terça-feira, 8 de junho de 2021

Uma espiritualidade para o cuidador

O lendário arcebispo de Recife, dom Helder Câmara, disse que, “se dou pão aos pobres, todos me chamam de santo. Se mostro por que os pobres não têm pão, me chamam de comunista e subversivo”. Um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que teve forte enfrentamento à ditadura militar, defendia a espiritualidade enraizada na ação social. Biógrafo do arcebispo, padre Ivanir Rampon, diz que “foi um místico original… apóstolo da não violência ativa, a esperança de uma sociedade renovada segundo o ideal cristão”.

Como secretário-geral da CNBB, em 1956, trouxe para o Brasil um braço da Cáritas Internacional, que já existia na Europa desde 1897. Hoje, tem sua sede em Roma, de onde coordena operações de emergência, propõe políticas para corrigir as desigualdades e suas 170 organizações membro trabalham em defesa de um mundo mais justo e solidário. Cárita é o pseudônimo de uma mártir cristã, Santa Irene, sacrificada em Roma, nos anos 300 d.C., por ordem do Imperador Dioclesiano.

Os tempos de pandemia mostram a necessidade dos serviços de caridade feitos por igrejas, entidades sociais e indivíduos. As demandas são grandes e pressionam para que as estruturas se reforcem no sentido de novos voluntários, mas também de buscar, junto às comunidades, material para a alimentação, higiene e frio. Como “a dor ensina a gemer”, também se veem cristãos de todas as denominações trabalhando com umbandistas, espíritas e pessoas de boa vontade.

Exatamente aí entra a preocupação com a espiritualidade do agente social que trabalha com uma população que necessita ver suas necessidades imediatas atendidas. Também uma perspectiva de vida com o necessário para a subsistência. A caridade não é o descarrego de consciência em que, feita a doação em produto ou dinheiro, julga-se estar isento de todas as demais responsabilidades. A responsabilidade não é com o que se dá, mas para quem se alcança o que minimiza sofrimentos...

A Cáritas Arquidiocesana de Pelotas está neste caminho: mobiliza a sociedade para o enfrentamento dos problemas que já se fazem presente e prospecta as sequelas que advirão com o controle (e não o fim) da pandemia. Não tem receitas mágicas… aliás, a única “mágica” que faz é colocar comida na mesa de quem precisa, dar condições de higiene e amenizar o frio… com agentes, funcionários e voluntários, que se veem em meio ao furacão, necessitando de ajuda para minorar os estragos.

Dom Helder provocou um “arrastão profético”, pois vivia a mística e espiritualidade de um jeito que foi amado por uns e odiado por outros. Mas não há, até hoje, quem se mostre indiferente. Encontrar-me com o pessoal que trabalha na Cáritas de Pelotas, ontem, foi um momento de sugerir que se aprofunde a espiritualidade helderiana e a Doutrina Social da Igreja. O pão que se coloca na mesa, hoje, é o pão da esperança (como a Eucaristia, para os cristãos), em que a justiça é o fermento e o percurso é longo iniciando pelo primeiro gesto: estender a mão e caminhar na solidariedade!


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