O presidente eleito, mas não empossado – porque morreu antes – Tancredo Neves contava para os íntimos a seguinte história: um deputado chegou a ele e perguntou: “Presidente, tenho um segredo, que gostaria de contar para o senhor. O senhor sabe guardar segredos, não?” E Tancredo, bonachão, respondeu com toda a tranquilidade: “se o senhor que é dono do seu segredo, não sabe guardá-lo, porque é que eu iria fazê-lo?”
Conto isto para falar de linguagem, que, no dito popular “é uma fonte de mal entendidos”. Explica-se pela técnica de grupos em que se retira alguém da sala e conta-se uma história. Depois, a pessoa que ouviu vai passar adiante, quando a última conta para todos. O interessante é que a história chega completamente diferente do que foi contada originalmente.
A linguagem é fonte de aproximação, sedução, encantamento, mas também pode ferir, magoar, distorcer, atormentar. É a forma como é utilizada. Talvez, nem sempre, intencionalmente, mas quando se pensa em reforçar uma argumentação, usada de forma definitiva - mas equivocada - pode ser um “tiro no próprio pé”.
Embora se diga que “de bem intencionados, o inferno está cheio”, não consigo ver em pessoas que ouvem informações e passam adiante de forma distorcidas apenas má intenção. É um processo. Trabalhamos com pessoas. E gente é uma “coisa” difícil de lidar. Já ouvi muitas vezes: “mas não era isto o que eu queria dizer!”. Mas disse, e acontece como a história daquele padre que ouvindo as duas maiores fofoqueiras de sua paróquia, resolveu dar uma penitência: soltar as penas de um travesseiro do alto da torre da igreja e voltar. Ambas foram, muito felizes. Ao voltar, o complemento da penitência: sair pela cidade recolhendo todas as penas!
Medir as palavras e pensar para quem se vai falar. Esta é uma regra elementar e que, se bem colocada, é capaz de fazer a alegria de todos. A linguagem oral pode ser uma fonte de mal entendidos, mas pode ser complementada pela linguagem do coração, do olhar, do carinho. E aí não há como errar: a gente faz da vida uma linguagem completa do que existe de mais significativo para a Humanidade: a linguagem do amor.
domingo, 29 de novembro de 2009
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
Aposentados, mas não mortos
Os aposentados que recebem mais do que um salário mínimo, até pouco tempo atrás uma massa disforme e sem força, estão mostrando que, embora tenham chegado à terceira idade, não entregam os pontos. Sabem que as centrais de trabalhadores, entre conseguir benefícios para os que estão na ativa e os que já penduraram as chuteiras, ficam com os primeiros. Restou a mobilização, constrangendo as lideranças do governo federal e imagens impactantes que repercutirão nas eleições do próximo ano.
Uma imagem e uma advertência: a foto dos aposentados deitados pelos corredores do Congresso correu Mundo, a mostrar o descaso com os idosos. E de um deles o aviso: “Temos todo o tempo possível e imaginável para fazer campanha ou, se for o caso, trabalhar contra aqueles que querem nos ver na mendicância”.
O certo é que a turma do “deixa disto” já está se mobilizando para que o governo tenha o menor prejuízo possível. O argumento é que, deixando o pessoal se aposentar cedo e permitindo reajuste integral pelo salário mínimo, causará problemas aos cofres públicos. Em sua defesa os aposentados - ou pretendentes - argumentam que não foram eles que causaram os problemas da Previdência que, eleitoreiramente ou não, criou uma série de benefícios sem ter caixa para tanto. Vão mais longe e dizem que trabalharam uma vida com a certeza de um tipo de aposentadoria que lhes é negada agora.
Vou colocar mais fogo na fogueira. Pelo jeito, o governo vai convencer da necessidade de que o homem some 95 anos (trabalho+idade) para se aposentar, o mesmo acontecendo com a mulher, aos 85 anos. Por quê? Eu conheço muitas viúvas e raros viúvos. Há uma campanha no ar dizendo que o homem dura sete anos a menos. Então porque tem que trabalhar e viver mais para se aposentar? O justo não seria o contrário?
O certo é que, parodiando o presidente, “nunca na história deste País” os aposentados estiveram tão unidos em busca de seus direitos. A turma ainda vai desfilar muito pelos corredores dos poderes públicos, mas, agora, é escutada e respeitada. De bobos, não têm mais nada e podem ensinar técnicas de mobilização. Quem diria, estão reconquistando o lugar de onde nunca deveriam ter saído: estão aposentados, mas não estão mortos.
Uma imagem e uma advertência: a foto dos aposentados deitados pelos corredores do Congresso correu Mundo, a mostrar o descaso com os idosos. E de um deles o aviso: “Temos todo o tempo possível e imaginável para fazer campanha ou, se for o caso, trabalhar contra aqueles que querem nos ver na mendicância”.
O certo é que a turma do “deixa disto” já está se mobilizando para que o governo tenha o menor prejuízo possível. O argumento é que, deixando o pessoal se aposentar cedo e permitindo reajuste integral pelo salário mínimo, causará problemas aos cofres públicos. Em sua defesa os aposentados - ou pretendentes - argumentam que não foram eles que causaram os problemas da Previdência que, eleitoreiramente ou não, criou uma série de benefícios sem ter caixa para tanto. Vão mais longe e dizem que trabalharam uma vida com a certeza de um tipo de aposentadoria que lhes é negada agora.
Vou colocar mais fogo na fogueira. Pelo jeito, o governo vai convencer da necessidade de que o homem some 95 anos (trabalho+idade) para se aposentar, o mesmo acontecendo com a mulher, aos 85 anos. Por quê? Eu conheço muitas viúvas e raros viúvos. Há uma campanha no ar dizendo que o homem dura sete anos a menos. Então porque tem que trabalhar e viver mais para se aposentar? O justo não seria o contrário?
O certo é que, parodiando o presidente, “nunca na história deste País” os aposentados estiveram tão unidos em busca de seus direitos. A turma ainda vai desfilar muito pelos corredores dos poderes públicos, mas, agora, é escutada e respeitada. De bobos, não têm mais nada e podem ensinar técnicas de mobilização. Quem diria, estão reconquistando o lugar de onde nunca deveriam ter saído: estão aposentados, mas não estão mortos.
domingo, 15 de novembro de 2009
Um bom e demorado abraço
Uma rede de supermercados da Zona Sul do Estado lançou uma campanha em que o ator sai de uma loja carregando diversos produtos, em sacolas recicláveis, e é abraçado na rua, por diversas pessoas que lhe são estranhas, em reconhecimento por sua ação positiva em favor do meio-ambiente. Claro que o mais emocionado é quando chega em casa, de sua companheira.
Lembrei do jeito prazeroso como os abraços eram recebidos quando vivenciei igual experiência de uma amiga que teve o esposo desempregado; um aluno aprendendo a lidar com o sentimento de perda, especialmente de amigos próximos e na família; e o filho de amigos que luta para ter a afetividade respeitada, inclusive a sua sexualidade.
Estávamos conversando, quando senti que a amiga iria chorar. Abri os braços e foi tomada por convulsões, extravasando sentimentos represados, precisando, de alguma forma, ser compartilhados. Mas ela é forte - embora sejam chamadas de “sexo frágil” - o grande esteio de uma família, onde, além do marido e três filhos, ainda cuida dos pais e cumpre tripla jornada de trabalho: em casa, lecionando e estudando.
O garoto que viu desmoronar uma série de relações em pouco menos de um ano ficou marcado por ter a mesma crença que todos um dia tivemos: de que nossas relações afetivas da juventude seriam eternas. Se o normal é que, passados os anos universitários, tomemos caminhos diferentes, diversos fatores levaram à perda de amigos e problemas familiares. E ainda precisa clarear o que quer de seu futuro, sendo daqueles alunos que a gente diz: “vou vê-lo tomar conta do Mundo!”
Em caso semelhante, está aquele que também vai ser um grande profissional, mas precisa, hoje, ver sua privacidade respeitada, querendo apenas o que é de seu direito: um lugar profissional, ao qual fez por merecer, independente do que sejam suas opções afetivas e sexuais.
Nos três casos, as pessoas têm as suas próprias respostas, mesmo que, neste momento, estejam fragilizadas, precisando de um ombro amigo, um olhar atento e afetivo e, se ainda assim estiver doendo muito, um bom e demorado abraço.
Lembrei do jeito prazeroso como os abraços eram recebidos quando vivenciei igual experiência de uma amiga que teve o esposo desempregado; um aluno aprendendo a lidar com o sentimento de perda, especialmente de amigos próximos e na família; e o filho de amigos que luta para ter a afetividade respeitada, inclusive a sua sexualidade.
Estávamos conversando, quando senti que a amiga iria chorar. Abri os braços e foi tomada por convulsões, extravasando sentimentos represados, precisando, de alguma forma, ser compartilhados. Mas ela é forte - embora sejam chamadas de “sexo frágil” - o grande esteio de uma família, onde, além do marido e três filhos, ainda cuida dos pais e cumpre tripla jornada de trabalho: em casa, lecionando e estudando.
O garoto que viu desmoronar uma série de relações em pouco menos de um ano ficou marcado por ter a mesma crença que todos um dia tivemos: de que nossas relações afetivas da juventude seriam eternas. Se o normal é que, passados os anos universitários, tomemos caminhos diferentes, diversos fatores levaram à perda de amigos e problemas familiares. E ainda precisa clarear o que quer de seu futuro, sendo daqueles alunos que a gente diz: “vou vê-lo tomar conta do Mundo!”
Em caso semelhante, está aquele que também vai ser um grande profissional, mas precisa, hoje, ver sua privacidade respeitada, querendo apenas o que é de seu direito: um lugar profissional, ao qual fez por merecer, independente do que sejam suas opções afetivas e sexuais.
Nos três casos, as pessoas têm as suas próprias respostas, mesmo que, neste momento, estejam fragilizadas, precisando de um ombro amigo, um olhar atento e afetivo e, se ainda assim estiver doendo muito, um bom e demorado abraço.
terça-feira, 10 de novembro de 2009
O perfume da dor e da morte
“Existem cheiros marcantes. Para mim, entre eles, está o da acácia, da dama da noite, do jasmim e o da flor do pessegueiro. E foi lembrando deles que fechei os olhos para não sentir o que estava acontecendo com meu filho naquele momento”. Não sei como aquele pai podia fazer “poesia” no momento em que falava a respeito do acidente de moto vivido por seu filho e no acompanhamento que tinha dado no hospital, descrevendo todo o desespero de lutar por sua vida e encarar um ambiente carregado de dor e sofrimento.
Num tempo de Primavera, em que todos os odores são marcantes e estão presentes nas árvores, arbustos e flores que desabrocham, a analogia não podia ser mais feliz, porque todos os sinais são de vida, enquanto um acidente sempre remete à dor ou à perda de uma existência. Mas há, sim, algo em comum: a capacidade de regeneração. Este é um tempo em que toda a natureza está desabrochando e mostrando a sua capacidade de se renovar, depois de atravessar o inverno. A semelhança, para o pai, é a espera de que seu filho, com cerca de 20 anos, seja capaz de vencer a dor e reconstruir seu caminho.
As estatísticas a respeito de acidentes têm sido, no mínimo, preocupantes, e, pode-se dizer, angustiantes, porque ceifam a vida de nossos jovens, especialmente homens, que se mostram mais predispostos a exagerar na velocidade, ou em dirigir, sob o efeito do álcool. As campanhas mostrando o que aconteceu não têm sido suficiente para prevenir. O que os jovens dizem é que isto aconteceu com outros, não vai acontecer com eles. Julgam-se acima do bem e do mal e deixam os pais e familiares na angústia da espera, especialmente nas noites de final de semana, quando cada minuto é precioso para saber se retorna.
As perdas são sempre muito dolorosas. A dor por algum trauma físico também. E mais ainda quando ficam seqüelas para o resto da vida. Uma ação impensada causa uma marca que fica. E para aquele pai que pensava em odores para manter a sanidade mental, ao lado do filho, num leito de hospital, fica a impressão de que arrancou o filho do próprio fim. E sentiu o perfume da dor e da morte.
Num tempo de Primavera, em que todos os odores são marcantes e estão presentes nas árvores, arbustos e flores que desabrocham, a analogia não podia ser mais feliz, porque todos os sinais são de vida, enquanto um acidente sempre remete à dor ou à perda de uma existência. Mas há, sim, algo em comum: a capacidade de regeneração. Este é um tempo em que toda a natureza está desabrochando e mostrando a sua capacidade de se renovar, depois de atravessar o inverno. A semelhança, para o pai, é a espera de que seu filho, com cerca de 20 anos, seja capaz de vencer a dor e reconstruir seu caminho.
As estatísticas a respeito de acidentes têm sido, no mínimo, preocupantes, e, pode-se dizer, angustiantes, porque ceifam a vida de nossos jovens, especialmente homens, que se mostram mais predispostos a exagerar na velocidade, ou em dirigir, sob o efeito do álcool. As campanhas mostrando o que aconteceu não têm sido suficiente para prevenir. O que os jovens dizem é que isto aconteceu com outros, não vai acontecer com eles. Julgam-se acima do bem e do mal e deixam os pais e familiares na angústia da espera, especialmente nas noites de final de semana, quando cada minuto é precioso para saber se retorna.
As perdas são sempre muito dolorosas. A dor por algum trauma físico também. E mais ainda quando ficam seqüelas para o resto da vida. Uma ação impensada causa uma marca que fica. E para aquele pai que pensava em odores para manter a sanidade mental, ao lado do filho, num leito de hospital, fica a impressão de que arrancou o filho do próprio fim. E sentiu o perfume da dor e da morte.
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Uma esperança além da vida
A criança que perguntava: “é aqui que o papai está?”, no cemitério, fazia um questionamento de fé. Vendo a mãe chorosa e preocupada em limpar a lápide, arranjar as flores, acender velas e fazer orações, queria entender uma das mais elementares dúvidas da existência: a finitude e a conseqüente volta ao pó. Embora padres, pastores e líderes religiosos tentem, sistematicamente, argumentar com “lógica” de que, especialmente para as religiões cristãs, a morte é o grande momento de passagem, para as pessoas mais simples, isto não é tão fácil de entender. Fica a lógica da precaução: “tá certo, eu até acredito, mas na possibilidade de que reste um fiozinho de vida ali, vou tentar mantê-lo vivo”.
Como dizia um poeta: “hoje caminho meio manco, porque já são muitos aqueles que carrego no lado esquerdo (coração)”. E o passar dos anos e a proximidade da data possível do fim quase sempre tornam as pessoas mais propensas a algum tipo de espiritualidade e buscar o conforto da fé. Mas não é incomum que também busquem “adaptar” algumas coisas às suas crenças mais antigas. Quem freqüenta algum tipo de cerimônia religiosa sabe que cerca de vinte por cento tem plena compreensão daquilo que está fazendo; mais vinte devem andar próximas; mas a grande maioria busca o sentido “mágico” de uma celebração, onde quer a bênção, o pedido, o agradecimento, colocar alguém nas mãos de Deus. Na Missa católica há uma oração chamada de “coleta”, antes do anúncio da Palavra, quando o padre recolhe todas as intenções dos presentes. Questionada uma pessoa sobre o que significava não teve dúvidas: “deve ser a preparação para depois apresentarmos a oferta em dinheiro”.
Embora muitos credos busquem explicações da fé na própria ciência, por exemplo, acho difícil que isto ajude para a maior parte da população. A fé, em primeiro lugar, é uma atitude pessoal, que depois vai buscar uma religião para se expressar socialmente. Todos os processos de “conversão” só fazem sentido se já houver uma predisposição. Por isso, pode-se dizer que é uma ação, mas também uma graça, melhorando a existência e lançando uma perspectiva de esperança para além da própria vida.
Como dizia um poeta: “hoje caminho meio manco, porque já são muitos aqueles que carrego no lado esquerdo (coração)”. E o passar dos anos e a proximidade da data possível do fim quase sempre tornam as pessoas mais propensas a algum tipo de espiritualidade e buscar o conforto da fé. Mas não é incomum que também busquem “adaptar” algumas coisas às suas crenças mais antigas. Quem freqüenta algum tipo de cerimônia religiosa sabe que cerca de vinte por cento tem plena compreensão daquilo que está fazendo; mais vinte devem andar próximas; mas a grande maioria busca o sentido “mágico” de uma celebração, onde quer a bênção, o pedido, o agradecimento, colocar alguém nas mãos de Deus. Na Missa católica há uma oração chamada de “coleta”, antes do anúncio da Palavra, quando o padre recolhe todas as intenções dos presentes. Questionada uma pessoa sobre o que significava não teve dúvidas: “deve ser a preparação para depois apresentarmos a oferta em dinheiro”.
Embora muitos credos busquem explicações da fé na própria ciência, por exemplo, acho difícil que isto ajude para a maior parte da população. A fé, em primeiro lugar, é uma atitude pessoal, que depois vai buscar uma religião para se expressar socialmente. Todos os processos de “conversão” só fazem sentido se já houver uma predisposição. Por isso, pode-se dizer que é uma ação, mas também uma graça, melhorando a existência e lançando uma perspectiva de esperança para além da própria vida.
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