Da série de minhas lembranças de artigos passados.
A cena parecia bastante
simples - chegar ao posto de lavagem de carros, perceber que se está sem
dinheiro e solicitar: “Estou sem dinheiro. Posso trazê-lo à tarde?” A resposta,
com um sorriso: “claro, não tem problema”.
Depois que sai do posto,
durante a caminhada pela avenida dom Joaquim, muitas e ternas lembranças vieram
da época em que meu pai, seu Manoel, trabalhava em armazém, na Vila Silveira.
Naquele tempo, a conta era anotada em caderneta, ou num pedaço de folha, que
ficava ao lado da balança. O componente mais importante – tudo era feito na
base da confiança: o crédito dado e a certeza de que, com o pagamento da
semana, da quinzena ou do mês, seria saldada a dívida.
Mesmo durante o curto espaço
de tempo que morei no bairro Santana, em Porto Alegre, pude ver que o
mercadinho em frente ao meu prédio – com estrutura de supermercado – tinha as
suas cadernetas para a vizinhança.
O dado mais interessante é que
a moeda que circulava tinha idêntico nome: confiança. Dos mais antigos, ouvimos
falar de tratos feitos “à base do fio do bigode”. Como este, em idos tempos,
era sinal de absoluta seriedade, era o demonstrativo de que o negócio era
sério. Absolutamente de confiança.
Um sentimento que é flagrado
quando se olha com tranquilidade num “olho no olho”. Desde nossas mais tenras
relações de família, nos acostumamos a olhar no olho de nossos pais e saber que
não há porque mentir. Se mentir, deflagra-se uma cadeia de erros difíceis de
recuperar. E, mesmo quando há um pedido de perdão por um erro, o perdão dado
não elimina um dos mais terríveis venenos: a dúvida.
Os pais acabam percebendo que,
a não se tratar os filhos com absoluto respeito, está semeando ventos. E
podendo colher tempestade. Os filhos também se dão conta de que necessitam,
muitas vezes, desesperadamente, de um porto seguro onde possam ancorar
quando de suas dúvidas e tristezas. Esta construção tem, como elemento
fundamental, a confiança.
Do muito que ouço sobre
relação de pais e filhos – e do que aprendo a cada dia na Escola de
Comunicação, fica sempre a sensação de que precisamos recuperar credibilidade
no discurso para podermos ter relacionamentos com bases mais fortes. E nestes
dois âmbitos – família e escola – estão colocados os pilares para todos os
demais relacionamentos.
O que nos ajuda a sobreviver
em tempos difíceis sãos as relações que estabelecemos no âmbito mais próximo de
cada um de nós: a comunidade, a vizinhança e a família. Aqui, ainda hoje, é
possível perguntar, com muita tranquilidade: “Dá pra pendurar a conta?”.
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