domingo, 20 de março de 2022

Fotografia: a eternidade de um momento

A fotografia entrou lentamente em nossas vidas. Durante muito tempo, pelo seu custo e dificuldades técnicas, era apenas para o registro de momentos muito importantes ou, em alguns casos, substituir os clássicos quadros pintados em poses “para a eternidade”. Pelo final da década de 60, começou a se popularizar e se tornou mais acessível, sendo presença constante em aniversários, casamentos e passeios. Um registro que entrou para os álbuns ou caixas de retratos que eram acessados quando batia a saudade, recordar bons momentos, ou não se tinha mais o que conversar com as visitas…

Já na faculdade, tive aulas de fotografia e se podia tomar emprestados equipamentos para trabalhos externos. Fiquei com muitos registros de lugares e pessoas ligadas ao tempo em que vivi no Seminário Diocesano. Fotografar já era um prazer mas, depois, íamos para os laboratórios onde se fazia a revelação – em preto e branco – contemplando a maravilha de ver a imagem surgindo gradativamente, enquanto se passava pelo revelador e o fixador. O “pequeno milagre” era colocado em varais que atravessavam a sala para secar e estar pronto para, com muito orgulho, ser mostrado.

Entre professores e palestrantes, fui conhecendo a forma como as pessoas e as diferentes culturas reagiam àquilo que, para nós, já se tornava banal. Numa ocasião, o repórter fotográfico de uma revista nacional contou que percorreu uma região da Amazônia. Registrou muitas imagens e, pensando agradar, revelou algumas para mostrar aos índios, seus novos amigos. Foi uma reação inesperada: os indígenas tremiam de medo e pediam, por todos os deuses, que ele rasgasse aquele papel onde havia capturado as suas almas! Que era um mau sinal e, sem elas, na certa, morreriam...

Não é diferente do que se tem, hoje, quando se vê pelas páginas de jornais e revistas a cobertura da guerra da Ucrânia. Há um embate entre os vídeos colocados à disposição e as fotografias feitas por alguns dos melhores repórteres fotográficos do Mundo. Sempre fico com a impressão de que o vídeo vulgariza uma situação, não conseguindo atingir a sua essência, enquanto a fotografia consegue a captura de um momento. Eterniza naquela situação, naquele rosto, naquele monte de escombros, informação, denúncia, alerta, a necessidade de um olhar que se comprometa com a vida.

Minha curiosidade também é atraída pelas muitas fotos antigas sem identificação que se encontram em baús, antiquários, brechós, feiras de antiguidades… De algum lugar do passado, personagens que cruzam com os nossos olhares, numa insistência em ultrapassar o tempo e, mesmo no anonimato, criar algum tipo de laço. Imaginar com o que estavam preocupados, que bobagem haviam pensado, em quem estavam interessados, o que iriam fazer depois… O papel que já enverga e amarela, as cores que esmaecem, mesmo os lugares que o passar do tempo modificou.

A fotografia é o olhar que eterniza um momento. Desde aquelas que nos olham de um passado remoto, das fotos em preto e branco ou a cores, até chegar ao digital, é um percurso recente de histórias e lembranças. Os mais velhos dirão que não veem graça em mexer com as fotos que ficam em celulares e tábletes. Por gavetas, álbuns e caixas, fica um pouco do que nos fez feliz. Nos sorrisos e brincadeiras que ali estão capturados, sossegamos o coração, pois se fazem presentes os poucos que ainda restam ao nosso lado e uma lembrança carinhosa de quem já partiu.

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