O Mosteiro das Nuvens fica a meio caminho entre a planície e o topo da montanha. Ali moram monges e aprendizes, com muitas crianças abandonadas pelos pais, que ganham abrigo. Naquele ambiente, vivem em paz, estudam, aprendem uma profissão e, quem sabe, tornam-se um religioso como quem as acolheu.
A única
referência feminina é a empregada que trabalha na cozinha. Cuida de todos, mas,
em especial, dos órfãos. Foi apelidada de "O Espírito que faz
barulho". O motivo é que, à tarde, depois do almoço, senta-se à mesa,
repousa a cabeça e, literalmente, ronca!
O Aprendiz chegou ao Mosteiro com quase um ano. Com oito, era desenvolto, inteligente, sagaz. Sempre que possível estava na volta do Mestre, questionando. Para o Mestre, motivo de um sorriso preocupado. Para os demais, um riso debochado (discretamente), pelas perguntas estranhas e cabulosas que formulava.
Depois da
sesta, o Aprendiz entrou na sala e, sem dizer uma palavra, começou a andar ao redor
da mesa de seu Mestre, que fez de tudo para mostrar que estava ocupado.
Mãozinhas cruzadas nas costas, ainda pigarreou para chamar a atenção. Até que
ouviu:
- Pequeno menino, o que
aconteceu?
Fez-se de
rogado, esperou um pouco e disparou:
- Mestre, o "Espírito que
faz barulho" é minha mãe?
A
aproximação do Dia das Mães levara a que se falasse a respeito, já que havia
aprendizes que vinham da vila próxima e conversavam sobre o que iria acontecer
em suas casas. Nunca fizera perguntas a respeito. Mas teve que responder:
- Não, meu menino, o
"Espírito que faz barulho" não é tua mãe (deu-se conta de que
até ele usava a expressão jocosa que os garotos tinham para a colaboradora).
- Então, Mestre, eu não tenho
mãe?
Sabia que
não poderia dar uma explicação que não fosse a verdade, pois ele, certamente,
perceberia. Respirou fundo e tentou explicar:
- Eu não sei se ainda tens
mãe. Como te contei, nós te recebemos num entardecer de Outono, quando o
frio já se fazia sentir e as estradas estavam largas e vazias. Alguém te
deixou sentadinho no degrau da calçada. O Monge Porteiro disse que tu eras
como uma benção da estação, a folha mais bonita que caiu de uma árvore à
nossa porta.
- Meus pais nunca me
procuraram? Eu não tenho família?
- Não procuraram. E eu não
sei. O certo é que não eram de alguma vila próxima, senão acabaríamos
sabendo. Mas não procuramos descobrir, porque eles já tinham seus
problemas e nós te acolhemos como se fosse da nossa família.
O
Aprendiz silenciou e ficou de costas olhando pela janela:
- Eu queria ter uma família,
especialmente, eu queria ter uma mãe...
O momento
de festas comemorando o Dia das Mães fez com que as palavras cortassem fundo no
coração do velho Mestre.
- Filho, eu não posso te dar
uma mãe, mas tentamos te dar uma família...
Depois de
algum tempo, o menino voltou-se para o Mestre enxugando as lágrimas que corriam
por seu rosto, com a manga do seu hábito. Era um sorriso dolorido e triste:
- Eu sei, Mestre querido. Eu
sei... Vou pedir ao Ser Supremo que a possa enxergar numa das tantas
estrelas que a gente vê nos céus.
O Mestre
recordou que numa ocasião, conversara com os meninos durante a noite no pátio e
dissera que "as estrelas são o jeito que o Ser Supremo tem de manter as
mães sempre junto da gente. Elas brilham como se fossem beijos que dão em nossos
corações".
O menino
saiu para o pátio. Com seus botões, o Mestre pensou:
- Que motivos tinha o Ser
Supremo para lhe entregar aquela pedra tão especial que se lapidava a cada
dia e lhe deixava a sensação de que oferecera a oportunidade de, na dor e
na ausência, criar sentimentos que compensassem laços humanos tão fortes,
sem que, de alguma forma, tivesse perdido a ternura...
Queridas
amigas e mães. Esta noite, olhem para os céus e procurem a estrela que as
acarinhe por aquelas que lhes fazem falta e o lugar onde gostariam de estar para
continuar amando seus filhos!
Que o Ser
Supremo as abençoe, hoje e sempre!
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