Na doença, como na velhice, existem altos e baixos. Pode-se ter a certeza do fim num dia e, no seguinte, um arremedo de esperança. Desistir, entregar os pontos, é acabar com todas as expectativas. Para quem cuida de um doente ou de um idoso, a sensação é de peso, mas se torna leve na medida em que se percebe que, na maior parte das vezes, o desejo de viver reside, exatamente, naquele que ficou ao lado.
Minha amiga com câncer de mama deveria ter feito a segunda sessão de quimioterapia. Não fez. Suas defesas estavam baixas. A pergunta óbvia: o que fazer? Medicação, alimentação, algum tipo de exercício? Sorrindo, o médico respondeu: "dando e recebendo muitos abraços, vivendo!"
Com uma semana de tratamento, a idosa com depressão apresenta um quadro bem melhor. Recebe o alimento com mais facilidade, mantém os olhos abertos por mais tempo, fala pouco, muito baixo, mas o olhar já sorri quando fixa em alguém que também a olhe com carinho.
Rubem Alves cita o caso em que foi internado e que teve a certeza de que "nesse ponto eu já não era dono de mim mesmo, eu estava à mercê dos outros", pois sentia muita dor na coluna. Foi quando, numa discussão com Adélia Prado, queriam saber se esta - a dor - era a pior, ou o medo.
No processo de doença - ou de envelhecimento - entre a dor e o medo, o pior é quando os cuidadores infantilizam ou coisificam o cuidado. No último caso, acontece o que citava Rubem Alves, a perda da autonomia. Que se expressa em coisas simples, como a pergunta se a pessoa ainda quer comer, se quer que feche ou abra a cortina, se deseja que o travesseiro esteja de um jeito ou de outro.
Ainda não é tempo de desanimar. Faltam abraços a serem dados, olhares que acariciem enquanto se gasta mais tempo para consumir uma colher de alimento, confidências capazes de dar ânimo à espera; um sol de Primavera capaz de fechar os olhos não por cansaço, mas pelo simples prazer de viver.
O problema da nossa funcionalidade é que tratar a pessoa adequadamente demanda tempo. E a maior parte dos cuidadores acha que é perda de tempo gastá-lo nos detalhes, quando se atende o atacado. Esquece que é nos detalhes que se esconde a diferença, inclusive onde quem é tratado pode sentir calor humano, sensibilidade, capacidade de empatia.
Ainda não... Convivo com doentes, idosos, deficientes... De cada um, há um jeito diferente para se ver a vida. Pura e simplesmente pensar nas necessidades que possuem é muita pobreza para um tratamento humano e cristão.
Mas de todos os caminhos que percorri, entre muitas lições aprendidas, há uma em especial: o tempo passa. As feridas se curam. A partida é inevitável. Mas nada, nem ninguém, faz retornar o momento perdido em que se negou o convívio. Na hora de cuidar, talvez não se perceba, mas confirma a memória afetiva ecoando na voz do Pequeno Príncipe: "tu te tornas eternamente responsável por aqueles que cativas!"
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