domingo, 25 de abril de 2021

Com doçura, uma boneca e muito afeto…

A proximidade do dia das Mães tem uma carga afetiva muito forte. Comércio e serviços garantem que vai ser difícil, com as pessoas gastando bem menos do que em outros anos. E quem não tiver condições, vai procurar uma lembrancinha para mimar quem já nos deu tantos mimos. Creio, será o momento de encontrar alternativas: pequenos objetos, cartões e muito carinho e amassos! Como diz a mídia: propiciar um “dia de rainha”, tomando para si atividades que ela faz todos os dias e que se rotula como sendo “coisas de mãe!”, na verdade, a doméstica não remunerada do lar.

Os dias próximos a esta festividade, assim como o aniversário da mãe - dona França, 1º de junho – tornam mais sensível o jeito com que se vê propagandas, especialmente em vídeos, e matérias humano/afetivas. Uma emissora de televisão apresentou especial sobre idosos que residem em casa atendida pelo setor público. Alguns há muitos anos sem contato com filhos ou netos. A psicóloga da instituição desenvolveu uma campanha recolhendo e recuperando bonecas, depois trabalhou a acolhida, por parte das senhoras, dos “filhos” ou “netinhos”, conforme o imaginário de cada uma…

Os psicólogos podem explicar melhor, mas, pelo processo de transferência, encontraram sentido e reagiram ao estado comatoso em que se encontravam. Passaram a fazer tarefas que não faziam, esforçar-se com a alimentação, com a higiene, cuidar do próprio espaço no dormitório… enfim, a nova companhia provocou mais do que a previsão dos cuidadores poderia imaginar e tornou o ambiente mais feliz e interativo. Claro que sempre tem um senão… e o delas é que, para as raras visitas que apareciam, todas queriam apresentar e descrever o que as suas “crianças” haviam feito!

Foi parecido com o processo que tivemos com a mãe quando passou a ficar mais tempo na cama. Havia um anjinho que rezava o Pai Nosso e ficava sempre na sua cabeceira, com o qual fazia sua primeira e última oração do dia. Mais uma boneca que andava com ela nas suas internações. O primeiro a acompanhou na última viagem… a segunda está, ainda hoje, na minha sala de trabalho - um jeito carinhoso dela se manter presente na minha vida. Dos objetos que guardam lembranças, o pai também tinha os seus e, ao nos deixar, levou um boné das suas caminhadas e o relógio de bolso.

Nos últimos tempos, ficávamos mais sozinhos. Quando um dos meus sobrinhos tinha um filho, sempre trazia para que a “bisa” conhecesse o mais novo integrante da família. Em determinado momento, acabava no colo da mãe, quando seus olhos demonstravam a felicidade em ver a família se renovando e pendia a cabeça em direção à criança – num sentido encontro de gerações… Tinha medo de que fosse muito peso para os ossos já fragilizados, mas era difícil tirar aquele pedacinho de gente de seus braços, que a fazia tão feliz e, parecia, renovar o sentido de seus últimos dias…

Com doçura, uma boneca, e muito afeto ficam as lembranças de mães que já não estão conosco; a vontade de pedir colo para as que estão por aqui; reconhecer os sacrifícios das genitoras biológicas; as “mães” de coração, que nos adotaram entre parentes, na escola, na vizinhança. Na falta de quem deveria amparar idosos que já não têm a mesma energia e memória, a boneca - como objeto de afetividade - dá sentido ao embalo em que dormitam abraçadas. No ocaso da existência, a dureza da vida se mistura com os sonhos, tornando menos doloridas as lembranças e a própria saudade…

Nenhum comentário: