domingo, 25 de julho de 2021

“Exploradores da terceira idade...”

Durante um bom período, tive uma agência que atendia jornalismo, publicidade e propaganda e relações-públicas. Quando comecei a lecionar na Católica, em pouco tempo, fiquei com a ocupação de 40 horas e dei-me conta de que não conseguiria atender a dupla jornada. Desfiz a sociedade e mantive alguns clientes para a produção de originais. Fazia em casa e o meu pai, o seu Manoel, era o meu “office old man” (não tinha um office boy). Numa ocasião em que o pai trabalhava no pátio e o tempo era curto, precisei de alguém que fizesse o serviço de entrega dos originais para revisão.

A dona França se ofereceu. Deixei-a na porta da entidade, onde uma secretária já aguardava e a mãe pegaria o ônibus de volta percorrendo poucas quadras. Comecei a aula de jornalismo gráfico e tocou o celular. Uma das secretárias da instituição que recebera o material perguntando se era o professor Manoel Jesus. Ela sabia que era, ligara para o meu telefone, mas, mesmo assim, confirmei. Veio uma risada, acompanhada das demais do seu setor, e a afirmação: “nós já vimos exploradores de crianças… exploradores de mulheres… mas explorador da terceira idade… o senhor é o primeiro!”

Foi no que pensei quando comecei a ler as análises a respeito do papa Francisco, depois da cirurgia. Uma delas dizia: “é o começo do fim do papado de Francisco”. Tenho muito carinho por uma das poucas (para não dizer a única) figura religiosa que a população, de um modo geral, tomou-se de simpatia e, embora não entendendo o conjunto da sua mensagem, sabe que é honesto, sincero e um homem de Deus. Fazendo 85 anos em dezembro, é uma lufada de esperança (o sopro do Espírito Santo) sobre figurantes que podem até estar sucumbindo, mas mantêm a pose e o nariz empinado.

Muito triste, ouvir dele que “não voltará mais a sua Buenos Aires”. É injusto que se exija que alguém, nesta idade, ainda faça um trabalho profundamente tencionado por conservadores, que empacaram e sonham com um passado glamoroso onde vestes coloridas simbolizam seu poder, com artefatos sobre as roupas para os “diferenciar” e demonstrações de subserviência em ajoelhar ou beijar a mão. O afastamento do povo das igrejas não é ausência de fé, mas demonstração de que, em alguns casos, discursos religiosos se transformaram em curiosidades e representações exóticas.

Também os progressistas, achando que o papa deve acelerar mudanças. Esquecem que a Igreja Católica sobreviveu a dois mil anos graças, exatamente, em não acertar seus passos pelo andar dos revolucionários sociais. Com todos os seus pecados - utilizada por grupos políticos, financeiros ou de poder - atendeu demandas da sociedade: educação, saúde, serviço social… e sempre teve profetas denunciando manipulações e desmandos dentro e fora dos seus quadros. Internamente, homens que não entenderam o chamado de gastar a sola do sapato pelas ruas e becos da vida...

Com a experiência de cuidar meus pais até idade avançada, sei que é importante dar a um idoso o direito de tocar a própria vida. Embora desejoso de acolhê-lo e pedir que descanse, o tempo da Igreja Católica faz pensar que precisamos ser “exploradores da terceira idade...” por mais uns cinco anos! - “E, quando descansares, olha para as ruas e periferias das Buenos Aires do mundo! Com sapatos grossos e vestes simples, reencontra o Senhor de Nazaré, que vai te alcançar a mão e dizer: ‘Podemos seguir juntos. Deixastes as marcas de um Cristianismo que há muito vinha sendo esquecido...”

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