com um gasto a menos.
“Gratidão” foi para mim palavra que sempre soou açucarada... Repensei o conceito a partir destes momentos recentes, em que o “agradecer”, mesmo que sem palavras, tenha sido por um outro gesto, um olhar, quem sabe um sorriso. Foi necessário passar uma noite chateado por um pequeno inconveniente, que poderia ser sanado com facilidade, para perceber a intensidade de algo que não precisa ser explicado, mas sentido na pele. É um dos motivos que nos aproxima, é um dos elementos que nos humaniza.
Quem é relativamente bem resolvido é pessoa
solidária e grata. Estudos mostram que o sentimento de gratidão está ligado à
sensação de bem-estar no que se refere às próprias emoções. O que pode fazer
com que se sinta tranquilo, vivendo momentos de felicidade, em paz consigo
mesmo. São energias positivas que não se concentram por acaso. Precisam ser
acumuladas e “distribuídas” na hora certa. Num tempo em que se tem mais
desencontros do que encontros, vale a pena valorizar estas singelas
oportunidades.
Também se pode pensar em momentos intensos: a mão estendida para matar a fome; o ombro
oferecido para mitigar a dor; o peito que atrai pelo simples fato de querer aliviar
o fardo do outro... Ou apenas o jeito como uma criança te mira e acaricia teus
dedos; o adolescentes que transparece no olhar um poço de incertezas; o idoso
insistindo em mostrar que está vivo, ainda – e sempre – sedento por carinho! O
balbucio das palavras em que transparece a gratidão: “muito obrigado”, “com
licença”, “por favor”!
Porém, não é o dito que expressa gratidão e
gentileza, mas as atitudes. Toda a forma de inter-relação que azeita uma
perspectiva positiva de vida. Que se dá nas pequenas e grandes perdas, quando,
de alguma forma, a vida se encarrega de dar mais uma lição... Um dos caminhos em
que se pode encontrar a tal de felicidade. Quem alimenta o espírito de gratidão é capaz
de conviver, pois se preocupa em tornar a vida do outro mais leve. Como diria
Jean-Jacques Rousseau, “a gratidão é a memória do coração”.
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