Numa das minhas andanças para palestras, falava em solidariedade e contaram do grupo paroquial que preparava sopão comunitário. Faltavam ajudantes e pediram na Missa. Na segunda-feira, apareceu um senhor dos seus 80 anos. Disse que não sabia cozinhar, mas aprendia. Descascava, fatiava, lavava e fazia um pouco de tudo. Depois, souberam que era professor aposentado com pós-doutorado. Morreu a esposa, filhos migraram e ainda queria se sentir útil. Não falava muito, mas era pontual e efetivo. Fez-se necessário.
Lembrei desta história quando acompanhei a discussão a respeito do envelhecimento da população brasileira e a quantidade de pessoas que se assusta quando se dá conta de que está se tornando idosa. Tem a ver com o fim da vida, mas não só. Infelizmente, não é somente envelhecer que pega de surpresa e se fica pensando em como o tempo passou e não se aproveitou. Embora as religiões e filosofias tentem, para a maior parte das pessoas é difícil entender a proximidade do fim, a proximidade da morte!
Parte da população concentra energias em trabalhar toda
uma vida para pagar contas e manter a família. O que aproveita não é suficiente
para criar um estilo de vida que dispense a atividade profissional. Então, a primeira
morte acontece quando se aposenta e não sabe o que fazer. Ou procura
desesperadamente recolocação no mercado, num país com tantas dificuldades para os
mais novos e recém formados e ainda com o estigma de estarem “velhos demais”
para o que fizeram até pouco tempo atrás.
A aposentadoria pode ser bênção ou desgraça para si
e para os demais. É então que se descobre a utilidade do inútil. Idoso que se
cuida ainda consegue ter qualidade de vida quando se der conta de que é ele/ela
quem tem que descobrir a sua “utilidade”. Não se precisa ocupar lugar no
mercado (claro, tem aqueles que se aposentaram mal e, tristemente, precisam
fazer bicos) ou achar atividades “próprias para idosos”. Mas também tem aqueles
que fazem bico exatamente para se manterem ativos.
Mesmo em família, é comum se falar a respeito da
dificuldade de lidar com o pai e a mãe aposentados. O que dificilmente se fala
é das vezes em que cuidam da casa, reparam os filhos, ficam com eles em
horários de trabalho, estudo, viagens ou consultas e escolinhas de futebol, por
exemplo. Isto enquanto estão em plena forma física. Depois, parecem objetos
descartáveis: já foram utilizados. Sob o pretexto de proteção e cansaço, são
afastados do grupo com o qual conviveram e do qual ainda querem fazer parte...
A “utilidade” é um escape para a solidão. Assim como
a inserção em grupos sociais com diferenças etárias. Não é verdade que a sociedade
e as instituições valorizam os idosos. Legislações e discursos, muitas vezes,
não fazem jus às práticas. Pena que líderes políticos, sociais e religiosos não
se deem conta da importância em acompanhar e motivar estes segmentos. Para que
pessoas que foram significativas na vida de outras não definhem sem que se atente
para a chama da vida e de uma história que se apaga!
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