Minha experiência em acompanhar meus pais até o seu fim – o pai com 85 e a mãe com 93 anos – fazem-me olhar de forma diferente para o papa Francisco, quando, cada vez mais, se mostra cansado. Em muitas cerimônias ou celebrações, ao sentar, cerra seus olhos, em atitude que pode demonstrar concentração, mas também a fadiga pela jornada de trabalho e envolvimento com situações das quais um idoso, de 84 anos e apenas parte do pulmão, deveria ser poupado. Mas não é o caso, e se alguém disser que ele dormiu, é capaz de concordar, sorrir e ainda dar uma bênção.
Figura pública, tem problemas com as diversas alas da sua organização, especialmente em países como a Alemanha, que foi taxada pela imprensa de “mais liberal”, porque abençoou uniões homossexuais. Uma discussão que o papa tem encaminhado com desvelo e carinho, mas que precisa ser colocada dentro da ótica do Catecismo da Igreja e das instruções dadas por seus dirigentes. Com a preocupação de agir menos tentando mostrar Deus aos homens (Teologia) e mais os homens a Deus (a Pastoral), o lugar onde se cuida de cada um, o respeita, sem estigmatizar opções…
Quem se debruça sobre os documentos que publicou percebe que, desde a “Alegria do Evangelho”, há um fio condutor com orientações focadas na atitude pastoral, sem perder a perspectiva do conhecimento teológico. Oito anos depois, ainda corre atrás de uma “igreja em saída”, fazendo com que prelados, padres e religiosos gastem mais sola de sapato andando por ruas e becos do que atrás de produções intelectuais e sacristias. Quem conhece a “lógica” como a Igreja Católica funciona sabe que serão necessários alguns “franciscos” para que as mudanças sonhadas se concretizem.
Recentemente, brincou com a cachaça, o brasileiro e a oração. Bastou para receber pedradas de diversos comentaristas de plantão. Convenientemente, esquecem que Francisco não é um homem preocupado com sua imagem pública. Seu olhar ultrapassa os muros do Vaticano e chega àqueles que ouvem suas palavras e ainda acalentam a esperança de superar as guerras, a fome, o frio e as calamidades. O que alguns consideram destempero fica na conta dos tempos em que andava pelas vielas de sua Buenos Aires e quando alguém aprontava alguma taxavam: "brasileños, brasileños"!
Me imagino puxando uma manta para encobrir seus pés e suas mãos: “dorme, Francisco, descansa. Muitas ovelhas te seguem. De outros rebanhos, olham com ternura o desvelo com que tratas cada uma. A perseguição de hoje é o jeito que os homens encontraram de tentar te mudar. Enquadrar como homem público comportado e os mais próximos sabendo que é impossível. Mesmo sendo argentino, para nós, também és o ‘Francisco de Deus’. Os que te amam te abraçam com a ‘cachaça’ das festas e a oração. Melhor que ninguém, sabes que é o sussurro com que a alma encanta a Deus!”