Pelotas recebeu uma destas mostras gastronômicos itinerantes, com uma marca que está nas lembranças de muitos de nós: o torresmo. Quem foi, achou interessante, mas não atendeu a todas as expectativas. Era um “food truck” vindo de São Paulo e já tendo percorrido muitos municípios brasileiros, com um cardápio até certo ponto sofisticado, para quem acreditou que ia encontrar algo bem mais simples... Os que vieram do interior ou da periferia, conheceram outro tipo de torresmo. E outro tipo de torresminho.
O torresmo era vendido em armazéns, como o do pai, o
seu Manoel. Os fornecedores eram abatedouros de porcos que existiam nas Terras
Altas, onde produziam embutidos como a linguiça, a morcilha e o patê. Num tempo
em que a vigilância sanitária não era tão rigorosa, era cardápio de produtos
que ficavam em armários sem conservação refrigerada. Em alguns casos,
alternativa para a carne. Ainda sinto o gosto do “arroz de puta pobre” (não
pensem bobagem, apenas arroz, muito tempero e uma boa linguiça).
Fui conhecer o torresminho pelas mãos de um irmão do
pai, tio Djalmo. Se o torresmo eram pedaços de carne de porco, gordura e pele
frita, o outro era tudo isto moído e prensado para que se transformasse numa
pasta para pão, perdendo bastante do seu colesterol (eu acho...). Íamos visitá-lo
na costa do Camaquã e de lá se voltava com alguns destes potes. Depois, comecei
a encontrar o mesmo produto vendido em feiras livres, em alguns casos ainda de
forma artesanal, mas alguns já com cara de industrial.
Alimento que deve ter a origem muito próxima ao
mocotó. Eram, praticamente, sobras das carnes, no caso, a suína, que atendiam
às demandas dos mais pobres. Naquele tempo, nem se pensava em colesterol,
então, era consumido em larga escala, desde ingrediente na comida, passando por
petisco, assim como, nos botecos, acompanhar um “martelinho de canha”. Me
escalava para cuidar do armazém à tardinha. Com o armário de frios à
disposição, catava os pedacinhos de carne seca, o melhor do torresmo...
Que meus referenciais de saúde não me leiam (ou
ouçam): doutor Pacheco, nutricionista Mariana e a enfermeira Raquel. Mas, na
semana passada, bateu uma vontade de procurar pelo torresminho na feira livre das
quartas-feiras no bairro Quartier. Com os índices de saúde sob controle, queria
sentir o gosto e matar a saudade. Deu para fazer as duas coisas. Uma
liberalidade controlada. Mas vieram as lembranças do boteco do seu Manoel, a
prosa com vizinhos ao voltarem do trabalho e das visitas aos tios no interior.
Assim como o mocotó, o torresmo tem o seu pé na
África. O mais popular era prensado em rodas e a melhor forma de separar as
partes era com as mãos. Depois, lamber os pedacinhos que ficavam nos dedos...
Pessoas que têm mais cuidado do que eu com a saúde, seguidamente alertam: “é
coisa muito forte!” Engraçado é que, pouco a pouco, se reconhece, como a banha
de porco, por exemplo, que não são estas comidas que prejudicam o organismo,
mas outras escolhas que fizeram a nossa mesa mais pobre...
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