Quem ainda não assistiu, deve assistir; quem já assistiu vai aproveitar melhor se assistir de novo o filme "Viva - a vida é uma festa". O desenho animado conta a história/parábola do menino de 12 anos, Miguel, que sonha ser um músico famoso, mas precisa lidar com sua família que é contra. Querendo mudar o comportamento da sua gente, desencadeia uma série de situações tentando entender o mistério que resultou no banimento da música - e dura quase 100 anos. Miguel vai à Terra dos Mortos e aí...
A história se baseia no Dia de Finados celebrado no México e que tem diversos ritos populares. Um deles é relatado quando Héctor (um guia malandro no além) obtém um violão com seu amigo Chicharrón, velho esqueleto amargurado e boêmio que desaparece por ter sido esquecido por seus parentes e amigos. A "parceria" é feita para que, quando Miguel retornar ao mundo dos vivos, recupere a foto e a memória de Héctor, a fim de que não tenha o mesmo fim de Chicharrón.
Esta cena me veio à lembrança quando comecei a acompanhar homenagens prestadas àqueles que tombaram como vítimas do coronavírus. De todos os jeitos, de todos os lados - agentes públicos, ilustres desconhecidos - surgiram registros de tentativas de não deixar esquecer... Pessoas que, em muitos casos, parentes e amigos sequer tiveram como dar um último adeus e a derradeira lembrança foi num corredor de hospital enquanto uma maca ia em direção a uma unidade de tratamento intensivo.
"Não há quem goste de ser número. Gente merece existir em prosa". É assim que o artista Edson Pavoni apresenta a plataforma digital "Inumeráveis", memorial que lembra mortos em todo o Brasil por conta do coronavírus. Ao desfilarem rostos e histórias pelos blocos do programa Fantástico, há um misto de esperança e tristeza. Sentimento de que uma história compartilhada ajuda a mitigar a própria dor e que, não há como acabar com a tristeza, mas fica envolta na sensação de que restou a saudade...
Nas grandes e pequenas cidades, nos templos e nos lugares públicos, tem havido um instante de silêncio impregnado de dor. A emoção de quem perdeu e a ameaça constante sobre a cabeça de todos. Poderemos ser motivo de lembrança, ou alguém vizinho, amigo, parente, da nossa casa que não resistiu. A sensação de que, enquanto sociedade, tivemos oportunidade para ter feito mais e assim tivéssemos menos perdas e ainda pudéssemos aproveitar destas presenças (agora ausências) por mais tempo...
Cruzes nas praias, sites na internet, projeções em edifícios, sinos nas igrejas e a imagem de um homenageado que, quando se aproxima, identifica outros também mortos durante a pandemia. Rostos ausentes, pessoas que farão falta: doloridas lembranças de memórias e afetos. Presentes em sonhos e recordações, certos de que a vida pode não ser sempre uma festa, mas deixaram marcas que a ausência não pode e não vai apagar!
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