terça-feira, 25 de agosto de 2020

Envelhecer na pandemia: "eu sou você, amanhã"

Meu caminho, ao meio-dia, quando busco almoço, é curto e certo para encontrar, ao menos, três figuras: o seu Manoel, na cadeira de rodas, em frente à casa, próximo da grade, cumprimentando os passantes; o seu Paulo, com seus 95 anos, numa poltrona mais retirada, mas com bons olhos, enxerga a gente de longe e acena. Também o seu Ceará, que está em frente ao buteco onde atende e concentra conhecidos e bebuns... Ainda a dona Braulina e diversos outros idosos, conhecidos e amigos de longa data.

Foi neles que pensei quando se fala no que acontece e pode acontecer com aqueles desta idade em tempos de pandemia. A maior parte mostra-se consciente e recolhe-se ao isolamento, atendidos por familiares e amigos. Infelizmente, nas vilas, tem casos em que o idoso mora com filhos, muitas vezes netos, e o cuidado tem que ser redobrado, pois convivem idades em que o vírus pode ser pego, mas ficar assintomático; ter uma gripe leve e ainda os da terceira idade, onde os estragos podem ser maiores.

Os noticiários dão conta de que há muitos aposentados vítimas do coronavírus, deixando famílias desassistidas. Embora os auxílios prestados pontualmente a famílias carentes, o problema do desemprego não é de hoje e, em muitos casos, a renda que mantinha e mantém o sustento básico é do salário de um ou dois aposentados. Assim como os benefícios dados aos idosos do meio rural, que tiraram da miséria um significativo número de moradores do interior, tanto em nível familiar, quanto reforçando o caixa de pequenos municípios.

Mas, nos últimos meses, também se mostrou um outro lado perigoso: o da violência contra idosos, em especial nas famílias de baixa renda, onde as dificuldades financeiras e a aglomeração de pessoas num pequeno espaço de moradia causa problemas. Também há o fato de que as pessoas já não sabem o que fazer para ocupar o seu tempo, resolver seus problemas e encontram consolo na bebida alcoólica. Alguns tendem a ficar violentos, com todas as consequências em relação a mulheres, crianças e idosos...

A pandemia tem mostrado a preocupação de filhos e responsáveis, mas também o quanto existem pessoas loucas para se livrar dos seus velhinhos. A conversa de valorização da experiência é, em muitos casos, somente conversa. Mesmo instituições religiosas e sociais não sabem bem o que fazer e, na prática, buscam crianças e jovens adultos, esquecendo que o público que deveria merecer especial atenção é exatamente o da terceira idade e doentes, mais próximos do seu encontro com a Eternidade...

Políticas do imediato atendem ao que acontece aqui e agora, mas não permitem que as gerações se sucedam com os cuidados necessários para quem, hoje, pode - não somente de forma financeira - estar presente, sendo útil no dia a dia. Uma boa perspectiva é a máxima em que um idoso pode dizer a um jovem: "eu sou você, amanhã!" Ou, se quiser, lembrando o chamado efeito do retorno: "cuida de mim, hoje, amanhã vais querer que alguém te cuide..."

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