domingo, 21 de maio de 2023

De quem você cuida?

Este semestre por motivos de saúde não estou aceitando convites para palestras ou cursos. Mas, quando voltar (e eu espero que seja a partir de julho) gostaria de iniciar conversas fazendo esta pergunta: “de quem você cuida?” Entidades sociais como as religiosas, associações, grupos de serviços poderiam tornar público lembretes com a mesma questão. Um alerta para os seus membros, não importando a idade, a função, a situação social. Cuidar inclui ficar atento, importar-se, facilitar e humanizar as relações.


Vou chamá-los de João e André. A mãe conta que, desde pequeno, João, o mais velho, tinha um cuidado especial com o irmão mais novo. Havia momentos, no pátio, em que ficava sentado próximo para cuidar da segurança do seu mano. Quando este choramingava durante a noite e iam até o quarto dos meninos, já o encontravam atento ajeitando as cobertas e repondo o bico na boca do menor. A diferença era de dois anos, apenas, mas o zelo tinha algo de especial que levaram algum tempo para entender...

Quando foram para a escola, João não se importava que o irmão pegasse a sua mão até chegar ao portão. Muitas vezes ia até a entrada da sala de aula, esperava no recreio e voltavam juntos para casa. Nos primeiros dias, as dificuldades do mais novo levaram-no a ser motivo de brincadeiras e zombaria por parte dos colegas. Foram os professores que repararam na dificuldade de concentração do menor. Levou algum tempo para perceberem outros sintomas se manifestando e o diagnóstico confirmou ser um autista...

O tratamento não foi fácil, especialmente para a mãe, que, de toda a família, encontrou no mais velho o apoio emocional e suporte para fazer a vida do outro filho o mais próximo de uma vida normal. Adolesceram e ficaram jovens juntos, com o mais novo imitando muitas vezes o comportamento do outro. Quando casou, quase teve que levar André na lua de mel... Isto não foi necessário, mas o novo casal percebeu que os pais envelheciam e, possivelmente, o primeiro filho que teriam seria um filho de coração...

Possivelmente, cada um de vocês sabe alguma história parecida. A pergunta que fiz: “de quem você cuida?” é um antídoto para quem, constantemente, se vitimiza, dá desculpas para fugir às próprias responsabilidades, especialmente com a família. Mas também no convívio social, onde, cada vez mais, as pessoas estão carentes e necessitadas de atenção, seja o porteiro do prédio, que espera um simples bom-dia, ou a senhora da limpeza, que cuida o corredor e a rua, merecendo, ao menos, um olhar e um sorriso. 

É muita pobreza gravitar na volta do próprio umbigo. Cuidei de meus país por mais de dez anos. Foi o maior aprendizado que tive, como já contei. Depois deles, preciso, ainda aprender, nem que seja ao ser escalado para ser "tio maneca uber" (levar ou trazer um familiar de algum lugar). É um tempo de muitas carências em que se quer atenção e não atender ao outro. Cuidar é uma prece que Deus ouve - mas dela não necessita - e sabe que faz bem quando as palavras viram ação, recheadas com gestos de amor e de afeto...

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