A tragédia acontecida com o Gabriel Marques Cavalheiro (18 anos), que morreu depois de abordagem policial em São Gabriel, expõe um problema sério: a necessidade de que agentes públicos sejam preparados para cuidar/servir. Infelizmente, é uma noção que falta a muitos servidores, quando há um relacionamento direto com a população mais fragilizada. Pode-se inferir que existem casos parecidos quando se fala do atendimento da saúde, da fiscalização de atividades públicas, assim como da educação.
Quando atuava na disciplina de Pastoral e Comunicação,
dentro do curso de Teologia, discutia com seminaristas e leigos que somente se
aprende a cuidar, cuidando. As teorias são interessantes, mas são muitos os
casos em que “na prática, a teoria é outra”. Usava como exemplo o caso da
assistência a pessoas idosas e doentes. Uma coisa é fazer uma “visita de
médico” em que, muitas vezes, não se gasta mais do que 15, 20 minutos. A outra
é um “estágio” quando se cuida de alguém por um tempo prolongado.
Explico, porque foi o meu caso: sempre tive pruridos com
o corpo, especialmente o alheio. No entanto, o envelhecimento de meus
pais e a necessidade de serem atendidos em carências básicas, como troca
fraldas, cuidar feridas, vômito... dão outra noção à palavra “cuidar”. Particularmente
quando se passam dias, muitas vezes meses e anos, em que as mesmas atividades se
repetem, necessitando readequar a própria vida para a nova realidade. Aí sim,
se aprende o que é “cuidar”, no sentido mais pleno da caridade.
Quem não aprendeu a valorizar a própria vida e a do
outro nunca vai ser capaz de cuidar. Pode, em algumas situações, imaginar que é
uma “autoridade” superior com a qual nada vai acontecer e da qual dependem os
demais. Tratar de pessoas nunca é fácil, mas há um olhar de simpatia e empatia
que faz a diferença de quem assume a função pública, lembrando que se
responsabiliza por mais “familiares”, porque ali estão idosos, adultos, jovens
e crianças que deveriam ver na farda a segurança da qual estão carentes.
Em muitas instâncias de formação se percebe o discurso
fácil das teorias sobre cuidados sem que se veja a prática do pregador. Era uma
das minhas questões básicas em sala de aula: “qual é a atitude de caridade
prática que hoje fazes com quem está contigo no teu grupo, teus familiares e
vizinhança?” Quem não percebe que é preciso ser “bom” primeiro com quem está
mais próximo não vai aprender a se comportar de tal maneira que evite gestos
agressivos, que muitas vezes fogem ao controle e acabam em morte...
A Brigada investiga o básico: fugiram ao protocolo de
liberar ou recolher à delegacia. “Deram carona” até o lugar onde o corpo foi
encontrado. Como assim? Seria diferente se os agentes tivessem aprendido a
cuidar um doente, acompanhar uma criança na rua, orientar um idoso, conviver
com situações em que se tornam arrimo... Quem, hoje, pede justiça não estaria
assustada tendo a violência como uma sombra que não ronda apenas os recantos
marginais dos becos e vilas, mas também quem deveria zelar pela paz...
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