Algumas coisas que o papa Francisco faz e diz soam tão simples que as máquinas políticas (inclusive da própria Igreja Católica) colocam uma pulga atrás da orelha, especulando: “será que é isto mesmo que ele está querendo dizer?” Estão acostumados a duvidar das intenções de seus dirigentes porque foram doutrinados a “tentar ler nas entrelinhas”, ou descobrir “segundas intenções”. Este o motivo do papa publicar a encíclica Fratelli tutti (“Todos irmãos”), em 2020, inspirado no outro Francisco, o santo.
Demonstrava a vontade de propor à humanidade uma coexistência com base na fraternidade e na amizade social. Com tantos interesses em jogo, especialmente de poder e financeiro, Francisco é boicotado de dentro da própria Igreja (sem contar declarados inimigos conservadores na política, na economia e na mídia internacional). Muitas especulações, são exatamente feitas por quem não leu o documento, que é uma profunda reflexão e sublima com a “Oração ao Criador” e a “Oração cristã ecumênica”.
Deseja desacomodar cristãos políticos, que
estão na economia, educação e na religião, para que se transformem em pessoas
de boa vontade. Motivo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
trazer a proposta para a realidade brasileira, com o tema – Fraternidade e amizade
social – na Campanha da Fraternidade 2024. Conceito básico de “amizade social”
é “expandir o coração para caber quem desconhecemos, que não faz parte do nosso
círculo de amizade, mas que também precisa de um olhar amigo”.
Este olhar diferenciado “pode” superar
conflitos culturais, econômicos e políticos que se manifestam em “guerras
fraticidas”. O papa é um homem atento ao mundo globalizado e percebe que a
política está se tornando cada vez mais frágil perante os poderes econômicos
transnacionais. Questiona, com razão: “qual
significado tem hoje palavras como democracia, liberdade, justiça, unidade?
Foram manipuladas e desfiguradas para utilizá-las como instrumento de domínio,
como títulos vazios de conteúdo”.
A experiência brasileira recente
demonstra a cultura do conflito por meio da
polarização de políticas acirradas, especialmente por quem detém o poder.
Francisco diz: “a política deixou de ser um debate saudável sobre projetos a
longo prazo para o desenvolvimento de todos e o bem comum, limitando-se a
receitas efêmeras de marketing cujo recurso mais eficaz está na destruição do
outro”. Aponta como desafio construir um novo estilo de se fazer política,
tendo presente um sonho quase utópico: o “amor social”.
É possível a “amizade social” de
Francisco? “O núcleo do autêntico espírito da política” é o “amor preferencial
pelos últimos”. Propõe às lideranças religiosas e políticas a cultura do diálogo,
reconciliação e paz. Num tempo de deboches narcisistas, sublinha que a política
é o mais alto grau da caridade: dar de comer a um desempregado pode ser, muitas
vezes, descarga de consciência; assegurar direito ao trabalho, pela ação
política, é autêntica caridade, que oferece a chance da própria pessoa alcançar
a sua dignidade.
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