terça-feira, 5 de abril de 2022

O pós-pandemia e a violência

Estava chegando em Porto Alegre. Havia deixado o carro numa garagem no centro, procurando por uma loja de calçados que vendia galochas (hoje chamadas de capas para calçados) e duas livrarias. Haviam alertado para ter cuidados naquela região próxima ao Mercado Público e ao camelódromo. Ao perceber que fechara, voltei em direção à praça XV. Num lance rápido, senti um safanão no pescoço. Voltei-me assustado e percebi um rapaz que fugia. Tentou arrebentar minha gargantilha. Sem conseguir colocar a mão entre a corrente e o corpo, não teve chance de concretizar o roubo.

No domingo passado, o programa Fantástico voltou a falar a respeito de violência nas escolas nestes tempos em que, para o meu gosto, apressadamente, se fala em pós-pandemia. Os índices indicaram aumento do número de jovens que apela para a violência sem que se consiga uma explicação razoável. Muitas teorias e ainda um maior número de dúvidas. Para orientadores pedagógicos e psicólogos, o confinamento afetou mais as crianças e os jovens que, pela própria idade, precisam de tempo ao ar livre ou em espaços em que possam circular e interagir.

Uma das primeiras áreas que sofreu com a pandemia foi a do emprego formal. Aumentaram os índices de desemprego e a diminuição da renda, que elevou o número de assaltos e furtos, especialmente nos médios e grandes centros. Mais pessoas sem conseguir uma forma de sustento – bicos, limpeza - levam ao desespero e à necessidade de continuar colocando alimentação na mesa, assim como ter o mínimo para a sobrevivência. Infelizmente, os números apresentados não são precisos e até a informalidade, que era a salvação da lavoura, não tem sido alternativa para renda.

Muitos ficaram confinadas em espaços diminutos, aumentando a irritação e o número de registros de agressões contra mulheres e crianças, especialmente. O modelo de habitação que se oferece para as classes mais pobres, com apartamentos em torno de 50 metros quadrados, restringiu a circulação de famílias que, mesmo pequenas – casal, muitas vezes mais dois filhos – tinham que exercitar a nem sempre fácil arte de conviver. Não tenho dúvidas de que, em determinados momentos, é necessário “colocar o nariz na rua” para desopilar e diminuir as reações intempestivas.

O uso do carro é outro termômetro desta violência. Durante quase dois anos, as estatísticas foram reduzidas a números civilizados. No entanto, bastou que se acenasse com liberações, aumentando o tempo das pessoas na rua – consequentemente o seu deslocamento – para voltar a se ter estatísticas preocupantes de mortes no trânsito, tanto no meio urbano, quanto nas vias estaduais e federais. Grande parte sendo resultado da imprudência ou do uso de álcool antes de dirigir. Sem contar os inúmeros casos de sequelados que atormentam a vida dos prontos-socorros nos fins de semana.

A constatação é básica, mas precisa ser assimilada e transformada em ação: a pandemia não nos deixou melhores, enquanto sociedade. Me atreveria a dizer que nem piores… Já se tinha problemas com a violência, um flagelo que encarcerou o cidadão atrás de muros, grades e sistemas de alarme. Os governos acenam para medidas na segurança pública. Não será suficiente se a sociedade não se mobilizar para fazer a sua parte: o processo educacional precisa gerar uma cultura da paz. Desarmar os espíritos é um bom início se o objetivo for transformar o Mundo num lugar melhor para se viver.

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