No silêncio em que afloram as tuas memórias,
O ringir que chega com a aragem
É o das dobradiças da porta do teu coração.
A madeira empenada reclama com as dificuldades
De entreabrir um espaço que permita que tuas lembranças
Alcancem a rua, o sol, o passante.
Desconfiado, frestearás a vida que escorreu
Pelas calçadas, pelos meios-fios, pelas sombras
Que projetam nos muros a tua solidão.
Para tricotar os fios da saudade que apertam o teu peito,
Precisarás fazer brotar um pouco da tua história
Já sem a certeza se escorre por memórias ou pelos teus
sonhos.
A luz é diferente e incomoda a tua retina.
É tempo de adaptar-se a um novo olhar.
Como quem filtra as cores pela primeira vez,
Vais te encantar não apenas com uma ou outra cor
Mas com o arco-íris tecido e ao alcance das tuas mãos.
Os gostos e sabores entrelaçados na beleza e no encanto
De rostos, formas, flores, perspectivas...
E até quando elas se fizerem ausentes,
Sentiras a falta do que apenas pressentias
E precisastes tocar, apalpar, redescobrir
Num festival de sensações em que
A presença e a ausência se complementam
Pela necessidade de reabrir portas.
Percorre a rua como um pedinte:
Esmola um toque de mão, a carícia de um afago;
No roçar dos sentidos, encanta-te com as marcas
Que outros deixaram em teu coração.
E, depois, olha com atenção
Quando passares por outras portas.
As que estão completamente aberta e não escondem nada.
As fechadas que se recolhem ao mistério.
As entreabertas que aguçam o olhar...
São as muitas portas que ressignificam nossas vidas.
No seu jeito de acolher, expõem
Um pouco dos nossos encantamentos.
E à noite, quando usares a tramela das tuas inseguranças,
Que na intimidade te descubras sossegado
Pelo eco dos passos das tuas nostalgias
Que seguem ecoando nos paralelepípedos
Onde o tempo açoita os vestígios das tuas
reminiscências...
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