O Antigo Testamento, da Bíblia, inicia com a afirmação: “E Deus disse, faça-se...” Já o Novo Testamento tem no Evangelho de São João algo parecido: “No princípio era o Verbo (palavra) e o Verbo se fez carne e habitou entre nós”. Em ambos os casos, a clara necessidade de que mesmo o Divino utiliza-se da comunicação que antecede ao fazer, a concretização de qualquer ação. Penso nisto quando a Igreja Católica do Rio Grande do Sul propõe a realização, entre 3 e 7 de fevereiro, do Mutirão Latino Americano e Caribenho de Comunicação. Uma proposta ousada e arriscada. Tenho dito em palestras que o problema da Igreja não está em documentos produzidos academicamente ou teóricos, mas em políticas que realmente levem a comunicação à realidade.
Um economista, obrigatoriamente não é um bom administrador. Pode conhecer a teoria sem que tenha tido chance de colocar a mão na realidade prática. Um sociólogo que se preocupa em buscar apenas na academia seu conhecimento pode ser um bom conferencista, mas não alguém que possa jogar luz sobre a vida do dia a dia que lhe está distante. Um padre pode ser um teólogo por excelência, mas terá dificuldade de contato com a população se não tiver a sensibilidade do pastor, que procura insistentemente qualquer ovelha perdida, até encontrá-la, tratá-la e festejar o seu reencontro.
Assim como existem alfabetizados funcionais, também temos batizados funcionais: pessoas com o mínimo ou nenhuma formação religiosa, precisando de carinho no trato do discurso que lhes é endereçado, porque não o entendem, ou entendem apenas em parte. As experiências feitas a respeito são exatamente isto: experiências. Não conseguiram transformar-se em políticas que possam dar certo em variados ambientes.
Uma comunicação popular é necessária. A academia produziu trabalhos interessantes, mas que não respondem aos anseios daqueles que estão próximos das bases e vêem a distância abismal existente entre quem produz conhecimento e aqueles que deles deveriam se valer para iluminar ou mesmo melhorar a própria realidade. Este é o desafio real: que o discurso e o testemunho possam ser entendidos, assimilados e façam a diferença entre quem prega caminhos e aqueles que caminham juntos.
domingo, 31 de janeiro de 2010
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Partilha de um sonho
Tenho um vizinho e amigo – João Jesus – que compartilha um sonho: reunir pessoas com alguma especialidade para socializar com crianças e adolescentes curiosos desejando encontrar um espaço no mercado de trabalho. Pois ao iniciar este ano, quando expressamos nossas boas intenções, decidimos tentar reunir ao menos cinco pessoas dispostas a sonhar o mesmo sonho (dizem que quando duas ou mais pessoas fazem isto, o sonho vira realidade) e colocar em prática.
Claro que também estamos “bem intencionados”, pois queremos constituir um grupo que vai do alvorecer da terceira idade (em torno dos 50 anos) até a idade que conseguirmos atingir fazendo o que pode nos dar prazer: teatro, dança, turismo... Em nossas conversas de beira de grade (as cercas já não existem mais há algum tempo), chegamos a pensar numa ONG (Organização Não Governamental), que propiciasse o espaço necessário e as mínimas condições. Não é impossível, mas é um sonho para ser colocado numa perspectiva a médio e longo prazo.
Por outro lado, a Marli – encostada e quase aposentada – gostaria de unir o útil ao agradável e trabalhar com idosos na perspectiva da afetividade, desenvolvimento cognitivo e praticas saudáveis que auxiliem a manter o corpo e a alma em movimento. Nestas andanças, ainda há aqueles que gostariam de colocar a sua espiritualidade numa nova perspectiva: sabem o quanto precisam da fé, dando sentido ao seu dia-a-dia, mas desejam ir mais longe do que algumas práticas religiosas.
Confesso que eu, embora um sonhador convicto, quando ouço estas coisas fico apenas com o desejo de que elas possam ser feitas. Algum tempo atrás, discutia com um padre, pois achava um desperdício os espaços das Igrejas ficarem restritos a uma celebração semanal, quando há tanta falta de lugares para ações envolvendo a população. Creio que da junção entre sonhos possíveis e boa vontade por parte de nossos dirigentes podemos oferecer entretenimento, informação e formação. Para além de qualquer tom político, ocupando o tempo, façamos a diferença entre viver plenamente ou simplesmente passar pela vida.
Claro que também estamos “bem intencionados”, pois queremos constituir um grupo que vai do alvorecer da terceira idade (em torno dos 50 anos) até a idade que conseguirmos atingir fazendo o que pode nos dar prazer: teatro, dança, turismo... Em nossas conversas de beira de grade (as cercas já não existem mais há algum tempo), chegamos a pensar numa ONG (Organização Não Governamental), que propiciasse o espaço necessário e as mínimas condições. Não é impossível, mas é um sonho para ser colocado numa perspectiva a médio e longo prazo.
Por outro lado, a Marli – encostada e quase aposentada – gostaria de unir o útil ao agradável e trabalhar com idosos na perspectiva da afetividade, desenvolvimento cognitivo e praticas saudáveis que auxiliem a manter o corpo e a alma em movimento. Nestas andanças, ainda há aqueles que gostariam de colocar a sua espiritualidade numa nova perspectiva: sabem o quanto precisam da fé, dando sentido ao seu dia-a-dia, mas desejam ir mais longe do que algumas práticas religiosas.
Confesso que eu, embora um sonhador convicto, quando ouço estas coisas fico apenas com o desejo de que elas possam ser feitas. Algum tempo atrás, discutia com um padre, pois achava um desperdício os espaços das Igrejas ficarem restritos a uma celebração semanal, quando há tanta falta de lugares para ações envolvendo a população. Creio que da junção entre sonhos possíveis e boa vontade por parte de nossos dirigentes podemos oferecer entretenimento, informação e formação. Para além de qualquer tom político, ocupando o tempo, façamos a diferença entre viver plenamente ou simplesmente passar pela vida.
quinta-feira, 14 de janeiro de 2010
Dona Zilda Arns
Se já o terremoto num país castigado pela pobreza como o Haiti se transforma numa grande desgraça, fica maior ainda quando leva a uma perda insuperável como a morte de dona Zilda Arns. Uma mulher marcada pela simplicidade com que se apresentava nas periferias e nos centros de poder, mas também com a singeleza de um olhar impregnado de carinho com que tratava crianças e adultos carentes que se achegavam a ela.
A firmeza em sua pregação e em seu testemunho vinha da convicção de que as mazelas enfrentadas por crianças e idosos devem ser enfrentadas com ações preventivas, iluminadas pela fé, com as mãos imersas na realidade que enfrentou e ensinou a centenas de voluntários a fazerem o mesmo.
Nunca tive oportunidade de conversar pessoalmente com dona Zilda Arns, mas ouvi palestras suas e a acompanhei em algumas aparições públicas. A médica pediatra e sanitarista não se deixava envolver nem pela sedução do poder e sequer pela sedução da mídia. Lembro uma ocasião em que ela foi a um destes grandes programas de televisão arrecadando recursos para entidades de assistência e o apresentador disse se sentir orgulhoso porque os recursos ali recolhidos mantinham a Pastoral da Criança. No mesmo instante, ela não teve dúvida e desmentiu o apresentador, dizendo que os recursos repassados significavam 30% daquilo que mantinha suas atividades.
Seu exemplo estimulou uma legião de pessoas que leva ações de prevenção da saúde em praticamente todas as periferias do Brasil. Sem a intenção de ações espetaculares, investiu na recuperação nutricional das crianças, diminuindo índices de mortalidade assustadores. Felizmente, existem muitas “Zilda Arns” que vão continuar o trabalho de formiguinha: silenciosamente, atuando na recuperação da infância e dando uma nova perspectiva àqueles que poderiam ter morrido já nos primeiros meses de vida.
Dona Zilda Arns foi uma grande mulher. Um exemplo a ser seguido, pois um caminho iluminado e que foi percorrido sempre na perspectiva do outro. Esta é uma luz que não se apaga, porque tem a força do Divino, de alguém que, superados todos os entraves, deu sentido ao próprio existir.
A firmeza em sua pregação e em seu testemunho vinha da convicção de que as mazelas enfrentadas por crianças e idosos devem ser enfrentadas com ações preventivas, iluminadas pela fé, com as mãos imersas na realidade que enfrentou e ensinou a centenas de voluntários a fazerem o mesmo.
Nunca tive oportunidade de conversar pessoalmente com dona Zilda Arns, mas ouvi palestras suas e a acompanhei em algumas aparições públicas. A médica pediatra e sanitarista não se deixava envolver nem pela sedução do poder e sequer pela sedução da mídia. Lembro uma ocasião em que ela foi a um destes grandes programas de televisão arrecadando recursos para entidades de assistência e o apresentador disse se sentir orgulhoso porque os recursos ali recolhidos mantinham a Pastoral da Criança. No mesmo instante, ela não teve dúvida e desmentiu o apresentador, dizendo que os recursos repassados significavam 30% daquilo que mantinha suas atividades.
Seu exemplo estimulou uma legião de pessoas que leva ações de prevenção da saúde em praticamente todas as periferias do Brasil. Sem a intenção de ações espetaculares, investiu na recuperação nutricional das crianças, diminuindo índices de mortalidade assustadores. Felizmente, existem muitas “Zilda Arns” que vão continuar o trabalho de formiguinha: silenciosamente, atuando na recuperação da infância e dando uma nova perspectiva àqueles que poderiam ter morrido já nos primeiros meses de vida.
Dona Zilda Arns foi uma grande mulher. Um exemplo a ser seguido, pois um caminho iluminado e que foi percorrido sempre na perspectiva do outro. Esta é uma luz que não se apaga, porque tem a força do Divino, de alguém que, superados todos os entraves, deu sentido ao próprio existir.
segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
A síndrome da esperança
Aqueles que me conhecem sabem que sou avesso a festas. Não sei se chega a ser uma síndrome, mas onde junta uma “multidão” com mais de dez pessoas, se me virem no meio é porque algum problema existe. Tudo piora com o Natal e Ano novo, quando aparece a “síndrome do final de ano”. Pensei que eu fosse o seu único portador, mas ao iniciar 2010 ouvi relatos interessantes de pessoas na mesma situação: as festas lhe doíam por terem perdido um emprego um pouco antes; pessoas que sempre estiveram juntas, agora estão ausentes; ou porque o chamado espírito de Natal está apanhando feio do espírito comercial, fazendo com que mais crianças saibam que há um Papai Noel, mas desconhecem a figura do menino Jesus.
Já ouvira história parecida, mas a pessoa que perdeu o emprego, numa situação que considera injusta, amargou as festas com um gosto de desilusão na boca. Era tão difícil se acostumar com a situação que precisava se manter permanentemente em atividade: se precisava comprar três coisas no centro da cidade, fazia três “viagens”, pois era assim que se mantinha ocupada e conseguia desviar o pensamento do que acontecera.
As perdas físicas também são muito difíceis. A morte é a pior, pois nos marca de tal forma que somos capazes de lembrar pequenos detalhes, pequenos costumes, até pequenas manias daqueles que faltam. Mas há, também, aqueles que, por diversos motivos, saem para morar longe. E famílias que eram numerosas, ruidosas em cada um destes momentos festivos, passam a se ver reduzidas a um mínimo e - embora se valorize a presença - sobra a mágoa da ausência. Neste momento são feitas avaliações e uma delas é a das desilusões sofridas. Neste caso estão as relações afetivas, de trabalho, familiares... As marcas que não deixam cicatrizes na carne, mas no coração, e que fazem rugas espirituais mais em nossas almas do que em nossos rostos.
Tomara que de todas as síndromes, de todas as marcas, aquela que nunca deixe o nosso semblante seja o de viver da esperança, de acreditar que tudo pode recomeçar, na certeza da fé, por pequena que seja, tremulando num recanto escondido, pronta a reviver, até naqueles que, algum dia, por algum motivo, nos desapontaram.
Já ouvira história parecida, mas a pessoa que perdeu o emprego, numa situação que considera injusta, amargou as festas com um gosto de desilusão na boca. Era tão difícil se acostumar com a situação que precisava se manter permanentemente em atividade: se precisava comprar três coisas no centro da cidade, fazia três “viagens”, pois era assim que se mantinha ocupada e conseguia desviar o pensamento do que acontecera.
As perdas físicas também são muito difíceis. A morte é a pior, pois nos marca de tal forma que somos capazes de lembrar pequenos detalhes, pequenos costumes, até pequenas manias daqueles que faltam. Mas há, também, aqueles que, por diversos motivos, saem para morar longe. E famílias que eram numerosas, ruidosas em cada um destes momentos festivos, passam a se ver reduzidas a um mínimo e - embora se valorize a presença - sobra a mágoa da ausência. Neste momento são feitas avaliações e uma delas é a das desilusões sofridas. Neste caso estão as relações afetivas, de trabalho, familiares... As marcas que não deixam cicatrizes na carne, mas no coração, e que fazem rugas espirituais mais em nossas almas do que em nossos rostos.
Tomara que de todas as síndromes, de todas as marcas, aquela que nunca deixe o nosso semblante seja o de viver da esperança, de acreditar que tudo pode recomeçar, na certeza da fé, por pequena que seja, tremulando num recanto escondido, pronta a reviver, até naqueles que, algum dia, por algum motivo, nos desapontaram.
segunda-feira, 4 de janeiro de 2010
Que classe média é esta?
Os números variam conforme os institutos de pesquisa, ou de acordo com as entidades que os analisam, porém o certo é que a classe média brasileira, na virada da década, gira em cerca de 50% da população. Também os critérios para se chegar a estes parâmetros não são muito seguros, entretanto, empiricamente falando, é uma fatia da população que, tendo mais dinheiro em mãos, consegue atender não apenas às necessidades básicas, mas faz investimentos, por exemplo, na casa própria e no automóvel.
Honestamente, ninguém, em sã consciência, pode dizer que estes números não sejam bons, embora eles, de cara, desnudem alguns problemas. O primeiro é o de que, incentivados por um tipo de cultura, lançam esta classe social em desmandos consumistas desnecessários, mas apresentados como necessários. E, então, o salário já não é suficiente, sendo preciso partir para o crédito a fim de aumentar a possibilidade de consumo, o que causa um desequilíbrio financeiro difícil de ser ajustado. Depois, a facilidade do crédito desacredita algo que, historicamente, sempre foi necessário para que se sedimentasse uma economia: a poupança, recursos devidamente guardados e investidos para imprevistos que a vida possa apresentar.
Também se podem questionar fatores estruturais, pois se tendo uma máquina administrativa com tantos problemas e mostrando seguidamente desvios de conduta, há quanto tempo não poderíamos ter tido mais gente vivendo na classe média e usufruindo de benefícios sociais? Historicamente, é esta classe que provoca as maiores mudanças, especialmente quando asfixiada, como aconteceu no início da década passada. Sabendo que não pode contar com a estrutura pública de governo, também provoca o investimento em áreas alternativas, como educação, saúde e segurança.
A inserção contínua e segura de parcelas da população na classe média significa um aumento de consciência, pela simples razão de que, podendo gastar mais, também pode exigir qualidade dos serviços prestados, dos públicos especialmente. É bom que se esteja alerta: afinal, é esta classe média que chega à segunda década do século podendo dar ao Brasil a paz social que todos sonhamos e que gostaríamos de ter em perspectiva.
Honestamente, ninguém, em sã consciência, pode dizer que estes números não sejam bons, embora eles, de cara, desnudem alguns problemas. O primeiro é o de que, incentivados por um tipo de cultura, lançam esta classe social em desmandos consumistas desnecessários, mas apresentados como necessários. E, então, o salário já não é suficiente, sendo preciso partir para o crédito a fim de aumentar a possibilidade de consumo, o que causa um desequilíbrio financeiro difícil de ser ajustado. Depois, a facilidade do crédito desacredita algo que, historicamente, sempre foi necessário para que se sedimentasse uma economia: a poupança, recursos devidamente guardados e investidos para imprevistos que a vida possa apresentar.
Também se podem questionar fatores estruturais, pois se tendo uma máquina administrativa com tantos problemas e mostrando seguidamente desvios de conduta, há quanto tempo não poderíamos ter tido mais gente vivendo na classe média e usufruindo de benefícios sociais? Historicamente, é esta classe que provoca as maiores mudanças, especialmente quando asfixiada, como aconteceu no início da década passada. Sabendo que não pode contar com a estrutura pública de governo, também provoca o investimento em áreas alternativas, como educação, saúde e segurança.
A inserção contínua e segura de parcelas da população na classe média significa um aumento de consciência, pela simples razão de que, podendo gastar mais, também pode exigir qualidade dos serviços prestados, dos públicos especialmente. É bom que se esteja alerta: afinal, é esta classe média que chega à segunda década do século podendo dar ao Brasil a paz social que todos sonhamos e que gostaríamos de ter em perspectiva.
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